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Actividades desenvolvidas para ultrapassar dificuldades

3. CUIDADOR INFORMAL FAMILIAR EM CONTEXTO HOSPITALAR

3.6. Actividades desenvolvidas para ultrapassar dificuldades

Os familiares quando assumem o papel de cuidador deparam-se com dificuldades inerentes a esta nova tarefa. Perante a situação indutora de stress, caracterizada pelo confronto com a dependência física de um membro da família, emergiram nos discursos produzidos pelos participantes, seis subcategorias, correspondentes às estratégias de

coping que os participantes utilizaram para lidar com a situação.

Para Bolander (1998, p.330) “… o stress é considerado como o processo de ajustamento

a circunstâncias disruptivas, ou que ameaçam sê-lo, do equilíbrio de uma pessoa”.

Assim, na perspectiva do referido autor, a forma como cada pessoa responde a situações de stress é mediada pela personalidade, percepção das fontes de stress e recursos de adaptação (coping). Neste sentido, a doença pode ser entendida como uma condição stressora, exigindo um esforço de confronto (coping). Folkman (1984) baseada nas

Área temática – Dificuldades do Cuidador

CATEGORIAS SUBCATEGORIAS UNIDADES DE REGISTO

Dificuldades do Cuidador

Cuidar na dependência

“…custa um bocado a gente ver aquilo, via a minha mãe andar, via a minha mãe a fazer tudo e agora vejo-a ali na cama, …” E1

“…porque a gente não sabe lidar, é um bebé mas em tamanho e peso muito maior, não é?” E2

“Na primeira fase é complicado porque eu estou habituada a ver a minha mãe a traquinar. Todo o dia, a ser ela auto-suficiente…” E4

“…estava habituada a chegar a casa e ver a minha sentada no sofá, ou então andar lá fora no meio das galinhas e isso custou-me muito, …” E1 “Depois da alta, eu pensava que não ia ser capaz de vê-la com a algália, a comer pela sonda, essas coisas todas, eu pensava que não era capaz, para mim não era capaz, …” E2

Cuidar sozinho

“ Olhe ontem até foi sozinha, que nem foi costume ser sozinha, …” E6 “…são coisas que eu sozinha não consigo fazer…” E4

Responsabilidade pela assunção do papel de PC

“…vou ter que fazer assim, o meu melhor” E3

“O meu medo é eu não ser… tenho medo que me vá abaixo e que não consiga, …” E2

Imprevisto

“…pensei que não ia conseguir, …” E1

“Depois da alta, eu pensava que não ia ser capaz (…), para mim não era capaz, …” E2

Financeiras

“…é muito dinheiro e eu não posso, (…) são cento e tal euros, como é que eu posso, para fraldas, que elas não dão fraldas” E3

definições de Lazarus, define coping como “os esforços cognitivos e comportamentais

para lidar, reduzir ou tolerar as exigências internas ou externas que são criadas por uma situação de stress” (p. 840).

A vasta investigação em torno do stress e do coping tem procurado perceber quais as exigências que os cuidadores informais enfrentam e como lidam com elas (Figueiredo, 2007).

Segundo o ICN “Coping é um tipo de adaptação com as características específicas: disposição para gerir o stress, que constitui um desafio aos recursos que o indivíduo tem para satisfazer as exigências da vida e padrões de papel autoprotectores que o defendam contra ameaças subjacentes que são apercebidas como ameaçadoras de uma auto-estima positiva; acompanhado por um sentimento de controlo, diminuição do stress, verbalização da aceitação da saúde, aumento do conforto psicológico” (2000, p.50). Ao

perceber a situação stressante (problema), a pessoa experimenta uma sensação emocional desagradável, procurando adoptar estratégias que minimizem o seu sofrimento.

As estratégias de coping podem ser diferenciadas, sob uma perspectiva cognitiva, em duas categorias: coping focalizado no problema e coping focalizado na emoção (Folkman e Lazarus, 1980). O Coping focalizado no problema é um esforço para agir contra o stress em si a fim de modificá-lo. O Coping focalizado na emoção é definido como um esforço para regular e aliviar o estado afectivo associado ao stress ou resultante do evento stressante.

Com o objectivo de ultrapassar as dificuldades, os entrevistados deste estudo adoptaram as seguintes estratégias: Enfrentar a situação/dependência, eliminação de barreiras

arquitectónicas, aprendizagem de capacidades, processo de coping/transição, preservar relação socioprofissional, atitude positiva/ optimismo, partilha do cuidar.

Ao enfrentar a situação/dependência, resignam-se ao momento vivido “… agora já

estou melhor e sei que agora é isto” (E1).

Por outro lado, também se reconhece a eliminação de barreiras arquitectónicas essencial para se adaptar à nova situação “… fazer a mudança, organizar a minha casa

para a poder receber, porque vou ter que modificar, tinha o meu escritório num quarto, agora vou ter que passar para a sala, …” (E4). Conforme legislado, “A promoção da acessibilidade constitui um elemento fundamental na qualidade de vida das pessoas…”

(Decreto-Lei nº163/2006 de 8 de Agosto). Contudo, as barreiras arquitectónicas são ainda hoje referidas como um dos principais factores limitativos de uma vida social completa para pessoas com dependência. Referem-se a todas as limitações que as

pessoas portadoras de deficiência encontram no seu dia-a-dia e que as impede de se deslocarem livremente “Vou ter no quarto que desarmar a cama porque é muito

acanhado para pôr lá a cama” (E3), causando um impacto significativo na sua vida. Estas

barreiras situam-se em vários locais, “Ele teve alta, pronto, começamos a tratar das

coisinhas, arranjar o quarto para ele” (E5), porém os participantes deste estudo salientam

a habitação como o local que necessita de modificações de forma a diminuir a dependência dos seus membros “Ao princípio quando me disseram que ela vinha para

casa, isto custou-me muito porque tinha de arranjar cama do hospital, (…), tive que pedir ao meu sobrinho para comprar o colchão, (…), tive que vender a mobília deles do quarto, porque não cabia as duas camas, tive que tirar aquelas roupas todas de fora, outras tive que arrumá-las, outras dá-las, (…), depois veio esta mobília deles, que eles agora têm, tive que pôr tudo outra vez no sítio e eu sozinha para tudo” (E1M3).

Com o propósito de facilitar a reintegração sócio-familiar e promover o máximo de autonomia do doente no domicílio, o Centro Hospitalar Póvoa de Varzim/Vila do Conde, disponibiliza a oportunidade de visitação domiciliária de enfermagem de reabilitação no âmbito do “Projecto de planeamento de alta hospitalar a doentes dependentes/visitação

domiciliária”, para reajustes e adaptações possíveis no espaço físico que irá receber o

doente.

Muitos dos participantes recorreu à aquisição de conhecimentos e aprendizagem de capacidades resultantes dos momentos de ensino proporcionados pelos enfermeiros do serviço de Medicina onde se encontra internado o familiar dependente “… nós é que

temos que aprender a dar-lhe de comer, aprender a virá-la, aprender a posicioná-la, aprender a lavá-la. Com a enfermeira eu aprendi a tratar dela” (E4), “Mas é (…) uma aprendizagem que tem de ser feita” (E4), de modo a poderem lidar melhor com a sua

situação. Segundo Folkman e Lazarus (1988), este conceito refere-se aos esforços de procura de suporte informativo, uma das competências do coping focalizado no problema e como nos refere um participante “…eu pensava que não era capaz, para mim não era

capaz, mas aprendi e sinto-me bem por ter aprendido e poder ajudá-la” (E2).

Processo de Coping/Transição

Coping é concebido como o conjunto das estratégias utilizadas pelas pessoas para se

adaptarem a circunstâncias adversas. Lazarus e Folkman (1986) definem coping como o conjunto de esforços cognitivos e comportamentais que estão em permanente mudança, desencadeados para fazer face às exigências internas ou externas que são avaliadas como atingindo ou ultrapassando os recursos da pessoa.

“O coping é um conceito de difícil definição, dadas as características inerentes à individualidade da pessoa, aos acontecimentos de vida e ao contexto onde ocorrem as situações problemáticas da vida humana” (Ferreira, 2006, p.19). Assim, “As pessoas que estão a responder ao stress de uma forma positiva estão a adaptar-se” (Bolander, 1998,

p.332). A adaptação à nova situação de saúde faz-se no sentido da manutenção do equilíbrio do seu sistema pessoal e familiar.

Os cuidadores consciencializaram as modificações da situação, as novas exigências, demonstrando vivenciar de forma saudável a transição, “Deitamos tudo para trás das

costas e é preciso andar para a frente” (E5), “Mas é uma adaptação que tem que ser feita…” (E4).

Preservar a relação socioprofissional é uma fonte de apoio para um cuidador. O relato evidencia que se refugia no emprego, como meio de se manter ocupado, distraindo-se e esquecendo temporariamente a situação de dependência do seu membro, “O que

também me fez, (…) foi eu não deixar o meu trabalho, como sou empregada de balcão lido com muita gente, falo, rio, …” (E1).

Esta conclusão é partilhada por Ferreira (2006), no estudo acerca das “Emoções e

estratégias de Coping face ao diagnóstico de doença oncológica”, que salientou a

importância dos participantes se distraírem em actividades profissionais, como estratégia para se abstraírem da situação de doença.

Emerge como estratégia de coping nos discursos dos participantes, manter uma atitude positiva/optimismo “Mas como também tive forças e o marido também ajuda e as

meninas, é mais fácil para mim” (E2), evidenciando a calma como forma de alcançar a

resolução da situação “Muita calma, muita paciência, que é o principal” (E1).

Os cuidadores referem também que uma das formas de ultrapassar as dificuldades se prende com a partilha do cuidar, através da ajuda de familiares de forma revezada, diminuindo a sobrecarga resultante desta tarefa “É assim, eu também não tenho o

trabalho todo e tenho o meu pai que olha por ela, sei o que o meu pai passa, dividimos, e não custa nem a um nem a outro” (E1).

Quadro 13 – Actividades desenvolvidas para ultrapassar dificuldades

Área Temática – Actividades desenvolvidas para ultrapassar dificuldades

CATEGORIAS SUBCATEGORIAS UNIDADES DE REGISTO

Actividades desenvolvidas para ultrapassar dificuldades Enfrentar a situação/dependência

“… agora já estou melhor e sei que agora é isto” E1

Eliminação de barreiras arquitectónicas

“Vou ter no quarto que desarmar a cama porque é muito acanhado para pôr lá a cama” E3

“… fazer a mudança, organizar a minha casa para a poder receber, porque vou ter que modificar, tinha o meu escritório num quarto, agora vou ter que passar para a sala,…” E4

“Ele teve alta, pronto, começamos a tratar das coisinhas, arranjar o quarto para ele” E5

“Ao princípio quando me disseram que ela vinha para casa, isto custou-me muito porque tinha de arranjar cama do hospital, não sabia onde era que me explicaram e tive que ir arranjar, tive que pedir ao meu sobrinho para comprar o colchão, que não vinha na própria cama, tive que ir comprá-lo, tive que ir de noite à farmácia Lusitânia, tive que vender a mobília deles do quarto, porque não cabia as duas camas, tive que tirar aquelas roupas todas de fora, outras tive que arrumá-las, outras dá-las, eu já não tinha onde deitar, depois veio esta mobília deles, que eles agora têm, tive que pôr tudo outra vez no sítio e eu sozinha para tudo” E1M3

Aprendizagem de Capacidades

“…eu depois indo para casa vou… com a prática vou ver”. E3

“… nós é que temos que aprender a dar-lhe de comer, aprender a virá-la, aprender a posicioná-la, aprender a lavá-la. Com a enfermeira eu aprendi a tratar dela” E4

“A primeira situação é aprendermos com alguém que sabe. E tentar aperfeiçoar para que realmente possamos ajudar a que a minha mãe tenha uma postura correcta, a que esteja mudada, a que não tenha feridas, a ter uma qualidade de vida como se ela estivesse a andar” E4

“…a dar-lhe de comer pela sonda” E5

“…eu pensava que não era capaz, para mim não era capaz, mas aprendi e sinto-me bem por ter aprendido e poder ajudá-la” E2

“Mas é (…) uma aprendizagem que tem de ser feita” E4 Processo de

Coping/Transição

“Deitamos tudo para trás das costas e é preciso andar para a frente” E5 “Mas é uma adaptação que tem que ser feita…” E4

Preservar Relação Socioprofissional

“O que também me fez, (…) foi eu não deixar o meu trabalho, como sou empregada de balcão lido com muita gente, falo, rio, …” E1

Atitude positiva/Optimismo “Mas como também tive forças e o marido também ajuda e as meninas, é mais fácil para mim” E2

“Muita calma, muita paciência, que é o principal” E1

Partilha do cuidar

“É assim, eu também não tenho o trabalho todo e tenho o meu pai que olha por ela, sei o que o meu pai passa, dividimos, e não custa nem a um nem a outro” E1

Em síntese, no sentido de lidar ou ultrapassar as exigências específicas da tarefa de cuidar, os participantes do estudo recorreram a algumas actividades e atitudes, por vezes conservando o optimismo, enfrentando a situação de dependência como algo inalterável, por isso consciencializaram a real situação e partiram para a aprendizagem de capacidades relacionadas com a necessidade cuidar do seu membro. Ao percepcionarem a sobrecarga decorrente desta tarefa, partilharam o cuidar com outros familiares e preservaram a relação socioprofissional.