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A Revolução Constitucionalista, O Estado Novo e os novos modelos de educação

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A década de 1930 efervesceu os debates para mudanças políticas e econômicas, que já vinham sendo provocadas por acontecimentos internacionais, como a quebra da bolsa de valores de Nova York em 1929 e acontecimentos internos com a derrocada da aristocracia rural e fortalecimento da incipiente burguesia industrial.

Desta situação, emergiu a figura de Getúlio Vargas, que com a Revolução Constitucionalista comandou o país entre 1930 a 1945 e imprimiu sua política autoritária denominada de Estado Novo durante os anos de 1937 a 1945.

Quanto ao processo educacional desse período, conforme ressalta Maria Lúcia Aranha (2006), na década de 1920 a situação do analfabetismo atingia a cifra de 80% da população.

O cadeirão de discussões pedagógicas era ímpar no período de Vargas. O Manifesto dos Pioneiros, Manifesto da Escola Nova (1932)10, influenciado pelas ideias político-filosóficas de igualdade entre homens e do direito de todos a educação direcionavam novas legislações, inclusive o texto constitucional de 1934. As exigências sociais e pressões de intelectuais culminaram com a criação do Ministério da Educação e Saúde e a tentativa de estruturação de

10 O Manifesto da Escola Nova defendia a universalização da escola pública, laica e gratuita. Assinavam o texto

um sistema nacional de educação.

As influências da Revolução de 30 na construção de um novo Estado brasileiro, vão se efetivar em diferentes ações:

A Revolução de 1930, no plano econômico, prioriza a substituição das importações pelo incentivo à industrialização do país, com tecnologia própria. Assim, abre-se uma nova fase no processo de acumulação do país cujo principal polo econômico desloca- se para as atividades urbano-industrias, configurando um novo pacto do poder. A conquista na Constituição de 1934 do ensino público, obrigatório e gratuito insere-se no processo histórico de formação do Estado burguês brasileiro, e, é, a partir de 1930 que fica evidenciado uma defasagem entre a Educação e o desenvolvimento (CARNEIRO, 1990, p.8-14).

No ano de 1934, a Assembleia Nacional Constituinte, convocada pelo Governo Provisório da Revolução de 1930, redigiu e promulgou a segunda Constituição Republicana do Brasil. Foi a primeira a estabelecer um capítulo específico para a educação, realizando mudanças progressistas. Consequência direta da Revolução Constitucionalista de 1932.

Importante explorar a redação do texto constitucional, fruto desse momento histórico, que determinará movimentos sociais outros na nossa história recente. Destacamos o capítulo II, intitulado de educação e da Cultura.

Em seu art. 148 a constituinte de 34, pela primeira vez, atribuiu à União, aos estados e municípios a responsabilidade para o desenvolvimento da cultura em geral. Diz o texto:

Art. 148 - Cabe à União, aos Estados e aos Municípios favorecer e animar o desenvolvimento das ciências, das artes, das letras e da cultura em geral, proteger os objetos de interesse histórico e o patrimônio artístico do País, bem como prestar assistência ao trabalhador intelectual (BRASIL, C.F., 1934).

O texto deixa claro a inclusão das responsabilidades que caberia também aos municípios. Outra redação legislativa importante inserida no texto está no art. 149, segue a reprodução da legislação educacional:

Art. 149 - a educação é direito de todos e deve ser ministrada, pela família e pelos Poderes Públicos, cumprindo a estes proporcioná-la a brasileiros e a estrangeiros domiciliados no País, de modo que possibilite eficientes fatores da vida moral e econômica da Nação, e desenvolva num espírito brasileiro a consciência da solidariedade humana (BRASIL, C.F., 1934, grifo nosso).

Cumpre ressaltar que a expressão ͞direito de todos͟, acima sublinhada, deve ser interpretada em consonância com o art. 150, inciso a e parágrafo único daquela carta. Conforme texto legal, caberia à União a elaboração do Plano Nacional de Educação, e esse plano deveria

obedecer às seguintes normas: a) ensino primário integral gratuito e de frequência obrigatória extensivo aos adultos; b) tendência à gratuidade do ensino educativo ulterior ao primário, a fim de o tornar mais acessível; c) liberdade de ensino em todos os graus e ramos, observadas as prescrições da legislação federal e da estadual.

Esses foram os pressupostos e diretrizes de direitos à educação que norteavam o sistema educacional. Mas, em se tratando do objeto deste estudo, os artigos 156 e 157 da Constituição foram importantíssimos para o financiamento educacional. Trataram diretamente da vinculação de receitas ou recursos para a educação. Pela primeira vez, podemos dizer, grosso modo, que o Constituinte obrigou os entes federados (União, estados e municípios) a gastarem, obrigatoriamente, determinado percentual arrecadado de impostos com educação. Apresentava a letra da lei:

Art 156 - A União e os Municípios aplicarão nunca menos de dez por cento, e os Estados e o Distrito Federal nunca menos de vinte por cento, da renda resultante dos impostos na manutenção e no desenvolvimento dos sistemas educativos (BRASIL, C.F., 1934).

Araújo (2016) explica o resultado prático dessa legislação acima citada, afirma o autor, que os estados e Distrito Federal foram os grandes responsáveis pelo provimento do ensino no país. Conforme dados, em 1930, 64% das matrículas do ensino primário eram estaduais, 18% eram mantidas por particulares, 17% do município e à União o residual de 0,1%. Observa-se que os números dos estados superam em muito os dos outros entes.

Outro ponto de grande destaque nas políticas de financiamento educacional no texto &RQVWLWXFLRQDOGHpDFULDomRGRV³IXQGRVHVSHFLDLV´2EVHUYHPRVRTXHGL]LDDOHLVREUH o assunto:

Art. 157: A União, os Estados e o Distrito Federal reservarão uma parte dos seus patrimônios territoriais para a formação dos respectivos fundos de educação.

§ 1º - As sobras das dotações orçamentárias acrescidas das doações, percentagens sobre o produto de vendas de terras públicas, taxas especiais e outros recursos financeiros, constituirão, na União, nos Estados e nos Municípios, esses fundos especiais, que serão aplicados exclusivamente em obras educativas, determinadas em lei.

§ 2º - Parte dos mesmos fundos se aplicará em auxílios a alunos necessitados, mediante fornecimento gratuito de material escolar, bolsas de estudo, assistência alimentar, dentária e médica, e para vilegiaturas (BRASIL, C.F., 1934).

Essa Constituição inovou nas extensões do direito à educação e, pela primeira vez, tornou a vinculação obrigatória de recursos resultantes de impostos para manutenção do sistema de educação. Outro ponto de importante avanço foi a ideia de movimentação financeira ligada

a criação dos fundos. Vale ressaltar que já havia inovações e necessidade de uma gestão financeira para a educação, mesmo que o modelo não fosse o mesmo das premissas que hoje se baseiam as políticas educacionais de fundo, mas, podemos dizer, que foi um avanço significativo a tentativa de concentração de recursos.

As inovações, entretanto, não surtiram efeito algum, posto que o golpe de Estado de 1937 pôs fim à vigência da Constituição de 1934, antes mesmo da votação do Plano Nacional de Educação.

A Constituição de 1937 implantou a ditadura do Estado Novo. Os poderes Executivo e Legislativo encontravam-se concentrados na figura do Presidente da República, que legislava via decretos-lei e posteriormente os aplicava. Isso fez com que grande parte da Carta de 1937 não tomasse eficácia. No período da ditadura, o movimento renovador entrou em recesso.

A Constituição de 1937 refletiu muitas tendências fascistas do Estado Novo. As conquistas relacionadas do dever do Estado com a educação foram deslocados para sugestão da liberdade a iniciativa privada. A garantia de aplicação de recursos públicos para o provimento educacional, inclusive com percentuais vinculados, é retirada da Constituição.

Em seu artigo 130, o ensino primário, obrigatório e gratuito não é mais absoluto, conforme se lê, é possível a cobrança mensal.

Art. 130 - O ensino primário é obrigatório e gratuito. A gratuidade, porém, não exclui o dever de solidariedade dos menos para com os mais necessitados; assim, por ocasião da matrícula, será exigida aos que não alegarem, ou notoriamente não puderem alegar escassez de recursos, uma contribuição módica e mensal para a caixa escolar (BRASIL, C.F., 1937).

Em resumo, o período da era Vargas é marcado por ambiguidades na educação. Em um primeiro momento a Constituição de 1934 é inovadora quanto a vários fatores que asseguram fontes financeiras orçamentárias para a educação, noutro, retira-se da Carta Magna todas as garantias e receitas vinculantes necessárias para o financiamento de políticas públicas educacionais. Há avanço e retrocesso em políticas públicas gratuitas.

No início, as políticas são de ordem a garantir a total gratuidade ao acesso à educação (BRASIL, CF, 1934), noutro, prevalece a relativização e predomínio a iniciativa privada (BRASIL, CF, 1937).

Outro cenário preocupante era o do analfabetismo. Na década de 1920, o avanço significativo da oferta da escolarização foi ampliado. Segundo Fernando de Azevedo (in

FREITAG, 1984), o desenvolvimento do ensino primário e secundário alcançou níveis altos. Também as escolas técnicas se multiplicaram. Em 1933 havia 133 escolas de ensino técnico industrial, em 1945 o número era de 1.368. As mudanças de ideologia e as exigências oriundas do processo produtivo da indústria impuseram a qualificação dos trabalhadores.

A ausência de um PNE e a retirada de impostos vinculantes para a educação, consubstanciada na Constituição, e a prevalência de reformas apenas por decretos-leis, não fizeram com que as demandas de vários educadores ligados a movimentos sociais avançassem. O Brasil ainda carecia de um plano político e financeiro para a educação. Além de um governo, não havia política de Estado que ultrapassasse as fronteiras do casuísmo.

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