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Um dos problemas mais mencionados nas análises e discussões sobre política científica e tecnológica nos países latino-americanos refere-se ao pouco uso do potencial de Pesquisa & Desenvolvimento das universidades devido à inexistência de uma demanda explícita por parte das empresas. Contudo, na América - Latina, a interação universidade e setor produtivo têm sido reconhecida como necessária e urgente para o desenvolvimento econômico da região. Apesar deste reconhecimento, pode-se afirmar que a interação ainda não se desenvolveu e que ainda estamos longe da criação de amplos programas de interação entre esses setores. Segundo SOLLEIRO (1990: 168), isso se deve a razões de caráter estrutural, tais como:

- falta de infra-estrutura nas universidades para desenvolvimento de pesquisa;

- número elevado de universidades que não se voltam para pesquisa; - o setor produtivo não tem investido na produção de pesquisa e

desenvolvimento, preferindo comprar tecnologias prontas;

- inexistência de um quadro normativo institucional para o desenvolvimento de pesquisa na maioria das universidades latino- americanas;

- política econômica da maioria dos países é instável;

- inexistência de instrumentos governamentais que promovam a interação.

Conforme Solleiro, tais problemas da interação entre universidade e empresa na América Latina só poderão ser superados com a experiência histórica. Construir um vínculo entre o mundo da pesquisa e o setor produtivo não é uma tarefa fácil, devido às disparidades de interesses e propósitos entre ambas as partes. De um modo geral, diz Solleiro (1990), as universidades operam com os seguintes princípios:

- preservação do conhecimento existente assim como a busca e a difusão de conhecimentos novos;

- liberdade para pesquisa;

Ao passo que a empresa opera com os seguintes princípios: - obtenção de utilidades;

- provisão eficiente de bens e serviços que satisfaçam demandas concretas;

- consideração dos diversos aspectos financeiros como parte essencial para poder assumir riscos;

- liberdade de pesquisa pode ser prejudicial , se levados em conta os aspectos confidenciais de tecnologia.

As possibilidades para a interação entre a universidade e a empresa são: - apoio técnico e prestação de serviços por parte da universidade - provisão de informações especializadas ;

- programas de capacitação ( especialização ) ; - cooperação na formação de recursos humanos;

- apoio financeiro a estudantes que realizam pesquisas relacionadas com a empresa;

- educação contínua; - intercâmbio de pessoal;

- organização conjunta dos seminários, conferências, colóquios, etc.; - contatos pessoais: participação em conselhos de assessoramentos, intercâmbio de publicações, etc;

- consultoria especializada ;

- programas de contratação de recém-formados ; - apoio á pesquisa básica ;

- desenvolvimento tecnológico conjunto;

Nos países periféricos, o padrão de desenvolvimento dependente e excludente determina um contínuo processo de importações tecnológicas, que vincula à produção interna de mercadorias, antes importadas, tecnologias já conhecidas no exterior. As características do produto estabelecidas a priori dificultam o desenvolvimento interno de tecnologia.

Outros aspectos ligados à disponibilidade de equipamentos e insumos, tamanho de mercado, distribuição de rendas e outros, agravam essa situação. Esse conjunto de fatores faz com que o setor de pesquisa aplicada não seja estimulado pelo setor produtivo, como nos países capitalistas centrais. (OCDE, 1984).

As empresas multinacionais instaladas nos países periféricos suprem suas necessidades pela importação de tecnologia. Já as empresas nacionais, impelidas pela concorrência, optam por soluções mais adequadas ao cálculo empresarial, feito em termos da expectativa de custo - lucro - risco, associadas ao processo de decisão tecnológica.

Nos países da América Latina, a experiência dos setores industriais interligados com universidades é escassa. Isso parece ocorrer devido a uma tendência de não dedicação às tarefas de Pesquisa & Desenvolvimento, pois persiste ainda a tendência das empresas se limitarem basicamente a importar pacotes tecnológicos. Isso ocorre principalmente com as indústrias menos complexas, onde ocorrem pequenas adaptações de tecnologia tradicional, que não justificam pesquisas universitárias para o seu desenvolvimento. Contudo, o sistema de ensino superior na produção científica na América Latina destaca-se na produção técnico-científica face à fragilidade do sistema de Ciência & Tecnologia privado ou mesmo estatal extra universitário. Muitas propostas procuram repensar o papel da universidade frente ao desenvolvimento econômico. Trata- se de tentativas de implantar programas de integração mais efetiva da academia com as empresas. No entanto, uma série de fatores tende a dificultar o entendimento entre esses dois setores. As empresas apontam várias dificuldades na relação com as universidades, entre as quais destacam-se as seguintes:

- lentidão e demora com que são processadas as formalidades contratuais;

- tempo gasto com bibliografia , trabalho experimental ou de campo e elaboração de relatórios finais , enquanto a empresa aguarda soluções rápidas e eficazes para seus problemas.

Já o setor acadêmico, por sua vez, faz as seguintes queixas:

- problemas de rivalidades que se estabelecem no seio do próprio corpo docente , principalmente entre os que apenas lecionam na Universidade e aqueles que são beneficiados pelos recursos alocados pelas agências de Pesquisa & Desenvolvimento;

- pesquisadores ignoram as técnicas de marketing e encontram dificuldades para transferir seus inventos às empresas. Nesse caso, existe a tendência do próprio pessoal acadêmico de formar uma empresa para comercializar suas inovações, à semelhança do que ocorre nos EUA.

Há, portanto, um conflito entre os interesses nacionais mais amplos e os interesses das empresas que, em última análise, são quem negocia e compra as tecnologias no exterior. Basta ver as polêmicas em torno da reserva de mercado na área de informática. Historicamente, o problema da tecnologia sempre esteve vinculado à questão da soberania e da hegemonia das nações. Em se tratando de empreendimentos destinados a proporcionar lucro, as empresas visam aos objetivos conforme fatores de ordem micro econômica, não estando, via de regra, interessadas nos efeitos que as tecnologias adquiridas possam causar ao meio ambiente, no mercado de trabalho, no balanço de pagamento, nos hábitos de consumo ou na cultura do povo. Nos países sub-desenvolvidos, a experiência tem ainda demonstrado que, em geral, não desenvolvem espontaneamente esforços para absorverem a tecnologia comprada e nem tampouco investem na busca de auto-suficiência de geração de tecnologia própria, nem mesmo em setores limitados. Na ausência de uma política restritiva, a tendência universal é a compra sistemática no exterior e de nova tecnologia, toda vez que aquela comprada anteriormente se torna ultrapassada. E, na ocasião da compra, são apontadas inúmeras razões e vantagens no procedimento, quando, na realidade, os argumentos apresentados, tiveram origem na posição de imobilismo tecnológico assumido pelas próprias empresas. Agravando ainda mais, este problema, grande parte das empresas instaladas nos países em desenvolvimento pertence a grupos multinacionais cujas sedes estão em nações desenvolvidas e que lutam

por perpetuar a importação das tecnologias nas matrizes e nas condições que lhes sejam mais favoráveis. (OCDE, 1984).

Mas, o efeito da importação indiscriminada da tecnologia tem sido o bloqueio ao florescimento de tecnologias nacionais, principalmente aquelas voltadas para a solução dos problemas específicos dos países subdesenvolvidos. Uma vez facilitada a entrada de tecnologias, não ocorre internamente uma demanda pela criação das mesmas. Não havendo um vigoroso exercício de busca de uma tecnologia nacional, ocorre a atrofia do trabalho criador dos pesquisadores engenheiros e a estagnação dos centros e laboratórios de pesquisa e das universidades. Estes resultados provocam a cristalização da dependência tecnológica externa, comprometendo as aspirações políticas, sociais e econômicas dos países meramente receptores. (RATTNER, 1972).

A transferência de tecnologia da universidade para a empresa - seja de produtos ou de processos -, além das políticas nacionais de Pesquisa e Desenvolvimento, envolve negociações e barganhas com os empresários (clientes), exigindo adaptações ao mercado, isto é, aos interesses e ao poder dos possíveis interlocutores e parceiros.

É em torno dos investimentos em Pesquisa & Desenvolvimento que se tem articulado empresas, Estado e universidades para desenvolver políticas nacionais. No Brasil tem ocorrido um quadro diverso do verificado nos países desenvolvidos. Enquanto nestes o financiamento de Pesquisa & Desenvolvimento por parte da empresa equipara-se ou supera à parte paga pelo governo, no Brasil, bem como nos demais países da América Latina, os investimentos em Pesquisa & Desenvolvimento são feitos quase que somente pelo governo. Aqui cerca de 25% são oriundos das empresas e 70% do governo. Nos Estados Unidos, o quadro mostra uma paridade: cerca de 45% dos recursos vêm do governo e aproximadamente 43% são oriundos da empresa. O Japão mostra um quadro sui generis: cerca de 72% vêm da empresa e apenas aproximadamente 18% são de origem governamental.15

15 CRUZ, C. H. id. ib. , p. 7. E ainda, sobre este assunto, Meneghini, R. diz que , “no Brasil 75% da

pesquisa científico-tecnológico é desenvolvida na Universidade pública e apenas 20% é desenvolvido pelas empresas. Os institutos de pesquisa são responsáveis por apenas 5%. Trata-se porem de dados “duvidosos”, pois “o conceito de pesquisa dentro de empresas privadas pode compreender pesquisa de mercado e análise de qualidade”. (R. MENEGHINI, “a universidade pública e a pesquisa: desafios” in

A partir dessa análise histórica da relação Universidade-Empresa, dos principais elementos ou sistemas desenvolvidos e da indicação da situação em que se encontra essa interação na América Latina e no Brasil, podemos traçar as características dos modelos da cooperação entre a academia e o setor produtivo. Esses modelos, do lado da análise histórica, nos permitirão uma compreensão mais acurada da questão da pesquisa aplicada na Unicamp e dos vínculos que esta universidade tem estabelecido com a empresa.