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3 ESPAÇO, SOCIEDADE E EDIFÍCIO PRISIONAL

3.1 A Sintaxe Espacial

Em Arquitetura, os fenômenos são analisados a partir de diferentes abordagens, o que demanda o desenvolvimento de teorias específicas para cada campo disciplinar (HOLANDA, 2002). Interpretar e descrever o espaço arquitetônico como produto de padrões sociais, a partir de suas características físicas, é tarefa atribuída à análise sintática do espaço. A Sintaxe espacial – ou Teoria da Lógica Social do Espaço (HILLIER e HANSON, 1984) – fundamentada inicialmente nos anos de 1970 – é uma teoria que dispõe de um conjunto de técnicas com o fim de representar, quantificar e interpretar a configuração espacial de objetos arquitetônicos e urbanos. Partindo do pressuposto de que, como na linguagem humana, os edifícios são peças estruturadas, a referida matéria explora a configuração espacial pela ótica das relações internas estabelecidas entre os espaços, e do seu respectivo rebatimento no processo de convívio social. Pelo seu enfoque, consiste em um caminho para apreender as interações morfológicas entre os arranjos espaciais e os relacionamentos sociais, pois entende que a dimensão social é um aspecto inerente ao ambiente construído.

Para a Sintaxe espacial, é através da configuração que as relações socioculturais se expressam no espaço (HILLIER; HANSON; GRAHAM, 1987).

Markus (1993) conclui que os edifícios conformam uma categoria única de objetos, porque não haveria outra classe que através da produção de formas materiais organizasse propositalmente o espaço e as pessoas no espaço. Enquanto Pssara (2009) diz que as diversas configurações, ou leiautes espaciais, induzem a diferentes experiências e comportamentos humanos num dado espaço. E mais: ao organizar características geométricas e configuracionais, a arquitetura constrói uma relação entre aspectos concebidos e percebidos do espaço. Não que essa relação seja apreendida da mesma maneira por todas as pessoas, ou que independa de condições sociais, econômicas e culturais; mas, os aspectos conceituais e perceptivos da arquitetura passam pelas propriedades espaciais e geométricas e suas inter-relações. Este inter-relacionamento é o responsável por coordenar percepções visuais, padrões experimentais e sociais no espaço- tempo e sincronizar os campos perceptivos, oferecendo gradualmente uma experiência prescrita ou variada (PSARRA, 2009).

Das ideias de Hillier e Hanson (1984), Markus (1993) e Pssara (2009), reforça-se a correlação entre a estrutura espacial de um edifício e certas intenções sociais preordenadas. Assim, esses preceitos atestariam que edifícios são capazes de estabelecer normas e comportamentos e direcionar a práticas sociais, ao mesmo tempo em que podem ser interpretados como reflexo dos valores próprios da sociedade.

Assentada nesse princípio, a Teoria da Lógica Social do Espaço parte de três leis subjacentes ao edifício, ou ao espaço urbano, associando configuração espacial e estrutura social (HILLIER e HANSON, 1984). A saber, as leis dizem:

1) do espaço propriamente dito: revelando como os arranjos espaciais estão presentes nos edifícios;

2) da sociedade para o espaço: descrevendo como os padrões sociais se materializam no espaço;

3) do espaço para a sociedade: demonstrando como o arranjo espacial pode afetar os padrões socioculturais.

As conclusões acerca da lógica socioespacial dos edifícios advêm da aplicação dos princípios descritivos e analíticos da Sintaxe espacial, os quais, como já mencionado, têm foco na configuração espacial.

Hillier e Hanson (1984) definem configuração espacial como sendo a relação entre, pelo menos, dois espaços, considerando um terceiro. Ou, de modo mais abrangente, a inter- relação entre todas as unidades espaciais de um sistema; este sendo o equivalente a um todo integrado cujas propriedades essenciais surgem das relações entre suas partes. Logo, à Sintaxe Espacial interessa conhecer as propriedades desse todo, e não apenas as propriedades individuais das estruturas espaciais que o compõem. Desse modo,

Configuração significaria mais ainda que um conjunto de relações, e sim um complexo de relações de interdependência com duas propriedades fundamentais. A configuração é diferente quando vista de (a) diferentes pontos dentro de um sistema e quando apenas de (b) uma parte do sistema. Seja em razão de mudanças em um elemento no sistema ou uma relação, todo o conjunto pode se alterar, em graus variados (MEDEIROS, HOLANDA, 2008, p.6).

Essa primazia da configuração na lógica social do espaço não acontece por acaso. Ela seria originada na mesma lógica espacial, e, segundo seus idealizadores, isso pode ser quantificado, representado graficamente e demonstrado probabilisticamente.

Para a análise de edifícios, o instrumental analítico da Sintaxe espacial é pautado, principalmente, na dimensão convexa do espaço.

Espaços convexos são compreendidos como aqueles que possibilitam o encontro de pessoas e coisas em um mesmo campo visual, com visibilidade e acessibilidade diretas. Graficamente, estes espaços são descritos “ao se representar sobre as plantas-baixas dos pavimentos de um edifício, os maiores e mais largos (nas suas dimensões) polígonos convexos possíveis de se delimitar entre os seus limites físicos” (NASCIMENTO, 2008, p. 58).

Figura 3 – a) Espaço convexo; b) Espaço côncavo Fonte: HILLIER e HANSON, 1984 (Adaptado).

Assim, em um espaço convexo, nenhuma linha desenhada entre dois pontos sai desse espaço. O que não ocorreria em um espaço côncavo (HILLIER e HANSON, 1984).

Conforme há de se observar nas Figuras 4 e 5, Hillier, Hanson e Graham (1987) demonstram como possíveis relações se estabelecem entre espaços convexos.

Figura 4 – Uma célula dividida Fonte: HILLIER, HANSON e GRAHAM, 1987.

Figura 5 – a), b) Duas possíveis relações entre os espaços a e b em relação ao espaço c Fonte: HILLIER, HANSON e GRAHAM, 1987 (Adaptado).

A Figura 4 mostra a relação entre dois espaços convexos – a e b – com apenas uma possibilidade de acesso. A Figura 5 apresenta duas possibilidades de relações espaciais entre os espaços convexos a e b, e um espaço externo c. Isto significa que a relação entre a e b muda quando c é considerado.

O controle das relações entre as unidades espaciais é exercido por meio de duas variáveis básicas: barreiras ou permeabilidades, entendidas como elementos que agem no sentido de impedir ou permitir acesso entre as unidades espaciais adjacentes; e opacidades ou transparências, entendidas como elementos que dizem das possibilidades de percepção visual entre indivíduos em unidades espaciais distintas, sejam elas adjacentes ou não. Respeitando a ideia de sistema, barreiras e permeabilidades estão associadas ao movimento de pessoas (co-presença); e, opacidades e transparências associam-se às possibilidades de contatos visuais e interações interpessoais (co-ciência).

A análise sintática do espaço se dá fundamentalmente através da decomposição dos elementos espaciais. Para tanto, se faz uso de técnicas e modelos computacionais, vislumbrando o entendimento das questões configuracionais, associando valores quantitativos e expressões matemáticas para a análise espacial (SABOYA, 2007). Nesses termos, a estrutura espacial de uma edificação pode ser descrita a partir de propriedades

específicas e representadas por meio de grafos, gráficos, mapas, entre outros recursos analíticos que compõem o instrumental da Sintaxe espacial.

Por fundamentarem o método aplicado a esta pesquisa, ferramentas e propriedades sintáticas, a serem utilizadas nas análises desenvolvidas no Capítulo 5, são abordadas no Capítulo 4 - Método.