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A pesquisa em Etnomatemática e suas implicações para a prática

CAPÍTULO 2 – ETNOMATEMÁTICACOMO PROPOSTADE INTERVENÇÃO

2.3 A pesquisa em Etnomatemática e suas implicações para a prática

educação matemática, em particular, procura compreender os significados da pesquisa na prática docente.

Até meados da década de 80, pesquisas sobre a prática docente eram marcadas pela tentativa de distanciamento entre o pesquisador e a escola, retratando a escola a partir de um olhar externo. Tal postura acabava por apresentar uma visão negativa sobre a escola e sobre os professores, o que não contribuía para a aproximação entre a universidade e a escola. A insuficiência desse modelo de pesquisa induziu a criação de um novo modelo, em que a prática docente passa a ser compreendida como espaço e tempo de formação e investigação coletiva. Como afirmam Diniz-Pereira e Lacerda (2009, p. 1230),

Já não bastava olhar para o outro, observar suas práticas e desenvolver análises sobre tudo isso. Era preciso repensar o lugar do pesquisador, questionar as abordagens metodológicas empregadas e, acima de tudo, abandonar qualquer tentativa de explicar as práticas para, diferente disso, tentar compreender os significados que as perpassavam. [...] Preocupações epistemológicas levam os pesquisadores a questionar o conhecimento que produzem, sua relevância e capacidade de contribuir com a escola por meio dos resultados de suas investigações.

Neste novo cenário, outras perguntas são formuladas pelos pesquisadores no campo da educação matemática, a fim de elaborar respostas para os desafios e as dificuldades vivenciadas no ambiente escolar. Dentre as muitas pesquisas produzidas, podemos destacar, para este nosso estudo, a tese de doutorado de Andrade (2008), na qual o autor procurou investigar sobre o impacto da pesquisa em Educação Matemática na sala de aula, por meio das seguintes perguntas:

Como as pesquisas e os pesquisadores vêm se relacionando com a sala de aula de Matemática? O que os pesquisadores têm a dizer à sala de aula de Matemática e o que esta tem mostrado a eles? Como as pesquisas e os pesquisadores podem contribuir, de um modo mais efetivo, com a mudança, a transformação e a reinvenção da sala de aula de Matemática? (ANDRADE, 2008, p. 17)

Para responder a esta pergunta, Andrade analisou os discursos de 71 pesquisadores da Educação Matemática, sendo 44 do Brasil e 27 de outros países. Tais textos e discursos foram obtidos por meio de questionário aberto/discursivo aplicado durante a pesquisa. Conclui o autor:

O tema pesquisa/sala de aula em Educação Matemática é um fenômeno complexo e de múltiplos olhares e o presente estudo apresenta, portanto, um tecer de fios dessa complexidade e multiplicidade, um processo de desconstrução capaz de ensinar algo sobre as condições da produção, possibilidades e impossibilidades de fazer, saber e ser do impacto da pesquisa de Educação Matemática na sala de aula, mas não traz uma chave para o impacto real. (ANDRADE, 2008, p. 12)

Podemos afirmar, no caso da Etnomatemática, que esse mesmo movimento em direção às demandas da sala de aula de matemática, tem se revelado cada vez mais forte. Assim, notamos um reconhecimento, por parte dos pesquisadores, das possibilidades e potencialidades de tomar a Etnomatemática como uma proposta pedagógica. Esse cenário tem produzido, entre educadores e pesquisadores, intensas discussões sobre o papel, o valor e o significado de levar em conta os pressupostos da Etnomatemática no processo de ensino e aprendizagem da matemática no contexto escolar e aponta para a necessidade de tomar a Etnomatemática como uma atitude pedagógica (DOMITE, 2014, p. 7). Na tentativa de fazer avançar a Etnomatemática como proposta pedagógica, este projeto de pesquisa procura aproximar os estudos etnomatemáticos dos processos de ensino da matemática, a partir da análise dos discursos dos primeiros pesquisadores deste campo de estudos. Compreender as histórias de vida desses pesquisadores e conhecer as transformações da Etnomatemática por eles percebidas ao longo do tempo pode fornecer novos caminhos e novas hipóteses para pesquisas futuras. Portanto, apoiamo-nos na história de vida, ou história oral, como meio para esta investigação, no sentido indicado por Fiorentini e Lorenzato (2007, p. 124):

A biografia ou a história de vida: é uma modalidade de investigação que se presta a narrar e a compreender a evolução de uma pessoa ou de um grupo de pessoas, dando destaque à trajetória profissional, sobretudo às suas práticas sociais e ao seu ideário.

[...] Uma outra fonte ou modalidade investigativa é a história oral. A história oral, segundo Meihy (2000), “é um recurso

moderno usado para a elaboração de documentos, arquivamento e estudos referentes à vida social de pessoas. Ela é sempre uma história do tempo presente e também conhecida por história viva” (p.25). E além disso, “se apresenta como forma de captação de experiências de pessoas dispostas a falar sobre aspectos de suas vidas”.

Trata-se, portanto, de colocar em destaque as vozes e as releituras desses pesquisadores, de modo a construir um registro que permita comparar, de alguma maneira, as primeiras intenções trazidas pelos fundadores desse campo de pesquisa, com os desafios atuais oriundos dos avanços conquistados nesta área e com as dificuldades ainda presentes em outras.

Do nosso ponto de vista, esta proposta pode ajudar a compreender a opinião atual dos primeiros pesquisadores da área, quando comparada às suas aspirações no momento de sua fundação. Por essa razão, entrevistar essas personagens, indagando-as a respeito de como esse campo de pesquisa evoluiu, constituirá um competente/potente instrumento para a obtenção de uma fonte histórica que servirá de orientação para as novas gerações de pesquisadores da área.

No capítulo a seguir serão discutidas as possibilidades metodológicas da História Oral como caminho para a realização desta pesquisa.