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Ativismo judicial e o controle jurisdicional do ato

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Academic year: 2018

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO CEARÁ FACULDADE DE DIREITO

CURSO DE GRADUAÇÃO EM DIREITO

CAROLINA GURGEL LOBO

ATIVISMO JUDICIAL E O CONTROLE JURISDICIONAL DO ATO ADMINISTRATIVO

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CAROLINA GURGEL LOBO

Ativismo Judicial e o Controle Jurisdicional do Ato Administrativo

Trabalho de Conclusão de Curso na área de Direito Administrativo e Constitucional, submetido à Coordenação do Curso de Direito da Universidade Federal do Ceará, como requisito parcial para a obtenção do grau de Bacharel em Direito.

Orientador: Professor Doutor Francisco Régis Frota Araújo

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CAROLINA GURGEL LOBO

Ativismo Judicial e o Controle Jurisdicional do Ato Administrativo

Trabalho de Conclusão de Curso na área de Direito Administrativo e Constitucional, submetido à Coordenação do Curso de Direito da Universidade Federal do Ceará, como requisito parcial para a obtenção do grau de Bacharel em Direito.

Aprovada em ___/___/_____

BANCA EXAMINADORA

_____________________________________________ Professor Doutor Francisco Régis Frota Araújo (Orientador)

Universidade Federal do Ceará – UFC

_____________________________________________ Professora Mestre Fernanda Cláudia Araújo da Silva

Universidade Federal do Ceará – UFC

_____________________________________________ Professor Doutor Regnoberto Marques de Melo Junior

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Aos meus pais, Fátima e Lobo, pelas lições repassadas ao longo dos anos e por serem minha fonte de inspiração e amor.

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AGRADECIMENTOS

A Deus, por minha vida, meus infinitos agradecimentos nos momentos de glória e de pesar.

A Mainha, presente em cada instante, transmitindo seus ensinamentos de forma sábia e serena. Suas palavras e seus silêncios me guardam e me guiam de forma divida.

A Painho, minha fonte perene de orgulho, em quem alicercei minhas bases e estabeleci minhas referências. Sigo, incansavelmente, na tentativa de orgulhá-lo e retribuí-lo.

A Fred e Camila, meus irmão, presentes de Deus e companheiros da minha vida, minha eterna gratidão por me proporcionarem conviver com um amor tão franco e desinteressado.

A Ceição, pelo amor maternal, pela dedicação diária e pelo cuidado inestimável.

Aos meus avós pelo carinho pueril repassado em lições generosas.

À Germana e Letícia, minhas grandes amigas, que estiveram sempre presentes ao longo da minha formação acadêmica, compartilhando todos os momentos e fortalecendo esse laço de carinho eterno.

Aos meus amigos, que caminham ao meu lado, alegrando minha alma. Ao Professor Doutor Francisco Régis Frota Araújo, de quem sou também monitora, por ter aceitado me orientar neste trabalho, acreditando em minha competência.

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“Seja um Colombo para novos continentes e mundos inteiros dentro de você, abrindo caminhos, não de comércio, mas de pensamento.”

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RESUMO

O ativismo judicial é fenômeno que tem se mostrado em expansão ao redor do mundo, podendo ser sentido, também, no Brasil. A Constituição Federal de 1988 ampliou sobremaneira os direitos fundamentais, tendo, ainda, alargado o papel do Poder Judiciário, que passou a ser entendido como meio indispensável para a concretização dos valores constitucionalmente consagrados. Com a finalidade de garantir a preservação e a efetividade de tais direitos, os juízes e magistrados passaram a intervir no âmbito de atuação dos demais Poderes, quando são observadas omissões ou abusos por parte do Legislativo e do Executivo. Nesse contexto, surge a possibilidade de controle jurisdicional dos atos administrativos, sejam eles vinculados ou discricionários. Analisa-se, então, a formação do ato administrativo e o regime jurídico que o regula, dando destaque aos seus princípios basilares; o mérito administrativo e as limitações e consequências da atividade criativa dos magistrados. Exemplifica-se o fenômeno com decisões do Supremo Tribunal Federal, pondo em debate as questões políticas e sociais analisadas pela Suprema Corte. Busca conscientizar o leitor da necessidade se estudar o tema do ativismo judicial na atual conjuntura sócio-política do Brasil, notadamente no que tange ao controle jurisdicional do ato administrativo.

Palavras- chave: Ativismo judicial. Ato Administrativo. Mérito Administrativo. Controle jurisdicional.

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ABSTRACT

Judicial activism is a phenomenon that has proved to be in expansion all over the world, being also felt in Brazil. The 1988 Federal Constitution has significantly broadened the fundamental rights as well as widened the role of Judiciary Branch, which came to be understood as an indispensable means of concretizing constitutionally consecrated values. In order to ensure the preservation and effectiveness of such rights, judges and magistrates began to intervene within the ambit of action of the other Powers, in case of omissions or abuses by the Legislative and the Executive Branches. In this context, arises the possibility of jurisdictional control of the administrative act, be it bound or discretionary. It is then analyzed the formation of administrative act and the legal framework that regulates it, highlighting its basic principles; the administrative merit and the limitations and consequences of the creative activity of magistrates. Such

phenomenon is exemplified with Federal Supreme Court’sdecisions, calling into debate political and social issues analyzed by it. It is sought the reader to be aware of the need

to study the judicial activism topic in Brazil’s current socio-political scenario, especially in regard to jurisdictional control of the administrative act.

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INTRODUÇÃO ...9

1. DO CONCEITO DE ATO ADMINISTRATIVO E O REGIME JURÍDICO DE DIREITO PÚBLICO ...11

1.1. Os Pilares do Regime Jurídico de Direito Público : aspectos Principiológicos ...12

1.1.1 Princípio da Supremacia do Interesse Público ...12

1.1.2 Princípio da Indisponibilidade do Interesse Público ...14

1.2 Elementos do Ato Administrativo ...15

1.3 Atributos do Ato Administrativo ...19

1.3.1 Presunção de Legitimidade ...20

1.3.2 Imperatividade ...21

1.3.3 Autoexecutoriedade...,,,,,,,,...21

1.3.4 Tipicidade...22

1.4 O mérito administrativo – Conveniência, Oportunidade e Poder Discricionário...23

2 LIMITAÇÕES AO CONTROLE JURISDICIONAL DO ATO ADMINISTRATIVO...26

2.1 Princípio da Separação Poderes na Constituição Federal de 1988 ...26

2.2 Limites à discricionariedade e a controvérsia acerca dos conceitos indeterminados...29

2.2.1 Os conceitos jurídicos indeterminados...31

2.3 O princípio da proporcionalidade como limite à discricionariedade da Administração Pública e como medida do controle Jurisdicional dos atos administrativos...34

3 O ATIVISMO JUDICIAL...40

3.1 A terminologia do instituto e sua dificuldade conceitual...40

3.2 A influência da Constituição Federal de 1988 no ativismo judicial...43

3.3 Atividade interpretativa, a criação do direito e o fenômeno da judicialização..46

3.4 Os benefícios e riscos da postura ativista...50

3.5 Decisões ativistas paradigmáticas do STF e o seu reflexo na seara administrativa...60

CONSIDERAÇÕES FINAIS...65

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INTRODUÇÃO

O ativismo judicial é fenômeno cada vez mais observado na seara jurídica ao redor do mundo. Tal instituto, de difícil conceituação, foi, por longo período, compreendido de forma negativa, atribuindo-se à nomenclatura sentido pejorativo.

O aumento progressivo da postura ativista dos magistrados pode ser atribuído em larga escala à Constituição Federal de 1988, que estendeu o papel conferido ao Poder Judiciário e ampliou sobremaneira os direitos fundamentais. Com a finalidade de concretizar os valores garantidos pela Carta Cidadã, os juízes e tribunais estão, cada vez mais, exercendo funções estranhas àquelas conferidas originalmente pelo ordenamento jurídico, o que tem gerado a reação de muitos, que argumentam haver uma usurpação de tarefas e uma afronta ao Princípio da Separação e Independência dos Poderes.

Nesse contexto, surge o controle jurisdicional do ato administrativo, objeto de estudo do deste trabalho, sendo criticado por uns e defendido por outros tantos. Historicamente, defendeu-se o fato de que apenas os atos administrativos vinculados e os elementos também vinculados do ato discricionários seriam passíveis de sofrer o controle jurisdicional, levando se em conta apenas a legalidade estrita. Ao longo do tempo, principalmente em razão dos abusos cometidos pela Administração Pública e acobertados pelo véu da discricionariedade, essa perspectiva tem-se alterado.

No presente estudo, busca-se observar a postura ativista dos juízes e tribunais brasileiros, sobretudo o Supremo Tribunal Federal, e analisar o controle jurisdicional dos atos administrativos, especialmente os discricionários, expondo exemplos paradigmáticos de tal realidade e trazendo à baila os posicionamentos favoráveis e contrários ao referido fenômeno.

Expõem-se as opiniões contrárias ao movimento e suas respectivas razões. Em seguida, são descontruídos e rebatidos, um a um, cada argumento negativo, narrando-se as razões do crescimento do ativismo judicial no Brasil e de sua importância nos tempos modernos.

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O primeiro capítulo aborda, de início, a conceituação de ato administrativo e o Regime Jurídico a que ele se submete, dando destaque às suas bases principiológicas, quais sejam os princípios da Supremacia do Interesse Público sobre o Privado e da Indisponibilidade do Interesse Público. Há, ainda, a exposição dos atributos e dos elementos do ato administrativo, estabelecendo quais desses elementos são considerados vinculados e quais se encontram no âmbito da discricionariedade. Por fim, procede-se com uma análise do que se chama de mérito administrativo, um estudo da conveniência, oportunidade e do poder discricionário.

Na segunda parte, tem-se o estudo das limitações do controle do ato administrativo. Dá-se especial destaque ao Princípio da Separação e Independência dos Poderes e a sua concepção atual. Em seguida, inicia-se o estudo dos limites à discricionariedade, realçando-se a atual concepção de legalidade, estudando seus aspectos principiológicos, notadamente no que tange as esferas da proporcionalidade e da razoabilidade. Procede-se, ainda, com o exame da controvérsia acerca dos conceitos jurídicos indeterminados, sob a perspectiva doutrinária e jurisprudencial.

Na terceira parte, debruçamo-nos sobre o fenômeno do ativismo judicial, alegando sua dificuldade de conceituação e sua incidência no Brasil. Tem-se, em foco, portanto, a tendência moderna da postura ativista dos magistrados, em destaque para a interpretação e criação do direito, procedendo-se, ainda, com uma análise do fenômeno da judicialização.

Apresenta-se o fenômeno ativista tanto entendido como essencial e benéfico, eis que capaz de sanar as omissões e conter os abusos dos demais poderes, como sob a perspectiva negativa exposta por alguns autores, que alegam ser o ativismo um meio de usurpação das funções e competências dos demais poderes e uma afronta ao Princípio da Separação e Independência dos Poderes.

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1. DO CONCEITO DE ATO ADMINISTRATIVO E O REGIME JURÍDICO DE DIREITO PÚBLICO

O ato administrativo, espécie de ato jurídico, não possui um conceito unanimemente estabelecido e aceito por toda a doutrina.

Pode-se afirmar, contudo, que determinados elementos devem estar presentes para que reste reconhecido um ato administrativo. Tais características definidoras levam em consideração três elementos, quais sejam: o sujeito de onde provém a manifestação de vontade, o fim a que se deseja alcançar e o regime jurídico a que se sujeita. Segundo José dos Santos Carvalho Filho (2010, p. 109):

Consideramos, todavia, que três pontos são fundamentais para a caracterização do ato administrativo. Em primeiro lugar, é necessário que a vontade emane de agente da Administração Pública ou dotado de prerrogativa desta. Depois, seu conteúdo há de propiciar a produção de efeitos jurídicos com fim público. Por fim, deve toda essa categoria de atos ser regida basicamente pelo direito público.

O ato administrativo, portanto, individualiza-se inicialmente por se tratar de externalização de vontade da Administração Pública. Tais manifestações ou declarações de vontade podem emanar da administração pública diretamente, quando age nessa qualidade, ou de particulares investidos em funções públicas.

No que tange aos efeitos de tal exteriorização volitiva, nota-se que o ato administrativo tem por finalidade atender ao interesse público. A produção de efeitos do ato administrativo é imediata, devendo observância à lei e tendo por objetivo alcançar o interesse público.

Exatamente por serem exercidos na atuação de atribuições públicas, é que os atos administrativos estão sujeitos ao regime jurídico predominantemente de direito público.

Alicerçado especialmente nos princípios da Supremacia do Interesse Público e da Indisponibilidade do Interesse Público, o Direito Administrativo rege-se por um Regime Jurídico próprio, dito exorbitante, ostentando prerrogativas e limitações peculiares que fornecem as armas para a consecução do interesse público.

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Por sua importância inconteste para o entendimento do Regime Jurídico Administrativo, tais princípios merecem análise pormenorizada.

1.1 Os Pilares do Regime Jurídico de Direito Público: aspectos principiológicos

A Administração Pública está submetida a um Regime Jurídico de Direito Público exorbitante, norteada por princípios constitucionais próprios e específicos ao atendimento de sua finalidade precípua, qual seja a busca do interesse público.

Na busca pelo bem comum dos administrados vistos como um todo coletivos, a Administração Pública mune-se de prerrogativas que a colocam em uma posição de superioridade em relação aos particulares. Em contrapartida, sujeita-se a limitações que a impedem de, no uso de suas atribuições, a impedem de dispor desse interesse geral. Nesse sentido, Maria Sylvia Zanella Di Pietro (2007, p. 57):

Ao mesmo tempo em que as prerrogativas colocam a Administração em posição de supremacia perante o particular, sempre com o objetivo de atingir o beneficio da coletividade, as restrições a que está sujeita limitam a sua atividade a determinados fins e princípios que, se não observados, implicam desvio de poder e consequente nulidade do ato.

A Administração Pública, portanto, com o objetivo de atender ao seu fim imediato sujeita-se ao binômio prerrogativas e restrições, necessárias ao atendimento do que se convencionou chamar de Welfare State, Estado de bem-estar, destinado ao atendimento do interesse público.

1.1.1 Princípio da Supremacia do Interesse Público

O Estado tem suas atividades direcionadas à conquista do bem-estar social; norteia sua atuação na consecução do interesse público, em prol da coletividade. Para que possa exercer essa função de maneira eficiente, à Administração são conferidos poderes especiais, não extensíveis aos particulares, posicionando o Poder Público em patamar superior nas relações de que faça parte atuando nessa condição.

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consistindo, em verdade, em decorrência do Estado de Direito, na essência da sociedade em si.

Desse princípio, extrai-se que o interesse público é supremo, devendo o exercício do Estado submeter os interesses privados ao bem-estar social. A atuação do Estado tendo como fim imediato a busca pelo interesse público encontra suas raízes no próprio regime democrático. Nesse diapasão, merece destaque o pensamento de Hely Lopes Meirelles (2004, p. 101), que ensina:

O princípio do interesse público está intimamente ligado ao da finalidade. A primazia do interesse público sobre o privado é inerente à atuação estatal e domina-a, na medida em que a existência do Estado justifica-se pela busca do interesse geral.

Na busca por esse objetivo, podem ocorrer situações em que o interesse particular entre em choque com o interesse público, devendo este prevalecer, mesmo acarretando o sacrifício daquele. Ressalte-se que em todas essas circunstancias a legalidade deve ser observada, não podendo tal princípio ser utilizado como meio de abuso da função pública. O princípio em comento, portanto, não tem caráter absoluto, estando a atuação do Estado vinculada à observância das diretrizes constitucionais.

Para que o fim público seja alcançado, como já dito, o Regime Jurídico da Administração Pública conta com determinadas prerrogativas, que a colocam em posição de superioridade nas relações com os particulares. Isso se deve ao fato de que o indivíduo deve ser analisado, nesse contexto, como parte de um todo, sendo o interesse público o fim último da atividade estatal. Corroborando com esse entendimento, José dos Santos Carvalho Filho (2010, p. 35), que aduz:

Desse modo, não é o indivíduo em si o destinatário da atividade administrativa, mas sim o grupo social num todo. Saindo da era do individualismo exacerbado, o Estado passou a caracterizar-se como o Walfa re State (Estado/bem-estar), dedicado a atender ao interesse público. Logicamente, as relações sociais vão ensejar, em determinados momentos, um conflito entre o interesse público e o interesse privado, mas, ocorrendo esse conflito, há de prevalecer o interesse público.

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individualmente considerado em detrimento do interesse público, sob pena de sacrifício frontal ao convício social harmônico e ao bem-estar coletivo.

O Estado, então, mune-se de prerrogativas não extensíveis aos particulares na busca do atendimento das necessidades coletivas. Atuando como defensor do interesse público, a Administração fortifica-se com tais privilégios inerentes a sua função, que fundamentam diversos institutos, como o Poder de Polícia, ao atos autoexecutáveis, as cláusulas contratuais exorbitantes.

Nesse diapasão, revela-se inconteste que o Poder Público pauta sua atuação na conquista de seu objetivo primeiro, o interesse público. Por ser a busca pelo bem coletivo a razão de sua atividade, não pode a Administração dispor desse interesse supremo, motivo pelo qual lhe são impostas determinadas limitações no exercício de sua função. Tais restrições dão forma ao outro pilar do Direito Administrativo a ser estudado a seguir.

1.1.2. Princípio da Indisponibilidade do interesse público

A coisa pública não é de propriedade da Administração Pública ou de seus agentes, sendo eles meros executores do interesse coletivo, gestores de bens e interesses de toda a sociedade.

Em assim sendo, não pode a Administração dispor livremente os bens e interesses públicos, uma vez que sua verdadeira titular é a coletividade. Nesse contexto, surge o Princípio da Indisponibilidade do Interesse Público, de onde derivam limitações impostas ao Poder Público no exercício de suas funções.

De tal princípio extrai-se que os agentes públicos, por serem meros gestores do interesse público, não podem dispor dos direitos do Poder Público como bem intencionarem. A administração Pública não possui autonomia para renunciar, mitigar ou transigir direitos públicos de forma deliberada.

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Tal princípio releva-se um contrapeso à supremacia conferido pela norma anteriormente estudada, no momento em que estabelece que a superioridade da Administração Pública não é absoluta, devendo ser direcionada para a busca do interesse público, de titularidade da sociedade como um todo. Em lição esclarecedora, merecem destaques os ensinamentos de Fernanda Marinella (2011, p. 28) sobre o tema:

Os bens, direitos e interesses públicos são confiados ao administrador para a gestão, nunca para sua disposição. O administrador tem o dever de guarda, aprimoramento e conservação, lembrando-se de que a atividade administrativa é um múnus público, é encargo, é obrigação para os administradores.

Deve, portanto, o administrador, no exercício de sua função de gestor do interesse público, respeitar as limitações a ele impostas, sendo vedada a utilização de sua posição de superioridade para o cometimento de abusos.

1.2 Elementos do ato administrativo

Chamado por alguns de “requisitos”, os elementos do ato administrativo são

as partes constitutivas do ato administrativo, sem os quais não poderá ser considerado válido. Independentemente da terminologia adotada, é certo que, ausente algum desses pressupostos, o ato estará eivado do vício da ilegalidade, sendo passível de anulação.

Nesse diapasão, são cinco os elementos do ato administrativo trazidos pela Lei 4.717/65, quais sejam: competência, finalidade, forma, motivo e objeto.

Passe-se à análise sucinta de cada um deles.

A competência é o poder estabelecido por lei aos agentes para o exercício de suas atividades, autorizando-o para a prática de certos atos. Tal poder deve ser proveniente de norma expressa e por ela limitada, não se podendo falar em competência administrativa presumida. Em razão disso, esse elemento será sempre vinculado mesmo que o ato administrativo seja discricionário.

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Em sendo a competência necessária para o exercício das funções administrativas que, como visto, tem em seu fim imediato o interesse público, não pode deixar de ser efetivada, sendo seu exercício obrigatório e irrenunciável.

Merece nota que a competência pode ser objeto de delegação ou de avocação desde que autorizadas legalmente, tendo caráter excepcional e temporário, devendo estar, ainda, presentes motivos relevantes que o justifiquem e os requisitos legais. Ressalte-se que, nessas hipóteses, o que é transferido é o exercício da competência, nunca a sua titularidade.

A delegação é a transferência temporária de determinadas funções para agente de mesmo plano hierárquico ou hierarquicamente inferior, sem que seja retirada a competência da autoridade delegante. A avocação, por sua vez, trata-se de atração de competência por autoridade hierarquicamente superior e incialmente incompetente. Ressalte-se que é vedada a avocação em casos competência exclusiva do subordinado.

Por muito oportunas, merecem transcrição as palavras de Hely Lopes Meireles (2010, p. 149) sobre o tema:

A competência administrativa, sendo requisito de ordem pública, é intransferível e improrrogável pela vontade dos interessados. Pode, entretanto, ser delegada e avocada, desde que o permitam as normas reguladoras da Administração. Sem que a lei faculte essa deslocação de função, não é possível a modificação discricionária da competência, porque ela é elemento vinculado de todo ato administrativo, e, pois, insuscetível de ser fixada ou alterada ao nuto do administrador e ao arrepio da lei.

Deve-se ter em mente que o chamado “excesso de poder” ocorre quando o agente púbico excede o uso de suas atribuições, extrapolando os limites de sua competência. O ato eivado de tal vício é passível de anulação, podendo, contudo, conforme o caso, vir a ser convalidado.

O segundo elemento do ato administrativo a ser estudado é a finalidade, entendida como o bem jurídico que se busca alcançar e proteger, aquilo que se objetiva com a prática do ato.

Celso Antônio Bandeira de Mello (2010, p. 405) define a finalidade com

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Distingue-se do motivo, haja vista que este é anterior à prática do ato, sendo elemento que conduz, que leva ao processamento do ato. A finalidade, por sua vez, refere-se a algo que a Administração visa a alcançar com a prática do ato, sucedendo-o portanto.

Merece destaque que a finalidade deve ser entendida em sentido amplo, assim considerada aquela presente em todos os atos administrativos, qual seja a busca pelo interesse público. Tem de ser analisada, ainda, em seu sentido estrito, que é o resultado específico previsto em lei que o ato deve produzir.

Nesse diapasão, pode-se perceber que a finalidade é um elemento vinculado do ato administrativo, tornando-o nulo de pronto caso seja desrespeitado.

Ressalte-se que o desrespeito a esse elemento do ato administrativo caracteriza-se como desvio de finalidade, espécie do gênero abuso de poder, acarretando a nulidade do ato, sem possibilidade de convalidação.

A forma, por sua vez, é o meio pelo qual o ato se exterioriza.

Em regra, os atos administrativos tem a forma escrita. Diferentemente do que ocorre das relações privadas, aqui, a regra que prevalece é a da solenidade das formas. Tal fato justifica-se em razão de serem as posturas administrativas de interesse de toda a coletividade, consistindo a sua exteriorização em mais um meio de fiscalização conferido à coletividade. Pode o ato, em razão de sua forma escrita, ser analisado a qualquer tempo por qualquer interessado.

Deve o ato, portanto, observar a forma estabelecida em lei, sob pena de incorrer em vício de legalidade, acarretando sua invalidação. Ocorre que é passivo o entendimento no sentido de que o vício da forma, a depender do caso, pode ser convalidado. Nesse sentido, a lição de José dos Santos Carvalho Filho (2010, ps. 122 e 123):

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Merece nota, por fim, que forma e procedimento não se confundem, sendo este último uma sucessão de atos. Ocorre que, ordinariamente, ao observar-se defeito no procedimento, considera-se que houve vício de forma.

O motivo, por sua vez, pode ser conceituado, em definição simplista, com a situação de fato ou de direito que enseja a prática do ato administrativo. É, pois, a causa imediata do ato; circunstância que autoriza ou determina a prática do ato, não sendo aceitável que um ato externalize-se sem a existência de razão justificante de sua prática.

Pode o motivo ser um pressuposto de fato – acontecimentos que conduzem à prática do ato pela Administração – ou um pressuposto de direito – disposição legal autorizadora a ensejar a prática do ato.

Caso a situação esteja expressa em lei, havendo uma subsunção entre a circunstância fática e a hipótese legal, cabe ao administrador apenas executar o ato correspondente da forma devida. Aqui, a lei descreve detalhadamente a conjuntura que, ocorrendo, deverá obrigatoriamente ensejar a prática de um ato administrativo específico estabelecido na lei. O motivo surge, nesse caso, como elemento vinculado, portanto.

Existem casos, contudo, em que a lei apenas autoriza a prática do ato ou permite que a Administração opte, segundo seus critérios de oportunidade e conveniência, entre diversos atos possíveis. Transmite-se ao administrador a escolha da postura a ser tomada no caso concreto. Tem-se, aqui, um ato discricionário.

Nesse diapasão, revela-se notória a importância do elemento motivo como determinante para caracterizar um ato como vinculante ou discricionário.

Deve-se destacar que motivo e motivação não se confundem. A motivação é entendida como a exposição dos motivos, a comprovação escrita de que as circunstâncias fáticas ensejadoras do ato administrativo ocorreram.

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Surge, aqui, a necessidade de se fazer menção à Teoria dos Motivos Determinantes. De acordo com essa teoria, a motivação feita pela administração passa a integrar o ato mesmo naqueles casos em que, embora dispensada, tenha ocorrido, restando vinculado o administrador aos pressupostos de fato e de direito que conduziram à prática do ato. A explicitação do motivo deve ser compatível com a situação fática ensejadora do ato administrativo.

Por fim, o último elemento, o objeto refere-se ao conteúdo do ato. É o fim imediato do ato administrativo, a modificação no mundo jurídico que se pretende alcançar com a execução daquele ato. Deve, ainda, para ser válido, ser o objeto lícito, possível e determinado ou, ao menos, determinável. Nesse momento, merece destaque a definição do elemento estudado de Fernanda Marinella (2011, p. 271):

O objeto do ato administrativo é o seu resultado prático; é o ato em si mesmo considerado. Representa o efeito jurídico imediato que o ato produz, o que este decide, certifica, opina, atesta. Esse elemento configura a alteração no mundo jurídico que o ato administrativo se propõe a processar.

O objeto pode ter natureza vinculada ou discricionária. Há hipóteses em que a circunstância fática já se encontra delineada na norma legal, cabendo ao agente apenas executar a lei, praticando o ato logo que configurado o fato, sendo caso de vinculação. Em outros momentos, permite-se que o agente, analisando a conveniência e a oportunidade, trace os limites do objeto do ato praticado.

Ressalte-se que, sendo ilegal o objeto, o ato é viciado, sendo nulo, eis que não admissível convalidação.

1.3. Atributos do Ato Administrativo

Chamados por alguns de “características”, os atributos dos atos

administrativos são peculiaridades que os diferenciam dos atos privados, conferindo-lhes prerrogativas necessárias ao alcance do interesse público.

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Doutrinariamente, elenca-se quatro atributos do ato administrativo, quais sejam: presunção de legitimidade, imperatividade, autoexecutoriedade, tipicidade. Via de regra, essas características estão presentes na maior parte dos atos administrativos, porém, em determinados casos, algum dos atributos pode estar ausente em virtude da natureza do ato.

1.3.1 Presunção de Legitimidade

Decorrente do princípio da legalidade, o atributo da presunção de legitimidade atesta que os atos administrativos presumem-se em conformidade com a lei até prova em contrário, sendo observado em todos os atos administrativos desde o seu nascimento.

Essa característica tem como fundamento a necessidade de agilidade das ações do poder público, que seria comprometida caso a administração dependesse de prévia autorização do Poder Judiciário. Não se pode admitir que atos provenientes de agentes públicos, na busca pelo interesse coletivo, portanto, dependam de aprovação anterior para a produção de seus efeitos ou fiquem a mercê de interrupções inoportunas, obstaculizando o alcance do bem-estar geral.

Em razão desse atributo o ato administrativo produzirá todos os seus efeitos, ainda que contaminado com algum vício, até que seja declarada sua ilegalidade com a consequente retirada do ordenamento jurídico. Referida presunção é, portanto, relativa, eis que admite prova em contrário, podendo o ato ser contestado.

De tal atributo decorrem alguns efeitos práticos. Merece destaque a lição de José dos Santos Carvalho Filho (2010, p. 134) no que concerne aos efeitos decorrentes da presunção de legitimidade:

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1.3.2 Imperatividade

A imperatividade, ligada umbilicalmente ao Princípio da Supremacia do Interesse Público, é característica do ato administrativo que revela sua natureza coercitiva, cogente.

O ato administrativo obriga a todos aqueles a quem se dirige, ainda que seu objetivo contrarie interesses privados, uma vez que o que se busca é o interesse social. Dessa forma, o poder público, de maneira unilateral, cria obrigações a serem respeitadas por todos os destinatários do ato de forma coercitiva.

De fato, não há como supor que a administração tivesse sua atividade condicionada a interesses e vontades individuais. Não pode, portanto, o particular recusar-se a cumprir os comandos emanados do ato administrativo, ainda que não obtenha nenhum benefício ou mesmo que seja prejudicado.

O Poder Público, portanto, em decorrência do atributo da imperatividade, tem a prerrogativa de praticar atos, impondo seu cumprimento a terceiros. É o chamado Poder Extroverso do Estado, que o autoriza a editar atos cuja interferência vai além de sua esfera jurídica, adentrando a esfera jurídica alheia.

Merece destaque o fato de que essa característica não estar presente em todos os atos administrativos, estando restrita àqueles que impõem obrigações. Fernanda Marinella (2011, p. 281) expõe a respeito da matéria:

Esse atributo não está presente em todos os atos administrativos; apenas naqueles que impõem obrigações aos administrados. Dessa forma, quando o ato administrativo visa conferir direitos solicitados pelos administrados, como nas licenças, autorizações, permissões, além de outros, não há imperatividade. Trata-se da efetivação de um requerimento do interessado. Para os atos enunciativos, que emitem opinião, certificam ou atestam determinada situação, não há que se falar em imperatividade. O mesmo acontece com os contratos administrativos, em que o interessado só participa do procedimento licitatório que cominará com a celebração do contrato quando compatível com o seu interesse.

1.3.3 Autoexecutoriedade

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portanto, dependência de previa autorização do Poder Judiciário para que os atos administrativos sejam executados de pronto.

Essa característica fundamenta-se no fato de que o Poder Público precisa agir com eficiência e presteza para que o interesse público seja alcançado. Isso não seria possível caso todo ato proveniente da administração fosse obrigado a submeter-se ao crivo do Judiciário.

Em decorrência disso, os atos administrativos podem ser executados diretamente, inclusive com o uso de força se necessária, caso autorizado por lei. Percebe-se isso, de forma cristalina, nos atos munidos do Poder de Polícia do Estado.

Ressalte-se que esse atributo não afasta a possibilidade de apreciação do ato pelo Judiciário, que pode ser acionado caso o administrado sinta-se lesado. O controle judicial continua a ser uma faculdade do administrado, portanto. O que a autoexecutoriedade acarreta é a dispensa de autorização prévia à prática do ato.

Merece nota a diferenciação feita por alguns autores entre exigibilidade e executoriedade. Segundo essa parcela da doutrina, na exigibilidade, obriga-se a obediência do ato, utilizando-se a Administração de meios indiretos de coerção. A executoriedade, por seu turno, compele materialmente o destinatário do ato, aplicando-se a coerção imediata, por meio da força inclusive.

Por fim, é de ser notar que esse atributo não está presente em todos os atos administrativos, sendo visualizado de forma mais ativa nos casos em que há restrição de direitos dos particulares. Maria Sylvia Zanella Di Pietro (2007, p. 184-185), lecionando sobre o tema, afirma que tal característica somente é possível em duas hipóteses: quando previsto em lei expressamente e em casos de urgência, situações em que, caso não seja adotada de pronto a providencia buscada pelo ato, haveria grandes prejuízos para o interesse público.

1.3.4 Tipicidade

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Tal atributo refere-se à obrigatoriedade de o ato administrativo respeitar a finalidade prevista em lei. Essa característica decorre do princípio da legalidade, segundo o qual a atuação do Poder Público deve ser pautada na lei, obedecendo as suas diretrizes.

Por se tratar de um desdobramento do supracitado princípio, muitos não o consideram como um atributo do ato, eis que toda a atividade administrativa tem, por sua própria essência, que ser exercida dentro dos parâmetros legais.

Ressalta Maria Sylvia Zanella Di Pietro (2007, p. 186-187), tal atributo representa uma segurança do particular, nos seguintes termos:

Esse atributo representa uma garantia para o administrado, pois impede que a Administração pratique atos dotados de imperatividade e executoriedade, vinculando unilateralmente o particular sem que haja previsão legal; também fica afastada a possibilidade de ser praticado ato totalmente discricionário, pois a lei, ao prever o ato, já define os limites em que a discricionariedade poderá ser exercida.

1.4 O mérito administrativo – conveniência, oportunidade e poder discricionário

Foi visto anteriormente que, a depender do ato administrativo, todos requisitos de validade ou somente alguns serão objetivamente definidos em lei, gerando a classificação de atos vinculados ou discricionários.

Os atos vinculados são aqueles em que todos os elementos que o constituem estão estritamente estabelecidos em lei, sendo o agente mero executor, ausente de qualquer grau de liberdade.

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Hely Lopes Meirelles (2004, ps. 152-153) assim conceitua o mérito

administrativo: “consubstancia-se, portanto, na valoração dos motivos e na escolha do objeto do ato, feitas pela Administração incumbida de sua prática, quando autorizada a decidir sobre a conveniência, oportunidade e justiça do ato a realizar.”

Em relação ao motivo e ao objeto, o agente tem o poder de, por meio de critérios de conveniência e oportunidade, avaliar e decidir a prática do ato. O mérito administrativo, então, é observado nos elementos não vinculados do ato, que concedem ao administrador público certa margem de liberdade, obedecidas as restrições legais.

Merece destaque o fato de que discricionariedade não se confunde com arbitrariedade, eis que somente pode ser exercida dentro dos limites impostos pela lei. Condutas arbitrárias, ao revés, vão de encontro ao ordenamento jurídico.

Nesse contexto, Celso Antônio Bandeira de Mello (2010, ps. 432-433) leciona sobre a discricionariedade, estabelecendo:

Em suma: discricionariedade é a liberdade dentro da lei, nos limites da norma legal, e pode ser definida como: ‘A margem de liberdade conferida pela lei ao administrador a fim de que este cumpra o dever de integrar com sua vontade ou juízo a norma jurídica, diante do caso concreto segundo critérios subjetivos próprios, a fim de dar satisfação aos objetivos consagrados no sistema legal’ (grifo original).

Frente a essa conjuntura, surge o questionamento acerca do controle jurisdicional dos atos administrativos, subsistindo divergência doutrinária no que tange à possibilidade de controle do mérito do ato administrativo, tema objeto de análise exaustiva por este trabalho.

Por fim, faz-se necessário estabelecer algumas considerações sobre o Poder Discricionário, eis que é sob seu fundamento que a Administração Pública pratica os atos discricionários.

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Nessa prerrogativa de valoração é que se situa o poder discricionário. Poder discricionário, portanto, é a prerrogativa concedida aos agentes administrativos de elegerem, entre várias condutas possíveis, a que traduz maior conveniência e oportunidade para o interesse público. Em outras palavras, não obstante a discricionariedade constitua prerrogativa da Administração, seu objetivo maior é o atendimento aos interesses da coletividade.

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2. LIMITAÇÕES AO CONTROLE JURISDICIONAL DO ATO ADMINISTRATIVO

Para que se possa estabelecer as corretas diretrizes do estudo do controle jurisdicional do ato administrativo, faz-se necessário fazer uma breve explanação acerca da forma de organização do País e dos princípios condizentes com o tema.

Estabelece o art. 1º da Constituição Federal que o Brasil é uma República Federativa, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constituindo-se em um Estado Democrático de Direito. Esse conceito de Estado revela que o regime jurídico adotado pressupõe a subordinação à Constituição, fundamentando-se na legalidade democrática. O Estado Democrático de Direito, portanto, pressupõe a ideia de obediência ao império da lei, enraizando-se na realização social e na justiça social e afirmando a ideia de participação popular nos processos políticos.

É nesse contexto de democracia participativa, de justiça social e de submissão do Estado à lei que surge divisão dos Poderes, cabendo a cada o desempenho de funções e a vigilância mútua.

2.1 Princípio da Separação dos Poderes na Constituição Federal de 1988

Inicialmente, faz-se necessário trazer à baila um breve comentário sobre a

terminologia “Poderes”. O Poder Político traz consigo a ideia de unicidade, de indivisibilidade. Seria mais apropriado, então, falar separação e independência das funções, já que essas sim são passíveis de divisão.

Ocorre que, apesar de o entendimento supracitado ser largamente aceito pela doutrina pátria, a Carta Maior utiliza-se dessa denominação, que será utilizada nesse trabalho por questões didáticas, tendo sempre em mente a ressalva feita acima.

O Princípio da Separação e Independência dos Poderes é consagrado pelo art. 2º da Constituição Federal de 1988, que dispõe que “São Poderes da União,

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Essa ideia foi sistematizada por Montesquieu, em sua obra “O Espírito das

Leis”, alegando o filósofo que, para que a liberdade seja garantida, há de existir uma divisão dos poderes, consagrando tal princípio. Sobre o tema, é de grande valia a lição de Paulo Bonavides (2007, p. 148-149):

A grande reflexão política de Montesquieu que conduz ao mencionado princípio gira ao redor do conceito de liberdade, cujas distintas acepções o autor de Do Espírito das Leis investiga, fixando-se naquela de sua autoria, segundo a qual consiste a liberdade no direito de fazer-se tudo quanto permitem as leis.

Depois de referir a liberdade política aos governos moderados, afirma Montesquieu que uma experiência eterna atesta que todo homem que detém o poder tende a abusar do mesmo.

Vai o abuso até onde se lhe deparem limites. E para que não se possa abusar desse poder, faz-se mister organizar a sociedade política de tal forma que o poder seja um freio ao poder, limitando o poder pelo próprio poder.

E acrescenta:

A liberdade estará sempre presente, segundo o notável filósofo, toda vez que haja um governo em face do qual os cidadãos não abriguem nenhum temor recíproco. A liberdade política exprimirá sempre o sentimento de segurança, de garantia e de certeza que o ordenamento jurídico proporcione às relações de indivíduo para indivíduo, sob a égide da autoridade governativa.

Daqui passa Montesquieu a explicar como se extingue ou desaparece a liberdade nas hipóteses que ele configura de união dos poderes num só titular. Quando uma única pessoa, singular ou coletiva, detém o poder legislativo e o poder executivo, já deixou de haver liberdade, porquanto persiste, segundo Montesquieu, o temor da elaboração de leis tirânicas, sujeitas a uma não menos tirânica aplicação.

Revela-se imprescindível a divisão dos Poderes, para se impedir abusos e tiranias, assegurando as liberdades políticas e suas garantias.

Desse modo, cada Poder desempenha uma função a ser exercida de maneira independente, sem que se fale em hierarquia ou subordinação entre Legislativo, Executivo e Judiciário.

É outorgada a cada Poder, então, uma função típica. É certo, contudo, que não há que se falar em exclusividade no desempenho de tais funções pelos poderes. O que ocorre é a predominância no exercício de determinadas atribuições.

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prepondera sobre as outras que também executa. Tal função preponderante define a sua atividade, objetivando os fins estabelecidos pela Carta Magna.

No desempenho de suas funções, sejam típicas ou atípicas, os Poderes são independentes e harmônicos entre si, fundamentando o sistema de freios e contrapesos, em que nenhum Poder se sobrepõe a outro, sendo possível a cada um deles o exercício de sua função.

Ocorre que, para que seja garantida a segurança da sociedade, faz-se necessário o controle sobre as atividades exercidas. Tal determinação também se emprega aos Poderes Políticos: cada um deles deve ter suas ações controladas e fiscalizadas, a fim de que sejam evitados arbítrios e excessos. Sobre o tema, merece nota a lição de José Afonso da Silva (1998, p. 114), senão vejamos:

A harmonia entre os poderes verifica-se primeiramente pelas normas de cortesia no trato recíproco e no respeito às prerrogativas e faculdades a que mutuamente todos têm direito. De outro lado, cabe assinalar que nem a divisão de funções entre os órgãos do poder nem sua independência são absolutas. Há interferências, que visam à busca do equilíbrio necessário à realização do bem da coletividade e indispensável para evitar o arbítrio e o desmando de um em detrimento do outro e especialmente dos governados (grifo original).

É nesse ponto que se desenvolve o presente trabalho. A doutrina clássica, erigindo seu pensamento no Princípio da Separação e Independência dos Poderes, defende que os atos administrativos, em geral emanados do Poder Executivo, somente poderiam sofrer controle pelo Poder Judiciário no tocando aos atos vinculados ou à legalidade dos atos discricionários. Afirmam que, caso se adentre no mérito administrativo, estar-se-ia violando o dogma basilar constitucional, restando ferida a independência dos Poderes.

(30)

2.2 Limitações da discricionariedade e a controvérsia acerca dos conceitos indeterminados

A discricionariedade deixou de ser vista como um poder absoluto e livre - e, portanto, incontrolável - da Administração Pública, passando a ser entendida como uma margem de escolha conferida ao administrador pela lei. Dentro desse conceito, o agente público deve limitar sua atuação discricionária às fronteiras restritivas da lei, devendo seu exercício obedecer aos princípios constitucionais, sobretudo à proporcionalidade e à razoabilidade. Preceitua Germana de Oliveira Moraes (2004, p. 42), no tocante ao modo como se deve proceder o controle do ato discricionário:

Nota-se, em sua redefinição teórica das categorias da vinculação e da discricionariedade, que o conceito de vinculação ultrapassou os limites da legalidade, no sentido estrito de conformidade com as regras jurídicas, para abranger também a compatibilidade com a principiologia constitucional, para além do principio da legalidade, pois assevera que o administrador jamais desfruta de liberdade legítima e lícita para agir em desvinculação com os princípios constitucionais do sistema.

Nesse contexto, revela-se plenamente cabível – por que não dizer necessário

– o controle jurisdicional do ato administrativo. A proporcionalidade e a razoabilidade são, então, utilizadas como critérios de aplicação do direito, sinalizando no sentido de que a conduta do agente público deve atender a critérios de necessidade e adequação, estando seu exercício enquadrado devidamente com a situação fática.

A discricionariedade não pode, portanto, ser entendida como a liberdade plena e incontrolável do administrador, encontrando limite nos princípios constitucionais, sobremaneira na razoabilidade e na proporcionalidade, que, por sua vez, decorrem da lei. É, então, que se entende que, quando o Judiciário realiza o controle desses atos, somente examina sua legalidade, deixando intacto o poder de escolha conferido pela própria lei ao administrador.

Ato contínuo, não se admite que o agente público disfarce-se do véu da discricionariedade para praticar condutas arbitrárias, em atuação contrária aos princípios administrativos, excedendo os limites legais.

(31)

Princípio da Separação dos Poderes; ao contrário, é expressão cristalina do sistema de freios e contrapesos.

Nesse sentido é que vem se posicionando os Tribunais pátrios. Por muito didática, merece destaque a decisão do Superior Tribunal de Justiça:

ADMINISTRATIVO. AÇÃO ORDINÁRIA. IMPUGNAÇÃO DE MULTA. ART. 630, § 5º DACLT. TRANSPORTE DOS FISCAIS DO TRABALHO. PASSE LIVRE. LINHA SELETIVA. DISCRICIONARIEDADE DO ATO ADMINISTRATIVO. CONTROLE. POSSIBILIDADE. PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E DA PROPORCIONALIDADE DO ATO.

1. Ação ordinária ajuizada pela recorrente, em que impugnou a multa aplicada por violação ao art. 630, § 5º da CLT, porquanto, no seu entender, é obrigada a conceder a gratuidade legal apenas no tocante ao transporte comum, não se estendendo o referido benefício ao transporte seletivo, que conduz um número menor de passageiros, dispondo de comodidades como ar condicionado, televisão, som ambiente, que o serviço comum não possui, tendo acentuado, ainda, que os passageiros optantes pelo transporte seletivo, pagam uma tarifa maior em razão do diferencial do serviço prestado.

2. A atuação da Administração Pública, deve seguir os parâmetros da razoabilidade e da proporcionalidade, que censuram o ato administrativo que não guarde uma proporção adequada entre os meios que emprega e o fim que a lei almeja alcançar.

3. A razoabilidade encontra ressonância na ajustabilidade da providência administrativa consoante o consenso social acerca do que é usual e sensato. Razoável é conceito que se infere a contrario sensu; vale dizer, escapa à razoabilidade "aquilo que não pode ser". A proporcionalidade, como uma das facetas da razoabilidade revela que nem todos os meios justificam os fins. Os meios conducentes à consecução das finalidades, quando exorbitantes, superam a proporcionalidade, porquanto medidas imoderadas em confronto com o resultado almejado.

4. É excepcional a intervenção estatal no domínio econômico, maxime no sistema de livre iniciativa. Sob esse pálio, a intervenção há de se pautar pela razoabilidade, que in casu, recomenda que a concessão de passe livre aos fiscais do trabalho mantenha a finalidade de viabilizar o bom andamento do seu serviço à luz do princípio da menor onerosidade possível. Havendo linhas regulares, com o mesmo itinerário, não há razoabilidade em que os fiscais utilizem-se gratuitamente de um serviço prestado seletivamente. O fato de a lei conceder a esses servidores a possibilidade de deslocamento, não significa que deva ser no meio de transporte mais oneroso.

5. Recurso especial conhecido e improvido.

(STJ, REsp. 443.310/RS; Rel. Min. Luiz Fux, DJ 21/10/2003)

(32)

administrativo discricionário pelo Poder Judiciário, tendo como parâmetro os princípios da proporcionalidade e da discricionariedade:

Com efeito, atualmente sobressai no âmbito de atuação da Administração Pública, a aplicação dos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, quando da análise do ato administrativo que não guarde uma proporção adequada entre os meios que emprega e o fim que a lei deseja alcançar.

Há, portanto, limites à discricionariedade. O controle jurisdicional do ato discricionário não viola o Princípio da Separação dos Poderes nem retira a liberdade concedida por lei ao administrador nos atos discricionários. Ainda no tocante às limitações à discricionariedade, merece nota o comentário de Hely Lopes Meirelles (2004, p. 118):

Mesmo quanto aos elementos discricionários do ato há limitações, impostas pelos princípios gerais do Direito e pelas regras da boa administração, que, em última análise, são preceitos de moralidade administrativa.

Daí dizer-se, com inteira propriedade, que a atividade discricionária permanece sempre sujeita a um duplo condicionamento: externo e interno. Externamente, pelo ordenamento jurídico a que fica subordinada toda atividade administrativa, como já demonstrado em tópicos anteriores; internamente, pelas exigências do bem comum e da moralidade da instituição administrativa.

O bem comum, identificado com o interesse social ou interesse coletivo, impõe que toda atividade administrativa lhe seja endereçada. Fixa, assim, o rumo que o ato administrativo deve procurar. Se o administrador se desviar desse roteiro, praticando ato que, embora discricionário, busque outro objetivo, incidirá em ilegalidade, por desvio de poder ou de finalidade, que poderá ser reconhecido e declarado pela própria Administração ou pelo Poder Judiciário.

Erro é considerar-se o ato discricionário imune à apreciação judicial, pois só a Justiça poderá dizer da legalidade da invocada discricionariedade e dos limites de opção do agente administrativo.

O que o Judiciário não pode é, no ato discricionário, substituir o discricionarismo do administrador pelo do juiz. Mas pode sempre proclamar as nulidades e coibir os abusos da Administração (grifo nosso).

2.2.1 Os conceitos jurídicos indeterminados

Os conceitos jurídicos indeterminados, conforme assevera José dos Santos

Carvalho Filho “são termos ou expressões contidos em normas jurídicas, que, por não terem exatidão em seu sentido, permitem que o intérprete ou aplicados possam atribuir certo significado, mutável em função da valoração que se proceda diante os

(33)

Conceitos indeterminados, portanto, seriam expressões ou termos passíveis de interpretação pelo agente público, uma vez que não vinculavam exata precisão de sentido ou alcance. O administrador, portanto, poderia aplicar tais conceitos de acordo com seu juízo de conveniência e oportunidade.

Desse modo, a discricionariedade seria constatada não apenas quando a lei assim o dispusesse, mas também quando, em razão dos conceitos jurídicos indeterminados, competisse ao administrador a escolha no que tange a sua interpretação e aplicação.

Ocorre que parcela considerável da doutrina discorda dessa posição, defendendo que somente se poderia falar em discricionariedade quando o legislador expressamente a conferisse à Administração, afastando a possibilidade de livre interpretação e aplicação pelo agente público dos chamados conceitos jurídicos indeterminados.

Nesse sentido é o entendimento do Ministro Eros Grau, no Recurso em Mandado de Segurança 24.699, considerado paradigma no assunto. Merece transcrição trecho do seu voto, senão vejamos:

Cumpre deitarmos atenção, nesse passo, sobre o tema dos limites de atuação do Judiciário nos casos que envolvem o exercício do poder disciplinar por parte da Administração. Impõe-se para tanto apartamentos a pura discricionariedade, em cuja seara não caberia ao Judiciário interferir, e o domínio da legalidade.

A doutrina moderna tem convergido no entendimento de que é necessária e salutar a ampliação da área de atuação do Judiciário, tanto para coibir arbitrariedades – em regra praticadas sob o escudo da assim chamada discricionariedade -, quanto para conferir-se plena aplicação ao preceito constitucional segundo o qual “a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito” (art. 5º, XXXV, CF/88).

O sistema que o direito é compreende princípios e regras. A vigente Constituição do Brasil consagrou, em seu art. 37, princípios que conformam a interpretação/aplicação das regras do sistema e, no campo das práticas encetadas pela Administração, garantem venha a ser efetivamente exercido pelo Poder Judiciário o seu controle.

(34)

expressa atribuição normativa à autoridade administrativa, e não da circunstancia de serem ambíguos, equívocos ou suscetíveis de receberem especificações diversas dos vocábulos usados nos textos normativos, dos quais resultam, por obra da interpretação, as normas jurídicas. Comete erro quem confunde discricionariedade e interpretação do direito (grifo nosso). (STF, RMS 24.699/DF, Rel. Min. Eros Graus, DJ 01/07/2005)

Nesse diapasão, apesar da existência de doutrina contrária, o entendimento predominante é no sentido de que não se pode permitir discricionariedade na interpretação dos conceitos jurídicos indeterminados, ficando a atuação discricionária da Administração Pública restrita às hipóteses expressamente previstas em lei.

Essa posição tem forte influência do pensamento europeu, dando destaque para nomes como Laband, Tezner e Büher, que construíram suas reflexões sobre o tema tendo como base principal a proteção dos direitos subjetivos dos indivíduos. Maria Sylvia Zanella Di Pietro (2001, p. 101), então, preceitua:

Dentro dessas concepções que colocam a lei como limite à atividade administrativa, sempre com o objetivo de proteger os direitos individuais, considera-se que a utilização de conceitos vagos, como tranqüilidade, ordem, segurança, não significa a outorga de discricionariedade ou arbítrio para a Administração, uma vez que a ela cabe encontrar a solução correta, podendo o Judiciário apreciá-la e corrigi-la quando contrária aos fins públicos objetivados pelo legislador.

A doutrina germânica, notadamente, foi a responsável pela evolução do pensamento dos conceitos jurídicos indeterminados. Tezner acreditava que a discricionariedade na interpretação de tais conceitos era contrária ao Estado de Direito. Pai da Teoria da Univocidade, que estabelece que a interpretação dos conceitos legais indeterminados somente pode gerar uma única solução correta, o que os encaixaria no âmbito da vinculação, sendo cabível o controle jurisdicional. Nesse sentido, Germana Oliveira de Moraes (2004, p. 72):

(35)

Pode-se notar, portanto, que, já em tempos longínquos, a doutrina alienígena prelecionava no sentido de que os conceitos vagos não geram à Administração Pública a outorga de discricionariedade, sendo possível e até obrigatório, o controle jurisdicional de tal atividade. Reiterando o citado, acrescenta Maria Sylvia Zanella Di Pietro (2001, p. 101):

Tezner parte da idéia de que todos os conceitos utilizados pela lei, ao limitar, de um lado, as esferas de liberdade e propriedade dos cidadãos e, de outro, os poderes da Administração, são conceitos jurídicos; por isso mesmo, ainda que se refiram a dados da experiência ou a elementos fornecidos por outras ciências, sua interpretação é sempre de ordem estritamente jurídica. Assim, cabe ao Judiciário fiscalizar a correta aplicação, pela Administração, dos conceitos jurídicos vagos. É precisamente quando a lei emprega conceitos dessa ordem [...] que a atuação do juiz é mais importante para proteger os direitos individuais contra os abusos da Administração (grifo original).

Percebe-se, portanto, que os conceitos indeterminados não se baseiam em discricionariedade administrativa. Somente se pode falar em discricionariedade administrativa naquelas situações expressamente delineadas e autorizadas por lei. Os conceitos vagos estão simplesmente descritos na norma, de forma inexata, pendentes de interpretação. Tal interpretação deve se dar, em última análise, pelo juiz, possuidor de conhecimento técnicos e munido de imparcialidade necessário para o alcance da solução adequada.

2.3 O princípio da proporcionalidade como limite à discricionariedade da Administração Pública e como medida do controle Jurisdicional dos atos administrativos

De início, antes adentrarmos no estudo do princípio da proporcionalidade em si, é de importância irrefutável, proceder com a análise de determinados pontos.

Merece realce, dentro do contexto dos limites à discricionariedade, o papel dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, de observância obrigatória para que o ato seja considerado legal e não sofra anulação.

(36)

Nesse diapasão, a ilegalidade do ato administrativo a ser combatida pelo controle jurisdicional revela-se não apenas com ofensa à lei, mas desponta, também, quando da ofensa a princípios do sistema jurídico. Veja-se, nesse sentido, o ensinamento de Maria Sylvia Zanella Di Pietro (2001, p. 173):

[...] não significa que o Judiciário não possa apreciar os atos discricionários, reduzindo também os limites da discricionariedade pela aplicação dos princípios gerais do direito. Sempre que a Administração tenha várias opções para atingir a mesma finalidade, ela deve necessariamente optar por solução que esteja em consonância com os princípios gerais do direito.

Por isso mesmo, em vez de afirmar-se que a discricionariedade é liberdade de ação limitada pela lei, melhor se dirá que a discricionariedade é liberdade de ação limitada pelo Direito. O princípio da legalidade há de ser observado, não no sentido estrito, concebido pelo positivismo jurídico e adotado no chamado Estado legal, mas no sentido amplo que abrange os princípios que estão na base do sistema jurídico vigente, e que permitem falar em Estado de Direito propriamente dito. (grifo nosso)

Deve-se, então, guardar a proporcionalidade e a razoabilidade entre a situação que se apresenta e a postura adotada, obedecendo-se, assim, a legalidade em sentido amplo para que seja o ato válido e apto à produção de seus efeitos. Caso não haja tal obediência, o ato poderá ser anulado pelo Poder Judiciário, eis que ilegal.

Muitos doutrinadores consideram que a proporcionalidade seria, a mais da verdade, um desdobramento da razoabilidade. Celso Antônio Bandeira de Mello (2010,

p. 111) afirma que “o princípio da proporcionalidade não é senão uma faceta da razoabilidade”.

Merece nota, contudo, a distinção feita por alguns autores de tais princípios que, embora implícitos na Constituição Federal de 1988, estão expressos em norma infraconstitucional, a exemplo da Lei 9.784/99.

(37)

Tais princípios, portanto, delimitam o âmbito de discricionariedade da atividade administrativa, funcionando, juntamente com a legalidade em sentido estrito, como parâmetro de controle da atuação dos agentes públicos. Visa-se, com isso, evitar abusos ou restrições inúteis pela Administração Pública.

Após essa introdução, procedida com o estudo necessário da ligação com a Razoabilidade, estabelecendo suas distinções apontadas pela doutrina, passaremos à análise mais detida do Princípio da Proporcionalidade, dando-se destaque a sua função como medida limitadora do controle jurisdicional do ato administrativo.

O princípio da proporcionalidade funda-se na busca pelo equilíbrio. Por demais oportuna, merece transcrição o que diz Celso Antônio Bandeira de Mello (2010, p. 110) sobre a proporcionalidade:

Este princípio enuncia a idéia – singela, aliás, conquanto frequentemente desconsiderar – de que as competências administrativas só podem ser validamente exercidas na extensão e intensidade correspondentes ao que seja realmente demandado para cumprimento da finalidade de interesse público a que estão atreladas. Segue-se que os atos cujos conteúdos ultrapassem o necessário para alcançar o objetivo que justifica o uso da competência ficam maculados de ilegitimidade, porquanto desbordam do âmbito da competência; ou seja, superam os limites que naquele caso lhes corresponderiam (grifo original).

Ato contínuo, deve-se entender que é necessário o alcance de três vertentes para que o ato emanado do Poder Público seja considerado proporcional. Paulo Bonavides (2004, ps. 396-398) afirma que o primeiro de tais princípios é a (a)

pertinência ou aptidão, que determina que a medida utilizada deve ser direcionada no

sentido de adequar o meio ao que que se deseja atingir, sendo considerado por muitos como a vedação de arbítrio. O segundo elemento da proporcionalidade é a (b)

necessidade, de acordo com o qual a medida adotada não deve exceder os limites

indispensáveis ao alcance do fim a que se destina; deve o meio empregado ser dosado na intenção de se utilizar a medida menos gravosa na obtenção da finalidade. O terceiro elemento, por fim, é o da (c) proporcionalidade stricto sensu, referindo-se à obrigação de utilizar-se de determinados meios adequados e à interdição de se fazer uso de meios desproporcionais.

(38)

fática existente -; da necessidade – determinado pela imprescindibilidade de sua prática, com a análise da conduta mais adequada e menos gravosa apta ao alcance da finalidade visada -; e da proporcionalidade stricto sensu, delineada pela exigência de serem utilizados os meios adequados e proporcionais na busca do fim colimado.

Tal princípio tem sido, ao longo dos anos, cada vez mais, utilizado como base e fonte de argumentação nas decisões dos tribunais pátrios, tendo alcançado importância inconteste no âmbito da jurisprudência. Germana Oliveira de Moraes (2004, p. 137), em reflexão sobre a relevância do Princípio da Proporcionalidade, sobretudo no controle de constitucionalidade das leis e na atividade administrativa, aduz:

A proporcionalidade tornou-se um ‘axioma do Direito Constitucional’, corolário da constitucionalidade e cânone do Estado de Direito’, vocacionado a limitar toda atuação estatal, inclusive a administrativa, atentatória aos direitos fundamentais, que se tornaram o eixo central do Direito, cujos domínios, para além da legalidade, foram expandidos pelos princípios gerais do Direito, implícitos ou explícitos nos textos constitucionais, para as fronteiras da juridicidade.

O controle jurisdicional da Administração Pública pelo Poder Judiciário não se encontra mais espartilhado pelo critério necessário, porém insuficiente do controle de legalidade, transmudado que foi em controle da juridicidade, o qual se concretiza através da análise da compatibilidade do conteúdo dos atos administrativos com os princípios gerais do Direito, inseridos expressamente na Constituição ou dedutíveis do seu espírito.

É sólido, portanto, o entendimento segundo o qual se deve utilizar do princípio da proporcionalidade no controle dos atos discricionários, limitando-os. Foge do aceitável a possibilidade uma conduta estatal pautada em desproporcionalidade, cabendo ao Poder Judiciário anulá-la.

Corroborando com tal entendimento, merece destaque o voto do Ministro Eros Roberto Grau, em decisão proferida em sede recurso de Mandado de Segurança (2005), já anteriormente transcrito:

(39)

Esse exame evidentemente não afronta o princípio da harmonia e interdependência dos poderes entre si [CB, art. 2º]. Juízos de oportunidade não são sindicáveis pelo Poder Judiciário; mas juízos de legalidade, sim. A conveniência e a oportunidade da Administração não podem ser substituídas pela conveniência e oportunidade do juiz. Mas é certo que o controle jurisdicional pode e deve incidir sobre os elementos do ato, à luz dos princípios que regem a atuação da Administração (STF, Primeira Turma, RMS 24699/ DF, Rel. Min. EROS GRAU, DJ 01-07-2005 PP-00056, EMENT VOL-02198-02 PP-00222, RDDP n.31, 2005, p. 237-238 LEXSTF v. 27, n. 322, 2005, p -167-183).

É inequívoco, portanto, a necessidade de sindicância do ato administrativo, tendo como parâmetro limitador da atuação do Poder Público, a proporcionalidade, faceta da legalidade.

É imperioso frisar que, quando do controle do ato administrativo pelo Poder Judiciário, não há interferência no mérito administrativo, preservando-se o âmbito de atuação e a independência da Administração Pública, base do princípio da separação e independência dos Poderes.

Por meio da aplicação do princípio da proporcionalidade que se pode sindicalizar os atos administrativos, cuidando para que seja mantido o espírito da Constituição Federal e o interesse público, tendo-se sempre em mente que não é apenas a legalidade em sentido estrito que macula o ato.

Refletindo sobre o juízo de ponderação feito pela Administração Pública e os limites à discricionariedade, tendo como base o princípio da proporcionalidade, Gustavo Binenbojm (2008, p. 83-84), em precisa lição, esclarece:

[...] Considerando que, na lógica da separação dos poderes, compete precipuamente à Administração Pública implementar projetos legislativos e políticas públicas, fazem parte da rotina do administrador público situações diversas as quais lhe demandam a tomada de decisões investidas, não raro, de larga margem de discricionariedade.

Nessas situações, conforme esposado, não é livre o agente público para decidir por um ou outro caminho. Chamado a realizar um interesse de índole difusa, para cuja implementação se depare, frontalmente, com um interesse particular juridicamente protegido, deve o administrador, à luz das circunstâncias peculiares do caso concreto, bem como dos valores constitucionais concorrentes, alcançar solução ótima que realize ao máximo cada um dos interesses públicos em jogo. Como resultado de um tal raciocínio de ponderação, tem-se aquilo que convencionamos chamar de melhor interesse público, ou seja, o fim legítimo que orienta a atuação da Administração Pública.

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