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A Performance dos agentes locais: organização e liderança

Parte II. Governação para o desenvolvimento Local

5. Estratégias para desenvolvimento (local) do concelho: análise e considerações em torno do

5.4. A Performance dos agentes locais: organização e liderança

A dimensão a que se chamou performance consiste no desempenho dos agentes locais e a análise desta dimensão centrou-se nas sub-dimensões organização e liderança.

A organização relaciona-se com a forma como os agentes locais trabalham e se articulam (ou não) com vista a atingir objectivos comuns. Neste sentido, foram considerados aspectos relacionados com a capacidade de mobilização dos agentes locais para a promoção de iniciativas de desenvolvimento local, a articulação das iniciativas/projectos com financiamentos (nacionais e/ou europeus) e com entidades externas (universidades, centros de estudo, centros de investigação e desenvolvimento, entre outros) para o desenho e concretização das mesmas. Foi ainda analisada a importância que assumem os novos meios de informação e comunicação para a organização e gestão dos trabalhos entre os agentes locais.

O discurso local demonstra que relativamente à capacidade e responsabilidade pela mobilização dos parceiros, a câmara se destaca de forma expressiva face a outras entidades

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também apontadas. Das opiniões recolhidas depreende-se que a autarquia não só é apontada como a entidade que reúne os requisitos necessários para potenciar o envolvimento e mobilização dos parceiros para a concretização de iniciativas locais como sobre a mesma recai essa responsabilidade:

“(…) a câmara tem de ser o principal motor de desenvolvimento e de ajuda aqui no concelho” (Entrevista a EMPRESA TERRAS DO LINCE 1- ETL1).

Esta questão encontra correspondência com a sub-dimensão da liderança analisada, como adiante será explicitado.

O desenvolvimento de actividades, projectos ou iniciativas por parte dos agentes locais ocorre em articulação com financiamentos, nomeadamente dos quadros comunitários de apoio. Como foi dito anteriormente, a própria criação de parcerias encontra na elaboração de candidaturas aos financiamentos referidos uma das suas principais motivações. Esta articulação das actividades com as várias modalidades de financiamentos disponíveis demonstra não só o interesse (individual) dos agentes locais para a concretização de investimentos no domínio das suas actividades como evidencia igualmente uma articulação e colaboração (ainda que momentânea e pontual) entre estes para a concretização desses objectivos. Como refere Simões (2008:27), as candidaturas aos financiamentos europeus revestem-se de um carácter casuístico e surgem mais como tentativa de resposta aos interesses e objectivos próprios de cada entidade e menos como o resultado de uma visão estratégica partilhada para o desenvolvimento do território.

A articulação com entidades externas para o desenho ou concretização das iniciativas dos agentes tem uma expressão reduzida. O recurso à “colaboração” deste tipo de entidades, através de contratações pontuais, apenas ocorre quando os parceiros locais necessitam de estudos específicos, no âmbito da elaboração de uma candidatura. Não é reconhecida a importância deste tipo de entidades, nomeadamente pelas suas competências ao nível científico, enquanto meios privilegiados de apoio à criação de um desenvolvimento baseado no conhecimento.

No que diz respeito à marca “Terras do Lince” conclui-se que a criação da marca não teve articulação com nenhum tipo de financiamento. A mesma foi suportada pela autarquia, que custeou o registo da mesma e a criação do respectivo logótipo. Percebeu-se, no entanto, que existe a possibilidade de submeter futuramente algumas das actividades equacionadas para o desenvolvimento da marca a algum tipo de financiamento (Ver Anexos III, Grelha de Observação, sub-dimensão “organização”).

A articulação com entidades externas só teve lugar na criação do logótipo e para a definição das especificidades dos produtos, acção em curso. Não há conhecimento de que tenha sido levado a cabo qualquer estudo de viabilidade económica ou similar.

No âmbito das orientações subjacentes à consolidação de uma sociedade da informação e do conhecimento, entendeu-se valorizar a questão dos novos meios de informação e

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comunicação. E, como foi referido no enquadramento teórico, esta sub-dimensão englobou a análise do papel que as tecnologias de informação possuem enquanto canais de facilitação da aproximação e comunicação entre os agentes.

Para além de se ter sido possível constatar que todos os agentes locais utilizam o computador como ferramenta de trabalho, a internet é o meio de comunicação mais utilizado entre os mesmos, sendo claramente reconhecidas as suas vantagens.

Do relatório elaborado no âmbito da implementação do Programa Agenda 21 Local constam várias conclusões que vão ao encontro das considerações acima expostas, nomeadamente: a utilização do computador está largamente difundida; a generalidade das instituições como a autarquia, juntas de freguesia, escolas, serviços públicos e privados, entre outros, tem computadores e os mesmos são usados com regularidade; muitos agentes têm também website (IPI, 2007: 135).

No entanto, regista-se também o destaque dado aos contactos telefónicos e sobretudo aos contactos pessoais (reuniões e encontros informais) para a organização dos trabalhos, como demonstram as seguintes expressões:

“ (…) hoje e nesta aldeia global, os meios, nomeadamente a internet e os e- mails são, porventura, os que mais utilizamos” ; “ Mas existe sempre a interacção pessoal, seja em que momento for (…)” (Entrevista a ENTIDADE PÚBLICA 1-EP1).

“Ficam logo estabelecidas reuniões periódicas entre os parceiros para fazer o ponto de situação. E internet e e-mails, mas é muito importante o contacto presencial para fazer a avaliação daquilo que está a acontecer”; “ (…) há um aspecto que nós privilegiamos que é um contacto quase permanente…” (Entrevista a ENTIDADE PÚBLICA 2–EP2).

Assim, embora a internet constitua um meio privilegiado de trabalho entre os agentes locais, esta assume especial importância nos contactos estabelecidos com regiões geograficamente mais distantes, como por exemplo os contactos estabelecidos com a cidade Francesa de Clamart, no âmbito da geminação.

A sub-dimensão performance contemplou a análise dos processos de liderança que se evidenciam na condução e gestão de iniciativas locais. Com a análise desta dimensão pretendeu-se principalmente avaliar a importância das lideranças na gestão dos processos de desenvolvimento local. Não houve, neste contexto, preocupação em classificar a tipologia de liderança vigente no território e apenas se considerou relevante perceber se no concelho e na implementação de estratégias de desenvolvimento existem dinâmicas de liderança.

Das considerações analisadas é evidente o seguinte aspecto: na opinião dos agentes locais, a autarquia é a entidade líder nas iniciativas de promoção do desenvolvimento local, embora os mesmos tenham revelado dificuldade em caracterizar a liderança assumida pela mesma. À liderança, enquanto dinâmica, é associado apenas o seu modo de actuação, as

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actividades que leva a cabo e o modo de gestão destas. Ou seja, na opinião dos agentes locais, quanto maior é a quantidade e diversidade das actividades feitas pela autarquia, tanto mais eficaz é a sua liderança.

Como se sabe, em territórios rurais, de baixa densidade demográfica, institucional e relacional (Dinis in Simões, 2005:5), as instituições públicas e privadas existem em número reduzido, ocupam-se de áreas muito específicas e as suas actividades são do conhecimento geral. Desta forma, as entidades com dinâmicas mais salientes assumem uma maior visibilidade, à qual é associada uma maior disponibilidade em termos de recursos humanos e financeiros. A câmara, como de resto foi possível comprovar pela observação, é a entidade de maior destaque no concelho, nomeadamente por actuar em áreas do domínio público. A ela é associado maior poder económico, técnico (sob o ponto de vista dos recursos humanos), logístico (infra-estruturas, equipamentos, etc.) e relacional (redes de conhecimento, contactos e solidariedades que se vão criando ao longo do tempo).

O capital relacional reconhecido ao poder local aproxima-se da sua capacidade de mediação, questão aprofundada por Ruivo (1990; 1988; 2000 e 2002). A este é reservado e comummente associada uma maior capacidade de negociação das condições vivenciadas localmente com outras instâncias: seja na negociação de financiamentos, seja na “reclamação” dos direitos dos territórios, seja na adequação das políticas ou ainda em outras áreas significantes para os “locais”.

Os locais são assim encarados como formas de “intermediação entre o Estado e sociedade”, assumindo um “papel mediador nas relações entre instituições estatais e processos sociais, entre estruturas e agentes portadores de práticas” (Ruivo, 1990:77). O autor salienta, inclusivamente, o termo “negociação” para dar conta das trocas estabelecidas entre poderes locais e poder central, metaforizando a sua relação como se de um tabuleiro de jogo se tratasse, onde duas equipas disputam partidas, cujos resultados têm diferentes significados para cada uma delas (2000:143), pois ambos, apesar das suas oposições pontuais, coabitam e são complemento um do outro (Ruivo e Veneza, 1988:10).

As considerações de Ruivo aqui adoptadas pretendem apenas dar conta do poder relacional do poder local e que foi possível percepcionar na pesquisa de terreno efectuada: o discurso local vai no sentido de que a autarquia é a detentora de maiores recursos humanos e financeiros, possuindo por isso uma função privilegiada para a negociação com os poderes situados num nível hierárquico superior.

Este reconhecimento não é alheio a uma certa “expectativa” de que cabe ao poder local a promoção, gestão e concretização do conjunto de actividades do território, nas quais se englobam também as iniciativas de desenvolvimento do concelho. O argumento mais saliente desta atribuição de responsabilidade à autarquia prende-se exactamente com o reconhecimento das suas capacidades técnicas e sobretudo financeiras face a outros agentes locais de menor visibilidade, menores recursos técnicos, financeiros e relacionais.

Contudo, submetida a essa apreciação, a liderança camarária dos processos de desenvolvimento local recolhe críticas dos agentes locais. Ainda que não se menospreze a

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opinião dos vários agentes locais sobre a liderança da autarquia, não é claramente perceptível no seu discurso se essas críticas se fundamentam exactamente na actuação da autarquia propriamente dita ou se nela se “escondem” o que Simões (2008:30) apelidou de “querelas localistas (concelhias) e político-partidárias”.

A liderança camarária das iniciativas locais pode implicar que as intervenções locais se pautem por uma “circunscrição excessiva do núcleo promotor a entidades públicas”, podendo desencadear “uma excessiva municipalização dos projectos e consequente perda de riqueza potencialmente proporcionada pela possibilidade em congregar outras entidades, com outras visões e lógicas de actuação no território” (Simões, 2008:33), conduzindo consequentemente à “atomização” (Ruivo, 2002:36) das intervenções locais.

Atendendo à definição da noção de liderança proposta por Northouse (1997:3) e explicitada no enquadramento teórico deste estudo, este processo não é verificável no contexto concelhio. Embora seja reconhecido que a autarquia reúne os requisitos para a mobilização dos parceiros para a definição e implementação de estratégias locais de desenvolvimento, a sua performance é medida pela quantidade de actividades que promove e concretiza, como se disse.

Ainda que a este “líder” seja reconhecida a capacidade de influenciar os restantes para atingir os objectivos propostos – e se reconheça que efectivamente promove iniciativas para o envolvimento dos agentes e da população local - seria precipitado considerar que promove uma liderança verdadeiramente mobilizadora e eficaz.

A questão já anteriormente focada sobre a proximidade do território concelhio a várias sub-regiões e a ausência de concertação entre os agentes locais que nelas têm intervenção, directa ou indirectamente, pode também encontrar revelar-se um entrave à dificuldade em criar dinâmicas de liderança no contexto concelhio.

De facto, inexistência de uma liderança eficaz no concelho pode também ser inibidora da concertação entre os agentes locais, para o desenvolvimento local. Assiste-se, desta forma, como refere Simões, a um défice de liderança e “ (…) dificuldades em criar verdadeiros sujeitos colectivos – parcerias de natureza simbiótica, em que o todo é maior do que o somatório das partes” (2008: 31).

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5.5. O exercício de prestação de contas nas iniciativas