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A regularização das ocupações na zona rural

Em alguns municípios, moradores de núcleos clandestinos e irre-gulares implantados na zona rural têm pressionado os governos locais, inclusive via Ministério Público, reivindicando a regularização fundiária e urbanística. São moradores com diversos níveis de ren-dimento, principalmente níveis médios. Trata-se aqui de residentes em condomínios fechados, loteamentos populares e loteamentos de padrão médio.

A irregularidade das ocupações urbanas na zona rural é multiface-tada. Nem todas as situações são regularizáveis. Para cada situação exige-se uma estratégia específi ca. Apesar de as ações de regulari-zação fundiária e urbanística poderem ser implementadas indepen-dentes do Plano Diretor, é importante articular essas estratégias no sistema de planejamento e gestão territorial do município, evitando regularizações ad hoc mediante termos de ajustamento de conduta pontuais.

A regularização das ocupações na zona rural deve ser bastante crite-riosa, especialmente nos locais com muitos vazios urbanos. Deve-se sempre ter o cuidado de não induzir o surgimento de outras ocupa-ções, principalmente em áreas distantes do perímetro urbano.

É imprescindível defi nir claramente os critérios para identifi car os

uma data limite, próximos às sedes dos distritos rurais, ocupados pela população de baixa renda, em estágio avançado de consoli-dação, localizados fora das áreas de risco e de interesse ambiental, dentre outros.

E os núcleos ocupados por grupos de renda média e alta? Esses preci-sam ser analisados com mais cuidado. Podem ser regularizados, me-diante contrapartida fi nanceira, desde que preencham os critérios pré-estabelecidos.

Se for possível, o Plano Diretor deve identifi car todas ou parte das áreas regularizáveis localizadas na zona rural; e deve incluir as es-tratégias e instrumentos para efetivar a regularização. Para isso, é imprescindível mapear e traçar o perfi l social, econômico e territorial de todos os núcleos na fase da leitura. Caso esse mapeamento e aná-lises não se viabilizem, pode-se detalhar um plano de regularização urbanística e fundiária em Lei Complementar. Contudo, é fundamen-tal estabelecer no Plano Diretor os critérios básicos para identifi car os núcleos regularizáveis, as estratégias para efetivar as ações de re-gularização, os parâmetros para a adequação urbanística, e defi nir as responsabilidades dos atores sociais envolvidos, como poder público, moradores e loteadores.*

Como em qualquer ação de regularização fundiária e urbanística, é importante que se adotem medidas preventivas que evitem que se produzam novos núcleos clandestinos e irregulares. As partes deso-cupadas dos núcleos parcialmente construídos podem retornar à condição de gleba. É importante que o poder público use seu poder de polícia na fi scalização e controle dos loteamentos e condomínios clandestinos e irregulares localizados nas zonas rurais, interditando, embargando e até demolindo novos núcleos. Entretanto, o exercício do poder de polícia da administração não pode ser uma ação isolada;

deve estar articulado com estratégias para democratizar e ampliar o acesso à terra urbana em áreas adequadas. O sentido do poder de

* Pode ser estrategicamente útil envolver a Procuradoria do Município, o Ministério Público e a Corregedoria nas discussões para consolidar

polícia da administração na regulação territorial não é pura e sim-plesmente proteger a propriedade, e assim garantir o cumprimento de sua função social da propriedade.

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plano diretor para pequenos municípios

A ampla maioria dos municípios brasileiros é de pequeno porte: 73%

têm menos de 20 mil habitantes e esse índice alcança 80% quando se incluem os municípios com menos de 50 mil habitantes e com baixa densidade populacional. São 4.485 pequenos municípios, para os quais o país nunca teve política específi ca.

A nossa experiência de planejamento urbano, exceto práticas loca-lizadas, está voltada para as grandes e médias cidades. O próprio Estatuto das Cidades traz, no seu conteúdo, essa concepção. Grande parte dos seus instrumentos está direcionada aos processos de verti-calização, de expansão periférica ou de falta expressiva de moradias, característicos dos municípios de médio e grande porte.

Portanto, abordar o tema “Planos Diretores para Pequenos Municí-pios”, é iniciar uma refl exão para construir novos parâmetros que contemplem uma diversidade de situações muito mais abrangente que o simples critério de população.

É muito diferente planejar o pequeno município localizado em região metropolitana, na região amazônica, nas novas fronteiras agrícolas do centro-oeste ou nas antigas colônias do Sul do Brasil. É preciso incorporar outras variáveis – localização, densidade demográfi ca, crescimento populacional, dinamismo da economia, dimensão terri-torial, formação histórica, inserção regional, dentre outros.

Partindo dessas variáveis, podem-se classifi car esses municípios em dois grupos:

Grupo 1: Pequenos municípios predominantemente urbanos, locali-zados nas periferias das metrópoles e das grandes e médias cidades.

Nesses, o processo de expansão das atividades urbanas, principal-mente dos novos loteamentos, dá-se como transbordamento da cidade-pólo.

Grupo 2: Municípios predominantemente rurais, em que o ecossis-tema é pouco alterado pelas atividades urbanas. Nesses até a eco-nomia urbana é alicerçada nas atividades ligadas ao meio natural.

Os moradores da sede são fazendeiros, bóias-frias, guardas fl ores-tais, pescadores, técnicos agrícolas, comerciantes de implementos agrícolas etc. Há, portanto, uma profunda sinergia entre atividades urbanas e rurais.

O Estatuto da Cidade torna obrigatória a elaboração do Plano Di-retor para 2.342* municípios, incluindo grande parte do primeiro grupo. Restam 3.218 dos pequenos municípios excluídos dessa obri-gatoriedade, a não ser que as leis orgânicas estaduais ou municipais o determinem, ou que os municípios, voluntariamente, desejem im-plementar alguns dos instrumentos previstos pelo Estatuto.

Embora possam não sofrer na mesma escala os problemas urbanos dos grandes centros, os pequenos municípios seguramente sofrem com a falta de defi nição de diretrizes e instrumentos para orientar seu desenvolvimento e, portanto, não devem abrir mão de construir seu referencial para cuidar do seu território e orientar o desenvolvi-mento urbano. Mais que isso, todos os municípios têm por atribui-ção constitucional a responsabilidade de exercer o controle sobre o uso e ocupação do solo e criar condições para o desenvolvimento sustentável e mais justo do seu território.

De modo geral, os municípios de pequeno, e mesmo médio porte, têm difi culdades operacionais para levar adiante uma prática de planejamento e gestão urbana, pela absoluta falta de estrutura administrativa, pessoal qualifi cado e instrumental apropriado de trabalho. Tais limitações fazem com que a leitura do seu lastro ins-titucional e do nível de mobilização social seja o primeiro passo para identifi car a capacidade de gestão – potencial e limites, para iniciar o processo de elaborar e discutir o Plano Diretor.

* Fonte: Ministério das Cidades 2004, baseado no art. 41 do Estatuto da Cidade, não contabilizados os municípios do inciso V – áreas de em-preendimento de impacto regional ou Nacional, onde o poder público municipal pretenda utilizar os instrumentos previstos no parágrafo 4°

Na maioria dos municípios, a mobilização social limita-se aos con-selhos obrigatórios nas áreas de saúde e educação. Concon-selhos de política urbana ou habitação são pouco expressivos. Mas em mui-tos se destaca o trabalho das comunidades de base feito pela Igreja Católica, ou a organização das comunidades rurais em função da produção.

A abertura de espaços institucionais de participação terá muito mais chance de sucesso (tanto em pequenos municípios como em gran-des), se houver vontade política de romper com a prática tradicional:

autoritária, clientelista e vertical. Não faz sentido reproduzir, para a estrutura social de uma pequena cidade, os complexos instrumentos de mobilização presentes nas grandes metrópoles, com a sua multi-plicidade de arenas representativas e mecanismos de participação.

Outro grande diferencial na capacidade de planejamento dos municípios de mesmo porte resulta do seu grau de integração microrregional, nas suas diversas formas: consórcios, associações microrregionais, pactos, fóruns de desenvolvimento, comitês etc. A capacidade municipal para elaborar o Plano Diretor será tanto maior quanto mais o município estiver articulado com os demais municí-pios da microrregião e iniciar seu processo de planejamento a partir da identifi cação da sua vocação regional, da divisão de papéis, entre outros pontos.

Essa articulação, não só potencializa a solução de problemas co-muns e qualifi ca os resultados, como permite otimizar recursos no processo de elaborar o Plano Diretor, ao possibilitar a contratação de serviços comuns como consultorias, elaboração de cadastros, estu-dos, mapeamento, dentre outros.