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A trajetória das forças locais no contexto da política municipal

A ExPAnsãO dAs OCUPAçõEs Em vIstA ALEgrE:

4.1 A trajetória das forças locais no contexto da política municipal

Conforme formulado nos capítulos anteriores, dois processos sociais distintos caracterizam a ocupação da região de Vista Alegre. O primeiro associado às origens da ocupação, com in- tensa organização e mobilização política na luta por serviços e benefícios públicos coletivos. O segundo característico da expansão desordenada das ocupações, com a crescente precari- zação das moradias, diversificação das formas de atuação e de busca por benfeitorias básicas, sugerindo menor capacidade e regularidade da mobilização coletiva.

Integradas ao processo social de origem, as lutas coletivas e conquistas sociais em Vista Alegre e adjacências constituíram-se com apoios da igreja católica, lideranças par- tidárias e estudantis de orientação política de esquerda. Mas, desde sempre enfrentaram res- trições por parte das gestões administrativas à época, de seus representantes na prestação de serviços básicos, bem como na câmara municipal, conforme mencionado no capítulo inicial.

Assim, a polarização entre posições ideológicas ou interesses políticos denomi- nados comumente de direita e de esquerda constituiu-se, desde o início, como parte da his- tória da região. No entanto, a despeito dos esforços e conquistas sociais – obtidos do poder público, por pressão popular – entre os anos 1970 e 1980166 e ampliados e aprimorados, par-

ticularmente, no início dos anos 1990 (gestão Erundina, 1989-1992), a referida polarização política não se superara. Ao contrário, nas gestões Maluf (1993-1996) e Pitta (1997-2000) os conflitos por interesses diversos tornaram-se intensos tendo resultado no recuo do aten- 166 As gestões municipais à época referem-se a Olavo Setubal (1975-1978) e Reynaldo de Barros (1979- 1982), ambos indicados pelo governo estadual, respectivamente ocupado à época por Paulo Egídio e Paulo Maluf. De forma diversa das anteriores, a gestão Covas (1983-1985) reconhecendo necessidades da região contemplou-a com algumas obras – como o Centro de Cultura da Brasilândia – Rua do Sabão, que não prosseguem na gestão seguinte, Janio Quadros (1986-1988), conforme retomado, de forma breve, ainda neste capítulo.

dimento às necessidades sociais da região, fechando as possibilidades do diálogo político e, consequentemente, impondo perdas para a capacidade de mobilização coletiva.

A referida polarização destacada acima, a nosso ver, alcançou seu ápice na re- gião, no início dos anos 2000, sob a gestão Marta Suplicy (2001-2004). Nesse caso, quando, a despeito da similaridade ideológica entre lideranças petistas e comunitárias, os movimentos locais tiveram suas dificuldades de representação popular e de mobilização coletivas inten- sificadas.

Conforme sugerem matérias jornalísticas à época e entrevista obtida para esta tese, o executivo municipal, imbuído do esforço de aprovar projetos de interesse da gestão na Câmara Municipal, praticou a política de coalizão. Nessa perspectiva, a Administração Regional da Freguesia do Ó (inclui Brasilândia) fora destinada aos representantes históricos do malufismo na região. Assim, esvaziaram-se os esforços e restringiram-se as oportunidades de conquistas esperadas pelos movimentos coletivos de origem. Sem retirar sua importância, esse processo, no entanto, não explica integralmente a situação, fortemente marcada, à época, pelas dificuldades de implementação de mecanismos de participação democrática, como por exemplo, os Conselhos Municipais e de Representantes167.

Pesquisa acadêmica destinada à região (GRIN, 2011) corrobora parcela da leitura acima, e associa as dificuldades em manter a atuação dos movimentos organizados na região à perda do controle político – por parte dos vereadores do PT e PC do B – da Subprefeitura da Freguesia do Ó168.

Durante a prolongada polarização na região entre representações de esquerda e de direita, conforme informações reunidas por esta pesquisa, ambas as forças políticas acu- mulavam desgaste e descrédito. Nesse relativo vácuo de hegemonia da política local iniciava escalada uma terceira força representada na época por candidatos trabalhistas (PTB ou PST), 167 Os Conselhos de Representantes, previstos na Lei Orgânica de São Paulo de 1990, como forma de controle social instalado nas subprefeituras, só foram aprovados na Câmara em 2004. Assim como a própria Lei de implantação das subprefeituras, em substituição às Administrações Regionais, só havia sido aprovada em 2002. Entre as discussões sobre o tema destacam-se: Teixeira e Tabagiba (2005).

168 Vale lembrar a importância dessa instância institucional nas decisões e execuções de obras e serviços urbanos de infraestrutura e melhorias locais, desde sua criação e implantação como Administrações Regionais entre os anos 1965 e 1966, conforme Lei 6236/65 e Lei 6882/66, mas, ainda mais, importante nas propostas de participação democrática. Sobre isso ver: Marques (2003, p. 60).

como o deputado estadual Celino169 e o vereador Claudinho de Souza – atualmente ambos no PSDB. Em apoio mútuo, ambos atuavam na região desde a metade dos anos 1980, vindo a viabilizar o pleito ao legislativo estadual, no caso do deputado Celino, a partir da segunda metade dos anos 1990, e na década seguinte, no caso do vereador Claudinho.

Apoiado desde o final dos anos 1990 pelo então deputado estadual Celino (PSDB),170 Claudinho viabiliza sua campanha na região, sendo eleito em seu primeiro man- dato em 2004, com cerca de 20 mil votos. Em 2012, ao término do segundo mandato e eleito para o terceiro, o vereador representa a principal força política reconhecida nas áreas centrais da Brasilândia e Freguesia do Ó, reforçando a característica de voto distrital. Aparentemente sem “concorrência” expressiva171, a não ser pela candidatura também eleita do vereador co- ronel Telhada (PSDB), que oriundo da região da Freguesia do Ó, além de colega de partido, tem característica de voto menos regionalizado e menor presença entre moradores da região, segundo nossa análise.172

A característica de voto distrital na candidatura do vereador Claudinho está ex- pressa na distribuição apurada para o vereador: de seus 37 mil votos, 15 mil, – aproxima- damente – se deve ao distrito da Brasilândia e pouco mais de nove mil ao da Freguesia do Ó. O restante distribui-se entre os bairros do Limão, Pirituba e Nova Cachoeirinha, todos na região. Nesse caso, segundo conversas informais, durante as visitas à região, muito mais como decorrência da identificação da pessoa do candidato, há anos em campanha na região, do que de uma atuação partidária de base.

Esse comportamento quanto ao voto associado à pessoa do candidato evidencia a relativa “vitória” do modo personalista de fazer política em relação aos movimentos sociais 169 Juscelino Cardoso de Sá (PSDB), tratado por Celino, nasceu em Terra Rica (PR), em 02/12/55. Aos quatro anos de idade mudou-se com sua família para o Bairro de Vila Brasilândia, no Município de São Paulo, onde cresceu e se estabilizou como comerciante, empresário e político.

170 O deputado inicia carreira política na região, eleito em 1988 para a Câmara Municipal pelo PTB, migrando mais tarde para o PST (Partido Social Trabalhista) e posteriormente para o PSDB, sob essa legenda foi eleito em 1994 para Assembleia Legislativa.

171 Embora o Partido dos Trabalhadores – PT tenha elegido no último pleito municipal (2012) o vereador José Américo, com forte representação na Zona Norte, ele não foi citado por nenhum dos entrevistados para esta tese.

172 O coronel Telhada obteve mais de 87 mil votos, desses cerca de 30 mil se distribuem na zona Norte, como um todo, o restante deve-se às demais áreas da capital. Sobre isso: <www.freguesianews.org.br> .

de origem. E nesse sentido, corrobora a citada ausência de atuação por parte do PSDB, parti- do do citado vereador, na comunidade. Mas, são determinadas práticas associadas à campa- nha eleitoral que melhor expressam essa ausência. Trata-se da contratação de cabo eleitoral residente no próprio território, remunerado pelo candidato, com o objetivo de manter seu nome e presença vivos no local. Esse comportamento, comum em outras regiões da periferia da capital, é igualmente identificado na Brasilândia, segundo matéria jornalística.

Eles não escolhem partido político [em referência aos atuais cabos eleitorais da pe- riferia]. Podem ser filiados ou não. A cada dois anos, aproveitam a campanha para ganhar um dinheiro extra como cabos eleitorais.” (...) ‘todo vereador vai atrás de uma liderança, porque senão ele não entra na comunidade’, diz Chico Loco. ‘Con- trato aquelas mulheres que fazem bandeirada. Se não é uma pessoa como eu, que não tem medo de entrar na comunidade, não teria isso na rua hoje.’ (O ESTADO DE S. PAULO, 09/09/2012) 173.

Diverso vem se tornando o modo de fazer política na região, sem a expressão de ideais e princípios políticos-ideológicos, e suas evidentes perdas acarretadas à organização e mobilização comunitária. Além disso, práticas como as destacadas no parágrafo anterior devem contribuir para explicar a ausência na agenda política das demandas relacionadas às carências extremas referidas a áreas específicas, como é o caso do Jardim Paraná, ocupação irregular, de extrema precariedade na Serra da Cantareira, contígua à Vista Alegre.

Do mesmo modo, em análise breve acerca do perfil de atuação do vereador Clau- dinho, para esta tese, pode-se dizer que este não desconsidera as questões coletivas, rela- cionadas às melhorias urbanas na região. Mas essas questões, não chegam a responder, em específico, às urgências dos mais vulneráveis, muito distantes socialmente desse contexto. Essas carências extremas, narradas no capítulo anterior, apesar de comprovadas pela reali- dade local parecem não encontrar expressão significativa na agenda formulada pela política

173 O despachante Geraldo Barreto, conhecido como Chico Loco na Associação de moradores do Jardim Paraná, na Serra da Cantareira, segundo matéria jornalística cobra entre 3 e 5 mil mensais para coordenar as equipes locais. Filiou-se ao PSC, por influência do ex-vereador Hanna Garib – acusado de envolvimento com a “máfia dos fiscais”, em 1998. Nas eleições passadas Chico Loco trabalhou para o vereador do Juscelino Gadelha (PSB); Naomi Nonato (PSB) e Nelo Rodolfo (PMDB). Sobre isso ver: Cabos eleitorais cobram R$ 200 mil para abrir as portas de comunidades. Jornal O Estado de São Paulo. Caderno Eleições 2012. 09/09/2012;p. 2.

institucional174. Essa agenda se volta às áreas centrais da região ou a suas demandas coletivas mais gerais, como a extensão da Linha 6 do Metrô; a ampliação de linhas de transporte co- letivo, a abertura de avenidas de fundo de vale entre outras175. Essas reivindicações são fun- damentais às necessidades do conjunto da Brasilândia, mas em nenhum momento constaram das demandas e necessidade expressas pelas famílias entrevistadas, como provável efeito da segregação característica dessa área hiperperiférica e de sua relação com a pobreza extrema. Desse modo, as necessidades associadas à extrema pobreza parecem ser tratadas menos como demandas formuladas, sendo colocadas, ora na expressão de denúncias, ora como ações públicas emergenciais. No caso das denúncias isso fica demonstrado pelas ma- térias e depoimentos da rádio comunitária do local – Rádio Cantareira, das publicações da Associação Cantareira176 e, em menor medida, nos conteúdos do jornal de bairro, Freguesia News. No caso das ações de emergência, essas ficam restritas às ações da Defesa Civil, com forte atuação de moradores da região, e aos setores municipais da habitação e da assistência social. E, de forma praticamente pontual aparecem algumas ações por parte da Subprefeitura da Freguesia do Ó, relacionadas às situações de risco.

As ações emergenciais não conformam necessariamente oportunidades para os segmentos em extrema carência, embora sejam indispensáveis diante da gravidade das situ- ações. Essas oportunidades aparecem, em alguma medida, sugeridas por ações locais pro- movidas por antigas entidades de caráter comunitário oriundas dos movimentos sociais das décadas passadas.

Essas entidades, por meio de um trabalho sistemático e integrado ao cotidiano da comunidade, são buscadas por parcela desses segmentos. Seu alcance não corresponde, evidentemente, à magnitude das privações, que são diversas e sobrepostas, mas há indícios 174 Entre os projetos de lei votados pelo vereador Claudinho, no último mandato concluído, além de mudanças em nomes de ruas e praças, merecem destaque as lutas pela extensão do metrô Linha 6 à Brasilândia. Ao lado, ainda, da especificação no Plano Diretor do município de área urbana, próxima à Serra da Cantareira, na extrema periferia da Brasilândia, como Zona especial de interesse social – ZEIS. Sobre isso ver: <www. camara.sp.gov.br/atividade legislativa/projetos>

175 Sobre isso ver: <www.freguesianews.org.br>.

176 Essas organizações serão abordadas ainda nesse capitulo. Trata-se de denúncias como áreas em risco de desmoronamento; descarte de lixo por parte de empresas de coleta em áreas da serra da Cantareira; falta de vagas em creches, ausência de coleta de lixo urbano; entre outros.

nesta tese de que as entidades de origem local, constituídas coletivamente e geridas por lide- ranças comunitárias, viabilizam respostas substantivas às demandas intangíveis e – de forma compreensível – modestamente, à parcela das tangíveis. Na forma de relacionamentos e aten- dimentos materialmente insuficientes, mas que não desconhecem as condições intangíveis do sujeito em privação, bem como suas possibilidades e limitações, conforme tratado ao término deste capítulo e retomado no próximo.

Assim, o detalhamento que segue refere-se ao esforço deste capítulo, na reconsti- tuição da trajetória das forças políticas e sociais e na apuração das atuais formas de organiza- ção e expressão coletiva. As experiências e conteúdos encontrados sugerem pouca aderência às demandas características da pobreza extrema, levando a crer que a periferia da Brasilândia conta com algumas forças sociais com relativa organização, voltadas aos interesses coletivos, mas fragmentadas. E, sobretudo, com poucas possibilidades de atuação sistemática e profí- cua diante da intensidade das carências e privações, típicas da hiperperiferia.

Nesse sentido, essas necessidades extremas parecem não ter representação no campo da política institucional, que vem sendo praticada no território. Assim, restariam as organizações gestadas na própria comunidade e seus atendimentos de caráter quase emer- gencial, praticados como assistência básica, mas sugerindo o apoio e estímulo aos eventuais esforços por alguma emancipação aos sujeitos atendidos.

4.2 A política institucional no território: limites e possibilidades às forças locais Desde a origem do bairro, tinha-se, de um lado, a militância partidária de esquerda, orientan- do sua atuação pela relação de proximidade com as lideranças locais, inserindo-se no coti- diano do bairro e dialogando com as possibilidades de seus sujeitos. De outro, a presença de forças políticas institucionais, tradicionalmente à direita, hegemônicas na Câmara Municipal e no governo, identificadas como tal por parcela das lideranças locais atuantes na época e, facilmente distinguidas da militância partidária atuante na região.

Dos vereadores nunca tivemos ajuda! [em referência ao conjunto da Câmara Mu- nicipal] Os que ajudaram – e foi na organização dos trabalhos, lá atrás, no início... – foram: o Nivaldo Santana (PC do B) José Laurindo (PC do B), Henrique Pacheco (PC do B), a Tereza Lajolo, a Aldaíza Sposate (PT). Foi no apoio [trazendo] com

advogado para legalizar terrenos, as obras [moradias autoconstruídas] ...e no aces- so à prefeitura. Eram apoios políticos, mas, era mais do que isso [reforça a entre- vista]: a “Tereza (Lajolo) era uma amiga, não era uma política, tinha proximidade e confiança nas relações” (Dona Zita, liderança).

O sentimento de confiança no apoio político recebido, destacado pela entrevis- tada, contribuía definindo condições à formação pessoal e política das lideranças locais. De modo a que se tornassem os principais responsáveis pelas negociações com o poder público, conforme o resgate do diálogo abaixo, rememorado por nossa entrevistada.

Ele [em referência ao vereador Henrique Pacheco] falava para mim: você, é que vai apresentar as reivindicações ao prefeito (na época, Reinaldo de Barros). Eu falava pra ele – eu não sei falar. E ele falava: sabe sim, você tá falando! Vamos treinar, fala para mim. E eu falava. E ele: espera aí, você vai falar tudo o que precisar, mas chamando o prefeito de ‘vossa excelência’. [nossa entrevistada]: E pra eu conse- guir?! Foi um esforço muito grande, no começo, mas eu fui! (Dona Zita, liderança) Além da formação política, associada à forma de atuação, a qual as lideranças eram levadas a desenvolver, ocorria que as necessidades e privações eram formuladas e apresentadas coletivamente como demandas. A importância em constituir demandas sociais evidentemente varia segundo a força política alcançada, portanto sem garantias de sucesso. Mas há nesse mecanismo certa capacidade em conferir reconhecimento/relevância às tais carências explicitadas. Mas há, sobretudo, a oportunidade de exercício da condição de sujeito para aqueles que as formulam e as apresentam. Nesse sentido, talvez criando condições propícias à chamada internalização [do conceito] de direitos por parte desses sujeitos, conforme tratado no primeiro capítulo, em referência a Bobbio (2000).

Por outro lado, a despeito da organização e mobilização popular, as regras da política institucional nacional e municipal, na época, impunham-se limitando as represen- tações alinhadas às demandas populares. Prefeitos indicados durante todo o período militar estendiam sua influência política aos diferentes distritos da cidade, garantindo aliados locais, em especial por meio das representações na Câmara dos Vereadores. No caso, da Brasilân- dia – região contígua ao distrito periférico da Freguesia do Ó, essas representações, ao que sugerem as informações, seguiam as conveniências da administração pública, seus pactos de

interesse, definindo o caráter da expansão desordenada das periferias, destacadas no primeiro capítulo.

Vale lembrar que o Partido da Arena mantinha a hegemonia na Câmara Munici- pal entre os anos 1960 e 1970 e que não havia pauta política favorável aos interesses popula- res177. Em novembro de 1979, o Congresso Nacional sanciona medida institucional consoante

ao movimento de distensão autoritária nacional, pondo fim ao bipartidarismo. Os vereadores da Arena migram para o PDS e os do MDP ao PMDB, mas a composição da Câmara para os eleitos em novembro de 1982 segue, como tal, até dezembro de 1988, configurando um único mandato.

A prevalência das forças à direita impõe-se também nos resultados do primeiro pleito eleitoral – em novembro 1985 – tendo sido eleito prefeito Jânio Quadros. Sua gestão acentuaria a política de privilégios contraposta ao abandono das periferias. De um lado, pre- valeciam as grandes obras de engenharia, com gastos excessivos, questionados posteriormen- te e, de outro lado acentuava-se a paralisação de serviços e obras socais na periferia. Como fora o caso das creches, escolas e hospitais, pronto socorro e postos de saúde, totalizando 76 obras sociais interrompidas, conforme balanço da gestão posteriormente eleita178.

Ao executivo municipal, refratário às demandas sociais, somava-se a represen- tação na Câmara não identificada com mandatos populares democraticamente constituídos, mas nem por isso, composta por vereadores ausentes na periferia. Ao contrário, esses verea- dores parecem ter sido bastante atuantes, sob a forma da conhecida política clientelista, como o exemplo abaixo:

A Freguesia sempre foi reduto da direita, principalmente malufista. (...) O Viviani [vereador José Viviani Ferraz] já era conhecido na região. Ele tinha um escritório por aqui (entre a Freguesia e a Brasilândia) e funcionava assim: fazia fila lá fora e as pessoas vinham pedir coisas – Sr. Viviane, eu to com meu aluguel atrasado, ... eu to sem comprar meus remédios; eu to precisando de uma dentadura”. E ele mandava atender. Ele foi o cara que entrou com a promessa de moradia na região. Era gestão Quércia [governo estadual], em 1987. Mas ele não trouxe nenhuma uma casa sequer. (Celio Pires, editor do jornal Freguesia News e morador da região). 177 No período entre os anos de 1969 a 1973, incluindo os suplentes que assumiram o cargo, 20 deles pertenceram

à Arena e 16 ao MDB.

A antiga política clientelista de fácil visibilidade, com resultados imediatos no plano individual foi garantia de projeção e popularidade do vereador acima citado. Forte- mente apoiado pelo voto de característica distrital, o vereador manteve sua influência se reelegendo, em 1994, com cerca de 10 mil votos na região. As práticas clientelistas acima citadas eram, ainda, facilitadas pelo controle do então vereador sobre a Administração Re- gional – AR da Freguesia do Ó, antes mesmo de sua eleição à Câmara179. E suficientes para manter sua presença na câmara no início dos anos 2000, com novamente cerca de 10 mil votos, predominantemente obtidos na região. Em matéria à época no jornal Folha de São Paulo, quanto às prioridades de mandato dos recém- eleitos, não havia nenhuma destacada pelo vereador Viviane Ferraz180. Mas, há herança política repassada a seu filho, José Viviane Ferraz Jr, em campanha na região.

Nesse sentido nota-se que, mesmo diante das condições favoráveis à participação coletiva e, em específico, à região, constituídas na gestão anterior – Luiza Erundina (1989- 1992) – essas não teriam sido suficientes para desacreditar as práticas clientelistas. Nesse