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O estado atual da unidade matriz da Cia Hering no Vale do Bom Retiro

4. PATRIMÔNIO INDUSTRIAL DE BLUMENAU

5.1 O estado atual da unidade matriz da Cia Hering no Vale do Bom Retiro

O estado atual do espaço urbano-industrial da matriz da Cia. Hering no Vale do Bom Retiro em Blumenau é muito bem definido, com o complexo industrial encravado em meio à Natureza, sem muita relação com as atividades residenciais ou comerciais que se desenvolvem ao longo da Rua Hermann Hering. Se anteriormente havia uma boa integração entre funcionários e os industriais, num primeiro momento em que existia a vila operária e as residências da família Hering implantadas ao lado do complexo industrial, que gerava uma dinâmica urbana maior, atualmente, com a retirada da vila operária desde os anos 1970 e da própria família de suas residências-jardins, que hoje são utilizadas como pontos comerciais e de prestação de serviços, o espaço permanece muito atrativo, porém, sem maiores relações interpessoais devido à falta de atividades sociais cotidianas.

A Rua Hermann Hering foi ocupada pelas residências-jardins inicialmente, a maioria delas pelos familiares dos empresários, que com o passar do tempo já não atendiam mais às necessidades funcionais das famílias e passaram a ser alugadas ou vendidas para estabelecimentos comerciais, de prestação de serviços e institucionais. A partir da década de 1980, com a construção de um edifício residencial de cerca de quinze pavimentos, alterou significativamente a característica do conjunto urbano-residencial de grande valor arquitetônico e urbanístico. Atualmente a rua encontra-se em processo de perda de identidade e de alteração significativa na paisagem e na ambientação desse espaço tão importante, decaindo também vertiginosamente a qualidade das novas intervenções.

Figura 5.9: Implantação do complexo industrial na Rua Hermann Hering. Fonte: Hans Broos S. C. Ltda, 1980.

A figura demonstra a atual implantação do complexo industrial no Vale do Bom Retiro, que pode ser separado em três grandes setores: a fiação, a malharia e o setor administrativo. O setor da fiação, atualmente alugado para outra empresa, é o marco de chegada do complexo industrial, com o antigo edifício da fiação preservado.

Figura 5.11: Imagens dos demais edifícios da fiação na Rua Hermann Hering. Fonte: Bielschowsky, 2009.

Fazendo um percurso pela Rua Hermann Hering, é possível perceber as diferenças entre as técnicas construtivas das edificações e as diversas ambientações que podem ser encontradas no local. Na seqüência do edifício histórico da fiação, podem se encontrar os demais edifícios da fiação, com as características já descritas anteriormente. Pelo lado externo é possível perceber a diferença de nível do terreno, que vai ser vencida facilmente com o edifício da malharia, que terá a entrada principal no nível térreo e a entrada de serviço, que anteriormente chegava o fio da fiação própria no mesmo nível, no nível do subsolo. Com relação ao edifício da malharia, é possível notar algumas modificações, como nas aberturas que anteriormente tinha aspecto de um rasgo aberto, fazendo a brincadeira do cheios e vazios que dava também maior horizontalidade ao edifício e atualmente se encontram fechadas com vidro. O recuo do edifício da malharia em relação à Rua Hermann Hering permite ter a perspectiva ampliada, sendo possível avistar o edifício histórico.

Figura 5.13: Imagem dos setores da malharia e da fiação na Rua Hermann Hering. Fonte: Bielschowsky, 2009.

Ao final do percurso fiação-malharia chega-se à área de estacionamento do complexo fabril, onde é possível ter a sensação de alargamento, pois não existe nenhuma edificação neste espaço, apenas uma loja que vende os produtos das marcas produzidas pela empresa. Esse espaço não deixa de ser um eixo articulador, onde de uma lado têm-se a perspectiva do conjunto fiação-malharia localizado no Vale do Bom Retiro (figura 5.13), do outro lado fica a loja da empresa (figura 5.14) e encravado no final do Vale têm-se a perspectiva do atual setor administrativo, que foi o núcleo inicial de implantação da empresa (figura 5.15).

Figura 5.15: Imagem do atual setor administrativo da Cia.Hering. Fonte: Bielschowsky, 2009.

Esse eixo articulador define um novo eixo em direção ao setor administrativo. O edifício com o terraço-jardim na cobertura faz a marcação desse eixo e define também as entradas, de um lado os pedestres e do outro os veículos. Esse eixo é reforçado pelo entorno, de um lado as edificações preservadas e do outro a Natureza, que ajudam a configurar a perspectiva em direção aos edifícios mais importantes do complexo fabril. Lado a lado, o edifício fabril mais antigo do complexo industrial preservado e o novo edifício administrativo.

Figura 5.17: Imagens da antiga entrada no final da Rua Hermann Hering. Fonte: Bielschowsky, 2009.

A antiga entrada do complexo fabril, que era o final da Rua Hermann Hering, conserva as edificações do antigo refeitório e as primeiras edificações residenciais da família Hering preservadas, porém conforme demonstra a figura 5.17, essa entrada não é mais utilizada. A entrada de pedestres (figura 5.18) nessa parte do complexo industrial é feita em uma das laterais do edifício da portaria e atual refeitório, embaixo do terraço-jardim, ao lado de onde foi canalizado o Ribeirão, que ficava no espaço do gramado. O caminho é interessante, porém as antigas edificações perderam, em parte, o sentido, pois agora estão de costas à passagem das pessoas, que visualizam a parte posterior e não a fachada frontal das edificações preservadas, que fazem a relação das edificações com a antiga rua principal. Vale lembrar que a partir desse ponto, somente funcionários e pessoas convidadas têm acesso a esta parte do complexo industrial, o que é uma grande perda para o conjunto urbano-industrial da cidade, pois o ideal seria que as pessoas tivessem acesso para conhecer e se apropriar de alguns desses espaços cheios de significados e de muitas referências históricas.

Figura 5.19: Imagens da praça social. Fonte: Bielschowsky, 2009.

Prosseguindo pelo acesso de pedestres, o funcionário ou o visitante chega à praça social, que no projeto original é o ponto de maior importância, pois remete à água do Ribeirão do Bom Retiro, fator decisivo na escolha do local para a implantação da empresa, exatamente onde passava o ribeirão. Além da água, apenas uma cobertura vazada e translúcida faz a conexão entre o novo edifício com o terraço-jardim na cobertura e a primeira edificação da família Hering preservada, com total permeabilidade desse espaço. Ao final da perspectiva é possível avistar o edifício industrial mais antigo do complexo fabril preservado, que é o da antiga costura (1897). Em cima do terraço-jardim as perspectivas são muito interessantes, para um lado o Vale do Bom Retiro e o edifício do antigo refeitório preservado e para o outro lado o atual edifício administrativo e o edifício da antiga costura preservado. O mais interessante do projeto paisagístico de Burle Marx para o terraço-jardim é que a vegetação vai alterando sua coloração constantemente ao longo do ano, com as diversas cores combinando com as diferentes temperaturas.

Figura 5.21: Imagens das laterais do edifício administrativo. Fonte: Bielschowsky, 2009.

O edifico do atual setor administrativo projetado por Broos merece maior atenção, pois além de sua implantação marcar e definir a organização o espaço, sua localização e a relação com o entorno é privilegiada. De um lado a Natureza do ambiente natural, que é reforçada pelo paisagismo criado pelo homem na cobertura do edifício com o terraço-jardim que define o novo eixo principal deste núcleo, e do outro lado a valorização da edificação histórica para a elaboração de uma ambientação cultural privilegiada (figura 5.21). O final da Rua Hermann Hering, já dentro do complexo fabril, perde seu sentido de via funcional para a passagem de veículos e ganha ares de passeio, emoldurado pela presença física das edificações do antigo refeitório, das antigas residências dos empresários e da antiga costura, todas preservadas.

Figura 5.23: Imagens do edifício preservado da antiga costura. Fonte: Bielschowsky, 2009.

As paisagens existentes neste espaço são muito interessantes, confirmando assim a qualidade das intervenções ocorridas na década de 1970. Mesmo que os funcionários não saibam explicar direito o significado de cada uma dessas intervenções e das perspectivas e vistas privilegiadas pela proposta urbano-arquitetônica-paisagística, constata-se o interesse de cada funcionário em saber mais sobre a história desse espaço. Com a permanência de diversos signos e elementos simbólicos, é possível fazer a reconstituição histórica do local, o que para os funcionários mais antigos torna-se uma viagem no tempo, cheio de nostalgia sobre um passado que parece ainda estar presente em cada um desses elementos preservados e valorizados pelo projeto. A presença desses elementos que despertam as vivências do passado, servem como elementos estruturadores das memórias coletivas, contribuindo assim para a fixação da identidade do lugar e de toda uma coletividade.