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ADJECTIVOS CORRECTOS PARA OS PORTADORES DE DEFICIÊNCIA

No documento Cidadania e deficiência (páginas 63-68)

Uma das grandes questões da temática da deficiência é o de como chamar ou se quisermos designar estes cidadãos. De facto ao longo dos tempos tem havido várias transformações, sendo certo que a evolução de adjectivos a aplicar em relação a estes cidadãos têm tido uma favorável modernização. Questiona-se afinal qual é o termo mais correcto actualmente? Devemos chamar “deficiente”, “portador de deficiência”, “inválido”, “aleijado”, “cidadão com necessidades especiais”? Enfim ao que parece há uma evolução dos termos.

De acordo com o Doutor Romeu Sassaki, não existe nem nunca houve um termo correcto a aplicar a cidadãos desta natureza tanto no aspecto estático como no aspecto dinâmico. Agora há adjectivos em que se enquadram mais do que outros e actualmente é isso que procuramos analisar. Durante muitos séculos usou-se muito a palavra “inválido” tendo sido escritos livros, nomes de instituições, a legislação em vigor, os órgãos de comunicação social e no caso do Brasil alguns Decretos Federais, entretanto já redigidos por outros adjectivos. A primeira vista “os inválidos” tinha o significado de indivíduo sem valor, tendo-se usado este termo em pleno século XX mas já sem sentido negativo. Quem não se lembra da “Associação de Inválidos do Comércio”, ou “Associação dos Inválidos da II Grande Guerra Mundial”. Do ponto de vista valorativo os inválidos não tinham socialmente valor nenhum. Era alguém portador de deficiência extremamente inútil, sendo considerado como “persona não grata” pois não trabalhava, logo não produzia. O seu estado profissional era desempregado e não tinha valor nenhum dando prejuízo a sociedade.

64 Durante o Século XX apareceu a palavra, “incapacitados” que na sua origem queria dizer cidadãos sem capacidade. Passado algum tempo e após uma determinada evolução já se considerava os “incapacitados” como “cidadãos com alguma capacidade residual”. Nas pessoas deficientes com diferentes escalões etários foi normal o uso deste termo aparecendo outro: “os incapazes,” eram cidadãos com deficiência mas que não eram capazes de efectuar algumas tarefas devido a deficiência de que eram alvo. Deu-se um passo evolutivo na sociedade sendo certo que se tratou de um avanço significativo. Em termos de valor reconhecia-se que o portador de deficiência tinha de facto capacidade residual mas de certa forma diminuta. Não obstante a sociedade assumia que qualquer que fosse o tipo de deficiência, diminuía a capacidade do cidadão do ponto de vista social, psicológico, profissional e físico.

Nos anos sessenta aparece o termo defeituoso no Reino Unido tendo sido escrito um artigo num jornal inglês24.Também foi fundada nos anos cinquenta a AACD-Associação de Assistência á Criança Defeituosa, que actualmente se designa Associação de Assistência á Criança Deficiente. Também foi nos anos cinquenta que apareceu a APAE, unidades de Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais. A verdade é que o termo “defeituosos” foi ganhando o seu lugar naquela década e significava cidadãos com inconformidades, principalmente físicas. Por outro lado a palavra “deficientes” queria dizer que se tratava de cidadãos com anomalias do ponto de vista psicológico e físico, também ao nível da fala (mudos), surdos e cegos ou invisuais. Apesar destes defeitos nestes cidadãos eles procuravam dentro do possível executar as tarefas diárias tal e qual os cidadãos sem deficiência, tendo a sociedade reparado neste feito e aceitar melhor este grupo de indivíduos. Também nos anos sessenta aparece o termo “os excepcionais” que eram principalmente cidadãos com deficiências do foro mental. Apesar da aceitação do ponto de vista social a verdade é que estes três termos foram usados naquela década para diferenciar os vários tipos de deficiência. Em relação aos cidadãos sobredotados houve também associações em defesa deste grupo. Tratava-se de cidadãos com conhecimentos e sabedoria acima do normal. Tinham uma inteligência fora do comum sendo apelidadas de “cidadãos com altas habilidades” ou “cidadãos com indícios de grandes habilidades.” Muitos entendidos que constituíam associações na altura provou que o termo “excepcionais” não tinha só a ver com os cidadãos com debilidades mentais, sendo que aqueles que tinham inteligência a mais ou seja os sobredotados também faziam parte do grupo dos “excepcionais”. De realçar que 3 a 5% das

65 crianças na escola são sobredotadas, sendo certo que a maior parte dos professores nunca conseguiu identificar alguma delas25.

Com o passar do tempo houve uma viragem do ponto de vista social a partir de 1981 até cerca de 1987. Houve organizações de cidadãos com deficiência que terão exercido a sua pressão na O.N.U. de tal maneira que o ano de 1981 ficou conhecido como o “Ano Internacional das Pessoas com Deficiência”. Começou-se a usar a expressão “pessoas deficientes”, sendo certo que a partir de 1981 aboliu-se a palavra “indivíduos” quando se tratava de chamar os portadores de deficiência. Em termos valorativos só o facto do termo “pessoas” ser um substantivo, ajudou os portadores de deficiência a ter os seus direitos e gozarem da mesma dignidade em relação aos outros cidadãos sem deficiência, praticamente em todas as sociedades. A verdade é que o termo “pessoas deficientes”, do ponto de vista social foi bem aceite pala maioria das pessoas sendo certo que a imagem negativa acerca dos deficientes que existia até então tivesse sofrido elevadas melhoras. Também em 1980 a O.M.S. (Organização Mundial de Saúde) editou a Classificação Internacional de Impedimentos Deficiências e Incapacidades. Conseguiu assim reunir de uma forma tridimensional ao mesmo tempo e transversal em qualquer cidadão deficiente os Impedimentos, Deficiências, e Incapacidades. Não obstante a partir de 1988 muitos responsáveis de várias organizações de cidadãos com deficiência puseram em causa a designação “pessoa deficiente”, pelo facto de insinuar que a deficiência estava na pessoa toda o que não é verdade e efectivamente tinham razão. Dando um exemplo concreto um cego é deficiente de uma das vistas e não das pernas. Um cidadão que não consegue andar e está numa cadeira de rodas, não tem problemas ao nível psicológico. Estas tomadas de posição que duraram até 1993, verificou-se que foi escolhido o termo “pessoas portadoras de deficiência”, nomeadamente em territórios de língua portuguesa, que substitui o termo “pessoas deficientes”. Em termos práticos passou a ser conhecido como “portadores de deficiência”. O Doutor Sassaki argumenta que um portador de deficiência tem algo de valor consigo, logo a deficiência passou a ser um pormenor da pessoa. Esta expressão passou a fazer parte do vocabulário das Constituições federal e estaduais, como também em todas as leis avulsas e normativos adjacentes que mencionavam a deficiência. Foram realizadas reuniões, alguns colóquios, comissões políticas, Conselhos administrativos, e verdade é que o termo “portadores de deficiência” ganhava o seu espaço.

66 A partir de 1990 há transformações verificando-se mesmo uma evolução em matéria de deficiência. O artigo 5º da Resolução CNE/CEB nº2 de 11 de Setembro de 2001, (Conselho Nacional Educação/Câmara Educação Básica), dispõe de notas explicativas relativamente as necessidades especiais e a sua importância vital. As necessidades especiais provêm de três situações:

- As dificuldades de aprendizagem do aluno bem como as suas limitações nos vários processos de desenvolvimento gradual, envolvendo dificuldades não vinculadas a uma causa orgânica específica e dificuldades que se relacionam com as condições, disfunções deficiência e até limitações do cidadão em questão.

- As dificuldades de comunicação, e os vários sinais com o intuito de dialogar no caso dos surdos, mudos e ainda outros meios existentes.

- As questões de sobredotação.

Também na década de 90 é criado o termo “pessoas com necessidades especiais” por diversas associações, e instituições de portadores de deficiência. Inicialmente a intenção era deixar-se de usar a palavra “deficiência” e começar a usar o termo “necessidades especiais”. Não obstante a expressão “portadores de necessidades especiais” adquire o seu próprio espaço, tendo o seu objectivo próprio e nunca se ter deixado de falar em “pessoas com deficiência”. A questão das “necessidades especiais”, no início era apenas uma expressão criada há pouco tempo, sendo certo que com a vigência da Resolução nº2, passou a englobar pessoas deficientes e outras pessoas com outro tipo de desvantagens. Também nesta década foram surgindo outros adjectivos como “alunos especiais”, “crianças especiais”, no fundo para retirar o impacto acutilante de palavras como “deficientes”, “alunos aleijados” e outras expressões com conotações mais severas. O termo “pessoas especiais” é consequência de uma redução de expressão “pessoas com necessidades especiais”, e por si só não designava um sector de pessoas da sociedade específico, pelo que se tornava mais positivo. Como já vimos as pessoas com necessidades especiais podem ser deficientes e outro tipo de pessoas. Em termos de valor convenhamos que é menos chocante dizer “pessoas especiais”, do que “pessoas deficientes”.

A Declaração de Salamanca organizada em Junho de 1994 pelo governo espanhol e pela UNESCO teve como objectivo de se pronunciar acerca dos princípios, da política e prática na educação especial. Nasce o conceito de Educação Inclusiva. Este conceito pretende fomentar

67 o ensino entre pessoas com deficiência e outras pessoas com outro tipo de carências e também com pessoas sem deficiência. A ideia é colocar estas pessoas a partilhar o mesmo espaço de ensino, permutando questões de ordem socio - cultural, tendo assim a oportunidade de aprenderem todos juntos, compondo assim a sociedade inclusiva e lutar por uma escola inclusiva. Em termos de valor da pessoa verificamos que estes cidadãos sentem-se mais importantes, mais motivados pois assim a diferença não é tão acentuada, e acabam por requerer a sua inclusão social e os seus direitos na sociedade que os alberga. Como diz o Doutor Sassaki é o EMPONDERAMENTO que está em acção.

Com efeito o jornal “O Estado de São Paulo” publica um artigo em Maio de 2002 cujo autor era o Senhor Frei Betto, um escritor religioso e dominicano que por acaso era filho de jornalistas. Ele perante a questão da deficiência sugere um termo novo “portadores de direitos especiais” com as iniciais PODE. Argumenta de sua iniciativa que esta sigla traduz capacidade daqueles cidadãos ao contrário das palavras “deficientes”, usadas como substantivo ou adjectivo, traduziam incapacidade e desvalor. Este artigo acabou por ser difundido em várias revistas cuja especialização era a área da deficiência. Também foi posto em bibliotecas municipais e colocado em publicações a nível mundial. A expressão “portadores de direitos especiais” acaba por ser problemática porque dava a impressão que aqueles cidadãos, portadores transportam a deficiência ou que carregam um fardo pesado às costas. Também a expressão “direitos especiais,” acaba por contradizer o facto pois as pessoas com deficiência querem apenas os seus direitos e não quaisquer direitos especiais. Conclui-se que o termo “portadores de direitos especiais”, não se pode atribuir apenas as pessoas com deficiência, já que outro grupo de necessitados e com vulnerabilidades também tem o direito de pedir direitos especiais. Também no Brasil chegou-se a conclusão que em termos semânticos, a sigla PODE apresentava dificuldades em ser usada, mesmo mostrando capacidade construtiva.

A verdade e por causa dos termos a designar os cidadãos portadores de deficiência desde 1990 a esta parte têm sido organizados muitos eventos de cariz mundial, pelos responsáveis de várias organizações de pessoas com deficiência. Não obstante o termo “pessoas com deficiência” acaba por ser o preferido, pelo facto de ter mais cidadãos naquelas condições a desejarem esse termo. Na cidade de Recife organizou-se um encontro para cidadãos deficientes no ano de 2000, em que foi determinado o uso do termo “pessoas com deficiência”, rejeitando assim a expressão “portadores de deficiência”. Assim sendo do ponto de vista valorativo as “pessoas com deficiência”, têm a oportunidade de se inserirem no

68 EMPONDERAMENTO, tendo assim possibilidade de escolher opções de vida, melhorar a qualidade de vida, e reivindicar os seus direitos. Passam a ser mais responsáveis contribuindo com o positivo de cada um, e suas coisas boas, com o fim de transformar a sociedade com uma visão inclusiva de cidadãos com deficiência, com outros tipos de desvantagens e outros sem incapacidades algumas.

8- ALGUNS DOCUMENTOS IMPORTANTES EM RELAÇÃO AOS DEFICIENTES

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