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A proximidade ou distanciamento do objeto de trabalho como o objeto da dissertação

2. ANÁLISE QUANTITATIVA DA PÓS-GRADUAÇÃO STRICTO SENSU DE

3.3 O processo do mestrado

3.4.2 A proximidade ou distanciamento do objeto de trabalho como o objeto da dissertação

Para a maioria dos mestrandos (12), o objeto da dissertação não estava relacionado ao objeto do trabalho.

Analisando por programa, no Direto apenas a metade dos objetos das dissertações estava relacionada ao objeto de trabalho e na Engenharia Civil

nenhuma dissertação estava relacionada, estando vinculada à linha de pesquisa do orientador.

No entanto na Medicina, notadamente no Programa de Moléstias Infecciosas e Parasitárias, os objetos de todas as dissertações estavam relacionados ao objeto de trabalho, o que acabou por facilitar o desenvolvimento do projeto.

MDIP1: tem, tem, não é uma infecção comum, mas tem relação com controle de infecção.

MDIP2: tanto é que muitos dados eu já tinha quando eu apresentei o projeto.

MDIP3: o fato de fazer o mestrado e trabalhar na mesma área, as coisas foram se complementando, porque à medida que o mestrado foi avançando, a própria experiência profissional desses anos foi contribuindo para meus empreendimentos, para que meu objeto de estudo melhorasse ... eu vejo no meu caso, como um privilégio convergir tanto, ... este foi um outro fator facilitador, que ajuda a conciliar as coisas, porque enquanto estou trabalhando estou estudando ao mesmo tempo.

Marques (2002) considera que o pesquisador, mesmo iniciante, possui sua própria história, experiência de vida e trabalho, de onde abstrai as perspectivas de suas novas aprendizagens, através da pesquisa que pretende realizar, e conclui que não se aprende a partir do nada, pois “a

aprendizagem é reconstrução de saberes prévios e a pesquisa é a maneira de assumir o comando dessa reconstrução” (Marques, 2002. p. 232). Os

mestrandos de Medicina, que são mais velhos e com maior experiência profissional, foram os que trouxeram para suas dissertações questões formuladas, a partir de sua experiência de trabalho, coincidindo com a

pesquisa da década de 1990 com pós-graduandos de Psicologia que elegeram temas dentro de sua atividade, ou decorrentes do exercício profissional ou ainda a própria atividade profissional como objeto de estudo, sendo o trabalho a atividade determinante na escolha dos temas para a dissertação (Sanchez, 1992).

No entanto Ferreti (2002), apesar de considerar válida a proposta de buscar uma resposta para uma questão que incomoda o aluno na sua prática profissional, atenta que nem sempre existe algo mais aprofundado nesta experiência, apenas uma hipótese genérica e sem o devido aprofundamento com a literatura sobre o tema, chegando a formulações de projeto ou de objetos de pesquisa extremamente genéricos ou abstratos. Pode ainda cair no extremo oposto. Pela sua falta de familiaridade com a literatura e de conhecimentos teóricos, acabe buscando uma resposta específica para um problema específico que freqüentemente é de natureza técnica, correndo o risco de não ultrapassar o nível de um relato de experiência.

Em ambos os casos, é a falta de familiaridade com a literatura produzida na área que permitia ao pesquisador selecionar adequadamente as pesquisas que seriam utilizadas na discussão dos resultados obtidos, bem como a falta de familiaridade com o estado do conhecimento na área que torna o pesquisador incapaz de problematizar um tema, indicando a contribuição que seu estudo pretende trazer à expansão desse

conhecimento para esclarecer questões controversas ou inconsistências, ou ainda preencher lacunas (Alves-Mazzotti, 2006).

No outro extremo, situa-se o aluno que busca o orientador em função da linha de pesquisa deste, até pelo interesse pelo tema, não necessariamente em função da experiência profissional, em que seu projeto será um recorte de um projeto de pesquisa, como é o caso dos mestrandos de Engenharia de Materiais. Neste caso pesa muito o papel do orientador de formar pesquisadores para assumirem suas potencialidades autônoma e criativamente e não fabricar clones de si mesmo, adestrando os pós- graduandos para cumprirem várias funções na bancada de um laboratório, repetindo seus métodos, sua forma de lidar com a empírica e com seus parâmetros teóricos (Cavalheiro, Neves, 1998).

Outra questão a ser considerada acerca das escolhas de objeto é a necessidade de conciliar as demandas internas e externas, uma vez que a hierarquia dos domínios e objetos pode direcionar os investimentos intelectuais na busca pela obtenção de lucro material e simbólico, sendo pouco provável que o pesquisador não leve em conta, consciente ou inconscientemente, na alocação de seus interesses intelectuais, o fato de que há pesquisas cientificamente mais relevantes acerca de objetos considerados mais insignificantes que têm poucas oportunidades de ter tanto valor quanto pesquisas cientificamente insignificantes sobre objetos considerados mais importantes, que freqüentemente são os mais irrelevantes e os mais banais (Bourdieu, 1998b).

A escolha de um objeto pode também estar condicionada ao paradigma aceito por uma comunidade científica que define os critérios para a escolha de problemas que podem ser considerados como dotados de uma solução possível, sendo freqüentemente os únicos problemas que a comunidade admitirá como científicos e que encorajará seus membros a resolver. Outros problemas, mesmo aqueles anteriormente aceitos, passam a ser rejeitados como abstratos, por constituir parte de outra disciplina, ou por ser excessivamente complexo para merecer o dispêndio de tempo. Assim, uma comunidade científica pode se afastar de problemas sociais relevantes, pois estes não podem ser enunciados nos termos compatíveis aos instrumentos e conceitos proporcionados pelo paradigma (Kuhn, 2003).

Buarque (1994) atenta que a seleção dos alunos muitas vezes está condicionada às estruturas de seus cursos, aos temas e aos conteúdos das teses e é baseada na capacidade de os candidatos repetirem o que aprenderam na graduação. Os temas das teses quase sempre estão presos aos mesmos paradigmas das teorias prevalecentes, nos quais os professores se formaram.

A esse respeito, Chaui (2001) denuncia a heteronomia imposta aos universitários, reduzidos à condição de meros executantes de tarefas, cujo princípio, sentido e finalidade lhes escapam. Os bolsistas estão mais propensos a reproduzir métodos tidos como válidos pelos seus avaliadores, do que investigar em função da natureza profunda dos problemas levantados (Samaja, 1995).

Os mestrandos de Medicina entrevistados se diferenciaram dos mestrandos de Engenharia Civil e de Direito por serem mais velhos, com maior experiência profissional, a maioria com mais de 15 anos de formação, trabalhavam, possuíam mais de um vínculo empregatício bem como uma jornada de trabalho semanal superior aos demais. Para os mestrandos de Medicina, as disciplinas serviram para atualização profissional e não para o desenvolvimento da dissertação e eles ministravam aulas na graduação por ser um dos requisitos dos alunos do programa e não por estarem inseridos no PAE, e o mestrando de Medicina buscou o mestrado não para suprir alguma deficiência da graduação, mas pela sua proximidade com a universidade, assim como escolheu o tema de sua dissertação e desenvolveu o projeto antes de ingressar no curso.