• Nenhum resultado encontrado

A visão da área central da cidade, com o símbolo turístico e a

2. CAPÍTULO 1: A “LOIRA BLUMENAU” E A DESCONSTRUÇÃO DESSE RÓTULO

―O governo municipal fez largo uso da germanidade para mostrar uma cidade habitada por

um povo ‗ordeiro e trabalhador‘.‖ Méri Frotscher, em Etnicidade e trabalho alemão Neste primeiro capítulo, apresento elementos na tentativa de compreender como se dá a construção da identidade de Blumenau, cuja predominância tem sido a ideia de uma ―sociedade germânica‖. Mobilizados para tanto, discursos e narrativas em diferentes contextos e esferas têm sido utilizados como mito de origem à fundação da colônia em 1850. Contextualizo algumas apropriações de certas trajetórias históricas para entender como se tem dado glorificação do passado dos imigrantes - pretensamente - alemães, a exaltação de uma etnia e a subalternização de outras tantas. Procuro identificar vozes que reforçam uma característica hegemônica e aquelas que se contrapõem a este discurso homogeneizador. A fim de pensar sobre a disputa por uma narrativa oficial em torno da cidade, introduzo a reflexão sobre as relações de forças envolvidas e acionadas nesta luta discursiva. Analiso o papel da Oktoberfest na estereotipização cultural da Blumenau germânica, alguns atributos na criação da narrativa sobre o que é a cidade e os interesses em jogo nesta construção. Abordo ainda como as experiências anteriores do município ainda são usadas no presente, ancoradas na falsa ideia de certa ―superioridade germânica‖, fundamentada na estigmatização e no silenciamento de outros povos. 2.1 DISPUTANDO NACIONALISMO: BRASILIDADE VERSUS GERMANIDADE

Uma aparente trajetória histórica do que seria o ―passado de Blumenau‖ tem sido regularmente utilizada como parte relevante dos processos de legitimação de uma identidade narrada de forma rotineira como predominantemente alemã; tal qual houvesse uma espécie de ―marca‖ que acompanhasse a cidade desde a fundação oficial da colônia privada em 2 de setembro de 1850. Mas a intensificação dos esforços da identificação germânica se dá na contemporaneidade, especialmente, pelo conjunto de ações de transformação da identidade alemã em produto turístico. Com sua repercussão internacional, a Oktoberfest assume protagonismo neste aspecto. Em diferentes narrativas, a cidade

costuma ser associada ao rótulo de ―Alemanha Brasileira‖. A reverência à história e à cultura dos imigrantes de origem germânica passou a ser explorada de forma a projetar Blumenau no contexto nacional.

A associação não se restringe às linguagens comercial e turística. Está presente também na mensagem institucional, inclusive nas placas à margem das rodovias que levam à região, indicando ―Vale Europeu‖ e, também, na imprensa. ―É outro país dentro do Brasil‖, definem os turistas, entusiasmados. ―Trata-se da Europa brasileira‖, sustenta o marketing turístico30. ―Bem-vindos ao Vale Europeu‖, saúdam as placas indicativas institucionais nas entradas e saídas de Blumenau. Fragmentos dessas narrativas são apropriadas pelo senso comum e reproduzidas pela mídia, que ajuda a construir e manter este cenário. A pujança econômica, assim como a força produtiva e a capacidade empreendedora da cidade reforçam o discurso. O argumento ganha sustentação na defesa: o Vale se diferenciaria culturalmente, sobretudo a partir de elementos como a qualidade de vida, a educação, a limpeza, a organização e a ordem.

Um dos pilares deste pensamento está na concepção de um ―Vale Encantado‖ –, pois europeu reside na ideia de que a cidade, assim como a região distingue-se pela herança de seus colonizadores europeus. Vincula-se à noção de uma cultura pretensamente superior, ao pertencimento de outra nacionalidade, diferente da brasileira. Fala-se como não sendo uma região de brasilidade, seja em momentos de elogio ou de críticas e desconfianças, confirmado no texto a seguir. Nele, a escritora Rachel de Queiróz (1949), ao denunciar uma ―menor brasilidade‖ no Vale do Itajaí, seja pelas aparências físicas, pelo dialeto falado ou comportamento de seus moradores, reforça o estereótipo do germanófilo. Mesmo quando vê miscigenação, a autora trata as pessoas de lá como estranhos brasileiros e parece convencida de serem europeus que estão no Brasil. A autora chega a entender a região como um país estrangeiro.

Nem parecem olhos de brasileiros aqueles olhos azuis que nos fitam as gentes de certas zonas do sul. Tão claros, tão arianos, brigando muitas vezes

30

Um exemplo pode ser conferido no link: http://www.skyscanner.com.br/noticias/inspiracao/cidades-brasileiras-que-vao- fazer-voce-se-sentir-na-europa (acesso em julho de 2016) que apresenta Blumenau como ―uma viagem à Alemanha em pleno sul do Brasil – arquitetura, costumes e biótipo dos cidadãos não deixam enganar‖.

com a pinta de sangue negro que o seu dono já possa ter de mistura e que se revela no cabelo ou na feição mulata, ou quando o tipo branco permanece fixo, brigando com a fala mansa de caipira, com o descanso, a gentileza, o pé no chão, e outras características tão nitidamente nacionais. Isso, porém se registra em alguns casos, em algumas regiões. Há outras em que os olhos estrangeiros combinam com tudo o mais do indivíduo, e de brasileira aquela gente não tem nada, só mesmo o direito que a constituição lhe dá de brasileiros se chamarem porque aqui nasceram – naturalmente, não por seu gosto. Quem anda pela chamada ―zona alemã‖ dos estados do Sul, e especialmente, pelo ―Vale do Itajaí‖, em SC, a sensação que tem é de estar em país estrangeiro, e país estrangeiro inamistoso. E essa sensação nos é transmitida não só pela cor do cabelo e dos olhos dos habitantes, não só pelos nomes que se ostentam nas placas das lojas e dos consultórios, não só pelo estilo arquitetônico, é antes e acima de tudo, pela fala daquela gente[...]. Se há, pois, quisto racial ainda em plena exuberância é aquele. Aquilo não é Brasil ou se o é, é Brasil transviado Brasil em mãos alheias. (QUEIRÓZ, 1949) (Grifos meus)

As palavras de Rachel de Queiróz revelam o estranhamento com a conservação e permanência de características e traços do que ela associou como sendo cultura germânica no Vale do Itajaí. Publicada na Revista O Cruzeiro, em 1949 (ver anexos), a crônica de título ―Olhos Azuis‖ resume as impressões da escritora cearense em visita à região. Faz pensar a construção da identidade de Blumenau, que também ocorre por olhares de fora e não apenas internamente no Vale. Talvez possa ser entendida como um dos fragmentos literários mais simbólicos da história recente, embora faça alusão a um momento específico. Refere- se ao período pós Segunda Guerra Mundial, marcado por ressonâncias da Campanha de Nacionalização e com toda a repressão aos descendentes de imigrantes e estrangeiros, na tentativa de forçar a integração junto à população brasileira.

O texto assinado pela primeira mulher a ingressar na Academia Brasileira de Letras desencadeou reações diversas da comunidade germanófila no Vale do Itajaí. Principalmente, algumas lideranças

públicas, quase sempre políticos, logo trataram de reforçar o quão brasileiros eram os habitantes do Vale. Rachel de Queiroz parece não ter se intimidado com as críticas, muito menos com a ideia de serem brasileiros os moradores do que ela entendia ser zona alemã de Santa Catarina. Chegou a escrever outro artigo, contra o que chamava de os alemães de Blumenau. Desta vez, no jornal carioca Diário de Notícias de 3 de abril de 1949, intitulado ―Nacionalização do Vale do Itajaí‖. Para compreender a dimensão do texto publicado pela autora, basta lembrar que, neste período, a revista O Cruzeiro, lançada pelo grupo Diários Associados de Assis Chateaumbriand, era considerada a principal do país.

Por isso, não é difícil imaginar as repercussões desencadeadas em torno da divulgação das ideias, recebidas como afronta por parte da comunidade residente na região. As reações envolveram, inclusive, manifesto liderado pelo então prefeito da cidade, Frederico Guilherme Busch Júnior. Como forma de protesto e símbolo da indignação e repulsa da comunidade blumenauense, ele enviou à revista carta de repúdio à escritora em 26 de março de 1949. A disputa pela nacionalidade dos moradores da região estava dada: para a autora, seriam alemães; para as autoridades do município, eram brasileiros. A seguir, cito trecho do documento encaminhado pelo prefeito, cuja redação pode ser encontrada nos anexos deste trabalho integralmente. A reprodução foi publicada no Jornal Cidade de Blumenau - Diário Matutino, edição de 30 de março de 1949.

Lamento sinceramente que V.S., que como escritora é sobejamente conhecida no Vale do Itajaí, tenha manifestado opinião tão pouco lisonjeira sobre nossa população, demonstrando completo desconhecimento dos sentimentos de brasilidade que norteiam nossa patriótica população[...] Venho, portanto, protestar veementemente contra as referências de V. autoria, lastimando que sua brevíssima passagem por nossa cidade não lhe permitisse uma análise mais profunda, mais serena, mais justa e mais honesta sobre o povo blumenauense, do qual, como Prefeito, só posso me orgulhar e que, pelo seu amor à Pátria, à Ordem e ao Trabalho, honra SC e o Brasil. (BUSCH, 1949) (Grifo meu) A Câmara Municipal de Vereadores também resolveu se manifestar e classificou o artigo de Rachel de Queiróz como

―desconhecimento completo dos sentimentos de patriotismo dos brasileiros no Vale do Itajaí‖. Por sugestão do vereador Herbert Georg, foi aprovado requerimento contrário ao texto, influenciando, assim, outros legislativos da região a fazerem o mesmo. No documento, o artigo da escritora foi considerado com ―informações inverídicas e tendenciosas‖ e sugeriu o encaminhamento do requerimento a todas as câmaras municipais do Vale do Itajaí. O episódio de embate do sentimento de pertencimento e nacionalidade entre a escritora e políticos de Blumenau ilustra o confronto entre algumas das forças envolvidas no processo de instituição da identidade local. Parece ser desconhecido pelas novas gerações, mas muito presente nos relatos e na memória de quem acompanhou as repercussões.

Entretanto, passados mais de 60 anos do episódio, a inversão é clara: a produção discursiva local e mesmo as autoridades públicas e políticas fazem Blumenau ser batizada como ―Alemanha Brasileira‖. Abrem mão da ideia de brasilidade - mesmo uma brasilidade particular - , tornam a cidade referência na colonização germânica no Sul do país e o Vale do Itajaí detentor do título de ―Vale Europeu‖.31

Assim como também se pode dizer, genericamente, que a imprensa e a mídia atribuem ao Vale aspectos europeus. Denunciado pela escritora Rachel de Queiróz como um problema no final dos anos 1940, hoje é tratado como identidade fixa e única. É vista assim, por meio de traços pensados como naturais, portados como se fossem algo estático e se confundissem com a origem do espaço ou sujeito. Como se por trás dela – da identidade – houvesse sempre uma única e exclusiva essência.

2.2 DA BLUMENAU COLÔNIA À ALEMANHA SEM

PASSAPORTE: GERMANOCENTRISMO COMO FIO CONDUTOR A colonização europeia no Sul do Brasil faz parte de uma política imigratória com fins de reordenamento populacional em parte do território nacional – quase sempre em área de fronteira, sendo conduzida pelo Estado com tipos étnicos diferenciais. Costuma-se dizer na

31

Um dos exemplos que alimenta a constatação foi o programa Globo Repórter, da Rede Globo, que foi ao ar em 19 de fevereiro de 2015 e tratou justamente do tema de uma região ao qual aderiu o uso da expressão Vale Europeu, valorizando as características europeias que diferenciam a região do restante do país. O programa pode ser acessado no link: http://g1.globo.com/globo- reporter/noticia/2016/02/vale-europeu-e-regiao-do-brasil-campea-em-qualidade- de-vida.html (acesso em 18 de junho de 2016).

literatura especializada que o processo foi iniciado em 1824, com a fundação da colônia de falantes da língua alemã em São Leopoldo (RS), seguindo no século XIX e início do XX. As manifestações da etnicidade germânica no Sul do Brasil influenciaram na constituição de pertencimentos e na própria ideia de existir um Sul do Brasil. Tais temáticas foram amplamente estudadas por diferentes autores. (SEYFERTH, 2012; VOIGT, 2008). A trajetória desses imigrantes hoje, em retrospectiva, chamados de alemães, é marcada por reconfigurações de suas identidades criadas e recriadas ao longo do tempo de forma coletiva e individual. (SEYFERTH, 2012). É no confronto com ―os outros‖ que essas identidades étnicas assumem significado social. No Vale do Itajaí, a imigração foi marcada por momentos distintos.

O processo de ocupação estrangeira do Vale do Itajaí se deu em diferentes fases. Em 1850, iniciou-se a entrada dos imigrantes em língua alemã; em 1860, a entrada de imigrantes suíços, belgas e holandeses; em 1875, de imigrantes provenientes do território italiano e tirolês e; em 1890, a entrada de imigrantes russos, poloneses e húngaros. A partir de 1875, entraram diferentes grupos de imigrantes no Vale do Itajaí, como consequência de uma nova política imigratória do governo brasileiro, contrário à formação de colônias formadas por um só grupo étnico (FROTSCHER, 2007, p. 29).

A colonização na segunda metade do século XIX está inserida no contexto da imigração europeia. Um dos principais interesses de formuladores da política brasileira era o ideal de branqueamento da população, com o objetivo de extinção dos negros – considerados ―inferiores‖ e ―não civilizados‖. O pressuposto da superioridade branca era apresentado como verdade e por argumentos ditos e comprovados cientificamente. Tinha adeptos entre intelectuais e cientistas. Para eles, as causas do atraso brasileiro eram atribuídas à presença de negros e mestiços, numa concepção preconceituosa e eurocêntrica. Um dos principais expoentes da tese do branqueamento, Silvio Romero, acreditava que desta forma ―salvaria o país da degeneração‖. (SCHWARCZ, 1987, p. 22). Com a miscigenação seletiva e a imigração europeia, fortalecia-se o desejo pela formação de um povo fenotipicamente branco, com base na não aceitação da imigração de negros e amarelos para o país. (SEYFERTH, 2000).

Entre os objetivos do incentivo à imigração europeia também havia a implantação de um modelo de exploração que privilegiava a pequena propriedade familiar agrícola, diferenciada do latifúndio escravista. A colonização feita de populações vindas da Europa (mais tarde áreas de abrangência da Alemanha) teve início em Santa Catarina, em 1829, com a Colônia São Pedro de Alcântara, região da atual grande Florianópolis. Em Blumenau, a colônia privada foi fundada em 1850, havendo ocorrido dois anos antes a concessão de 220 quilômetros quadrados de mata virgem pelo governo provincial de Santa Catarina a Hermann Bruno Otto Blumenau. Concretizava-se, assim, o projeto de colonização do imigrante H. Blumenau. Nascido na cidade de Hasselfelde, então ducado de Brunswick32, ele foi responsável pela fundação da colônia que levaria seu nome, onde passou a fomentar a colonização com imigrantes oriundos da Europa33.

À distância de 140 quilômetros da capital Florianópolis, Blumenau contabiliza aproximadamente 310 mil habitantes conforme o último censo do IBGE. (2010). Costuma ser destacada no cenário nacional pelos índices de qualidade de vida, como se fosse exemplo de um primeiro mundo encrustado no Brasil. Apresentou o primeiro lugar no ranking nacional do Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), em 1980, e é frequentemente exposta como se sempre tivesse sido assim. Líder catarinense na geração de empregos por quatro anos consecutivos (2011 a 2014), é a terceira cidade mais populosa do Estado. Blumenau vem buscando títulos e nomenclaturas que a nomeiem como sucesso. Apresenta um dos melhores PIBs de Santa Catarina (R$ 8,95 bilhões), tendo destaque nacional em diversos setores econômicos, como o têxtil e a informática. A renda per capita da cidade também está entre as melhores do Estado34, embora seja pouco problematizada a formação social que construiu tais arranjos.

32

O ducado de Brunswick fazia parte da confederação alemã conforme estabelecido pelo Congresso de Viena após a guerra de libertação da França (1813-1815). Cf: SEYFERTH, Giralda. A colonização alemã no Vale do Itajaí Mirim. Porto Alegre: Garibaldi, 1974, p. 18

33

A diversidade caracteriza os imigrantes vindos à época, pois eram: pomeranos, prussianos, austro-húngaros, trentinos... nem todos ―alemães‖. Como a Alemanha só vai existir formalmente pós 1871, o passaporte daqueles que vem nas duas primeiras décadas para a Colônia Blumenau não era da Alemanha, mesmo que viessem saídos pelo Porto de Hamburgo.

34

É de R$ 3.052,00 de acordo com dados de 2010 do Sistema de Informações Gerenciais de Apoio à Decisão (SIGAD).

Joinville, Blumenau e Brusque, núcleos fundados entre os anos 1850-1860, tornaram-se o exemplo de colonização bem-sucedida em Santa Catarina. A evolução das três colônias, apesar de suas características específicas, obedeceu, basicamente, ao mesmo modelo, em que se implantou a atividade industrial nas comunidades até então dedicadas à agricultura (HERING, 1987, p. 34) Em sua tese de doutorado: ―Colonização e Indústria no Vale do Itajaí: O modelo catarinense de desenvolvimento‖ (1987), a historiadora Maria Luiza Renaux Hering sustentou o argumento de que ―o desenvolvimento do Vale do Itajaí obedeceu à dinâmica interna própria‖. (HERING, 1987, p.11). O modelo do empreendedor com origem europeia, voltado ao trabalho e à acumulação, é a base para sua defesa do protagonismo e sucesso do empresariado catarinense. Numa perspectiva reducionista e limitadora, a obra valoriza a identidade étnica de origem europeia ao defender a construção de um modelo característico de desenvolvimento, atribuído às individualidades da colonização. Sem contraponto e atualização na imprensa, os dados apresentados também costumam associar o desempenho econômico atrelado às heranças e influências germânicas. As tradições alemãs são motivo de exaltação nessas versões que fortalecem o mito dos ―heróis‖ e ―pioneiros‖. A imagem em evidência do blumenauense parece querer refletir outra forma, como se houvesse um jeito alemão de ser e isso se expressasse na vida rotineira, com pouco espaço às suas multifacetadas características. Mesmo a festividade não fica fora disso. A Oktoberfest assume destaque nos jornais quando se trata das manifestações ligadas à identidade germânica.

Mas o município reuniria uma coleção destas ―maneiras alemãs de ser‖, como os Clubes de Caça e Tiro. O calendário oficial de eventos do município fortalece a marca, tendo promoções como o Festival Brasileiro da Cerveja, Sommerfest35, Stammtisch.36 A recriação da

35

Sommerfest, ou Oktober de Verão é uma festa que ocorre no início de todos os anos no Parque Vila Germânica desde 2012. O objetivo é atrair par a cidade os turistas e visitantes que estão no litoral nesta época e apresentar a eles a cultura alemã.

36

Stammtisch, ou encontro de amigos é também um evento realizado uma vez por ano na Rua XV de Novembro, no centro de Blumenau. O Stammtisch* teve sua 1ª edição em agosto de 2000. Hoje o Stammtisch integra o Calendário de Eventos da Santur e da Secretaria de Turismo de Blumenau.

cidade a partir das representações germânicas, sem convivências com outras referências, tem corrido o risco de transformar a cultura em espetáculo. O alerta foi feito pela historiadora da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), Maria Bernadete Ramos Flores quando trata dessas ―encenações‖ no livro Oktoberfest: Turismo, Festa e Cultura na Estação do Chopp (1997). A suposta ascendência majoritariamente alemã de Blumenau e a desmistificação da Oktoberfest são discutidas na obra que lança outro olhar sobre a ―invenção‖ das festas típicas da região.

A germanidade blumenauense no processo de legitimação da identidade do município assumiu ainda mais força com as enchentes dos anos 1983/1984, responsáveis por devastar a cidade. A imagem de um povo ―guerreiro‖, capaz de superar as adversidades e lutar pela reconstrução, associou-se à ideia do trabalho no imaginário popular. Os discursos em torno de Blumenau ajudaram a construir uma identidade formada por um ―povo trabalhador‖, acostumado a arregaçar as mangas, limpar a lama deixada pelas cheias e superar as adversidades. Produziram, também, uma noção de ―cidade eficiente‖. A construção desses sentidos não parece estar limitada a um passado remoto, mas ainda interfere intensamente nas representações feitas sobre Blumenau. Basta ver a propaganda ―Blumenau, o Brasil de alma alemã‖, que apregoa o slogan da campanha publicitária lançada em 2015 pela prefeitura.

Blumenau não é a única cidade do Estado a reverenciar traços e elementos da cultura europeia, além de festejar as tradições e o culto aos colonizadores com uma festa típica no mês de outubro. A Fenarreco em Brusque, Marejada em Itajaí, Festa do Imigrante em Timbó, Schützenfest em Jaraguá do Sul e Oktoberfest em Itapiranga – primeiro município catarinense a realizar a Oktoberfest – promovem comemorações nos moldes de celebração identitária e de origem étnica. Vizinha de Blumenau, Pomerode, por exemplo, reivindica o título de ―cidade mais alemã do Brasil‖ e também festeja as tradições germânicas com a Festa Pomerana, em janeiro. Mas a prática da teuto-brasilidade não se resume ao turismo. Aplica-se, inclusive, às disputas internas das elites locais e aos palanques eleitorais, conforme verificado em Pomerode, onde candidatos apelam, pedindo votos no idioma alemão.37

37

Em 2012, o portal Uol divulgou seguinte reportagem: Em cidade catarinense, candidatos falam alemão para ganhar confiança do eleitor.

http://eleicoes.uol.com.br/2012/uol-pelo-brasil/2012/09/26/em-cidade- catarinense-candidatos-falam-alemao-para-ganhar-confianca-do-eleitor.htm .

Em Blumenau, investimentos discursivos contribuíram para a germanidade ser constituída como identidade dominante. ―Uma elite