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A UTILIZAÇÃO DA MÉDIA APARADA COM DISTRIBUIÇÕES ASSIMÉTRICAS E

No documento Textos de política e situação económica (páginas 83-85)

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4. A UTILIZAÇÃO DA MÉDIA APARADA COM DISTRIBUIÇÕES ASSIMÉTRICAS E

ACHATADAS

Como se disse na secção 2, o uso da média apa- rada surge justificado no contexto das distribui- ções achatadas e simétricas por ser um estimador mais eficiente da média da população.

A ideia base é a de que as variações de preços, em cada mês, correspondem a uma amostra da po- pulação das variações de preços com distribuição

Gráfico 2 PERCENTIL DA MÉDIA 25 30 35 40 45 50 55 60 65 70 75 1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000 β βm

desconhecida. A tendência da inflação é vista como correspondendo à média populacional (tam- bém desconhecida) desta distribuição e que por- tanto pode ser estimada de forma mais eficiente através da média aparada. Todavia, dado que a distribuição é leptocúrtica, a inflação observada (a média amostral) é um estimador centrado mas re- lativamente pouco eficiente da tendência da infla- ção (a média da população), o que justifica o uso de médias aparadas como estimadores da média da população.

Além da média aparada, tem também sido su- gerida na literatura a utilização de medianas (pon- deradas) como indicadores de tendência da infla- ção (Bryan and Checcetti (1994) e Checcetti (1997)). Quando a distribuição é simétrica pode ser justifi- cável o uso da mediana (ou mesmo da moda) com esta finalidade. Tal deve-se ao facto de a inflação registada — a variável de interesse — correspon- der à média amostral da distribuição das variações de preços. Todavia, quando a distribuição é assi- métrica a média não se confunde com a mediana

ou a moda(3), e portanto, para se obter um indica-

dor que verifique a condição (5) da secção (2), isto é, que seja um estimador centrado da tendência da inflação, temos de utilizar um estimador centrado da média da distribuição da variação de preços.

Esta conclusão sugere que a utilização de médi- as aparadas pode ser adequada, mesmo quando a distribuição das variações de preços é assimétrica. Todavia, parece óbvio que a média aparada deve ser calculada de forma a ser um estimador centra- do da média populacional. Aliás, esta condição ajuda a responder à questão de saber se numa dis- tribuição assimétrica positiva (por exemplo) se deve “aparar” mais a aba direita ou a aba esquer- da da distribuição.

A resposta a esta questão depende da impor- tância relativa que for atribuída ao enviesamento e à variância do estimador. Se se procurar minimi- zar a variância dum estimador, deve-se “aparar” mais do lado direito. De facto, numa distribuição assimétrica positiva as amostras com elevadas va- riações de preços tendem a surgir mais do lado di- reito da distribuição e, portanto, a minimização da variância do estimador resultante obrigaria a

“aparar” mais do lado direito. Todavia é fácil de antecipar o que sucede à média aparada se se “aparar” mais do lado direito da distribuição. Qu- ando a distribuição é assimétrica positiva verifi- ca-se que, por exemplo, as 10 por cento maiores variações de preços têm um contributo maior para a inflação do que as 10 por cento menores varia- ções de preços. Isto significa que se se “aparar” mais do lado direito, a média aparada resultante tenderá a exibir um desvio sistemático em relação à média da distribuição, ou seja, a média aparada será, em média, inferior à inflação observada, e portanto, a condição (5) da secção (2) não será ve-

rificada, isto é, ter-se-á E u

[ ]

t ¹ 0. Assim, e esta

constitui a outra resposta à pergunta formulada, no caso de uma distribuição assimétrica positiva, se se pretender obter um estimador que não divir- ja de forma sistemática da taxa de inflação obser- vada, teremos forçosamente que “aparar” menos do lado direito da distribuição.

No gráfico 3 apresenta-se a média aparada si- métrica a 10 por cento que tem vindo a ser calcula- da pelo Banco de Portugal. Por uma questão de harmonização será designada por TM(50,10) (abre- viatura de “trimmed mean”, a 10 por cento, em tor- no do percentil 50). O seu valor é obtido “aparan- do” 10 por cento das variações de preços em cada aba da distribuição. Como se pode verificar a série TM(50,10) apresenta um nível médio inferior ao da inflação ao longo do período amostral, reflectido no facto de a média aparada estar na maior parte do tempo abaixo da taxa de inflação. Esta caracte- rística da média aparada retira-lhe naturalmente interesse enquanto indicador de tendência, pois a série é incapaz de estabelecer o nível correcto da própria tendência da inflação. Por outras palavras a variável TM(50,10) não verifica a condição (5) da secção 2, como aliás se mostrou em Marques et

al.(1999). Tal reduz claramente a utilidade de

TM(50,10) como indicador da tendência da infla- ção. Todavia, neste momento é clara a explicação para este resultado. A média aparada (centrada) a 10 por cento subestima com carácter sistemático a taxa de inflação porque “apara” demais no lado direito da distribuição (ou se se quiser “apara” de menos no lado esquerdo).

Em termos práticos, põe-se a questão de como encontrar uma média aparada assimétrica que não seja sistematicamente enviesada face à inflação.

Banco de Portugal / Boletim económico / Setembro 2000 93

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(3) Por exemplo, numa distribuição assimétrica positiva temos em geral a desigualdade: moda< mediana < média.

Sob a hipótese simples (mas realista, no caso por- tuguês) de que o grau de assimetria e achatamento são constantes ao longo do tempo, existe uma for- ma relativamente fácil de encontrar uma média aparada que não apresente um desvio médio siste- mático relativamente à taxa de inflação. Esta forma pode traduzir-se na seguinte regra:

i) Para um dado nível de “aparamento” calcu- lar a média aparada centrada em diferentes percentis da distribuição começando no per- centil 50 e tomando valores sucessivamente maiores (no caso de uma distribuição assi- métrica positiva);

ii) Parar no percentil tal que a média aparada resultante não divirja de forma sistemática da taxa de inflação, ou seja, tal que no pe-

ríodo amostral se tenha

(

pt pt

)

T

- =

å

* 0

1

ondept*representa a média aparada.

A condição i) desta regra diz simplesmente que se a distribuição for assimétrica positiva não vale a pena calcular médias aparadas à esquerda do per- centil 50, pois nunca será possível obter uma mé- dia aparada a verificar a condição de não enviesa- mento sistemático. A condição ii), por sua vez, es- tabelece o limite superior do intervalo de pesquisa relevante para um dado nível de “aparamento”, dado que as médias aparadas, em torno de percen- tis superiores, apresentam um valor médio supe- rior.

Para o caso português, aplicando esta regra para a média parada a 5 por cento verificou-se a condição ii) para o percentil 51. Note-se que a mé- dia aparada, neste caso, corresponde a tomar 90 por cento das variações de preços centradas neste percentil, ou seja, na prática corresponde à média aparada que se obtém “aparando” 4 por cento no lado direito da distribuição e 6 por cento no lado esquerdo.

Poderia pensar-se que a solução obtida para a média aparada a 5 por cento (percentil 51) seria também a solução óptima para o caso de uma mé- dia aparada a 10, 15 ou 25 por cento, mas tal não é verdade. De facto, nas distribuições assimétricas, a simples alteração da percentagem de “aparamen- to” para o cálculo da média aparada altera tam- bém o valor médio da própria média aparada. O gráfico 4 apresenta as médias aparadas a 10 e a 25 por cento centradas no percentil 52. Como se pode ver, a consequência do aumento do grau de “apa- ramento” é, basicamente, uma alteração do valor esperado da média aparada, que se desloca para baixo, quando aumenta a percentagem de “apara- mento”.

A explicação para este fenómeno é muito sim- ples. Quando se aumenta a percentagem a aparar altera-se a relação existente entre as proporções ex- cluídas à direita e à esquerda. Por exemplo, quan- do se passa da média aparada a 10 por cento para a média aparada a 25 por cento significa que se passa a “aparar” mais quinze por cento de cada lado da distribuição. Mas, dada a assimetria positi- va da distribuição, os quinze por cento excluídos à

Gráfico 3

TAXA DE INFLAÇÃO (INF) E MÉDIA APARADA

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