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A terminologia do instituto e sua dificuldade conceitual

1. DO CONCEITO DE ATO ADMINISTRATIVO E O REGIME JURÍDICO DE

3.1 A terminologia do instituto e sua dificuldade conceitual

Antes de se iniciar o estudo de qualquer tema, faz-se necessário entender a sua conceituação. No que tange ao ativismo judicial, esse ponto revela-se tomentoso, tendo, ao longo dos anos, existido grandes esforços no sentido de delimitar tal conceito, de maneira didática e objetiva. Nesse sentido, leciona Marcelo Casseb Continentino (2010, p.141-142):

Ao mesmo tempo, não me parece possível divisar um sentido bem delimitado ou, melhor dizendo, um parâmetro ou critério que defina satisfatoriamente a dimensão semântica do conceito [...]. Significaria, pois, ativismo judicial a extrapolação das funções inerentes ao Poder Judiciário? A usurpação de competência institucional alheia (Executivo ou Legislativo)? Erro da decisão? Decisão proferida por juiz inconsequente? A adoção de uma metodologia da interpretação escusa? O casuísmo jurídico? Uma decisão da qual eu ou você discorda? Enfim, uma decisão que frustra uma expectativa prévia?

Revela-se oportuno, portanto, uma análise da nomenclatura atribuída ao instituto. Luís Roberto Barroso (on line, p. 9), expondo a origem histórica da expressão, informa que, inicialmente, a postura ativista foi repelida por grande parte da sociedade, senão vejamos:

Ativismo judicial é uma expressão cunhada nos Estados Unidos e que foi empregada, sobretudo, como rótulo para qualificar a atuação da Suprema Corte durante os anos em que foi presidida por Earl Warren, entre 1954 e 1969. Ao longo desse período, ocorreu uma revolução profunda e silenciosa em relação a inúmeras práticas políticas nos Estados Unidos, conduzida por uma jurisprudência progressista em matéria de direitos fundamentais. Todas essas transformações foram efetivadas sem qualquer ato do Congresso ou decreto presidencial. A partir daí, por força de uma intensa reação conservadora, a expressão ativismo judicial assumiu, nos Estados Unidos, uma conotação negativa, depreciativa, equiparada ao exercício impróprio do poder judicial. (grifo original)

Para muitos doutrinadores, o ativismo judicial está umbilicalmente ligado à ideia de separação dos poderes, fundamento do Estado de Direito e base do ordenamento jurídico pátrio.

A polêmica passa, então, a correr em torno da desobediência ou não desse princípio pela postura ativista, tendo em vista que o juiz retira-se do seu papel de simples aplicador da lei e passa a ser criador do direito, exercendo funções que vão além daquelas previstas pelo ordenamento jurídico.

Os opositores à postura ativista tem, como principal crítica ao instituto, o argumento de tal o ativismo judicial representaria uma ofensa frontal ao Princípio da Separação e Independência dos Poderes. Apresentando defensores dessa ideia maléfica de ativismo judicial, Inocência Mártires Coelho (2009, p. 18), expõe o pensamento de Elival Ramos:

Por ativismo judicial – segundo esse jurista -, deve-se entender o exercício da função jurisdicional para além dos limites impostos pelo próprio ordenamento jurídico, que, institucionalmente, incumbe ao Poder Judiciário [...]. Saul Tourinho Leal, de sua parte, mesmo destacando que há dificuldade em se fixarem critérios objetivos para uma conceituação sobre o termo ativismo judicial, assinala que essa expressão está associada á ideia de exorbitância de competência por parte do Poder Judiciário, razão por que – adverte – chamar-se de ativista a um tribunal implica atribuir-lhe algo negativo na sua conduta institucional. (grifo original)

Deve-se ter em mente, contudo, que a postura ativista não é obrigatoriamente uma expressão negativa da atividade judicial. Revela-se bastante útil – por que não dizer necessária – nos casos de omissão legislativa ou de abusos administrativos.

Não se pode admitir que o jurisdicionado fique órfão de um resposta a sua prestação quando Legislativo e do Executivo assumirem postura omissa, impedindo, ainda, o Judiciário de atuar, com a justificativa de preservação do Princípio da Separação e Independência dos Poderes. Caso tal situação fosse configurada, restariam feridos princípios basilares e estruturantes da Carta Magna. Sobre o risco do reducionismo do conceito de ativismo judicial e da sua vinculação a uma concepção negativa, acrescenta Marcelo Casseb Continentino (2012, p. 145):

[...] vejo um relevante risco no uso, ou melhor, na manipulação do conceito, pois, no cenário brasileiro, em geral, o conceito de ativismo judicial reveste- se de conotação negativa. Em geral, aqui, os autores tomam-no por sinônimo de extrapolação das funções inerentes ao Poder Judiciário.

Precisamente nesse ponto é que reside o problema, já que o legítimo exercício das funções inerentes a Poder Judiciário é tudo menos objeto de consenso. Normalmente quando se acusa uma decisão de ativista, esquece-se de justificar o porquê. O uso do conceito traz um ônus argumentativo, o qual – pela força semântica que adquiriu – termina por ser deixado de lado, interrompendo-se o debate crítico. Em outras palavras, assistimos a uma crítica superficial e não fundamentada das decisões judiciais e, em partículas do Supremo Tribunal Federal, o que, no fundo, revela uma mera ideologização da visão de nossa prática judicial e do seu discurso crítico.

Releva-se, portanto, necessária uma postura ativa do Poder Judiciário, exercendo funções de outros Poderes, quando estes revelarem-se omissos ou abusivos, afrontando garantias constitucionais e gerando prejuízos à sociedade.

Ainda no que tange aos obstáculos encontrados no estabelecimento de uma nomenclatura uniforme e pacífica do movimento ativista, John Hart Ely (2010, p. 3), explicita uma diferenciação entre as posturas adotáveis pelos juízes, senão vejamos:

Há uma antiga disputa na teoria constitucional que vem sendo chamada por diferentes nomes em diferentes épocas; porém, para falar dela, a terminologia contemporânea parece ser tão boa como qualquer outra. Hoje em dia, tendemos a chamar os lados em disputa de ‘interpretacionismo’ e ‘não interpretacionismo’ – o primeiro afirma que os juízes que decidem as questões constitucionais devem limitar-se a fazer cumprir as normas explícitas ou claramente implícitas na Constituição escrita, e o segundo adota a opinião contrária, a de que os tribunais devem ir além desse conjunto de referências e fazer cumprir normas que não se encontram claramente indicadas na linguagem do documento.

Os posicionamentos, portanto, são diversos, existindo inúmeros doutrinadores contrários ao ativismo judicial convivendo com numerosa classe que

defende a postura ativista. O aceitável por todos é que o ativismo revela-se quando os juízes atuam para além da função jurisdicional de mero aplicador da lei, interferindo em esferas dos outros poderes, visualizado, a título de exemplo, quando da anulação de um ato administrativo considerado ilegal ou do controle positivo de leis.

Resta inequívoco, também, o aumento progressivo, ao longo dos anos, da postura ativista dos juízes e tribunais, notadamente no que diz respeito às políticas públicas. Tal crescimento deve-se, principalmente, à ampliação dos poderes do Judiciário, trazida pela Constituição Federal de 1988 e impulsionada pela busca à proteção e efetivação os valores nela impostos.