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A questão de gênero e o sistema penitenciário: a população LGBT+ privada de

2 A QUESTÃO DE GÊNERO E O SISTEMA PENITENCIÁRIO: O TRATAMENTO

2.2 A questão de gênero e o sistema penitenciário: a população LGBT+ privada de

2.2 A questão de gênero e o sistema penitenciário: a população LGBT+ privada de liberdade

O sistema penitenciário brasileiro vive em um cenário de precariedade, o que de fato vem aumentando cada vez mais, sendo a superlotação de celas um dos problemas mais recorrentes. De acordo com o Levantamento Nacional de Informações Penitenciarias – INFOPEN, os dados referentes a junho de 2016, apontam que o Brasil é o terceiro pais que mais aprisiona pessoas no mundo, sendo um total de 726.712 mil pessoas privadas de liberdade, já a taxa de ocupação no sistema prisional brasileiro corresponde a 197,8%. (RELATÓRIO DEPEN, 2017, p. 7).

Acerca da destinação dos estabelecimentos prisionais de acordo com o gênero, os dados mostram que a maioria das penitenciárias foram projetadas para aprisionar a população masculina. As unidades prisionais destinadas à homens correspondem à 74%, sendo 7% destinas ao público feminino e outros 17% são classificadas como mistas, ou seja, são as

unidades prisionais que possuem alas ou celas especificas para mulheres dentro de um estabelecimento masculino. (RELATÓRIO DEPEN, 2017, p. 19).

Segundo Roberta Olivato Canheo (2017, p. 02), no Brasil há uma ausência legislativa eficaz no que tange ao assunto do tratamento das identidades de gênero. O que há de fato são iniciativas de projetos leis e resoluções quanto a esse tema, como a Resolução Conjunta do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária e do Conselho Nacional de Combate à Discriminação CNPCP/CNCD/LGBT n° 01 de 2014, com base nesta resolução, deu origem à outras duas resoluções no âmbito do Estado do Rio de Janeiro, a Resolução Conjunta nº 558, de 29 de maio de 2015, que estabelece diretrizes e normativas para o tratamento da população LGBT+ no Sistema Penitenciário do Estado do Rio de Janeiro e a Resolução conjunta da Secretaria de Administração Penitenciária (SEAP) e Secretaria de Estado de Assistência Social e Direitos Humanos (SEASDH) nº 34, a qual originou o Grupo de Trabalho Permanente de Políticas LGBT no Sistema Penitenciário do Estado do Rio de Janeiro. É evidente que a população LGBT+ privada de liberdade demanda de necessidades coletivas diversas dos demais grupos de apenados, como por exemplo respeito, reconhecimento de sua identidade e personalidade, proteção à integridade física e psicológica e atenção à saúde.

No que tange aos direitos da personalidade, os autores Dirceu Pereira Siqueira e Robson Aparecido Machado (2018, p. 177), abordam que estes são direitos inerentes a pessoa humana, ou seja, estão ligados ao ser humano e são indivisíveis, porquanto a pessoa não existiria sem eles, nascem e morrem com ela. Os direitos da personalidade estão ligados à concepção de individualidade, liberdade e a dignidade, eles visam tutelar a própria pessoa humana e a sua e integridade.

De acordo com Lucas Saldanha de Carvalho (2016, p. 05), acerca da percepção do sujeito transexual quanto ao seu gênero, a incompatibilidade entre o sexo aparente e o sexo psicológico gera conflitos de diversas ordens, tais como psicológicos, social e principalmente conflitos individuais/internos. É possível se ter um pequeno panorama de compreensão acerca da tumultuada vivência transexual, diante disso, sabe-se que a carência de direitos para o grupo LGBT+ é deveras preocupante, e quiçá mais ainda no que toca os transexuais. Os direitos da personalidade são imprescindíveis para a efetiva aplicação do princípio da Dignidade da Pessoa Humana. Dentre os direitos da personalidade, cumpre destacar o direito à identidade, que permite que cada pessoa possa ser reconhecida pelo nome que é identificado

socialmente, fazendo com que este possa constar em seu registro. Para a população trans, ter o direito à identidade reconhecido é um longo percurso visto que a identificação entre seu sexo biológico e o sexo psicológico não condizem com sua identidade de gênero, fazendo com que haja imenso abalo psicológico principalmente pela não compreensão acerca de sua existência

Nesse sentido, é imprescindível a elaboração de iniciativas eficazes, com intuito de promover a proteção e reconhecimento desses sujeitos, tendo por base a criação e execução de políticas públicas através da inserção da questão nas pautas governamentais. (ANDRADE; CARTAXO; CORREIA, 2018, p. 499).

Entretanto, é certo que, mesmo havendo essa necessidade imediata de dar um tratamento adequado a este grupo, é sabido que carece de visibilidade e reconhecimento social/político quanto a sua importância, e temas como a efetivação dos direitos humanos para pessoas presas é um tanto que desaprovado pela sociedade, ainda mais quanto à proteção de apenados do grupo LGBT+. (ANDRADE; CARTAXO; CORREIA, 2018, p. 499).

Nesse sentido, na busca por enfrentamento a essa questão um tanto quanto delicada Andrade, Cartaxo e Correia (2018) entendem que o que pode ser feito para atender as necessidades dessa população seria a efetivação de políticas públicas:

Incluir na agenda política o cuidado e atenção aos homossexuais constitui tarefa das mais complexas, razão pela qual é fundamental desenvolver iniciativas capazes de reconhecer a identidade e a cidadania, assegurar direitos inerentes à condição humana e promover o combate ao preconceito social – o que pode ocorrer por meio da implementação e desenvolvimento

de políticas públicas.(ANDRADE; CARTAXO; CORREIA, 2018, p. 499).

Para Aida Susmara da Silva (2011, p. 207-208), as políticas públicas são um conjunto de normas que tem a finalidade de alcançar um determinado objetivo. É a busca explícita de um objetivo socialmente relevante relacionado à destinação adequada de recursos, nos quais a utilização razoável deve gerar consequências positivas que alcancem as populações e grupos em estado de vulnerabilidade.

Para que sejam formuladas políticas públicas específicas à um grupo de indivíduos, se faz necessária uma criação de estratégias e planejamentos para justificar sua permanência, o que sugere que esse projeto de elaboração de políticas públicas necessita da existência de

pessoas cujos direitos vêm sendo dispensados de maneira ineficaz e para justificar a sua continuidade, bem como, a necessidade de assegurar o cumprimento dos direitos humanos. (ANDRADE; CARTAXO; CORREIA, 2018, p. 500).

O conteúdo dos direitos humanos deve superar o âmbito normativo e se inserir no plano da concretude, porque, se não é aplicado, deixa de existir. Se a aplicação dos direitos humanos não observa demandas individuais, atingindo sujeitos com problemas em diferentes dimensões, pode perder o efeito pela cristalização de propostas normativas meramente simbólicas. (ANDRADE; CARTAXO; CORREIA, 2018, p. 501).

No que tange às políticas públicas para a comunidade LGBT+ privadas de liberdade, convém ressaltar as adversidades sociais e culturais existentes, que não podem ser deixadas de lado. Para Andrade, Cartaxo e Correia (2018, p. 501) “avançar no reconhecimento dos direitos para todos os seres humanos, indistintamente, exige o desenvolvimento de iniciativas inclusivas, o aumento da representação e o combate ao preconceito, que pode ser manifestado de diversas formas.”.

A Resolução Conjunta nº 1, de 15 de abril de 2014, assinada pelo Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária e pelo Conselho Nacional de Combate à Discriminação, define medidas acerca do tratamento de pessoas privadas de liberdade que pertencem ao grupo LGBT+ no Brasil. (BRASIL, 2014a). De acordo com esta Resolução Conjunta, é notório uma significativa preocupação em relação aos detentos LGBT+, uma vez que estes vivem em um cenário caótico dentro do sistema prisional. Na sociedade, essas pessoas sofrem diversos tipos de preconceito e repressão, quando encarceradas em um sistema totalmente despreparado para recebe-las este quadro se agrava consideravelmente.

O ponto positivo da Resolução Conjunta nº 1/2014 é que ela serviu como parâmetro para criações de outras duas resoluções, como é o caso das Resoluções Estaduais do Estado do Rio de Janeiro e São Paulo. A Resolução n° 558, estabelece diretrizes e normativas para o tratamento da população LGBT+ no Sistema Penitenciário do Estado do Rio de Janeiro e a Resolução conjunta nº 34, criou o Grupo de Trabalho Permanente de Políticas LGBT+ no Sistema Penitenciário do Estado do Rio de Janeiro. No estado de São Paulo há a Resolução SAP-11, de 30/01/2014 que dispõe sobre a atenção à travestis e transexuais no âmbito do sistema penitenciário.

Entretanto o sistema penitenciário brasileiro ainda necessita de adequações para alojar as pessoas pertencentes ao grupo LGBT+, conforme relatório do DAPEN de junho de 2014, há pouquíssima disponibilidade de vagas destinadas à grupos específicos. Apenas 6% dos estabelecimentos têm celas específicas para pessoas lésbicas, gays, bissexuais e transgêneros. Layla Raissa Ramalho Paulino et al. (2012, p. 2) refere que a situação se torna preocupante no tocante ao bem-estar físico, sexual e psicológico quando da inserção dessas pessoas no sistema.

Segundo Iarani Augusta Galucio Lauxen, Caroline Cristine Costa Camargo (2016, p. 170), a comunidade LGBT+ sofre muito mais descasos dentro do sistema prisional em decorrência de invisibilidade que esses indivíduos sofrem, frente a uma população carcerária que também se encontra em situações precárias, mas por ser uma minoria, acaba vivenciando o sofrimento e o descaso em dobro seja no convívio com os demais detentos, seja em relação aos agentes penitenciários e demais servidores do sistema prisional.

2.3 As demandas mínimas do Grupo LGBT+ e a necessária adequação do sistema

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