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2.1 OS PRIMEIROS PASSOS DA COOPERAÇÃO TÉCNICA

2.1.1 A política externa brasileira e a evolução da Cooperação

desenvolvimento

A inserção internacional do Brasil e a dos países latino-americanos deveria ser estudada a partir de conceitos e modelos de análise desenvolvidos por pesquisadores da região. É neste contexto que Amado Luiz Cervo defende o argumento de que:

Toda teoria envolve uma visão de dentro das relações internacionais, porque veicula valores, desígnios e interesses nacionais. Por tal razão, uma teoria alheia pode ser epistemologicamente inadequada para explicar as relações internacionais de outro país e, ainda, ao informar o processo

decisório, pode ser politicamente nociva.

Tomemos dois exemplos elementares. Se o choque de civilizações, com que Samuel Huntington vê o mundo posterior à Guerra Fria, ou o dilema de segurança, com que R. Jervis interpreta os problemas da paz e da guerra, convêm como categorias explicativas e inspiração prática para os acadêmicos ou decisores norte-americanos, por óbvio, não convêm aos brasileiros nem como explicação das relações internacionais do país, muito menos como referências para o processo decisório (CERVO, 2008, p. 5).

Segundo o autor, o modelo de inserção internacional adotado pelo Brasil, entre os anos 1810 e 1930, caracteriza-se pelo paradigma Liberal- Conservador. O liberalismo, de matriz europeia, definia o modo de organizar a produção, de se fazer o comércio e de portar no exterior. O modelo liberal fazia valer os interesses dos países europeus pautados pela imposição da abertura ao comércio internacional aos seus produtos. Era um modelo de clara exploração da periferia pelo centro capitalista. Os liberais-conservadores brasileiros procediam à leitura do interesse nacional a partir de uma sociedade simples, composta apenas por dois grandes segmentos: os grandes proprietários e exportadores de café e açúcar: donos do poder; e os escravos, ex-escravos, trabalhadores livres e imigrantes. Deste modo, os dirigentes brasileiros consideravam o interesse nacional de acordo com os seus próprios interesses, ou seja, possuir mão-de-obra barata, exportar os frutos da lavoura e importar bens de consumo diversificados (CERVO, 2003; 2008). Isso representou na chamada "diplomacia da agroexportação", conceito elaborado por Clodoaldo Bueno.

A crise econômica que assolou os países capitalistas avançados no início da década de 1930, fazendo com que adotassem práticas nacionalistas e o protecionismo comercial, impulsionou os países latino- americanos para o processo de modernização. As massas urbanas passaram a requerer emprego e melhor renda, a burguesia nacional por novas oportunidades de negócios, os militares objetivando fornecer a segurança nacional, e os intelectuais e políticos com visão revolucionária. Nesse contexto, entre os anos de 1930 e 1989, o Brasil muda o paradigma de sua inserção internacional para o Estado Desenvolvimentista28, por sua vez, composto por três características: i) consciência da transição; ii) desenvolvimento como vetor da política exterior; e iii) o realismo de conduta (CERVO, 2003; 2008). Além disso, o modelo de inserção internacional teria novas ações:

a) realizar interesses de uma sociedade complexa; b) conceber o desenvolvimento como expansão da indústria; c) prover de eficiência a política exterior mediante autonomia decisória, cooperação externa,

28 O modelo do Estado Desenvolvimentista articulou-se no Brasil em três fases

sucessivas: i) a fase da implantação de uma grande indústria de transformação (1950 e 1960); ii) a fase da implantação da indústria de base (1970); e iii) a fase de inovação tecnológica em alguns setores de ponta a partir da década de 1970.

política de comércio exterior flexível e não doutrinária, subordinação da política de segurança, da guerra e da paz, aos fins econômicos e negociação simultânea com os grandes e os vizinhos (CERVO, 2003, p. 12).

Iniciada como receptora de doação internacional pelos países desenvolvidos, a cooperação técnica internacional do Brasil tinha como objetivo aprimorar o desenvolvimento tecnológico e econômico do país, uma vez que “a cooperação haveria de preencher, mediante mecanismos concretos, a função supletiva consignada à política exterior para o esforço interno de desenvolvimento” (CERVO, 1994b, p. 41). Em outras palavras, a busca pela CTI representara na possibilidade de conseguir a melhora do desenvolvimento e alterar a situação de dependência do país no cenário internacional. Foi este o escopo que definiu a institucionalização e o gerenciamento da CTI no Brasil.

Em decorrência de uma série de fenômenos internacionais que marcaram a década de 1970, como o fim do sistema de Bretton Woods, as crises do petróleo, a desvalorização do dólar, entres outros, fazem com que os Estados Unidos reduza suas importações dos países em desenvolvimento. Isso afeta diretamente a economia brasileira, fazendo com que o país alterasse sua estratégia de cooperação internacional. Como citado anteriormente, pelo conhecimento adquirido pelas cooperações técnicas internacionais recebidas no país e pelo sucesso da sua industrialização, possuindo de certa inovação tecnológica, o Brasil passa a realizar projetos de CTI prestada aos países em desenvolvimento neste período.

Desta forma, o Brasil se insere no contexto da Cooperação Sul-Sul, que passa a ganhar força no cenário internacional neste período. A partir da crítica dos países do Sul sobre a cooperação desigual realizada pelos países capitalistas avançados, ou seja, os países do Norte, a Cooperação Técnica entre Países em Desenvolvimento (CTPD) é colocada como uma via alternativa para o desenvolvimento dos mesmos. Assim, impulsionado pela boa imagem do país no sistema internacional bem como a propagação da CTPD, passa haver a demanda por parte dos países em desenvolvimento por projetos de CTI prestada do Brasil. Aliado ao interesse do país em utilizar a CTPD como instrumento da sua política externa para estreitar suas relações comerciais com os países do Sul, o Brasil passa a realizar projetos de CTI prestada aos países em desenvolvimento.

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