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A situação das políticas públicas e a ESCCA de Foz do Iguaçu

No documento PR THALITA RAFAELA NEVES (páginas 68-72)

2. A PERCEPÇÃO DOS PROFISSIONAIS SOBRE AS CRIANÇAS E

2.1 Um pouco mais sobre Foz do Iguaçu

2.1.1 A situação das políticas públicas e a ESCCA de Foz do Iguaçu

Apesar das diversas instituições mencionadas que nós procuramos para a concretização do trabalho, notamos que embora os projetos e programas que visem o combate da ESCAA e do desenvolvimento dos direitos humanos infantis, encontramos profissionais que não se vêem em uma situação de trabalho favorável o suficiente para promover uma condição apropriada às crianças e adolescentes violados. Notamos isso através de falas que apresentavam uma espécie de desabafo e até cansaço quanto a condição encontrada, pois para abolir essa forma de violência, era necessário atingir diversas outras redes de crimes e de outras violações que são, muitas vezes organizadas e ocultas. Eram inúmeros os casos a serem ditos. A conselheira tutelar Rute comentou sobre a temática que:

“[...] é um campo muito delicado, (...) porque é uma organização bem montada, tem estratégias bem definidas, então, pra você poder conseguir abordar, pegar e até abrir inquérito não é sempre que a gente consegue. Tem vários casos que a gente tem conseguido e são essas experiências que motivam a gente para não desanimar [...]” RUTE.

Nisso, percebemos que havia uma luta contra essa forma de violência, mas ao mesmo tempo, acabou sendo desfalecida por não conseguir acompanhar a altura e profundidade do fenômeno aqui abordado. Conforme Moraes (2009), é preciso considerar que a ESCCA é um fenômeno complexo devido aos mais variados atores envolvidos, sobre isso, Leal (1999) ainda reflete que a violência sexual acaba não sendo compreendida como localizada, mas um processo de redes que se articulam com outras formas de violência e de crimes. Lidar com a exploração de crianças de Foz do Iguaçu não é o suficiente, se os casos de Ciudad del Este e Puerto Iguazú

são constantemente presentes e não há estrutura política adequada para lidar com isso. Sobre isso, a assistente social da Casa Azul, Lucy, ainda comentou que:

“É bem complicado. Porque o município de Foz do Iguaçu tem tantos adolescentes do Paraguai, como da Argentina, de Foz do Iguaçu, aí as vezes o Conselho Tutelar atende essas meninas, elas não querem falar o endereço onde elas moram, eles não podem colocar dentro de uma casa-lar porque não tem casa de passagem8 aqui em Foz e daí a gente também não aceita porque não tem documentação brasileira. Ás vezes eles (Conselho Tutelar) falam que ficam perambulando horas com essa criança, adolescente, dentro do carro e a demanda é grande [...]” LUCY

A cidade enfrentava a falta de uma Casa de Passagem o que dificultava a concretização do trabalho de diversos profissionais, principalmente os da Assistência Social. Percebemos que assim como a exploração é bem articulada na Tríplice Fronteira, há uma desorganização nas redes para lidarem frente a isso, devido a grande demanda e a dificuldade de acesso a essas crianças e adolescente. Como já indicado por Sprandel (2005), há políticas, mas insuficientes. Pois a realidade da fronteira enfrentava não apenas um fluxo de turistas que se interessam pelas Cataratas do Iguaçu ou pela Itaipu, mas por conta do turismo sexual (MORAES, 2009) além dos violadores existentes na própria cidade e dos casos intrafamiliares.

Thamires, a psicóloga do Novos Rumos ressaltou sobre a jovialidade das crianças e adolescentes que estão sob situação de exploração sexual na fronteira:

“[...] meninas assim de onze, doze anos, paraguaias, estão ali são exploradas, com doze anos elas já engravidam, quando elas tem vinte anos o filho de dez já está indo junto, é bem complicado, aí o Conselho do Brasil pega e leva pro Paraguai, fica cinco minutos no Paraguai e eles estão aqui de volta [...]” THAMIRES

Sobre isso, ainda notamos sobre o déficit das assistências governamentais provenientes da área da Saúde e até Educação de ambos os lados da fronteira entre

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Uma Casa de Passagem possui como principal objetivo abrigar temporariamente pessoas que tiveram seus direitos violados, principalmente no caso de crianças e de adolescentes, essa estrutura aguarda a regularização da situação judiciária pelo Juízado e Conselho Tutelar da vítima acolhida (PREFEITURA DE CAXIAS, 2015).

Brasil e Paraguai (Foz do Iguaçu e Ciudad del Este) não abrigando ou dando suporte para situações como essas.

Compreendemos que os jovens não estavam sendo atendidos devidamente quanto suas necessidade de saúde relacionadas à sexualidade e à reprodução. Consequentemente, serviços de saúde deparavam-se com dificuldades para um atendimento propício incluindo os profissionais de saúde. As crianças e adolescentes acabavam muitas vezes não sendo reconhecidos como participantes de uma vida sexual e principalmente reprodutiva não recebendo uma devida atenção e investimento dos serviços de saúde (BRASIL, 2007).

Entendemos que por mais que diferentes profissionais venham a identificar os casos de exploração, estes são interrompidos momentaneamente e logo voltam ao mesmo estado de violência. Em relação a Argentina, Thamires disse que apenas maiores de 18 anos tinham esse acesso, pois são exigidos documentação e acompanhamento dos pais, no caso de meninos ou meninas. No entanto, através do discurso de Rute, há casos provenientes de todos os países da Tríplice Fronteira.

Sobre isso, a assistente social, Lorena, mencionou sobre a falta de controle na entrada e saída de pessoas no Paraguai permitindo a exploração sexual que ao mesmo tempo, tão detectada na fronteira, não sofre denúncias e encaminhamentos com freqüência, controle este destinado às redes de segurança da região. A Polícia Federal, responsável em fiscalizar os crimes que passam pela fronteira, muitas vezes se atentava ao tráfico de produtos ilegais e até de drogas, mas não o de crianças e adolescentes ou à violência ali emergente. Contudo, a psicóloga Eloísa, responsável pela Casa Amarela, afirmou uma movimentação social em prol da conscientização da cidade sobre a importância de extinguir essa forma de violência:

“Até no Fórum a gente tem algumas reuniões relativas a essa questões de fazer campanhas, palestras, nas escolas sabe, para as pessoas estarem conscientes de refletirem sobre o assunto pelo menos, de colocarem o que é certo e o que errado [...]” ELOÍSA

No entanto, não podemos deixar de mencionar que a época que a investigação ocorreu era a de meses antecedentes da Copa do Mundo 2014, com sede no Brasil. Essa informação nos levou a compreender a mobilização da cidade turística para evitar não só a agravação da exploração sexual comercial de crianças

e adolescentes como impedir ainda uma imagem mundial de que Foz do Iguaçu é fortemente mobilizada por violência infantil. Luísa, a assistente social do CRAS, com um pensamento não diferente das demais profissionais, relatou:

“Nós estamos em uma divisa e eu vejo muito pouco ainda em relação à divisa [...]” LUÍSA

Contraditoriamente, segundo Cláudio, trabalhador da Itaipu, ele nos informou que a Hidrelétrica atua no desenvolvimento dos mais variados programas na defesa e garantia dos direitos das crianças e adolescentes, envolvendo políticas de prevenção como a distribuição de folhetos e adesivos contendo informações sobre a violência sexual e episódios de envolvimento e lazer com crianças e adolescentes de comunidades carentes:

“A gente sempre busca parceiros pra incentivar e fortalecer essas políticas públicas e a gente nota que embora falte muito ainda, algumas coisas tem funcionado [...]” CLÁUDIO

No entanto, notamos que apesar do pensamento esperançoso e positivo Do administrador, juntamente com o discurso da maioria dos profissionais que entramos em contato, os programas e a estrutura da cidade ainda são insuficientes.

“È um trabalho de prevenção que tem que ser feito (...) tem tanta coisa acontecendo, mas muita coisa ainda precisa ser feita num trabalho de prevenção, de conscientização, de aglomerar muito mais grupos, muito mais união, por que é uma realidade muito forte aqui.” DÉBORA

Assim, entendemos que não podemos nos conformar ou acomodar com a situação das instituições e programas desenvolvidos em Foz do Iguaçu, pois de acordo com a demanda de violência e exploração, ainda há muito o que percorrer no sentido de prevenção e intervenção.

Frente a isso, o discurso dos profissionais mencionados resultou numa percepção quase que única considerando a realidade de fronteira em que Foz do Iguaçu encontra-se em meio a falta de políticas que combatam adequadamente a

exploração sexual comercial de jovens na região versus a expansão e organização da violência dificultando sua abolição. É necessário uma maior capacitação dos agentes combatentes e um investimento em melhores condições de trabalho e em mais pessoas que visem colaborar com a efetivação dos direitos desses jovens.

Notamos que em Foz, não há políticas públicas que possam combater com a violência abordada indicando falhas em seus sistemas de proteção e defesa (MORAES, 2009) além de sua escassez (LEAL; LEAL; LIBÓRIO, 2007). Assumimos ainda a importância de compreender o período do desenvolvimento humano, inclusive o da adolescência, como uma fase que necessita de atenção e recursos especializados (ABERASTURY; KNOBEL, 1985) e também devemos considerar o contexto social e histórico que esses jovens estão inseridos (LEVI; SCHMITT, 1996).

No documento PR THALITA RAFAELA NEVES (páginas 68-72)