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Capítulo 3: Desenvolvimento Local e a Alimentação Escolar

3.3 Associação da Alimentação Escolar e Desenvolvimento Local

3.3.2 Principais Entraves

3.3.2.7 Acesso a Crédito

O financiamento rural tem impactos tanto sociais quanto econômicos, atuando de maneira decisiva no Desenvolvimento Regional. Ao mesmo tempo em que dá condições para que a pequena produção e agroindústria obtenham ganhos de escala dentro da unidade de produção, mantém as pessoas ocupadas, gera empregos e possibilidades para que a família permaneça no meio rural. Acessando o crédito rural, esses agentes produtivos locais têm como ampliar e qualificar as atividades que já desenvolvem, implementar novas atividades agrícolas e não agrícolas, adquirir máquinas, equipamentos e insumos, tornando-se mais competitivos no mercado privado e nas vendas para o governo.

No entanto, esse segmento, embora altamente empregador, foi tradicionalmente relegado pelo Estado, acarretando, entre outros problemas, o baixo acesso ao financiamento quando

comparado a outros segmentos da produção agropecuária. Esta situação resultou basicamente da descapitalização e do comprometimento da capacidade creditícia, principalmente do pequeno produtor brasileiro, destacando-se que, a partir de 1987, houve a diminuição crescente do crédito agrícola como um todo, principalmente para investimento.

No mesmo sentido, verifica-se também que os intermediários financeiros e comerciais privados ao serem grupos econômicos de grande porte, não buscam alternativas de investimento local para se financiar pelo retorno do uso produtivo das poupanças, preferindo transferir os recursos para as matrizes, localizadas em regiões mais desenvolvidas, deixando o município ou a região descapitalizada, o que favorece a perpetuação da concentração de renda (Instituto Cidadania, 2006).

Não obstante as linhas do PRONAF, e mais especificamente o PRONAF-infra-estrutura, tenham contribuído, em relação à produção familiar, para viabilizar o Desenvolvimento Local – ampliando o leque de ações e aumentando o volume de recursos de R$ 2,4 bilhões, em 2002, para R$ 5,6 bilhões, em 2004 (incremento de 134,2%) – ainda se verificam deficiências com relação ao acesso e cobertura da pequena produção que sempre esteve à margem do sistema financeiro. (MDA, 2006-a).

Para atenuar essa situação foram feitos esforços buscando desenvolver o crédito cooperativo, o rotativo amparado por legislação, o micro-crédito e a criação de agências de garantia de crédito, entre outros. Um bom exemplo dessa evolução foi o já citado programa de Desenvolvimento Regional Sustentável do Banco do Brasil, ao introduzir uma visão de apoio territorial integrado ao desenvolvimento, e o Programa Nacional de Micro-Crédito Produtivo Orientado, que conta atualmente com 158 instituições. Apesar de serem iniciativas significativas, ainda precisam ser ampliadas e integradas em um conjunto de medidas convergentes para o Desenvolvimento Local (Instituto Cidadania, 2006).

3.4 Conclusão

A agricultura familiar – incluindo o desdobramento para as pequenas agroindústrias – é um segmento heterogêneo e passível de várias tipologias. Neste capítulo procurou-se demonstrar os motivos dessa complexidade e definir os princípios básicos que norteiam a classificação adotada no trabalho.

O eixo central de caracterização é a inacessibilidade do segmento ao mercado concorrencial, mais especificamente, a sua impossibilidade de concorrer em processos licitatórios

com médias e grandes empresas. Ou seja, definiu-se aqui um segmento não ligado ao agronegócio, mas de importância crucial com relação aos aspectos econômico, social e ambiental para se alcançar um Desenvolvimento Local integrado e sustentável.

Alguns elementos foram considerados básicos nessa categorização: a gestão feita pela família, sendo seu trabalho preponderante; o modo de produção sustentável, que garanta a preservação do estabelecimento; e a classificação por parte dos agentes locais.

No apoio à economia local presente na legislação do PNAE, esse estrato tem um peso significativo, dada sua importância para o Desenvolvimento Local e vinculação com outras diretrizes preconizadas como o resgate da cultura local, respeito à vocação agrícola regional e a prática de bons hábitos alimentares. O segmento de que trata as resoluções do PNAE tem correspondência com o definido como objeto do presente estudo, principalmente em sua porção mais fragilizada, justamente devido à dificuldade de implementar essa associação por parte da administração pública local em vista da informalidade legal, típica dos segmentos mais marginalizados da agricultura familiar.

Quanto à terminologia adotada no trabalho, optou-se pela flexibilização de termos, usando-se “agricultura familiar”, “pequena agricultura” ou “pequena produção” para designar o conceito estabelecido.

Do ponto de vista da análise do Desenvolvimento Local/Territorial verificou-se que, nos últimos anos, a abordagem deixou de ser setorial para se ter uma estratégia territorial de desenvolvimento, incluindo novas dinâmicas e o realinhamento dos instrumentos tradicionais. O conceito de território foi além dos limites administrativos e espaciais, passando a ser visto como uma construção social na qual as características geográficas, ambientais, culturais, econômicas, políticas e institucionais são consideradas elementos de identidade da população para a coesão da região em uma unidade.

Uma das características da nova abordagem territorial de Desenvolvimento Local é a intersetorialidade e a integração das políticas públicas dos três níveis de governo. Nesse sentido, o PNAE apresenta vantagens bilaterais, pois, ao mesmo tempo em que contribui como instrumento de política de Desenvolvimento Local para a inserção produtiva e re-capitalização dos produtores da região sem acesso aos grandes mercados, o próprio programa se beneficia com uma alimentação escolar de melhor qualidade pelo uso de produtos in natura que, adquiridos localmente, apresentam melhores características nutricionais, microbiológicas e de aspecto.

Por outro lado, o resgate histórico dos estudos e conceituações sobre o processo de desenvolvimento territorial revelou a existência de duas linhas de pensamento antagônicas, que se diferenciam quanto à importância e necessidade da coordenação do Estado nas diferentes localidades do país e da centralização ou descentralização das políticas públicas.

Quanto às experiências de Desenvolvimento Local no país, destacaram-se os diversos exemplos de âmbito local cadastrados na FGV-SP, no Instituto Pólis e na Fundação Banco do Brasil, bem como as ações e programas de nível federal: o estudo “Eixos Nacionais de Integração e Desenvolvimento”, dos programas “Brasil em Ação” e “Avança Brasil”, parceria entre o MPOG e o BNDES (1997); o DLIS – Desenvolvimento Local Integrado e Sustentável, do programa Comunidade Ativa, do Governo Federal (1999); o ZEE – Zoneamento Ecológico- Econômico, do MMA (2000); o DRS – Desenvolvimento Regional Sustentável, do Banco do Brasil (2003); o PRONAF – Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (1996) e o PRONAT – Programa Nacional de Desenvolvimento Sustentável de Territórios Rurais (2003), do MDA; o SIMBRASIL, da CEF (2003); os CONSADs – Consórcios Intermunicipais de Segurança Alimentar e Desenvolvimento (2003); e os programas da PNDR – Política Nacional de Desenvolvimento Regional, do MIN (2004). Nessas ações, os principais pontos de insucesso diagnosticados foram: a falta de participação social ativa; a inexistência de institucionalidades regionais de concertação; a sobreposição de ações; e a carência de recursos e intersetorialidade.

Logo, a partir da apresentação das estratégias de Desenvolvimento Local/Territorial, em suas diferentes linhas de pensamento e também pela retrospectiva da experiência brasileira, supõe-se que a introdução do PNAE na política de Desenvolvimento Local pode ser considerada mais um componente importante da necessária transversalidade de ações e cooperação entre os agentes locais e esferas superiores no sentido de se chegar ao desenvolvimento pretendido. Acredita-se que o programa pode atuar como um mecanismo de inserção competitiva no mercado institucional de segmentos tradicionalmente marginalizados, com o objetivo de se alcançar melhorias significativas na eficiência e na competitividade sistêmica e, conseqüentemente, maior apropriação e circulação de riqueza nos municípios e localidades.

A presença do Estado como coordenador dessas ações é reforçada por um programa de âmbito nacional, com uma história de mais de 50 anos, de atendimento universal, o que lhe confere uma situação privilegiada de maior estabilidade e continuidade de ações em relação a mudanças de gestão e diferenças partidárias entre os níveis de governo. Além disso, a experiência de descentralização da sua administração desde 1994, considerando principalmente as

Prefeituras, lhe confere maior potencial de articulação das ações, bem como de abandono de metodologias e critérios que perpetuam a pobreza e a concentração de renda.

Apesar dessa potencialidade e longevidade, o PNAE, como instrumento de política de Desenvolvimento Local, por meio do apoio à agricultura familiar, tem sido relativamente pouco explorado. Ainda persistem entraves sérios que impedem a sua efetiva incorporação, de forma coordenada como: a questão da gestão terceirizada; a falta de regularidade jurídica e acesso a crédito dos agricultores familiares; a impossibilidade de concorrência no mercado institucional com outros fornecedores de maior porte; a carência de qualificação técnica e a baixa organização da produção e em cooperativas/associações do segmento. Para procurar entender os caminhos dessa associação, as experiências em andamento, de âmbito local e federal, devem ser mapeadas e analisadas para servir de base na formulação e aprimoramento das políticas públicas, o que será estudado no Capítulo 4 deste trabalho.

Capítulo 4: A Experiência Acumulada da Associação Desenvolvimento