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Academia Imperial de Belas Artes

CAPÍTULO 2: HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO PARA A ARTE NO BRASIL

2.2. A Formação Oficial em Artes Visuais

2.2.2. Academia Imperial de Belas Artes

Em 1808, por causa das Guerras Napoleônicas, a Família Real e a corte portuguesa transferem-se para o Rio de Janeiro, nova sede do Império naquele momento. A cidade não estava apta a receber esse contingente de nobres habituados aos modos de viver e morar da Europa. Para tanto foi necessária a instalação de instituições públicas e privadas, resultando em um marco sem precedentes na área cultural. (MONTEZUMA, 2002).

O príncipe regente D. João, ao mesmo tempo em que negociava com a Inglaterra após a queda de Napoleão (1815), encarrega o embaixador português na França de entrar em contato com o naturalista alemão Alexander Von Humboldt que conhecera a Colônia, para que este indique artesãos e artistas do Instituto de França, para organizar uma pinacoteca e iniciar o ensino das Belas-Artes no Rio de Janeiro. Joachim Lebreton, Secretário Perpétuo do Instituto da França importante intelectual e connaisseur do cenário artístico europeu, e mal visto naquele momento

por ser bonapartista, reúne e chefia o grupo composto por ―sete professores de arte, com três auxiliares e mais seis mestres artífices, como serralheiros, ferreiros marceneiros, fabricantes de carros, curtidores de peles finas, etc‖. (LEMOS, 1977, p. 108). Os integrantes da intitulada ―Missão Artística Francesa‖ desembarcam no Rio de Janeiro, em março de 1816, tendo como um dos principais objetivos a profissionalização e formalização do ensino da arte no Brasil (BARBOSA, 2002; REQUIÃO, 2007).

Nas artes visuais os principais integrantes a serem destacados são: o arquiteto Auguste Henry Victor Grandjean de Montigny, os pintores Nicolas Antoine Taunay (paisagens) e Jean Baptiste Debret (história), os escultores Auguste Marie Taunay, Marc Ferrez e Zépherin Ferrez sendo este último também gravador de medalhas e o gravador Simon Pradier. (XEXÉO, 2007).

Um dado importante é que a missão francesa se inscreve num quadro mais amplo do que a mera circunstância da Corte no Brasil. Foi, na verdade, parte de um processo de rompimento com a arte colonial barroca, mestiça e autodidata. Foi também o coroamento de uma nova concepção de arte, integrada no contexto mundano- aristocrático do Rio de Janeiro dos começos do século XIX. A serviço de interesses seculares, a arte, segunda as idéias trazidas pela missão francesa, deveria ser aprendida em academias. Como já dissemos, ela se destinou a introduzir o ensino artístico sistemático no país. (LOPEZ, 1988, p.15).

A escola de arte fundada pelos integrantes da ―Missão Artística Francesa‖ passa por várias denominações que indicam a postura adotada pelo governo em relação à política cultural e ao ensino oficial das artes e ofícios. Em decreto de 1816, denominada de Escola Real de Ciências, Artes e Ofícios, seguindo o planejamento de Lebreton, nos cânones das experiências de Bachelier em Paris, voltada às artes aplicadas, às atividades técnicas e à indústria (BARBOSA, 2002).

Tal escola tem como objetivo formar, não apenas burocratas, mas homens capazes de concorrer para a ―subsistência, comodidade e civilização dos

povos‖17 e de tirar o máximo partido dos produtos da natureza, se afastando de uma

simples economia de subsistência. (CUNHA, 2005, p.80).

Em decreto de 1820, é denominada Academia Real de Desenho, Pintura, Escultura e Arquitetura Civil, seguida um mês depois pela denominação de Academia de Artes, e em 1826, Academia Imperial de Belas-Artes. As modificações de nome refletem a mudança metodológica do ensino da arte como disciplina supérflua e destinada a erudição e refinamento. Após a proclamação da República receberá o nome de Escola Nacional de Belas Artes (ENBA) nome que permanece até hoje. (BARBOSA, 2002).

Uma vez que a arte como criação, embora atividade manual, chegou a ser moderadamente aceita pela sociedade como símbolo de refinamento, quando praticada pelas classes abastadas para preencher as horas de lazer, acreditamos que, na realidade, o preconceito contra a atividade manual teve raiz mais profunda, isto é, o preconceito contra o trabalho, gerado pelo hábito português de viver de escravos. (BARBOSA, 2002, p. 27).

A AIBA enfrenta forte rejeição social em termos políticos, pois os membros da Academia eram todos franceses e bonapartistas, acrescido os ciúmes provocados aos portugueses que não possuíam uma Academia de Arte de qualidade como a formada no Rio de Janeiro. Outro preconceito relacionado à Missão Artística Francesa é de ordem estética, contra o formalismo e a racionalidade do neoclassicismo, imposto como estilo hegemônico em substituição ao barroco e o rococó, extremamente emocional e considerado como uma manifestação artística brasileira. (BARBOSA, 2002; XEXÉO, 2007).

Sua contribuição para a laicização da Arte foi importante, mas não o foi para a sua democratização. Baseando-se no culto à beleza, na crença acerca do dom e em árduos exercícios de cópia, tornou a Arte acessível somente a alguns ―poucos felizes‖. Os aristocratas eram incumbidos de apenas apreciar e comprar, deixando aos artistas estrangeiros o monopólio da criação e a conquista do artista nativo. (BARBOSA, 1997, p. 41).

Em 1855, Araujo de Porto Alegre, diretor da AIBA durante um período de três anos, faz uma tentativa de reforma no método de ensino aproximando-o do plano de Lebreton, formando classes de artistas e artesãos. Para os primeiros, a formação era composta de mais disciplinas, inclusive de caráter teórico, quanto aos artífices o foco era destinado ao desenho aplicado. Essa reforma devido ao curto período de Porto Alegre na direção da AIBA, não se solidifica, sendo implantado em 1860, um curso noturno para as classes desfavorecidas, no qual há uma simplificação curricular, transformando-se em mera aplicação técnica. (BARBOSA, 2002).

O ensino da arte no Reinado e no Império como da Educação Brasileira em geral, tem como prioridade o grau superior, ou seja, a formação de ―uma elite que defendesse a Colônia dos invasores e que movimentasse culturalmente a Corte‖, sendo considerado como a base para o desenvolvimento do ensino primário e secundário (BARBOSA, 2002, p. 16).

Segundo Zanini (1983), o ensino da arte efetuado até meados de 1870, nas escolas secundárias é muito semelhante aos cânones da AIBA. Nas escolas particulares para meninos e meninas, a metodologia de ensino da arte era a cópia: para os retratos utilizavam como modelo pessoas ilustres ou imagens de santos, e para as paisagens empregavam estampas de paisagens europeias, esteticamente essas pinturas geraram a preferência a paisagens estranhas ao ambiente tropical em que essas crianças e jovens viviam.

Outras instituições são criadas tendo como objetivo o ensino do desenho técnico, como tentativa de preparação das classes populares para as artes aplicadas às indústrias, sem alcançar o público destinado, como a escola da Bahia (1818), a escola de Vila Rica (1817) e o Liceu de Artes e Ofícios de Betancourt da Silva no Rio de Janeiro (1831). (BARBOSA, 1987).

A partir de 1870 há no país um desenvolvimento econômico, e se sedimentam as ideias contestadoras contra a monarquia. Os abolicionistas, os republicanos e os liberais fazem críticas severas às políticas do Império, inclusive à política educacional. As artes visuais no país apresentam duas vertentes

relacionadas ao ensino das artes: a visão tradicional ligada às Belas-Artes destinadas às classes privilegiadas considerada como erudição, e o ensino defendido pelos liberais das Artes Aplicadas à indústria, e que após a abolição da escravatura e a modernização das técnicas de construção, começa a ser considerado como um meio de subsistência e preparação para o trabalho de um grande contingente de libertos.

A escola imperial das Belas-Artes inaugurou a ambigüidade na qual até hoje debate a educação brasileira – isto é, o dilema entre educação de elite e educação popular. Na área especifica de educação artística incorporou o dilema já instaurado na Europa entre arte como criação e técnica. (ZANINI, 1983, p.1078).

Neste momento, os intelectuais e os políticos, principalmente os liberais, entre eles Rui Barbosa, buscam as ideias e os métodos de ensino de arte implantado pelo inglês Walter Smith em Massachusetts (EUA). Na metodologia de Smith, o ensino do desenho geométrico deveria ser acessível a todos, pois é a base para o trabalho na indústria. Essa metodologia vem de encontro às ideias dos liberais que defendiam, ―primeiro aprender a trabalhar, depois aplicar as habilidades técnicas solucionando os problemas e dando forma concreta às criações individuais‖ (ZANINI, 1983, p.1081). O educador Abílio César de Pereira Borges publica um livro ―Geometria Popular‖, tendo como referência os exercícios propostos por Smith, utilizado nas escolas brasileiras até o final dos anos de 1950. (BARBOSA, 2002; ZANINI, 1983).

O desenho permanece como prioridade no ensino da arte no século XX, sendo utilizados métodos de ensino de desenho técnico como o traçado de barras decorativas, gregas e rosáceas, sob a influência da metodologia de Smith. O ensino que no final do século XIX era considerado inovador, com o passar do tempo e a sua repetição quase que automatizada, torna-se extremamente defasado. (ZANINI, 1983).