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2 QUALIDADE E RELEVÂNCIA DA PESQUISA CIENTÍFICA NO CAMPO DA

2.2 PESQUISA CIENTÍFICA NA ADMINISTRAÇÃO

2.2.4 Administração como ciência ou campo científico:

A administração ainda está um estágio de desenvolvimento em que não há um consenso sobre se pode ser ou não considerada ciência. Para Ferreira, Reis e Pereira (2000) para que uma área se desenvolva como ciência é preciso que possua personalidade própria, mas pondera que o conhecimento gerado pela administração se alicerça em outras áreas, tais como, a sociologia, psicologia e economia, por exemplo.

Sob essa ótica, a Administração se apropria de saberes difusos de diversas áreas, o que comprova a influência de engenheiros e psicólogos para a gestão da produção, de

processos e projetos e gestão estratégica de pessoas, respectivamente, de modo a proporcionar espaços para questionamento das teóricas basilares e para a criação de novos corpos teóricos, principalmente pela consolidação dos programas de doutorado e pós-doutorado em Administração.

Assim, conforme informa França Filho (2004), considerar a Administração como uma área do conhecimento é o mesmo que reconhecê-la como uma ciência, isto é, a ciência administrativa, ideia advinda da Administração Científica, que teve como expoentes Taylor, Fayol e outros, tais como, Gantt e os Gilbreths9, conforme França Filho (2004).

Acrescenta-se que, de acordo de França Filho (2004), os primeiros teóricos da Administração tentaram restringir a área apenas a iniciativa privada, principalmente aplicada ao ramo industrial, e idealizaram que deveria ter planejamento racional, previsibilidade, e controle, portanto, essas características tornariam a Administração uma ciência legítima, concomitantemente um conjunto de regras gerais para gerenciar o ato administrativo.

Outrossim, a administração foi evoluindo, e manteve-se a concepção da Administração Científica, o que pode ser comprovado pela definição dada pelo CFA (2017) : A administração é “[...] ciência da área humana fundamentada em sistemas e processos que buscam o planejamento, organização, direção e controle das realizações, tanto na esfera pública quanto na privada.”.

Em razão disso, a área possui capacidade técnica para lidar e resolver os problemas de todas as organizações em que atua. Ela age por meio de suas diversas áreas do conhecimento, que conversam entre si compartilhando dados e informações multidisciplinares.

Taffarel e Silva (2013), pensado similar ao CFA (2017), destacam que a Administração é ciência, pois investiga uma ampla variedade de organizações e procurar criar soluções, como também, é arte e concebe um espaço de aplicação de conhecimentos de origens diversas. Para se atingir o caráter científico na área é necessária subordinação da prática a um conjunto de modelos e teorias, dos quais não deve haver desvinculação, bem como, a interligação entre prática e a teoria tem que ser perene; a primeira fornece novos desafios à teoria; essa desenvolve os subsídios necessários para melhorar a prática.

Contrariando a ideia anterior, Administração, como campo científico, conforme disciplina Gomes et al. (2013) e Santos (2017), expressa-se como um saber interdisciplinar que ainda não tem reconhecimento e legitimação pela comunidade científica, por que está em

fase de consolidação, de modo que se considerasse ciência exclusivamente as áreas de pesquisa das ciências naturais ou hard cience. Como consequência disso e em resposta ao não reconhecimento da Administração como ciência, a comunidade científica administrativa está se esforçando para conceder status de ciência à área.

Independentemente do reconhecimento ou não da Administração como ciência, conforme entende Chizzotti (2008), destaca-se que, juntamente, as ciências e a pesquisa cresceram e se desenvolveram inicial por um processo de procura metodológica das explicações das causas dos fatos ou do entendimento laborioso da realidade, usando-se de informações obtidas através de observações atentas ou outros meios adequados de se colecionar e compilar os dados singulares que fundamentassem afirmações mais amplas.

Desse modo, a Administração para se efetivar como campo científico, necessita se libertar dos entraves do pensamento epistemológico moderno, que constrói um conceito de ciência rejeitando e desqualificando as demais fontes de saberes (SANTOS, 2017). Isso prejudica a constituição de comunidade científica, que presume ter um corpo teórico, mas também absorve saberes de outras áreas para poder compor seu próprio corpo teórico, pois segundo Betero et al. (2013), a censura aos conhecimentos originados em áreas externas afeta a principal missão que uma comunidade científica tem, que é a construção de teorias que identifiquem fenômenos importantes e busquem os porquês de eles ocorrerem, o seu modo e as suas consequências.

De qualquer forma, o reconhecimento e o prestígio de determinada ciência estão intimamente ligados ao fato da mesma ser considerada e aceita, verdadeiramente, como ciência sendo que o sentido da ciência reside no fato de que o progresso não tem fim. (GOMES et al., 2013, p. 8)

Mesmo que a pesquisa científica em administração esteja com seus status científicos indefinidos ou questionados, a administração precisa construir uma comunidade científica forte que batalhe para a valorização social, econômica, política e científica da área. Isso geraria resultados positivos que tornariam o administrador um profissional respeitado no mercado, pois traria contribuições imprescindíveis ao mercado privado, e, não só a esse, mas também, ao setor público e ao terceiro setor.

Para a construção da comunidade científica administrativa, a área precisa se consolidar como campo de conhecimento, que para Tonelli et al. (2003) e Betero et al. (2013) tem crescimento notoriamente, de modo que o aumento da produção científico-acadêmica

brasileira em Administração ocorre significativamente desde a década de 1990, tanto em nível de Graduação, quanto na pós-graduação.

Nesse sentindo, as pesquisas de pós-graduação têm se destacado, porque são publicadas em espaços além dos bancos de pesquisas institucionais, havendo tendência de privilegiar produções de mestrado e doutorado no tocante à publicação em eventos e periódicos científicos nacionais. Além desse fenômeno, à medida que houve, não só, o aumento dos programas de pós-graduação, bem como consequência do fator, o aumento na quantidade de artigos publicados em periódicos científicos nacionais, passe-se a questionar a qualidade dessas publicações. (CARDOSO, 2017)

Mesmo com esse avanço na produção científica, essa é, segundo Betero e Keinert (1994), divulgadora no tocante a repetição do que é produzido no exterior; é aplicada à proporção que utiliza conceitos modernos e recupera experiências estrangeiras com objetivos de aplicá-las às questões administrativas do Brasil; sendo também crítica e reflexiva à medida que indaga e procura eliminar de forma total ou parcialmente concepções e elucidações que são criadas em outras nações.

Assim, vale destacar o desempenho limitado da produção científica e dependência dos autores nacionais em relação aos estrangeiros. No tocante ao primeiro, Roesch (2003) afirma que diversos fatores podem influenciar o desempenho limitado, dentre eles:

[...] modelos teóricos, temas de pesquisa e metodologias, em vez de desenvolver algo original. [...] copiamos mal e desenvolvem pesquisas insuficientemente delineadas, metodologicamente confusas, e com pouco manuseio de dados empíricos; a ênfase na quantidade, na massificação e na subordinação às estatísticas de sucesso conduzem à perda de qualidade. Outros acreditam que este processo é inevitável, mas pode levar à aprendizagem. Outros, ainda, atribuem o problema à própria natureza da área de Administração, onde a urgência para solucionar problemas organizacionais práticos estimula a criação de modismos e impede espaços de reflexão e criação teórica.

Roesch (2003), contra-argumentando o que foi supracitado, informa que talvez nossas autocríticas estejam dando ênfase exagerada a fatores institucionais ou organizacionais, de modo que sugere que elas atribuem destaque desproporcional a fatores contextuais, como motivo para o desempenho limitado. Como resposta, diz que diferentemente do que é dito, as pesquisas científicas em Administração possuem a falta de rigor técnico; comodismo; rapidez na realização do trabalho científico; e o relato da pesquisa, com frequência, desmerece o trabalho que foi realizado.

O desempenho limitado também pode ser consequência da massificação do curso de Administração, conforme Oliveira, Lourenço e Castro (2015). Como a área passou pelas suas

duas primeiras fases10, a terceira fase, fruto das mudanças históricas, políticas, internacionais e mercadológicas, representou o nascimento de novos cursos em quantidade colossal, o que é reforçado por Souza-Silva e Davel (2005): a maior parte das instituições de ensino superior não atinge seu objetivo educacional mais importante, que é a formação do cidadão competentemente crítico e reflexivo, pois o aluno passou a ver visto como um cliente, uma fonte de lucro.

Oliveira, Lourenço e Castro (2015) argumentam que pesquisadores como Nicolini (2003) e Alcadipani (2011) têm suas dúvidas quanto à formação acadêmica dos alunos, a qualidade do ensino e pesquisa, o tipo de profissional que está sendo formado e suas consequências para a sociedade e o mercado, de modo que questionam como a massificação afeta diretamente a qualidade do ensino, resultando em administradores medíocres sem base teoria desenvolvida e com foco exclusivo no mercado.

A formação e o ensino dos profissionais da área de administração sem um preparo adequado do pensar, refletir, questionar, pesquisar se tornam ações cada vez mais descompensadas (sic), inviabilizando um processo cíclico, autoalimentado e fundamentalmente crítico e fecundo. (CARDOSO, 2015, p.114)

No tocante à dependência dos autores nacionais em relação aos estrangeiros, é importante informar que “Parte essencial da missão de qualquer comunidade científica é a construção de teorias, ou seja, a identificação de fenômenos relevantes e a busca de explicações sobre por que ocorrem, como ocorrem e quais são suas consequências” (BETERO et al., 2013, p. 15), ou seja, os pesquisadores, que somados todos formam a comunidade científica, devem elaborar teorias que desenvolvam suas respectivas áreas de atuação. O desenvolvimento dessas deveria ser pautado pela originalidade e pela realidade local, porém o que realmente acontece é a importação de teorias estrangeiras, conforme discute Betero et al. (2013, p. 15):

Os pesquisadores brasileiros vêm sistematicamente se apropriando de teorias originadas fora do País, especialmente aquelas produzidas nos países anglo-saxões, e aplicando-as ao contexto local. Tal modus operandi abrange todo o espectro paradigmático, do neopositivismo às teorias críticas, incluindo as abordagens pós- modernas.

10 A primeira fase foi o currículo mínimo e a segunda foram as reformas promovidas pelas Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional e Diretrizes Nacionais Curriculares, conforme informa Castro, Lourenço e Oliveira (2015).

Betero et al. (2013) acrescenta que não há problema em se apropriar das teorias estrangeiras, pois, por meio delas pode-se ter acesso às mais modernas teorias para explicar fenômenos regionais, como também, há possibilidade de contribuição para o avanço dos sabe teórico em contextos diferentes daqueles em que as teorias importadas foram geradas.

Assim, pretendendo alterar a cultura de apropriação superficial das teorias estrangeiras, é necessário ter um processo de escolha consciente e estratégica delas que serão usadas e sobre sua aplicação real na realidade local, o que reforçado por Giroletti (2005), que diz que, na medida que a literatura acadêmica-científica nasce inicialmente nos países que pertencem ao primeiro mundo. A crítica passa a ter razão, porque reforça uma cultura colonialista que valoriza o que é estrangeiro em detrimento ao nacional.

Para superar esse paradigma, é necessária a construção de uma comunidade científica. Ela geraria contribuições para as três esferas que compõe a sociedade, conforme expressa França Filho (2004).

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