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A unidade matriz da Karsten S.A no Testo Salto

4. PATRIMÔNIO INDUSTRIAL DE BLUMENAU

4.2 A unidade matriz da Karsten S.A no Testo Salto

Figura 4.38: Imagem atual do espaço do complexo industrial da Karsten S.A. no Testo. Fonte: www.wikimapia.org, 2009. Elaboração: Bielschowsky, 2009.

Com relação à forma de implantação e apropriação estabelecidas no espaço físico onde se implantou e se desenvolveu a unidade fabril da Karsten S.A., podemos tomar como referência as mesmas condições anteriormente citadas, como a cultura trazida pelo imigrante e sua adaptação ao local encontrado, mediante as técnicas disponíveis. Nesse espaço, as diversas quedas de água foram determinantes para o fornecimento de energia desde o início. Estimulados pelo inicio das atividades têxteis na empresa, e por essa possuir também uma fiação, os colonos da região de Testo Salto organizaram uma cooperativa de plantadores de algodão, dando início à cultura com sementes vindas de Pernambuco. Infelizmente as condições desfavoráveis acabaram com essa cultura após quatro anos de tentativas. Houve então uma tentativa de se produzir lã de ovelhas como matéria prima para a empresa, porém, a criação de ovelhas necessitava de grandes pastagens, incompatíveis com o modelo dos lotes ali existentes. Durante a I Guerra Mundial, com a impossibilidade de importação de diversos produtos, a empresa paralisou suas atividades. Porém, como o sítio físico ficava distante 20km da sede da Colônia, as relações de trabalho e de vivência no campo eram bem diferentes das outras localidades que já formavam uma estrutura mais urbana. Aqui, desde o inicio, os operários jamais abandonaram suas terras e suas atividades agrícolas e caseiras porque sempre existiu certa sazonalidade na demanda atendida.

A empresa se implanta no meio rural, em meio à natureza, abrindo caminhos e utilizando somente a natureza como fonte de recursos de sobrevivência e energia, sem nenhum tipo de urbanidade. Na figura anterior é possível verificar a ausência de qualquer tipo de infra-estrutura urbana, como pavimentação, pontes, iluminação pública e energia elétrica.

As técnicas desenvolvidas para obter o melhor proveito dos recursos naturais disponíveis, onde o meio técnico se impõe ao meio natural, foram fundamentais para o crescimento e desenvolvimento da empresa. Na foto de 15/08/1895, à beira do Ribeirão do Testo, empresários, técnicos, comerciantes e operários-colonos se relacionam sem maiores distinções, adaptando a natureza às suas necessidades, de onde também retiravam o sustento agrícola e a pecuário. O corte das árvores servia para a construção das moradias e das edificações indústrias, podendo também servir para esquentar as caldeiras. Além da força animal, contavam com a roda d’água para mover os teares. As edificações eram muito simples, com a mesma tipologia arquitetônica utilizada no Bom Retiro, padrão de uso misto com residencial e produtivo juntos, com a água passando pelo subsolo e fazendo a roda girar, o pavimento do nível térreo em tijolos maciços com a estrutura de travamento em madeira conhecida como enxaimel, o segundo pavimento feito de madeira e a cobertura com bastante inclinação, fornecendo espaço para o sótão. Nessa arquitetura mais simples, não existem as mansardas no telhado e as aberturas não são tão generosas e nem em grande quantidade.

A figura 4.41, de 1929, demonstra o desenvolvimento do núcleo fabril inicial. Ao contrário das demais unidades desse mesmo período, não ocorrem construções de muitos anexos em torno de um edifício principal, com maior imponência. Neste caso, ocorre a construção de diversos edifícios de vários tamanhos, de acordo com a necessidade e a funcionalidade necessária. O núcleo fabril inicial se apresentava inserido junto à natureza de tal forma que a leitura da paisagem local poderia ser feita como se fosse uma “fazenda têxtil”, remetendo às grandes fazendas de produção de café no interior paulista, por exemplo. Mas com algumas diferenças, como em vez do trabalho escravo, o trabalho remunerado como um complemento de renda da produção agrícola dos imigrantes operários-colonos germânicos. Outra característica local na paisagem vai ser a presença da chaminé, que vai servir como elemento simbólico e marco visual para toda a comunidade local. Em 1929 foi construída a Igreja, do outro lado do Ribeirão, porém como demonstra a figura, a importância e a imponência da chaminé definem quem é o “dono do pedaço”.

Figura 4.41: Núcleo fabril em 1929. Fonte: AHJFS. Elaboração: Bielschowsky, 2009.

Com o desenvolvimento da empresa, as tipologias arquitetônicas vão ficando mais sofisticadas e adaptando-se mais a função industrial. Os edifícios tornam-se maiores, com um pé direito mais generoso, maiores aberturas ao longo de toda a fachada e janelas corridas na parte superior ao invés de mansardas, demonstrando as novas técnicas construtivas que visam oferecer maior conforto ambiental ao local de produção, conforme a figura 4.42. A Igreja já aparece finalizada e novas edificações residenciais se localizam ao longo do Vale do Testo.

Figura 4.42: Núcleo fabril na década de 1940. Fonte: AHJFS. Elaboração: Bielschowsky, 2009.

Porém, o destaque maior ocorre na ambientação, visto que o sitio se encontrava num fundo de Vale menos íngreme que os outros, num ambiente mais aberto, mesmo que o relevo fosse um pouco acidentado, o que dava características de um “sítio industrial” localizado em uma grande fazenda, com enormes pastos a sua volta (onde antes havia floresta nativa) e o Ribeirão margeando suas construções. Os acessos e caminhos reforçam essa característica ao longo de todo o Vale do Testo. Com relação à implantação das residências, localizam-se ao longo desses tortuosos caminhos em meio à natureza, tirando o sustento e as forças necessárias para o cotidiano local. A residência da família Karsten se localizava ao lado da empresa, demonstrando maior integração na relação entre a moradia e o ambiente de trabalho, conforme figura 4.42.

A figura 4.43 demonstra um dia de cheia do Ribeirão do Testo, uma constante no Vale em que a empresa se implantou. Porém as edificações eram feitas com desnível em relação à cota da rua, justamente para evitar que essas cheias invadissem o espaço das moradias. Um bom exemplo disso é a nova residência da família Karsten, que agora já se localiza do outro lado do Ribeirão, em uma edificação imponente e mais elevada do nível da rua, ao lado da Igreja, ao invés de permanecer ao lado da indústria. Assim como nas cidades européias medievais, principalmente as germânicas, têm-se a separação entre o Sagrado e o Profano, de um lado a indústria e os executores, e do outro lado, a Igreja e os pensadores.

Figura 4.43: Núcleo fabril na década de 1950. Fonte: AHJFS. Elaboração: Bielschowsky, 2009.

A figura 4.44 demonstra a fachada principal da empresa na década de 1950, com a justaposição de diversos anexos e o aproveitamento do sótão com aberturas na cobertura.

Figura 4.45: Interior da edificação de tecelagem na década de 1960. Fonte: AHJFS.

As figuras anteriores demonstram os espaços interiores das edificações fabris. Na figura 4.45 é possível observar os teares da tecelagem em um espaço amplo, com poucos pilares dispostos uniformemente com o objetivo de não atrapalhar o processo produtivo. Ainda nessa figura é possível observar o detalhe do pilar cilíndrico, que evita grande quantidade de acidentes, pois não tendo pontas, são menores as chances de ocorrerem acidentes de trabalho. É possível ainda observar que existe uma viga de “amarração” das vigas perpendiculares no espaço entre os pilares, reduzindo pela metade o número necessário de pilares que poderiam atrapalhar o processo produtivo. A figura 4.46 demonstra o espaço interno do edifício da tinturaria, com grandes aberturas que facilitam a entrada de ventilação e iluminação natural e ausência de pilares no “chão de fábrica”, facilitando muito o processo produtivo.

A figura 4.47 demonstra as sucessivas ampliações do parque fabril, com seus diversos anexos e a tentativa de se criar um conjunto fabril através de cores, aberturas e das coberturas. Como já havia sido dito anteriormente, a chaminé sempre foi o elemento visual de referência desse espaço para toda a comunidade local. Na década de 1970 foi construída uma nova chaminé, praticamente ao lado a antiga, porém com proporções ainda maiores por necessidade produtiva e para reforçar ainda mais a identidade do lugar.