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5. PROPOSTA DE ORÇAMENTO-PARTICIPATIVO PARA A UFPE

5.1 Contexto da Proposta

5.1.1 A UFPE e a Reforma Gerencial

O governo do Presidente Fernando Henrique Cardoso promoveu uma reforma no aparelho de Estado, denominada de “Reforma Gerencial” cujos argumentos, de acordo com os seus mentores, em especial o então Ministro de Administração e Reforma do Estado, Luiz Carlos Bresser Pereira84, assim comentou:

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PERREIRA, Luiz Carlos Bresser. A Reforma do Estado e Administração Gerencial. Org. Luiz Carlos Bresser Pereira e Peter SpinK. Rio de Janeiro. Editora da Fundação Getúlio Vargas. 1997. p. 237-239.

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A reforma da administração pública que o governo Fernando Henrique Cardoso vem propondo desde 1995 poderá ser conhecida no futuro como a segunda reforma administrativa do Brasil. Ou a terceira, se considerarmos que a reforma de 1967 merece este nome, apesar de ter sido, afinal revertida. A primeira reforma foi a burocrática de 1936. A reforma de 1967 foi um ensaio de descentralização e de desburocratização. A atual reforma apóia-se na proposta de administração pública gerencial, como uma resposta à grande crise dos anos 80 e à globalização da economia - dois fenômenos que estão impondo, em todo mundo, a redefinição das funções do Estado e de sua burocracia.

A crise do Estado implicou a necessidade de reformá-lo para reconstruí-lo; a globalização tornou imperativa a tarefa de redefinir suas funções. Antes da integração mundial dos mercados e dos sistemas produtivos, os Estados podiam ter como um dos seus objetivos fundamentais proteger as respectivas economias da competição internacional. Depois da globalização, as possibilidades do Estado de continuar a exercer esse papel diminuíram muito. Seu novo papel é o de facilitar que a economia nacional se torne internacionalmente competitiva. A regulação e a intervenção continuam necessárias na educação, na saúde, na cultura, no desenvolvimento tecnológico, nos investimentos em infra-estrutura - uma intervenção que não compense os desequilíbrios distributivos provocados pelos mercados globalizados, mas principalmente que capacite os agentes econômicos a competir em nível mundial85.(Grifo nosso)

A reforma gerencial defendida pelo então governo considerou dois objetivos básicos para justificar sua implantação. O primeiro, por imposição externa, principalmente dos organismos de financiamento, concentrando-se no ajuste fiscal dos Estados e Municípios que segundo o próprio governo, padecia de um problema grave: “excesso de quadros”; e a médio prazo, tornar mais eficiente e moderna a administração pública, voltando-a para o atendimento dos cidadãos, como confirma PEREIRA86:

O ajuste fiscal será realizado principalmente através da exoneração de funcionários, por excesso de quadros; da definição clara do teto remuneratório dos servidores e da modificação do sistema de aposentadorias, aumentado-se o tempo de serviço exigido e a idade mínima para aposentadoria, exigindo-se tempo mínimo de exercício de serviço público e tornando o valor da aposentadoria proporcional à contribuição. As três medidas exigirão mudança constitucional. A primeira será aplicada apenas nos estados e municípios, já que na União não existe excesso de quadros. A segunda e a terceira, na União.

O segundo objetivo da reforma gerencial seria a modernização ou o aumento da eficiência da administração pública, onde o governo criou - sem até hoje ter implantado por completo - quatro setores:

a) Núcleo Estratégico do Estado responsável pela formulação de toda as políticas públicas, inclusive a definição de leis, devendo o modelo ser seguido por Estados

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Como observou o Fernando Henrique Cardoso (1996-A10): “a globalização mudou o papel do Estado... a ênfase da intervenção governamental [está] agora dirigida quase que exclusivamente para tornar possível às economias nacionais desenvolverem e sustentarem condições estruturais de competitividade em escala global”.

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PERREIRA, Luiz Carlos Bresser. A Reforma do Estado e Administração Gerencial. Org. Luiz Carlos Bresser Pereira e Peter SpinK. Rio de Janeiro. Editora da Fundação Getúlio Vargas. 1997. p. 257.

e Municípios, guardando suas peculiaridades. A composição desse núcleo na União teria a participação:

• Do Presidente da República; • Dos Ministros de Estados;

• Da Cúpula dos ministérios, responsáveis pela definição das políticas públicas;

• Dos Tribunais Federais;

• Do Supremo Tribunal Federal; e • Do Ministério Público.

a) Atividades Exclusivas de Estado definidas como sendo aquelas em que é exercido o “poder do Estado”, basicamente as de legislar e tributar, envolvendo:

• Forças Armadas; • Polícias;

• Órgãos de fiscalização; • Órgãos de regulamentação; e

• Órgãos responsáveis pela transferência de recursos.

b) Os serviços não-exclusivos ou competitivos do Estado, sendo aqueles que embora não envolvam o poder do Estado, são realizados por ele por serem considerados de alta relevância para os direitos humanos, ou por envolverem economias externas, não podendo ser adequadamente recompensados no mercado através da cobrança dos serviços;

c) A produção de bens e serviços para o mercado, definidos como os setores que o Estado produz esses bens e serviços, por considerá-los estratégicos.

No contexto da reforma gerencial, as Universidades são consideradas como integrantes dos serviços não-exclusivos do Estado, a exemplo de hospitais, centros de pesquisa, museus e outras atividades, devendo deixar de participar da administração direta, para se tornarem organizações sociais, fundamentada por PEREIRA87, da seguinte forma:

No capitalismo contemporâneo, as formas de propriedade relevantes não são apenas duas, como geralmente se pensa e como a divisão clássica do direito entre o direito público e o direito privado sugere - , e sim três: a) a propriedade privada, voltada para realização de lucro (empresa) ou de consumo privado (famílias); b) a propriedade pública estatal; e c) a propriedade pública não-estatal. A confusão não

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deriva da divisão bipartite do direito, mas do fato de que, em seguida, o direito público foi confundido ou identificado com o direito estatal, enquanto o direito privado foi entendido como englobando as instituições não-estatais sem fins lucrativos, que, na verdade, são públicas.88

Este fato, embora não tendo sido considerado por muitos uma ameaça para o tipo de universidade pública existente, traz alterações profundas nas suas relações com o Estado e com o público-alvo que atende, pois de acordo com os propósitos da reforma, deveriam deixar de ser gratuitas para receberem pelos serviços prestados, podendo, no máximo, serem subsidiadas, como confirma PEREIRA89:

[...] no setor dos serviços não-exclusivos de Estado, a propriedade deve ser em princípio pública não-estatal. Não cabe ser estatal porque não envolve o uso do poder do Estado. Deve ser pública para justificar os subsídios recebidos do Estado. O fato de ser pública não-estatal, por sua vez, implica a necessidade de a atividade ser controlada de forma mista pelo mercado e Estado. O controle do Estado, entretanto, deve ser necessariamente antecedido e complementado pelo controle social direto, derivado do poder dos conselhos de administração constituídos pela sociedade. E o controle de mercado se materializa na cobrança dos serviços. Dessa forma, a sociedade atesta permanentemente a validade dos serviços prestados, ao mesmo tempo em que se estabelece um sistema de parceria ou co-gestão entre o Estado e a sociedade civil.

[...] A reforma proposta é transformá-lo em um tipo especial de entidade não-estatal - as organizações sociais. A idéia é transformá-los, voluntariamente, em “organizações sociais”, ou seja, em entidades que celebrem um contrato de gestão com o Poder Executivo e contem com autorização do Parlamento para participar do orçamento público. A organização social não é, na verdade, um tipo de entidade pública não-estatal, mas uma qualidade dessas entidades, declarada pelo Estado. (Grifo Nosso)