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2.2 Metodologia de trabalho

2.2.1 Abordagem Antropológica

Antes de discorrer sobre que técnicas de pesquisa antropológica foram utilizadas para essa pesquisa, torna-se necessário esclarecer alguns pontos referentes à interdisciplinaridade no processo da construção de uma metodologia assertiva para o trabalho na comunidade Xucuru-Kariri.

As necessidades postas com a prática arqueológica em aproximação com a comunidade, estabelecendo novos modos de relação entre pesquisador e grupo, trazem uma ênfase maior a sua base que dialoga com a Antropologia Social. Neste caso, a Antropologia não será apenas utilizada como categoria de análise, mas fomentará a metodologia de trabalho (SILVA E., 2011). A inclusão de uma abordagem antropológica não invalida o trabalho arqueológico; pelo contrário, aproxima o pesquisador da comunidade aonde se vai trabalhar, promovendo a prática multivocal.

Uma aproximação com a antropologia, portanto, além de deixar-nos mais atentos às pessoas por trás dos objetos, ainda nos ajudaria na tarefa de repensarmos, reestruturarmos nossa disciplina, seus campos de atuação. E isso não implicaria perda de sua identidade, enquanto campo de conhecimento, nem em uma mera militância, mas deslocaria o foco de uma inclusão que só se pretende no discurso para uma, quem sabe, perspectiva menos homogeneizante, com mais vozes dissonantes, implicando relações que vão além daquelas do campo da representação. Reconhecer esta necessidade não tornaria a arqueologia (um dos universos epistemológicos possíveis) menos Arqueologia, enquanto disciplina acadêmica, responsável pela produção e validação hegemônica do conhecimento científico (SILVA E., 2011: 79).

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Partindo desse aspecto, no atinente à apreensão das representações do grupo, o trabalho foi desenvolvido a partir de pesquisa empírica, de cunho qualitativo, com o objetivo de apreender os significados e discursos indígenas referentes à materialidade da região. Também fez parte do universo de pesquisa a apreensão dos discursos de representantes de órgãos institucionais como o IPHAN e a FUNAI, onde, mediante entrevistas de seus agentes, foram captadas as práticas fomentadas por esses órgãos no que se refere aos expedientes indígenas relacionados a esses processos de identificação e representatividade do grupo.

A pesquisa qualitativa é parte do aparato metodológico utilizado pelas Ciências Sociais, onde se busca um aprofundamento das temáticas através de técnicas que trazem uma gama maior de informações a respeito de um determinado grupo estudado. Martins H. (2004) define a metodologia qualitativa, de um modo geral, como focada na análise de microprocessos através do estudo de ações individuais e grupais. Os dados podem ser analisados intensivamente tanto em “amplitude como em profundidade”, tendo, portanto, o pesquisador a possibilidade de apreender e compreender a realidade do fenômeno social de maneira mais completa.

Godoy (1995) assinala que a pesquisa qualitativa, por apresentar maior flexibilidade, pode entrar em consonância com diversos quadros de orientação teórica, como a fenomenologia, o materialismo dialético, o interacionismo simbólico, dentre outros. Nesse tipo de abordagem, as informações podem induzir o pesquisador a um maior aprofundamento nos questionamentos propostos. A análise não privilegia dados exatos que precisem ser apurados através de medição objetiva e quantificação para encontrar respostas.

Algumas características são levadas em consideração durante o processo de análise qualitativa:

 A observação do fenômeno social compreendido no contexto em que ocorre e do qual faz parte;

 O aspecto descritivo dos fatos, dos quais se tenta apreender informações relevantes para o grupo, ao levar em consideração o fato de “o ambiente e as pessoas deverem ser olhados holisticamente: não reduzidos a variáveis, mas observados como um todo” (GODOY,1995:62). Portanto, a preocupação está relacionada com o processo e não com os resultados do produto; a pesquisa é realizada de acordo com a perspectiva do participante, “o significado que as pessoas dão às coisas e à sua vida são a preocupação essencial do pesquisador” (GODOY, 1995: 63);

 O enfoque indutivo da análise, ou seja, a preocupação primordial não é a busca de dados que corroborem ou neguem a evidência, parte de questões mais amplas dando ao pesquisador uma maior liberdade na investigação. As abstrações são formuladas a partir das informações, e o quadro teórico é construído na medida em que se coletam os dados e se examinam.

2.2.1.1. Estudo de Caso

Para apreender os discursos produzidos pela comunidade a respeito do manancial arqueológico da região, escolheu-se o estudo de caso, que difere da pesquisa etnográfica, uma vez que não tem a intenção de abarcar fenômenos sociais do grupo em sua totalidade, e sim o recorte relacionado aos processos de (re)significação da cultura material e sua representatividade. Realizaram-se entrevistas com os Xucuru-Kariri semiestruturadas durante os meses de junho e novembro de 2012, em visitas realizadas nas áreas indígenas. As entrevistas foram filmadas e esses registros foram disponibilizados para a comunidade junto ao mapa com a localização dos sítios arqueológicos. As perguntas foram estruturadas da seguinte maneira:

 O que significam os sítios arqueológicos para a comunidade;

 Como são tratados os artefatos encontrados casualmente nas áreas;  Esses objetos são reutilizados, ou não;

 Existe alguma utilização desse material nos rituais religiosos;

 Há a preocupação da preservação desses locais para gerações futuras.

A despeito do direcionamento para essas questões, o impacto do discurso local trouxe inúmeros questionamentos novos, inclusive mudança de perspectiva ao longo do processo de construção dessa dissertação.

As filmagens realizadas durante a visita aos sítios arqueológicos foram disponibilizadas para a comunidade. Nesses lugares, os integrantes mais velhos do grupo fizeram uma retrospectiva de seu histórico e assinalaram a importância daqueles locais. Posteriormente, poder-se-á utilizar o material nas escolas indígenas da região, assinalando para os mais jovens a importância do histórico do grupo, bem como a preservação dos lugares considerados pela comunidade como sagrados.

2.2.1.2. Entrevistas com Instituições

Realizaram-se entrevistas com agentes das instituições FUNAI e IPHAN para apreender o discurso relacionado às áreas indígenas Xucuru-Kariri. Tendo em vista que esses

órgãos são os responsáveis pelo estabelecimento e implementação da política indigenista no país, bem como a salvaguarda do patrimônio arqueológico brasileiro.

As perguntas foram semiestruturadas e visaram perceber como esses agentes lidam com essas questões. No caso do IPHAN, se há políticas que incluam a preservação desses espaços, e se o patrimônio imaterial da comunidade é levado em consideração em trabalhos relacionados a essas áreas. No tocante à FUNAI, as perguntas foram direcionadas para saber se o órgão tem conhecimento desses espaços e se eles interferem na política de demarcação de terras indígenas em Palmeira dos Índios.

A estrutura base das perguntas foram:

 Como é visto o patrimônio arqueológico de Palmeira dos Índios;

 Se dentro das ações implementadas pelos órgãos houve a incorporação do discurso da comunidade;

 Se houve medidas mitigadoras para a conciliação do discurso arqueológico X discurso local.

Realizaram-se as entrevistas nos meses de junho e novembro de 2012 e foram filmadas. Os registros estão guardados e disponibilizar-se-ão após a dissertação para futuros pesquisadores que queiram trabalhar com os dados.