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1. Introdução

2.2 Inovação em Serviços

2.2.1 O conceito de inovação e os serviços

2.2.2.3 Abordagem Integradora

As fronteiras entre produtos e serviços não são claramente estabelecidas (SUNDBO; GALLOUJ, 2000). No geral, os setores de serviços e manufatura mostram mais similaridades que diferenças no que se refere a algumas dimensões básicas do processo de inovação (SIRILLI; EVANGELISTA, 1998). Os produtos industrializados possuem cada vez mais serviços agregados e, por outro lado, em determinados setores, os serviços estão em busca de padronização, e estão vinculados a produtos. Para Gadrey, Gallouj e Weinstein (1995), a distinção tradicional entre indústria e serviço tende a perder o significado em certas situações, tais como as empresas de tecnologias, as quais produzem simultaneamente bens e serviços tecnológicos.

Dado que as atividades de manufatura e serviços estão se tornando mais integradas, mostra-se necessário desenvolver um sistema comum para analisar estas atividades (DREJER, 2004). Tal vertente tem sido desenvolvida sob uma abordagem integradora, a qual está baseada no fato de que a necessidade de consumo pode ser satisfeita por um produto ou serviço (GALLOUJ, 2002a).

Sob um enfoque integrador, desenvolvido a partir das considerações de Lancaster (1966), onde produtos são o resultado de uma série de características, Gallouj e Weinstein (1997) desenvolveram uma classificação de inovação que não se ateve a diferenciar produto e processo e que pode ser aplicada tanto aos serviços quanto à indústria. A classificação, representada na figura 3, na sua forma mais geral, caracteriza os vetores que podem resultar em diferentes tipos de inovações, ocorridas a partir de mudanças nas características (técnicas - T ou produto final - Y) e/ou nas competências (do cliente – C’ e/ou do prestador - C).

As características técnicas (T) podem ser decompostas em meios pelos quais os serviços são prestados: objetos materiais (M), informações (I), conhecimento (knowledge) (K) e os próprios indivíduos (R). Os objetos materiais (M) – operações ou funções tangíveis - envolvem a prestação de serviço baseada em objetos tangíveis (seja transporte, transformação, armazenamento, manutenção, reparo, etc.). As operações ou funções informacionais (I) consistem no processamento ou tratamento de informações (produção, captura, transmissão, etc). Nas operações de serviço relacionais (R) o próprio cliente é o meio pelo qual o serviço é prestado e consiste no contato direto entre o cliente e o prestador de serviço. As operações cognitivas ou metodológicas (K) envolvem o processamento de conhecimento por meio de métodos (rotinas, tecnologias intangíveis, consultorias, etc) (DJELLAL et al., 2003). Tais características técnicas terão maior ou menor presença em função do tipo de serviço prestado.

Figura 3: Serviços e produtos como um sistema de características e competências Fonte: Gallouj (2002)

As contribuições dessa classificação consistem no reconhecimento da influência das competências do cliente nas inovações em serviços; na expansão dos tipos de inovação, limitando-as não apenas às inovações radicais e não radicais (GALLOUJ; WEINSTEIN 1997; GALLOUJ, 2002a; VRIES, 2006); além de permitir uma análise mais ampla da inovação que não esteja restrita a mudanças tecnológicas (GALLOUJ, 2002a).

Competências do prestador de serviço C1 C2 . Ck . . Cp Caracteristicas finais do serviço Y1 Y2 . Yk . . Ym T1 T2 . Tk . . Tn Caracteristicas tecnicas (materiais ou imateriais) Competências do cliente C’1 C’2 . . C’k . . C’q

As inovações baseadas nas características do serviço elaboradas por Gallouj e Weinstein (1997) e aprimoradas por Gallouj (2002a), são:

ƒInovação radical: representa a criação de um produto totalmente novo, com características (técnicas, competências e resultado final) distintas do produto anterior. Quanto mais radical a inovação, mais será necessário ensinar o cliente a utilizar o produto, uma vez que as competências do consumidor constituem uma das características do produto final. No setor de seguros de vida, uma inovação radical seria a oferta de um produto com coberturas de novos riscos.

ƒInovação de melhoria: consiste em uma certa melhoria nas características, sem nenhuma mudança na estrutura do sistema. Ou seja, um valor agregado ao produto final teria influência de uma melhoria em uma competência do prestador do serviço ou por uma melhoria em uma característica técnica.

ƒInovação incremental (inovação por substituição ou adição de características): neste caso, a estrutura geral do sistema permanece a mesma (competências do consumidor, prestador, características técnicas e características finais); contudo mudanças ocorrem pela adição de novos elementos nas técnicas e ou produto final ou por meio de substituição de elementos. Nisso, pode ocorrer, por exemplo, a inclusão de uma ou duas características para um certo tipo de produto, pela mobilização de certa competência ou pela adição de novas características técnicas. Assim, tal inovação baseada em melhorias pode ocorrer de diversas formas, e, pode ou não ser baseada na utilização de novas tecnologias, no sentido usual do termo. Um exemplo que possa ilustrar a inovação incremental poderia consistir na adição de rastreamento por satélite, realizado por empresas de logística, que permite ao cliente acompanhar sua mercadoria.

Tanto a inovação de melhoria quanto a incremental possuem características bastante semelhantes, constatação que é mencionada por Gallouj e Weinstein (1997), ao admitir que há certa dificuldade em definir claramente a fronteira entre a inovação incremental e a inovação de melhoria, ou seja, distinguir o momento no qual uma nova característica é adicionada de um momento onde uma simples melhoria é realizada. O fato é que há uma área de sombreamento entre as duas classificações, o que tornaria mais adequado uni-las em uma única classificação. Vries (2006), ao realizar estudo baseado nos tipos de inovação de Gallouj e Weinstein (1997), optou por utilizar o termo inovação incremental para representar as inovações de melhoria e incremental, dado que, segundo o autor, não havia distinção entre as duas inovações.

ƒInovação Ad hoc: pode ser definida, em termos gerais, como uma construção interativa (social) para solucionar um problema particular posto por um cliente. Ocorre com freqüência nos serviços de consultoria, caracterizado por conhecimento e experiência que são postos em prática de forma sinérgica para criar novas soluções e novo conhecimento que muda a situação do cliente de uma forma positiva e original (GALLOUJ, 2002a). A inovação ad hoc ocorre por meio da interação cliente/prestador do serviço e surge durante o processo normal de entrega de serviço; contudo, freqüentemente não é reconhecida a inovação até o produto ser entregue, o que a caracteriza como uma inovação não programada. (GALLOUJ, 2002a; SUNDBO; GALLOUJ, 2000). Segundo Vries (2006), quanto mais estreito o relacionamento com cliente, mais facilmente ocorre o processo de interação em busca de uma solução específica e, por conseguinte, uma solução específica, que atenda às necessidades do consumidor fortalece o relacionamento. Mamede (2002) destaca a capacidade de adaptação nesse tipo de processo em busca da inovação. Do ponto de vista do prestador de serviço, a inovação ad hoc representa a aquisição de novos conhecimentos e competências, que podem ser reutilizadas em diferentes circunstâncias. Representa, também, a codificação e formalização de certos elementos da solução obtida, o que permite, parcial e indiretamente a sua reprodução (GADREY; GALLOUJ; WEINSTEIN, 1995; GALLOUJ, 2002a; SUNDBO;GALLOUJ, 2000), fator este, que distingue a inovação ad hoc das transações cotidianas de serviço (GALLOUJ, 2002a).

ƒInovação recombinativa ou arquitetural: explora combinações de várias características finais e técnicas, derivadas de um estoque de conhecimento estabelecido e de uma base tecnológica; e representa um método rotineiro de produzir inovação por meio da reutilização sistemática de certos elementos e componentes (GALLOUJ, 2002a). A inovação recombinativa pode ser caracterizada pela criação de um novo produto; pela combinação de dois ou mais produtos existentes; ou quando novos produtos são criados pela separação das características e tornando certos elementos produtos autônomos (GADREY; GALLOUJ ; WEINSTEIN, 1995; GALLOUJ, 2002a). Gallouj (2002a) pondera que a noção de inovação recombinativa é deliberadamente simplificada; no entanto, o processo de construção e desconstrução possui especificidades mais complexas. De acordo com Henderson e Clark (1990), a inovação recombinativa preserva o conhecimento da utilidade dos componentes individuais do produto, fato que, ainda de acordo com Henderson e Clark (1990) permite relacionar a inovação e as competências organizacionais.

Alguns exemplos mencionados por Gallouj (2002a) sobre inovação recombinativa são: os vôos charter; o segmento de fast-food, ambos caracterizados por terem sido originados da fragmentação de serviços; e os pacotes turísticos, caracterizados pela combinação de serviços, pois, são compostos por serviços de transporte aéreo, hospedagem, city tour. No que se refere a seguradoras e bancos, Gadrey, Gallouj e Weinstein (1995) mencionam como exemplos, a prestação de um serviço único, obtido a partir de diferentes operações realizadas pelo cliente em diversos contratos (abrir conta corrente, realizar aplicações financeiras, obter empréstimos); ou a oferta de um serviço a partir de um serviço composto por diversas operações (gestão de carteira de investimentos).

ƒInovação de formalização: neste tipo de inovação, as características do serviço são organizadas, especificadas, tornam-se mais claras e concretas, ou seja, adquirem uma forma. Neste caso, o objetivo consiste na padronização das características do serviço. Gallouj (2002a) compara o processo de formalização de serviços com o processo biológico de divisão e diferenciação celular, originado a partir de uma única célula. No estágio inicial, as competências e funções/características são relativamente indiferenciadas e tácitas (contidas na célula original), enquanto, no estágio final as funções e serviços estão claramente diferenciadas e articuladas entre si. Ainda segundo Gallouj (2002a), o processo de formalização consiste em denominar o serviço e estabelecer pontos de referência ou marcas metodológicas, pelas quais a inovação pode ser definida. Nesse sentido, Drejer (2004) diz que a formalização consiste em um importante elemento em todos os processos de criação de novos conhecimentos em inovações, e, em relação a serviços, o benefício adicional seria o de contribuir para que as inovações não sejam perdidas e percebidas como respostas customizadas, aplicadas em um caso específico. Para isso, formalizar implica codificar e tornar explícito os conhecimentos e os processos, que, até então seriam informais e tácitos (DREJER, 2004).

Apesar de reconhecer a importância de formalizar o processo de inovação, para Drejer (2004), a formalização raramente constitui uma inovação por si só, a menos que possa estar diretamente relacionada com novas necessidades de mercado ou com novos caminhos de organizar a produção. De acordo com a autora, instituir como inovação processos que não criam novidade tende a negligenciar a herança dos estudos sobre inovação baseados em Schumpeter, os quais estão fundamentados na introdução bem-sucedida de algo novo, fora da rotina.

Alguns exemplos da inovação de formalização podem ser encontrados nas cadeias de fast-

food, ao formalizarem procedimentos para atendimento tempestivo da demanda do consumidor;

também nas empresas de auditoria e contabilidade, ao estabelecerem metodologias de apuração de dados e informações.