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A reestruturação produtiva e o surgimento de novas estratégias competitivas

Dadas as características da crise atual, a pressão pela adoção de inovações tecnológicas que garantam maior competitividade pode resultar num processo diferenciado de modernização, rompendo com o padrão anterior de melhoramentos e adaptações das tecnologias tradicionais e adiamento da adoção de tecnologias novas e mais eficazes já em uso há muito em outros países (EID, 1998; EID;PINTO et al., 1998).

Essa nova “modernização” está fundamentada na adoção de um novo padrão tecnológico baseado principalmente na mecanização da colheita de cana crua e do plantio, mas também na utilização mais intensiva dos subprodutos da cana-de-açúcar, na busca de produtos diferenciados e de maior valor agregado, na incorporação de avanços recentes das biotecnologias e da tecnologia da informação, principalmente na automação de processos industriais, ao processo produtivo. Também está baseada em mudanças na logística e na diversificação para atividades complementares, como por exemplo, a co-geração de energia elétrica (VEIGA FILHO, 1998).

O fim do monopólio estatal da comercialização dos produtos da agroindústria canavieira obrigou as usinas a adquirirem rapidamente competência em áreas onde não tinham experiência acumulada. Uma forte adaptação organizacional resultou na criação de departamentos ou

diretorias comerciais, inclusive com a contratação de executivos com experiência nas Traders. Aumentaram os investimentos em marcas próprias, marketing, novos canais de distribuição e comercialização e participação direta em eventos e feiras internacionais (COSTA, 1999d).

BELIK, RAMOS e VIAN (1998) classificam as estratégias competitivas que tem aparecido como resultado dessas mudanças institucionais e de coordenação do setor canavieiro em três grupos:

1. A diferenciação de produto, através da qualidade, processos de produção como o açúcar orgânico, novas marcas, formas de entrega, diversos tamanhos e materiais de embalagem, diferentes tipos de refino, adição de sabores, combinações com adoçantes artificiais e açúcar de baixo teor calórico;

2. A diversificação produtiva, destilarias que passam também a fabricar açúcar, associando suas marcas à produtos como café e suco de laranja para o consumo final, co-geração de energia elétrica a partir da queima do bagaço, xarope concentrado para glutamato monosódico e l-lisina, utilização dos sub-produtos como mel final esgotado para fermento de panificação, levedura seca para ração animal, gado confinado, alcoolquímica;

3. O aprofundamento e especialização na produção de açúcar e álcool, mecanização da parte agrícola, automação da produção industrial, melhorias na logística, transferência de usinas para terras mais planas e mecanizáveis e de melhor qualidade, terceirização de vários serviços antes assumidos pela usina.

Em paralelo ao desenvolvimento dessas estratégias ocorreu também um conjunto de investimentos no setor de bens de capital voltado para a agroindústria canavieira: A Cameco-John Deere internalizou sua produção de colheitadeiras de cana com uma fábrica em Catalão-GO e a Case adquiriu a nacional Brastoft e inaugurou uma fábrica em Sorocaba-SP (P. R. NEWSWIRE, 1998; CARDOSO, 1999). O “Banco John Deere” constituiu-se no maior tomador individual de empréstimos do BNDES, indicando que a adoção da mecanização foi fortemente estimulada pelo governo federal, apesar do seu conteúdo implícito de eliminação de empregos e aumento das importações já que, apesar de montadas no país, as colheitadeiras implicam num grande volume de peças importadas (COSTA, 2001).

É provável que, além dos ecologistas urbanos e do movimento sindical dos trabalhadores rurais que pressionaram por aumentos salariais, estes capitais da indústria de máquinas também jogaram um papel importante na conformação das leis paulistas do programa de eliminação de

queimadas. O efeito resultante dessas diversas ordens de pressões e estímulos foi a aceleração das decisões dos usineiros de implantar a mecanização.

Além do setor de bens de capital, grandes empresas multinacionais e de capital estrangeiro como a Tate&Lile, Cargill, DuPont, Aji-no-moto e Carrefour, da indústria de transformação ou da logística de distribuição à jusante da agroindústria canavieira tem demonstrado interesse crescente em associar-se a empresas do setor sucroalcooleiro para a exploração de mercados de serviços industriais específicos (BRITO, 1999; COSTA, 1999a; MICHELAZZO, 1999; RAPOSO, 1999; REBOUÇAS, 1999b; ALVES, 2001).

A venda de energia elétrica obtida pela co-geração a partir da queima do bagaço nas caldeiras das usinas passou a ser, para um grupo de empresas que investiu em novas tecnologias e equipamentos, uma opção de negócio que cada dia ganha mais importância nas estratégias de diversificação das usinas, especialmente diante da crise de oferta de energia elétrica que atingiu o país, apesar de haver ainda instabilidades políticas nas regras para esse mercado (RIVERAS, 2000; BRITO;FRANCO et al., 2001).

Essas novas estratégias que surgiram nos ano 90 podem, no entanto, ainda ser insuficientes para o avanço da agroindústria canavieira na solução definitiva de seus problemas de mercado: Como coloca (SZMRECSÁNYI, 1993, p.24):

"Os atuais problemas de mercado da agroindústria canavieira poderão ser superados através da diversificação de produtos, mas apenas na medida que estes forem oferecidos a preços competitivos [...] é preciso que a agroindústria canavieira dê um salto de qualidade, deixando de ser uma indústria simplesmente extrativa, e assumindo o caráter de uma verdadeira indústria de transformação - algo que, obviamente, não está ao alcance de todas as empresas que a integram, mas apenas ao de uma minoria. A sucroquímica, portanto, representa uma saída da crise, mas somente para aquelas empresas dispostas e capazes de reorientarem suas atividades".

Isto é, a intensificação da produção agrícola e industrial, com aumento do uso de tecnologias intensivas em capital, visando explorar todas as oportunidades proporcionadas pelo domínio da cana-de-açúcar como matéria-prima para uma variada gama de produtos e sub- produtos pode garantir a competitividade de longo prazo da agroindústria canavieira. Mas esta opção exigirá, como pré-condição, volumes elevados de inversões. Mais ainda, além de dispor do capital suficiente, será preciso encontrar empresários dispostos a trilhar este caminho, condição essa que ainda não se apresentou na história da agroindústria canavieira do Brasil.

2.4. As transformações recentes na produção de açúcar de cana no estado de São