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PARTE I FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

2. Fundamentos teóricos sobre inovação

2.2. As abordagens teóricas sobre inovação

2.2.4 A abordagem sistémica da inovação

Esta abordagem surge nos finais da década de 80 e vem dar relevância a determinados fatores externos, que influenciam e determinam o processo de inovação, permitindo revelar uma ligação entre esta abordagem e a teoria evolucionista (Edquist, 2001a), à qual Lundvall (1992) associa o próprio desenvolvimento do conceito de inovação. As teorias de inovação mudaram, desde a abordagem linear até à identificação da natureza interativa e sistémica do processo (Lundvall, 1992; Nelson,1993; Rothwell, 1994; Edquist, 2005), que atribui progressos acerca da performance inovadora e económica dos países. Autores como Anderson et al. (1994); Achrol (1997); Ford et al. (1998); Achrol e Kotler (1999) realçam o surgimento de substanciais mudanças no mundo dos negócios, reconhecendo que as empresas apresentam um grau de envolvimento muito intenso (em inglês “embedded”) em relações interorganizacionais e redes de cooperação com outras organizações. Nesse sentido, destacam-se, desde logo, o processo

de aprendizagem e a interação entre utilizador-produtor, naquela que é a relação entre sistema de inovação e teoria de inovação. São os contributos de autores como Kaufmann e Tödtling (2001) que mostram que o processo de inovação não depende apenas de um único sistema, contando pois com a participação de três sistemas sociais, que interagem entre eles, mas que não se sobrepõem – sistema político, sistema de indústria (negócios) e sistema de ciência. Entende-se assim que o processo de inovação é um processo interativo, de cooperação entre os diversos elementos que integram cada um dos três sistemas.

De acordo com as perspetivas de Cassiolato e Lastres (2000) e de Johnson, Edquist e Lundvall (2004), a abordagem sistémica da inovação está fortemente orientada em processos de desenvolvimento interdependentes e não lineares, através dos quais as inovações surgem no contexto das empresas e organizações sob uma forma partilhada e que envolve uma diversidade de agentes, que interagem através de um conjunto de relações socioeconómicas, cuja complexidade e intensidade dependem do meio onde se encontram inseridos.

Galende e Fuente (2003) e Caloghirou et al. (2004) revelam e sugerem uma combinação de influências para o desempenho da inovação, integrando o ambiente externo da empresa e o seu ambiente interno. Perante tal perspetiva, no âmbito da abordagem sistémica da inovação, surgem assim conceitos que têm vindo a ser desenvolvidos ao nível de investigações académicas, como o Sistema Nacional de Inovação e o Sistema Regional de Inovação, que serão aprofundados a seguir:

a) O Sistema Nacional de Inovação (SNI)

Surge na década de 80 o conceito de Sistema Nacional de Inovação (SNI), sob a análise de Lundvall (1985), que lhe deu ênfase, com o objetivo de descrever a relação e a interação entre o sistema de produção das empresas, os laboratórios de I&D e as instituições tecnológicas. Mais tarde, Freeman (1987:1) descreve o conceito como a “rede de relações de instituições do setor público e privado, cujas atividades, interações iniciais e importações modificam e difundem as novas tecnologias”.

No âmbito do Sistema Nacional de Inovação, a inovação não pode ser limitada à interpretação restritiva de determinadas empresas, essencialmente, as de produtos. Por essa razão, diversos autores estudaram a inovação no seu sentido mais amplo, orientando as suas investigações para o reconhecimento de que a inovação não é limitada ao comportamento das empresas altamente tecnológicas, ou a organizações de investigação científica avançada, mas também aos fatores que influenciam e determinam a capacidade tecnológica nacional (Nelson e Rosenberg, 1993), não descurando, no entanto, que o conceito de Sistema Nacional de Inovação tem em linha de conta o conjunto de instituições que estão mais diretamente relacionadas com as atividades do sistema científico (Freeman, 1992).

Sobre as interações existentes, Lundvall (1992) e Edquist (2001b) defendem que essas interações entre os diversos intervenientes do sistema de inovação devem figurar com repercussões económicas, ao nível da disseminação e partilha de conhecimento num determinado território nacional.

Em complemento da teoria de Lundvall (1992), Nelson (1993) atribui especial enfoque à análise empírica de 15 países, o que lhe permitiu perceber que o desempenho inovador das empresas é determinado pelas interações entre um conjunto de instituições (Nelson e Rosenberg, 1993:4), e também que os Sistemas Nacionais de Inovação são diferentes de país para país e fortemente dependentes “da estrutura económica, base de conhecimentos e instituições específicas”.

Segundo Lundvall (1992), as limitações desta abordagem prendem-se, essencialmente, com os limites geográficos de cada país, admitindo que as interações no contexto nacional são ditadas pela partilha do mesmo espaço, da mesma história, da mesma linguagem e instituições políticas e sociais. Outra das limitações reconhecidas aos Sistemas Nacionais de Inovação é que estes dependem fortemente do apoio e financiamento dos governos. Contrariamente, os sistemas de inovação são mais difíceis de delimitar (Rip e Van der Meulen, 1996), já que as ligações e dependências não são definidas por fronteiras nacionais e jurisdições nacionais, mas sim pelos padrões de inovação (Pavitt, 1984), pelas estruturas setoriais, pelas estratégias e outras alianças (Hagedoorn e Schakenraad,1990; Duysters e Hagedoorn, 1996), e por redes industriais (Hakansson e Snehota, 1995). Contudo, os governos nacionais assumem também um papel relevante, nomeadamente na regulamentação de apoio e na criação de normativas, bem como na criação de infraestruturas de suporte à inovação e na manutenção de instituições relacionadas com a I&D (Rip, 2002).

Entretanto, acerca dos Sistemas Nacionais de Inovação, autores como Archibugi, Denni e Filippetti (2009) defendem que, independentemente do contexto nacional, qualquer que seja o sistema, este requer, à partida, conhecimento e capital de financiamento, para que tal se venha a repercutir em ganhos efetivos e resultados positivos, o que, por sua vez, depende, desde logo, de uma gestão coerente e harmoniosa destes dois fatores. Ainda, Etzkowitz (2008) menciona a relevância das interações (cooperação) no seio dos Sistemas Nacionais de Inovação, sendo que estas são, efetivamente, complexas e muito importantes para a criação, disseminação e difusão do conhecimento. O mesmo autor conclui assim que esse processo de interações define aquilo que designa de ‘a eficiência do empreendedorismo científico’.

b) O Sistema Regional de Inovação (SRI)

O plano regional remete as investigações para a análise da evolução do espaço geográfico, ao longo de diferentes trajetórias, que são influenciadas por um conjunto de fatores políticos, sociais, económicos e de interligação com outras regiões. Essa combinação de fatores

determina, de acordo com Cooke, Uranga e Etxebarria (1997), a capacidade e o nível de competências internas, orientando os territórios para uma trajetória de competitividade e de coesão, o que também permite diferenciá-los de acordo com essa especificidade, comparativamente com outros territórios e regiões. Assim, as dinâmicas regionais são cada vez mais reconhecidas no processo de inovação (Bajmócy, et al., 2013), o que não invalida a importância do plano nacional (Bruijn e Lagendijk, 2005).

A inovação não é apenas um processo que ocorre no espaço mas também um processo que é determinado por circunstâncias endógenas das regiões (Storper, 1997; Ács et al., 2000; Asheim e Gertler, 2005), isto é: a localização espacial dos agentes, quer seja pela proximidade quer seja pelos efeitos de aglomeração, é um fator de elevada importância no processo de inovação.

O Sistema Regional de Inovação (SRI) apresenta-se como um conjunto de redes entre agentes públicos e privados que interagem num território específico, aproveitando as suas próprias infraestruturas para se adaptarem, gerirem e criarem conhecimento e inovação (Cooke et al.,1997; Braczyk et al., 1998; Yam et al., 2011). Autores como Bajmócy, et al., (2013), defendem mesmo que os efeitos positivos da inovação dependem consideravelmente da situação de bem-estar da região. Não é só a capacidade inovadora, refletida na eficácia do sistema de inovação, que importa, mas também a situação de bem-estar e a capacidade da sociedade de se adaptar às mudanças que devem ser consideradas. Assim, os Sistemas Regionais de Inovação assumem, de acordo com o contexto regional, diferentes configurações, não existindo uma abordagem única para os caraterizar (Tödtling e Trippl, 2005).

Cooke e Piccaluga (2004) sugerem que o Sistema Regional de Inovação contempla as universidades, as empresas, os ativos locais de inovação, a política regional e os subsistemas de governança. Já Tödtling e Trippl (2005) defendem que o mesmo inclui a política regional, vertical e horizontal em rede, com as empresas industriais e a geração de conhecimento e os respetivos agentes de difusão. Porém, Buesa et al. (2010) sugerem que o Sistema Regional de Inovação consiste no ambiente regional de inovação, incluindo as universidades, as administrações públicas, o ambiente nacional e as empresas inovadoras. Posteriormente, Chen e Guan (2011) propõem incluir nestes sistemas os recursos inovadores, as instituições e condições de enquadramento, as saídas inovadoras e a comercialização.

No plano atual, um dos principais objetivos da economia política das regiões é o aumento do desempenho inovador. Por um lado, as regiões têm vindo a atribuir um papel cada vez mais preponderante à inovação nas suas estratégias de desenvolvimento. Por outro lado, é possível constatar aquilo que Koschatzky (2005) denomina de ‘a regionalização da política de inovação’. Nesta ótica, a política de inovação incide sobre o tempo e a localização específica

como sendo os fatores que influenciam o processo de inovação: o sistema de inovação (Bajmócy, et al., 2013). Um dos mais relevantes argumentos desta vertente da literatura é que o processo de inovação é influenciado por uma multiplicidade de fatores que são interdependentes (Nelson e Rosenberg, 1993; Lundvall et al., 2002; Edquist, 2005). O sistema abrange os agentes económicos, as instituições, e um conjunto de elementos com ligações e interações, tanto a nível nacional (Nelson e Rosenberg, 1993; Lundvall et al., 2002; Edquist, 2005; Johnson, 2008) como subnacional (Doloreux, 2002; Doloreux e Parto, de 2005; Tödtling e Trippl, 2005).

Para Cooke, Uranga e Etxebarria (1997) as políticas regionais surgem assim para auxiliar o financiamento da inovação devendo, então, ser direcionadas para garantir melhores relações interorganizacionais, bem como para minimizar as incertezas no mercado. No entanto, a maioria das regiões não tem capacidade financeira para a construção de infraestruturas básicas de suporte à inovação. É, por isso, relevante conhecer o potencial de influência das regiões acerca da criação dessas infraestruturas básicas, que são fulcrais para definir um Sistema Regional de Inovação.

A propósito da relação dos sistemas de inovação com a capacidade das empresas em assimilar o conhecimento e a informação externos com o seu conhecimento interno, o que designam de capacidade de absorção (tema aprofundado no ponto 2.4.3.), bem como a aprendizagem organizacional, Lau e Lo (2014) apresentam três componentes que integram um Sistema Regional de Inovação (RIS - Regional Innovation Systems):

1) As iniciativas regionais de inovação (RII - Regional Innovation Initiatives);

2) Os serviços intensivos em conhecimento de negócio (KIBSs - Knowledge-Intensive

Business Services);

3) As fontes de informação da cadeia de valor (value chain information sources).

Segundo esta classificação de Sistemas Regionais de Inovação, as três componentes descritas afetam a capacidade de absorção das organizações, e essa mesma capacidade determina o desempenho da inovação das empresas (Lau e Lo, 2014). Asheim e Vang (2006) referem mesmo uma capacidade de absorção coletiva de uma região, ao nível físico, social, humano e financeiro (Figura 4).

Figura 4 – Os Sistemas Regionais de Inovação e a capacidade de absorção

Fonte: Elaboração própria.

Partindo da capacidade individual para a coletiva, a capacidade de absorção de uma organização dependerá assim da capacidade individual dos seus membros. Dessa forma, o desenvolvimento da capacidade de absorção vai ter repercussões nos efeitos cumulativos que partem do conhecimento individual (Cohen e Levinthal, 1990), o que é sintetizado na Figura

4.

Os serviços intensivos em conhecimento de negócio (KIBSs) são determinantes para o Sistema Regional de Inovação (Muller e Zenker, 2001), e dizem respeito aos serviços que se destinam a resultar na criação, acumulação ou disseminação do conhecimento (Miles, 2005). Nesta ótica, para melhorar o seu desempenho ao nível da inovação, as empresas precisam de ter a capacidade interna para aprender e melhorar, que pode ser complementada com a intensidade e a proximidade de redes, bem como com os meios institucionais de suporte (Romijn e Albaladejo, 2002; Galende e Fuente, 2003). No entanto, autores como Cohen e Levinthal (1990) defendem que, para além das estruturas de conhecimento, importa também considerar o tipo de conhecimento que os agentes envolvidos devem possuir no sentido de incrementarem a capacidade de absorção organizacional. Mais ainda, os mesmos autores referem a importância de uma consciência coletiva, no seio das organizações, para a aquisição de competências complementares, quer seja dentro ou fora das organizações, no sentido de estimular a capacidade para inovar.

Doloreux e Shearmur (2013) concentraram parte da sua investigação nas abordagens mais antigas que consideravam as fontes de conhecimento externas, tanto num sentido geral como

Iniciativas regionais de inovação Serviços intensivos em conhecimento Fontes de informação SRI Capacidade de Absorção Empresas Conhecimento interno Conhecimento externo Desempenho da Inovação Capacidade de Absorção Coletiva

do ponto de vista científico, associadas aos centros de investigação e conhecimento, focando- se basicamente nos serviços intensivos em conhecimento e negócio (KIBSs) como sendo os impulsionadores da inovação no seio das empresas. Entretanto, os autores levaram também em consideração o interesse mais recente na análise dos serviços intensivos em conhecimento e negócio (KIBSs), admitindo que têm vindo a revelar um papel cada vez mais relevante na economia (Maroto-Sanchez e Cuadrado-Roura, 2009). Também, Martinez-Fernandez (2010); Sundbo e Toivonen (2011); Di Maria et al. (2012) manifestam a importância desses serviços intensivos em conhecimento e negócio (KIBSs), nomeadamente no seu papel ao nível da performance de desenvolvimento, na capacidade de absorção e na consequente aplicação de novos conhecimentos nos processos de inovação das empresas, das organizações e dos territórios.