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3.4 A criação e a ampliação lexical na LIBRAS

4.1.10 A validação dos sinais

Um dia após o segundo encontro, foi pedido aos alunos que repassassem aos demais colegas os sinais criados durante as duas aulas com o professor. PR reuniu os alunos na sala de recursos, escreveu os termos no quadro, pegou o material concreto utilizado no experimento e começou a mostrar uma das esferas de isopor, associando ao sinal ÁTOMO. PA

explica aos colegas que o sinal utilizado anteriormente não era adequado, pois indicava apenas o núcleo do átomo.

O sinal MOLÉCULA gerou, entretanto, uma discussão em que uma das alunas

questionou a configuração de mão usada por PR. Ela não percebeu de imediato que os três dedos (indicador, médio e anular) indicavam a CM «M» e entendeu como CM «W». Depois

se deu por convencida pelas explicações de PR que associou a forma em LIBRAS à do

português. A discussão deixou a dúvida de que esse seria o melhor sinal para representar

molécula. Os dois sinais registrados, o da intérprete C e o dos alunos, passaram por processos semelhantes de formação: (i) duas mãos envolvidas, uma passiva e outra ativa; (ii) a configuração da mão ativa correspondente à primeira letra da palavra em português. No sinal realizado pela intérprete, a configuração da mão passiva faz alusão ao núcleo do átomo; no sinal criado pelo aluno, a referência são as ligações químicas entre átomos. Um dado interessante surgiu durante a pesquisa: na língua de sinais americana (ASL), a forma do sinal

ÁTOMO é muito próxima à forma criada pelos alunos em Libras. O sinal MOLÉCULA é derivado

do sinal ÁTOMO e parecido com o utilizado pela intérprete C:

Exemplo 17

Fonte: American Sign Language for Biology.

Disponível em: <http://www.needsoutreach.org/Pages/sign.html>

Ficou decidido no grupo que as ligações químicas seriam representadas de duas formas: um sinal específico LIGAÇÃO (aproveitando o que existe na LIBRAS) e o classificador com CM mão a depender do átomo. O contexto determina a utilização de um ou de outro. Durante todo o experimento, quando alunos ou professor falavam genericamente sobre as ligações químicas, o sinal era LIGAÇÃO, mas quando se referiam às ligações de um átomo, os classificadores apareciam. Exemplo:

Exemplo 18

Exemplo 19

LIGAÇÃO

O sinal BIOQUÍMICA foi criado fora do experimento e trazido para o grupo;

seguindo a regra de composição: BIOLOGIA e QUÍMICA:

O sinal PROTEÍNA sofreu uma alteração proposta pelo grupo. Como a sua origem

foi explicada pela etimologia (‘proto’ = primeiro), os alunos pediram para trocar a configuração da mão de apoio (mão passiva) «G1» para «Å», utilizada no sinal PRIMEIRO já existente na LIBRAS.

Nova polêmica aconteceu com o sinal RADICAL. Uma das alunas estranhou a

configuração «L» da mão ativa. Para ela, o sinal deveria ser «R», já que, no seu entendimento, se tratava de um novo empréstimo. A motivação, porém, não era essa, mas a idéia trazida pelo sinal VAZIO. A discussão delongou-se até que uma outra aluna sugeriu a troca de configuração

da mão de apoio. Em lugar de CM «G1» (com referência à ligação em aberto ), a CM «R» seria a mais apropriada. A mão ativa poderia permanecer a mesma. Uma terceira aluna reforça que a expressão facial é um parâmetro forte no indicativo a VAZIO e não pode ser esquecida.

Houve uma preocupação por parte dos alunos PR e PA em transmitir o conhecimento a respeito da proteína queratina, a fim de que o grupo criasse um sinal. As explicações foram dadas analogamente às fornecidas pelo professor durante as aulas. PR disse ao grupo que não havia conseguido criar um sinal com PA. O grupo apresenta uma proposta baseada na função de proteger as células da pele dos raios de sol. O sinal criado usou a CM «G», orientada para baixo (letra Q do alfabeto em Libras):

Seguindo o exemplo prático do professor ao demonstrar a função da insulina em permitir a entrada do açúcar nas células, os alunos criam também em conjunto um sinal que não surgiu durante o experimento. Levados pela idéia da responsabilidade de transporte, eles fazem o sinal com CM direita «I», mão esquerda ativa segura o dedo mínimo da mão direita e leva à frente:

Esse sinal, entretanto, não parece adequado, pois a insulina34 é um tipo de proteína secretada pelo pâncreas que é responsável pela diminuição da glicose no sangue, facilitando a sua entrada nas células. A insulina não é transportada como sugere o sinal.

34 Em UCKO (1992, p. 463) a insulina é definida como um hormônio produzido e secretado pelo pâncreas. Sua

produção é controlada pelo nível de glicose no sangue. Sua função é reduzir a quantidade glicose, aumentado sua entrada nas células. É chamada também de “fator hipoglicêmico”.

Os termos hemocentro e hemoglobina foram explicados aos colegas a partir da sua formação, ressaltando o afixo de origem grega. O sinal HEMOCENTRO não tem qualquer

referência ao sangue. Os alunos preferiram o empréstimo da letra inicial (CM «H»), deitando sobre as costas da mão de apoio, indicando CENTRO:

Para a criação do sinal HEMOGLOBINA, eles acessaram o conteúdo. O sinal começa

com as duas mãos na configuração «C» , em simetria e opostas. Enquanto a mão de apoio fica fixada na CM «C», a mão ativa, já em CM «H» movimenta-se em direção oposta. O conjunto tem como referência o glóbulo e o sangue:

O último sinal por eles criado foi o de ENZIMA. A proposta anterior de PR foi

modificada por causa da configuração de mãos. Novamente o grupo solicitou que houvesse o empréstimo da letra E inicial. Associada à idéia da quebra de ligações pela enzima, o sinal ficou representado pelas mãos direita e esquerda CM «L1», com orientações opostas, dedo indicador da mão esquerda apoiado no dedo polegar da mão direita. As mãos se afastam e se aproximam, dando a idéia de encaixe:

O grupo encerrou o encontro, prometendo transmitir a todos os colegas e intérpretes os sinais criados, para que prosseguissem com a unificação.