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A Revista do Brasil e a flutuação do jornalismo sindical: combate, negociação

5 DOS DISCURSOS EM FUNCIONAMENTO

5.2 OS SENTIDOS SOBRE SINDICALISMO NA REVISTA DO BRASIL

5.2.1 A Revista do Brasil e a flutuação do jornalismo sindical: combate, negociação

Na Revista do Brasil, como esboçamos durante a análise dos sentidos, há uma intensa “mobilidade” discursiva. Ao contrário do que encontramos em Veja, o veículo sindical noticia sobre sindicalismo sob três vértices: combate, negociação e defesa. As marcas discursivas, verificadas a partir das 30 SDs extraídas das reportagens, direcionam-nos para esses sentidos nucleares.

Ocorre na Revista do Brasil um fenômeno discursivo mais plural do que o observado em Veja: seu discurso asila diferentes FDs. Entendemos FD como um espaço aberto, invadido por noções, elementos que vêm de outro lugar e chegam sob a forma de pré-construídos (PÊCHEUX, 1993). Veja, entretanto, no que toca o assunto sindicalismo, conseguiu produzir

um efeito próximo da unidade discursiva, tendo em vista que a FD2 é constituída de poucos resquícios.

Regressemos à RB: a sondagem dos sentidos denuncia que a revista enfileira seus saberes dentro daquelas que intitulamos de FD3 – DISCURSO DO SINDICALISMO

COMBATIVO, FD4 – DISCURSO DO SINDICALISMO NEGOCIADOR e FD5 – DISCURSO DO SINDICALISMO DEFENSIVO.

Sob a custódia da FD3, estão saberes abalizados por uma perspectiva de classe – da classe trabalhadora -, que ensejam uma ação transformadora da realidade política, econômica e cultural, que servem de ferramenta na luta contra a exploração (VERDELHO, 1986). Ela acumula seis Famílias Parafrásticas, cujos sentidos se repetem na potencialização da oposição de interesses entre trabalhadores e classe patronal. As marcas ou legitimam a postura de resistência sindical (FP8), ou intimam a classe trabalhadora, valorizando essa conduta de resistência (FP9), ou denunciam para o leitor os “riscos” a que ele está exposto (FP10, FP11, FP12 e FP13), na condição de trabalhador.

Imbuída em sobrelevar a ideia de confronto, a Revista do Brasil, na FD3, exprime certa autonomia sindical. Certa, porque mesmo nessa Formação Discursiva há fragmentos das diversas vertentes ideológicas presentes no movimento sindical que a curto-circuitam, como atestamos na FP10. Mesmo assim, as construções discursivas, em sua maioria, polarizam um “nós”, trabalhadores, versus um “eles” (empresas, empresários, governos, mídia).

Para arrematar, perpassa a FD3, o discurso do Novo Sindicalismo, com toda a sua bagagem contestatória aos governos ditatoriais, de luta pela democracia, de institucionalização da ação organizativa. A enunciadora RB, nas zonas limítrofes da FD3, convida seus interlocutores a confiarem na sua própria capacidade, a duvidarem do discurso midiático, que não o seu.

A FD4, por sua vez, armazena duas Famílias Parafrásticas em que os enunciados são construídos no intuito de louvar um sindicalismo que ensaia uma aproximação, seja com patrões, seja com governos (o do PT, essencialmente). A conciliação, a não radicalidade é respaldada pela revista nessa FD como saída para os trabalhadores.

O legalismo, a possibilidade de se chegar a “bons termos” para ambos os lados e a busca pelo consenso são os recados discursivos da RB. A intransigência (classista), nessa posição, vira teimosia. Ela cede seu lugar para a tolerância, a flexibilidade. O ímpeto dos anos de 1980 é sufocado, ou porque não resta outra saída para a classe trabalhadora, senão aceitar (índices de reajuste pífios, retirada de direitos...), ou porque a RB coloca o governo do PT – o

federal, sobretudo – num espaço de coalizão, dispensando o respaldo político-organizativo dos trabalhadores.

Essa FD institucionaliza ainda uma vocação para a centralização. Nesse quadro, os trabalhadores não são os principais atores. São os órgãos e agentes de cúpula que irão encaminhar – e decidir – rumos.

A FD5 – última delas - também concentra duas Famílias Parafrásticas. Há, por parte da RB, nesta Formação Discursiva, um investimento na estratégia da negação. Os enunciados são providos de sentidos que assumem uma postura de defesa. A FD5 vitimiza a CUT, faz dela bode expiatório do sindicalismo brasileiro. As propostas estão sempre fora de seu escopo de responsabilidade ou são intangíveis. Há uma transferência, consciente ou inconsciente, de obrigações para fatores externos. E quando, na FD5, a RB deixa ver que a “má” conduta é inegável, como no caso da divisão das centrais sindicais, ela mortifica-se: admite o erro e pede perdão.

A ideologia defensiva (DEJOURS, 1994 apud HALLACK; SILVA, 2005, p. 75), acolhida por essa FD, cauciona as relações de poder. Gasta-se tempo e linhas e mais linhas falando dos nós políticos, quase impossíveis de se desatar, peculiares à organização sindical, para se atravancar uma possível ação. Na pior das hipóteses, a FD5 acarreta num imaginário perseguidor entre seus membros.

Quadro 6: Síntese discursiva da Revista do Brasil

FORMAÇÃO

DISCURSIVA (FD3)

Discurso do Sindicalismo Combativo

FAMÍLIAS

PARAFRÁSTICAS

FP8 - Prática sindical é de resistência

FP9 - Greves, protestos e manifestações são legítimos e valorosos

FP10 - Classe política age de maneira sorrateira ao tratar questões dos trabalhadores

FP11 - Empresas e empresários desfavorecem trabalhadores FP12 - Políticas neoliberais são prejudiciais aos trabalhadores FP13 - Discurso da mídia é contra a classe trabalhadora

FORMAÇÃO

DISCURSIVA (FD4)

Discurso do Sindicalismo Negociador

FAMÍLIAS

PARAFRÁSTICAS

FP14 - Negociar é a melhor saída FP15 - Governo do PT pode ser aliado

FORMAÇÃO

DISCURSIVA (FD5)

Discurso do Sindicalismo Defensivo

FAMÍLIAS

PARAFRÁSTICAS

FP16 - Não somos pelegos

FP17 - Centrais sindicais estão divididas

Fonte: Quadro elaborado pela autora.

Findada a sistematização das FPs e FDs nas duas revistas, a qual resulta de uma análise que concebeu o texto na sua totalidade, afunilamos nossa pesquisa em direção da metáfora. Cabe-nos frisar que esse processo – de olhar os sentidos do “todo” – foi necessário à medida que as expressões metafóricas são parte deste “todo”. Não alcançaríamos nosso intento, de descobrir o impacto que elas acarretam no discurso jornalístico, se não cumpríssemos essa fase, já que é a esse “produto discursivo” que cotejaremos as metáforas. Para chegarmos ainda mais perto do seu funcionamento, inteiremo-nos da noção de funcionamento discursivo.