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1.2. Da delinquência juvenil

1.2.4. Abordagem jurídica da delinquência juvenil

A delinquência juvenil tem sido alvo de intensivos estudos, já que tem vindo a adquirir maior relevância derivado ao aumento da sua ocorrência e reiteração. Este fenómeno ocorre quando o jovem rompe com o mínimo ético e social em que se baseia a vida em comunidade (Pais, 2016). A partir do momento em que este ofende os bens jurídicos, protegidos pelo direito penal, o Estado vê- se forçado a intervir repreensivamente em relação ao jovem, uma vez que este ofende diretamente os princípios basilares da vida social. Esta repreensão é fundamentada com o principal objetivo de proporcionar ao delinquente a oportunidade de rever as suas ações e compreender as normas vitais e indispensáveis da vida em comunidade e face às quais qualquer ser humano deve respeito e aquiescência.

O Estado esteia a sua intervenção sempre que se assista a um comportamento delinquente que revele um rompimento dos princípios basilares da ordem jurídica. Aqui, o Estado é legítimo de educar o jovem para o direito de

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forma independente daqueles que são os detentores legais das responsabilidades parentais. Surge então a intervenção tutelar educativa, cujo principal objetivo se baseia no auxílio prestado no que respeita ao desenvolvimento da personalidade de forma responsável e normativa (E-BOOK abril 2015: Centro de Estudos Judiciários – Intervenção Tutelar Educativa).

Após o ano de 2001, denotou-se um afastamento das leis delineadas e aplicáveis a menores, nomeadamente entre a Lei de Proteção de Crianças e Jovens em Perigo (originalmente designada a Lei n.º 147/99 de 1 de setembro) e a Lei Tutelar Educativa (originalmente designada a Lei n.º 166/99 de 14 de setembro). A LPCJP, cuja intervenção se destina a vítimas menores, foi redigida com vista à promoção dos direitos e à proteção das crianças e jovens em perigo, com o principal objetivo de salvaguardar o seu bem-estar e desenvolvimento social, psicológico e físico. Paralelamente, a LTE foi redigida com o propósito na educação do menor para o direito e a sua reinserção, de forma plena, íntegra e consciente, na sociedade, bem como está direcionada para aqueles que, com idade compreendida entre os 12 e os 16 anos, praticam atos ilícitos e que justifique a aplicação de medidas tutelares educativas.

O primeiro marco importante no que respeita à delinquência juvenil remonta o ano de 1985 nas regras de Beijing, parte integrante das Regras Mínimas das Nações Unidas para a Administração da Justiça de Menores. Adotadas pela Assembleia Geral das Nações Unidas na sua resolução 40/33, de 29 de novembro de 1985, têm como principal objetivo a promoção do bem-estar do jovem e da sua família. Para tal, regista-se o compromisso dos Estados Membros em conceber as circunstâncias necessárias que proporcionem aos jovens a garantia de um crescimento e desenvolvimento estável, com acesso à educação, e que permita a vida em comunidade. Para a preservação da paz e harmonia da sociedade, e para a promoção do bem-estar e estabilidade do jovem, é prioritário restringir a intervenção nos termos da lei e proceder de forma eficiente, íntegra e indulgente para com o jovem delinquente.

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Segundo a Convenção sobre os Direitos da Criança, adotada pela Assembleia Geral nas Nações Unidas a 20 de Novembro de 1989 e ratificada por Portugal em 21 de Setembro de 1990, “criança é todo o ser humano menor de 18 anos, salvo se, nos termos da lei que lhe for aplicável, atingir a maioridade mais cedo” (p.6). À semelhança dos anteriores, a presente convenção é baseada também no interesse da criança/jovem e tem como principal objetivo assegurar o pleno bem-estar da mesma. No que respeita à delinquência juvenil defende o artigo 40º da presente convenção que a criança/jovem que seja considerada suspeita, seja acusada ou que lhe seja reconhecida culpa tem direito às garantias mínimas de natureza processual, sejam elas a presunção da inocência, notificação da acusação, direito ao silêncio, patrocínio judiciário e, por fim, presença dos pais. Assim, o jovem tem direito às garantias acima descritas, bem como a uma assistência jurídica ou outra adequada à sua defesa.

Um outro marco importante no que respeita à abordagem jurídica da delinquência juvenil é datado de 1990 e relaciona-se com os Princípios Orientadores das Nações Unidas para a prevenção da delinquência juvenil (Princípios Orientadores de Ríade). Adotados e proclamados pela Assembleia Geral das Nações Unidas na sua resolução 45/112, de 14 de dezembro de 1990, foram redigidos com o principal objetivo de prevenir a delinquência juvenil e, consequentemente, prevenir o crime. Defendem que a prevenção tem que ser um objetivo comum e só será bem-sucedida se for desenvolvida por toda a comunidade. Com isto, é pretendida a promoção da personalidade e desenvolvimento do jovem, bem como o respeito pela mesma, mas também o reconhecimento da necessidade de aplicação de políticas progressivas de prevenção da delinquência, cujo objetivo principal passa pela redução da motivação, necessidade e oportunidades para a prática de comportamentos delinquentes.

Seguem-se as Regras das Nações Unidas para a Proteção dos Jovens Privados de Liberdade (Regras de Havana), adotadas pela Assembleia Geral das Nações Unidas na sua resolução 45/113, de 14 de dezembro de 1990. Defendem

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principalmente que a prisão deve ser vista como medida de último recurso, visto que o sistema de justiça de jovens deverá, como principal objetivo, defender os direitos e a segurança dos jovens e, como tal, propiciar o bem-estar físico e mental, compatíveis com os direitos humanos e as liberdades fundamentais. Tutelam também que as crianças e jovens só deverão ser privadas de liberdade com base nas presentes Regras, bem como nas Regras de Beijing acima enunciadas.

Sucedem-se as Regras Mínimas das Nações Unidas para a elaboração de medidas não privativas de liberdade, datadas de 1990, e mais conhecidas como as Regras de Tóquio (adotadas pela Assembleia-Geral das Nações Unidas na sua resolução 45/110, de 14 de dezembro de 1990). Estas visam a promoção do recurso a medidas não privativas de liberdade, bem como as garantias mínimas para aqueles que são submetidos a medidas de pena de prisão. São delineadas com o principal objetivo de promover o equilíbrio entre os direitos de cada delinquente, os direitos das vítimas e as preocupações da sociedade quanto à segurança pública e à prevenção do crime.

Em 2013, surgem as Diretrizes do Comité de Ministros do Conselho da Europa sobre a justiça adaptada às crianças, adotadas pelo Comité de Ministros do Conselho da Europa em 17 de novembro de 2010 e exposição de motivos. Estas integram o Programa do Conselho da Europa «Construir uma Europa para e com as Crianças», concebido para garantir e promover os direitos humanos das crianças e protegê-las contra todas e quaisquer formas de violência. As regras e princípios acima descritos visam o encorajamento dos tutores a assumirem as suas responsabilidades enquanto representantes legais dos jovens. Com isto, os principais objetivos europeus passam por formar operadores de processos em direito de menores, fomentar e desenvolver processos de desjudicialização, evitar a detenção preventiva, evitar a privação da liberdade e considerá-la como último recurso, reforçar as garantias processuais e fomentar novas medidas que sejam executáveis em comunidade.

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As reações sociais dependem dos marcos etários e da consumação de factos. Em indivíduos com idades inferiores a 12 anos, a sociedade reage de forma protetiva no sentido em que, segundo a edificação do sistema penal, a criança pode estar em perigo (segundo o art.3º, alínea 2 da LPCJP). Nas idades compreendidas entre os 12 e os 16 anos, a sociedade reage educativamente, visando a reeducação e reinserção do jovem na comunidade. E, por fim, em indivíduos com idades superiores a 16 anos, a sociedade reage de forma punitiva.