• Nenhum resultado encontrado

2.3 A Abordagem dos Mercados, a Dinâmica Agropecuária e o Debate sobre as Causas

2.3.1 A Pobreza como uma das Causas do Desmatamento na Amazônia

No contexto da emergência dos debates sobre desenvolvimento sustentável, tem- se observado que o mesmo se refere à um processo que deveria congregar diversas dimensões: sociais, ambientais, econômicas e tecnológicas e etc. Assim, trata-se de um objetivo dificultoso de ser obtido, em especial, quando permeado pela relação entre conservação dos recursos naturais e a superação da pobreza. De acordo com Reardon e Vosti (1995), uma ideia de origem malthusiana permeia a essência e o início do debate ao redor do conceito de desenvolvimento sustentável. Neste sentido, a ligação entre pobreza e meio ambiente é frequentemente referida como relacionado ao conceito de “desenvolvimento sustentável”, sendo a mesma, um resultado do processo de expansão do crescimento populacional.

Essa ligação geralmente é designada como um “ciclo vicioso” entre pobreza e degradação, no qual os agricultores, impulsionados pelo aumento da população e pela pobreza estendem o cultivo para terras marginais, causando degradação nessas últimas. Tal movimento reduz os rendimentos que empobrecem ainda mais os agricultores, o que faz retornar ao início do ciclo (DINIZ, 2018; DINIZ et al., 2008; REARDON; VOSTI, 1995).

Outro debate sobre a possibilidade de desenvolvimento em regiões com alto volume de recursos ambientais é a respeito da existência da “maldição dos recursos naturais” ou “paradoxo da abundância”, que é caracterizada pela relação controvérsia entre a abundância dos recursos naturais e o reduzido crescimento econômico em

relação as regiões com quantidades limitadas de recursos naturais (BRUNNSCHWEILER; BULTE, 2008; MEHLUM; MOENE; TORVIK, 2006; SACHS; WARNER, 2001).

A tese da maldição dos recursos naturais foi estabelecida por Richard Auty (1993) que demonstrou a incapacidade dos países detentores de riquezas naturais em promover suas economias a partir de uma base natural. As razões para existência da maldição dos recursos naturais são variadas e vão desde a apreciação do câmbio até falhas de mercado e questões institucionais (BOYCE; HERBERT EMERY, 2011; PAPYRAKIS; GERLAGH, 2007; STIJNS, 2006).

Seguindo uma perspectiva mais histórica para o tratamento da questão do desmatamento da Amazônia, algumas abordagens se utilizam também da relação entre o grau de dependência econômica da região em relação à exploração de seus recursos naturais e a atuação do Estado como agente institucional em prol do desmatamento. Neste sentido, as alternativas e tentativas de impulsionamento econômico pelo Estado para fins de exploração dos recursos naturais gerariam uma situação de subdesenvolvimento e não de superação da pobreza. Situação exemplificada a partir da demonstração do passivo ambiental como resultado dos projetos e programas de desenvolvimento agrário desenvolvidos para a região a partir dos anos de 1970.

O desmatamento, assim, seria o resultado da dinâmica agrária amazônica, a qual de acordo com Costa e Fernandes (2016) tem tido foco em duas posições contrapostas: a conservação versus a produção ou desmatamento contra não desmatamento. Naturalmente, a conservação é a opção que mantém a floresta de pé, todavia, os agentes que viveriam em uma economia relegada à pobreza e ao subdesenvolvimento. Diniz (2018) aponta a existência de uma tese difundida internacionalmente de que existe uma causalidade entre a condição de pobreza e a degradação ambiental que se traduziria no reforço da armadilha da pobreza que imporia uma sobre-exploração dos recursos naturais pelos pobres. Costa e Fernandes (2016) explicam que, de acordo com essa abordagem, o contexto na qual a hipótese da armadilha da pobreza é posta decorre da demanda por novos recursos naturais, o que levaria aos agentes econômicos a avançar sobre o bioma, no caso amazônico, sobre a floresta, desmatando-a e desprotegendo o solo e, tornando o território e os agentes mais empobrecidos. “Ao fim, os dois fenômenos retroalimentar‑se‑iam, gestando um futuro de carências sociais e devastação ambiental” (COSTA; FERNANDES, 2016).

A dicotomia entre riqueza e pobreza, vistas a partir de um enfoque tradicional, aponta, portanto, para análises contrapostas no que é econômico e do que não é econômico, se expressando em: melhor e pior; progresso e estagnação; sucesso e fracasso. Em geral, nas análises econômicas a riqueza é relacionada à indústria, transformação, grandes negócios e ao mercado globalizado, enquanto a pobreza é relacionada ao autoconsumo (subsistência), dependência da natureza (COSTA, 2012a, 2012c; LOCATEL, 2012).

Na situação da pobreza ou de subdesenvolvimento, tal como visto anteriormente, se encaixa a ideia de que o extrativismo vegetal foi o que manteve a Natureza amazônica alheia as grandes conversões impostas em relação ao industrial e o crescimento populacional. Dinâmicas estas que acabam por impulsionar a formação de núcleos urbanos e um aumento das áreas para produção de bens agropecuários, as quais serviriam como ponta de lança para o processo de desmatamento (DINIZ et al., 2008, 2009; LOUREIRO, 2002; PANDOLFO, 1994).

Na perspectiva de Margulis (2003) as condições edafoclimáticas, ainda, eram mais relevantes, pois, devido às singularidades amazônicas, como a umidade e pluviosidade, restringiriam o aumento da produtividade da pecuária. Nesse contexto, a elevação da produção ocorreria com o aumento da área de pastagem o que, em muitas ocasiões, implica em mais desflorestamento, situação que reforça a relação inversa entre expansão econômica e conservação florestal (MUELLER, 2007)

Segue que a disponibilidade de vastos recursos naturais e a superação da pobreza na Amazônia é somada a outras questões como o aumento da soberania nacional por meio do incremento populacional, redução das disputas por terra em outras regiões, assim como a migração de camponeses impostas como fatores para colocação em prática de um amplo plano de transformação agrária que mudou a configuração territorial amazônica (FERNANDES, 1999; MELLO, 2006). Tal transformação teve ampla atuação estatal através do desenvolvimento de mecanismos e instrumentos para facilitar a entrada de pessoas e de capital com o objetivo de expandir a fronteira agropecuária nacional (ALSTON; LIBECAP; MUELLER, 2002; MUELLER, 2011; NEPSTAD et al., 2002), causando, como se sabe, grande impacto ambiental e destruição de parcela significativa da floresta amazônica.