• Nenhum resultado encontrado

1.2. Da delinquência juvenil

1.2.2. Família, escola e grupo de pares

É na fase da adolescência que os indivíduos tendem a adotar comportamentos desviantes e de risco como veículo de teste dos seus limites, obtenção de liberdade e desenvolvimento da autonomia, do mesmo modo que colocam à prova o autocontrolo e o controlo social (Silva, 2016).

O autocontrolo, por sua vez, foi considerado por Gottfredson e Hirschi (1990) em Teoria Geral do Crime como o principal responsável pela origem e prática dos comportamentos delinquentes. Afirmam ainda que estes mesmos comportamentos proporcionam ao sujeito momentos de excitação e prazer imediato, sendo que são fundamentalmente atraídos indivíduos com baixo autocontrolo cujos comportamentos eram geralmente impulsivos e egocêntricos. Segundo Cusson (2011), os delinquentes reincidem com a ânsia de, não só recolher os ganhos materiais, mas também sentir o prazer e a euforia que o crime lhes proporciona: “A noção de estilo de vida delinquente deixa adivinhar a razão de uma minoria de criminosos reincidirem vezes sem conta: esta vida é fácil, excitante, divertida, apaixonante, e a delinquência faz parte integrante dela.” (p.136).

Porém, outros autores como Longshore, Turner e Stein (1996) e Pratt e Cullen (2000) rejeitam a ideia de que o autocontrolo é a principal causa de

30

práticas transgressivas, defendendo que a ausência de autocontrolo potencia a prática de comportamentos desviantes, mas não obriga à sua ocorrência. A prática de condutas desta natureza é influenciada por vários fatores que condicionam o desenvolvimento individual e social dos jovens, reunindo um vasto leque de impulsionadores sejam eles fatores individuais, bioantropológicos e sociais. Estes podem ser divididos em duas tipologias motivacionais: motivações internas e motivações externas.

As motivações internas são intrínsecas ao agente e podem resultar de fatores individuais (existência ou não de anomalias mentais e/ou comportamentais que condicionem o discernimento, garantindo uma aptidão inata à prática de delitos, contemplando o baixo QI, o insucesso escolar, comportamentos como a hiperatividade e/ou a impulsividade) ou sociais (a pobreza, racismo, baixa escolaridade e desigualdade socioeconómica). A par destas, situam-se as motivações externas, que ocorrem externamente ao agente; podem resultar de fatores familiares (fruto de uma pobre supervisão parental, disciplina inconsistente e/ou marcada pelo autoritarismo, negligência ou abuso físico na infância, pobre vinculação afetiva e envolvimento criança-pais, conflitos parentais), escolares (fraca vinculação, absentismo, abandono escolar e comportamento antissocial e delinquente em contexto escolar), ou socioeconómicos e sociais (como a pobreza, o fato de residir em zonas socialmente “vulneráveis”, o que pressupõe a acumulação de desvantagens sociais e de elevados índices de comportamentos delinquentes e de desordem social) (Castro, 2012).

As relações familiares são as mais importantes, pois são estas as primeiras com as quais a criança/jovem tem contacto após o nascimento e que perduram durante a fase da adolescência. Laraia (1986) defende que “qualquer criança humana normal pode ser educada em qualquer cultura, se for colocada desde o início em situação conveniente de aprendizado" (p.17). São estas relações fulcrais na compreensão e investigação da eclosão da delinquência juvenil, uma vez que a influência protetora da relação-família, como primeiro autor de socializador, se

31

molda em três elementos basilares: a supervisão parental, o estabelecimento das figuras parentais (tutores) e a comunicação entre progenitores e filhos (Ferreira, 1997). Segundo Nardi e Dell’Aglio (2010), as práticas educativas parentais ineficientes são os primeiros determinantes do comportamento antissocial. Mediante uma postura e vínculos familiares elencados em comunicação, compreensão e tolerância, os jovens jamais se sentiriam inseguros e abandonados, diminuindo a probabilidade de tentarem conquistar ou afirmar a sua identidade e aceitação noutros grupos sociais. Assim, e de acordo com Patterson, Reid e Dishinon (1992), é esta a primeira etapa do modelo de desenvolvimento do comportamento antissocial que delinearam.

O fator que se segue é a escola. Jovens com fraco aproveitamento ou sucesso escolar tendem a adotar comportamentos desviantes, uma vez que não estabelecem um laço afetivo com os professores, os colegas e o meio escolar em si, o que conduz ao termo indisciplina (que pode estar na base da compreensão da violência nas escolas). Creem Patterson, Reid e Dishinon (1992) que o período de entrada para a escola constitui a segunda etapa do modelo de desenvolvimento do comportamento antissocial, sendo esta etapa é caraterizada como o momento de transição em que a criança/jovem alarga o seu leque de relações e inicia relações sociais fora do contexto familiar. Conforme Ferreira (1999), a escola acentuou o isolamento dos jovens, procurando afastá-los da mediação adulta. Este isolamento conduz ao reforço das relações e comunicação entre os grupos de pares, contribuindo para o aparecimento de comportamentos e influências responsáveis pelo desenvolvimento e afirmação da identidade individual.

Como resultado da etapa supra, segue-se o terceiro fator: o grupo de pares. Intimamente ligado com o fator escola, através das carências familiares e académicas, o jovem sente-se motivado a procurar um grupo que o aceite e que partilhe as mesmas crenças e comportamentos. No ambiente escolar, o jovem estará exposto a outros indivíduos oriundos de diferentes origens económicas, culturais, religiosas. De acordo com Ferreira (1999), numa primeira fase o jovem

32

procurará estabelecer contacto e comunicar com pessoas provindas do mesmo meio social e económico do qual todo aquele que for diferente pode originar conflitos. Numa segunda fase, o jovem procurará criar laços com pessoas diferentes, cujas trajetórias de vida são distintas. É nesta fase que o fator escola exerce controlo, no caso particular dos jovens que sofrem de uma forma permanente de carências sociais.

Uma vez que as relações familiares podem influenciar positiva ou negativamente o adolescente (se o jovem não recebe afetos e atenção familiar), este procura obter os mesmos junto de outros grupos sociais que tendencialmente são grupos caraterizados pelas mesmas falências sociais e que possuem comportamentos desviantes (Carvalho, 2012).