• Nenhum resultado encontrado

5. A ARBITRAGEM E O CONTESTADO FRANCO-BRASILEIRO

5.1. A Resolução de Conflitos por meio da Arbitragem

Inicialmente, importante é definir o que são os conflitos internacionais, recorrendo à abalizada doutrina de Francisco Rezek38, o qual destaca o conceito formulado pela Corte de

Haia, que afirma ser o conflito ou litígio internacional “todo desacordo sobre certo ponto de direito ou de fato, toda contradição ou oposição de teses jurídicas ou de interesse entre dois Estados”.

Pode-se afirmar, portanto, que os litígios internacionais não se limitam aos conflitos armados, mas também abrangem as questões argumentativas e políticas. Na verdade, essas são as que mais suscitam divergências, devido ao aumento da interação entre países originada pela globalização, o que importa em choques de poderes soberanos e de leis e costumes diferentes.

Mister se faz destacar que os litígios internacionais não se estabelecem apenas entre dois Estados, podendo ser um desacordo entre vários Entes Soberanos, apesar de aquele ser o caso de maior ocorrência.

Diante dessas controvérsias surgidas no desenrolar das relações internacionais, foram criados meios visando soluções pacíficas, evitando a resolução armada, ou seja, a guerra. Entretanto, não se pode deixar de pontuar que, apesar de hoje a guerra ser um ilícito internacional, ela já foi considerada anteriormente um meio perfeitamente legítimo para findar litígios internacionais.

O ilustre autor Ian Brownlie ensina o que abaixo se evidencia sobre a resolução de litígios internacionais:

A resolução de litígios entre Estados através da função judicial representa apenas uma faceta do enorme problema da manutenção da paz e da segurança internacionais. Face à Carta das Nações Unidas, o uso da força pelos Estados individuais como meio para resolver litígios não é admissível, sendo a resolução pacífica o único meio de resolução disponível. Contudo, em Direito Internacional geral não existe qualquer obrigação de resolver litígios, assentando os processos de resolução por meio de procedimentos formais e jurídicos no consentimento das partes.39 (sic)

Quanto à solução pacífica de pendências entre dois ou mais Estados soberanos, há três meios que podem ser escolhidos livremente, pois entre eles não existe hierarquia, que são: os diplomáticos, os políticos e os jurisdicionais.

Nos meios diplomáticos, o entendimento é direto entre as partes discordantes, sem a intervenção de terceiros. Resolve-se o impasse quando “as partes transijam em suas pretensões, ou quando uma delas acabe por reconhecer a validade das razões da outra”.40

Assim, como formas de resolução de litígios pela via diplomática, têm-se as negociações diretas, os serviços amistosos, os bons ofícios, a mediação e o sistema ou regime de consulta.

39 BROWNLIE, Ian. Ob. Cit., p. 735. 40REZEK, Francisco. Ob. Cit., p. 340.

Com relação aos meios políticos, estes se caracterizam por sua atuação em conflitos cuja gravidade seja significativa para a sociedade internacional e por não requerer a aceitação de todas as partes envolvidas na contenda para se fazer presente, ou seja, podem ser requeridos à revelia dos outros entes litigantes. Como instâncias políticas destacam-se a Assembléia Geral e o Conselho de Segurança da ONU, mas ainda podem ser avocadas outras organizações de caráter regional e vocação política, tal qual a Organização dos Estados Americanos.

Quanto aos meios jurisdicionais, são duas as vias comumente apresentadas para a resolução pacífica por este meio, as soluções judiciais e a arbitragem. Nestas formas de resolver litígios, James Leslie Brierly41 enfatiza que tanto os juízes quanto os árbitros estão

subordinados ao ordenamento jurídico, não possuindo poderes discricionários “que lhes permitam pôr de lado as normas jurídicas existentes e decidir de acordo com a sua concepção pessoal de eqüidade e da justiça”.

Nesse diapasão, pode-se definir arbitragem, nas palavras do douto Hildebrando Accioly (1991, p. 247-248), como “um processo de resolver litígios internacionais, mediante o emprego de certas normas jurídicas ou por intermédio de uma pessoa ou pessoas que as partes litigantes escolhem livremente para esse fim”. Logo, conforme defende a doutrina em geral, para o uso deste meio jurisdicional é necessário que o conflito telado seja passível de ser resolvido juridicamente.

Em seu artigo publicado em um sítio da internete, Rodrigo Ferreira Santos e Victor Paulo Kloeckner Pires42 definem arbitragem da forma como se destaca em seguida:

Derivada do latim “arbiter” (juiz, louvado, jurado), arbitragem significa, na linguagem jurídica, o procedimento utilizado na solução de litígios e tem como definição sumária e tradicional, segundo STRENGER, Guilherme Gonçalves (Do Juízo Arbitral, RT 607, p. 31), “a técnica, pela qual a divergência pode ser solucionada, por meio da intervenção de terceiro (ou terceiros, onde é chamado de Juízo Arbitral), indicado pelas partes, onde se presume a confiança de ambas. Isto tudo tendo por base a assinatura da cláusula compromissória ou do compromisso arbitral, onde as partes confiam a alguém a condução dos trabalhos para solucionar os conflitos. E, por fim uma decisão, livre de intervenções estatais, destinadas a assumir eficácia de sentença judicial”.

41 BRIERLY, James Leslie, 1979 Apud DEL’OLMO, Florisbal de Souza. Curso de Direito Internacional

Público. Rio de janeiro: Editora Forense, 2006, p. 183.

42 SANTOS, Rodrigo Ferreira; PIRES, Victor Paulo Kloeckner. Arbitragem Internacional: Uma análise à luz

Do exposto, pode-se inferir que a arbitragem tem como características precípuas: o acordo de vontade das partes litigantes para a escolha de um ou mais árbitros, desde que seja em quantidade ímpar, e a delimitação do objeto do litígio; e a obrigatoriedade da decisão, que não é suscetível de recurso.

Da primeira característica, depreende-se o princípio fundamental da arbitragem, que é a livre escolha do árbitro, que pode ser selecionado ad hoc ou dentre as pessoas qualificadas as quais figuram na lista da Corte Permanente de Arbitragem.

Para que seja oficializada a arbitragem como meio de resolução do conflito e a participação do árbitro escolhido pelas partes, faz-se necessária a celebração de um compromisso arbitral. Neste estará definida a matéria da controvérsia, a designação do(s) árbitro(s) e seu(s) respectivos(s) poder(es), bem como “a promessa formal de aceitação, respeito e execução da futura sentença arbitral”. 43

Convém lembrar que a arbitragem não precisa ser indicada como via pacífica apenas quando o conflito já é existente. É possível, por meio de uma cláusula arbitral, que um tratado determine à submissão de um eventual conflito entre os dois Estados contratantes à apreciação de um árbitro previamente escolhido.

Uma vez que o conflito existe e as partes requerem a intervenção do árbitro no litígio, dar-se-á início ao processo arbitral. No caso deste não está regulado no compromisso arbitral ou não se encontrar completamente disposto, invocar-se-ão subsidiariamente as disposições estipuladas sobre este assunto na Convenção de Haia.

De acordo com a referida Convenção, o processo consistirá em duas etapas: a escrita e a oral. Nesta existirão debates orais entre as partes os quais só serão públicos se elas assim o decidirem, mas as deliberações arbitrais serão sempre a portas fechadas. Naquela, documentos serão apresentados pelas partes como prova da veracidade dos argumentos aventados nos debates, concluindo-se esta etapa com a sentença prolatada pelo árbitro.

A sentença arbitral tem caráter definitivo, não se aceitando a interposição de recurso, pois “o árbitro não se inscreve num organograma judiciário como aquele das ordens jurídicas internas”.44

Salienta-se, contudo, que a obrigatoriedade da sentença arbitral não implica em sua auto-executoriedade. Isto quer dizer que às partes incumbirá o seu fiel cumprimento, em

43 ACCIOLY, Hildebrando. Ob, Cit., p. 248. 44 REZEK, Francisco. Ob. Cit., p. 352

respeito aos dois princípios importantes do direito internacional: o da pacta sunt servanda e o da boa-fé.

Mesmo vigorando o princípio da irrecorribilidade da decisão arbitral, esta poderá eventualmente ser anulada. Cretella Júnior e Cretella Neto enumeram as hipóteses limitadas para se considerar a sentença de um árbitro internacional sem eficácia e sem obrigatoriedade, senão veja:

a) excesso de poder dos árbitros; b) sentença proferida como resultado de fraude ou deslealdade dos árbitros; c) quando os árbitros que proferiram a sentença forem incapazes de fato e de direito; d) se não forem cumpridas as regras estipuladas pelas partes, no compromisso arbitral, ou se forem violados princípios jurídicos fundamentais, como o da ampla defesa; ou e) falta de fundamentação da sentença arbitral.45

Afora as hipóteses acima indicadas, a sentença arbitral põe fim ao litígio levado a sua apreciação, determinando a melhor solução para a controvérsia de forma definitiva e permanente. Por isso, tem sido um meio de resolução de litígios adotado cada vez mais por diversos países, como demonstram as estatísticas. De acordo com sítio da internete chamado Direito Net, os Estados têm buscado cada vez mais a arbitragem, conforme os dados dispostos:

Segundo dados da Projuris – Câmara de Mediação e Arbitragem Internacional a Espanha é um dos países que mais utiliza a arbitragem como solução de conflitos, cerca de 98% . Em seguida vem o México com resolução de 95% dos conflitos via arbitragem; Japão com 92%; Portugal com 72% e Argentina com 63%. No Brasil a arbitragem ainda é pouco utilizada [...].46

Do exposto, pode concluir que a tendência mundial é de optar pela arbitragem como meio de resolução de controvérsias internacionais em detrimento dos outros meios, devido ao caráter irrevogável de sua decisão.

Documentos relacionados