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Adquirindo Gostos e Afetos

O que a neuroplasticidade nos ensina sobre a atração sexual e o amor

A. era um jovem solteiro e bonito que me procurou porque estava deprimido. Tinha se envolvido amorosamente com uma linda mulher — que já tinha um namorado —, e ela começara a encorajá- lo a maltratá-la. Ela tentou convencer A. a encenar fantasias sexuais em que ela se vestia de prostituta, e ele devia “cuidar” dela; tratando-a com violência. Quando começou a sentir um desejo alarmante de submetê-la, A. ficou muito perturbado, terminou o relacionamento e procurou tratamento. Ele tinha um histórico de envolvimento com mulheres emocionalmente descontroladas que já eram ligadas a outros homens. As namoradas que havia tido ou eram exigentes e possessivas ou eram de uma crueldade castradora. No entanto, eram essas mulheres que o atraíam. Mulheres “legais”, mulheres atenciosas e gentis, o entediavam, e ele via defeitos em qualquer mulher que se apaixonasse por ele de uma forma terna e descomplicada.

Durante toda a infância dele, a própria mãe foi uma alcoólatra grave, frequentemente carente, sedutora e dada a tempestades emocionais e a explosões de violência. A. lembrava-se da mãe batendo a cabeça da irmã no aquecedor e queimando os dedos de seu meio-irmão como castigo por brincar com fósforos. Ela ficava deprimida com frequência, ameaçando suicidar-se, e o papel dele era ficar atento, acalmá-la e impedi-la de se matar. Seu relacionamento com ela também era altamente sexualizado. Ela vestia camisolas transparentes e falava com ele como se fosse um amante. Ele se recordava dela convidando-o para sua cama quando era criança e tinha uma imagem de si mesmo sentado com os pés na vagina dela enquanto ela se masturbava. Ele tinha uma sensação excitante mas furtiva com a cena. Em raras ocasiões, quando o pai, que tinha se afastado da esposa, estava em casa, A. se lembrava de ficar “perpetuamente sem fôlego”, tentando evitar as

brigas entre os pais, que acabaram por se divorciar.

A. passou grande parte de sua infância reprimindo a raiva que sentia dos pais, muitas vezes sentindo-se como um vulcão prestes a entrar em erupção. Os relacionamentos íntimos pareciam formas de violência em que os outros ameaçavam devorá-lo vivo; no entanto, depois de atravessar a infância, ele adquirira um gosto erótico por mulheres que prometiam fazer justamente isso, e só por elas.

Os seres humanos exibem um grau extraordinário de plasticidade sexual, se comparados com outras criaturas. Variamos quanto ao que gostamos de fazer com nossos parceiros no ato sexual. Variamos sobre onde experimentamos a excitação e a satisfação sexual em nosso corpo. Mas variamos sobretudo quanto à pessoa ou coisa que nos atrai. As pessoas costumam dizer que acham um determinado “tipo” atraente, e esses tipos variam imensamente de uma pessoa para outra.

Para alguns, os tipos mudam conforme fases diferentes e novas experiências. Um homossexual tinha relações sucessivas com homens de uma raça ou grupo étnico, depois com homens de outro grupo, e em cada fase só conseguia sentir atração por homens do grupo “da vez”. Depois que uma fase acabava, ele não conseguia mais se sentir atraído por um homem do grupo anterior. Ele adquiria um gosto por esses “tipos” sucessivos e parecia mais enamorado da categoria ou tipo da pessoa (isto é, “asiáticos” ou “afro-americanos”) que dos próprios indivíduos. A plasticidade das preferências sexuais desse homem exagera uma verdade geral: a libido humana não é um impulso biológico estruturado e invariável, mas pode ser curiosamente inconstante, facilmente alterada por nossa psicologia e pela história de nossos encontros sexuais. Nossa libido também pode ser bem caprichosa. Muitos textos científicos sugerem o contrário e descrevem o instinto sexual como um imperativo biológico, uma besta sempre ansiosa, sempre exigindo satisfação — um glutão, não um gourmet. Mas os seres humanos estão mais para gourmets, sentem-se atraídos por determinados tipos e têm fortes preferências; ter um “tipo” nos leva a adiar a satisfação até que encontremos o que procuramos, porque a atração por um tipo é restritiva: a pessoa que fica “ligada a louras” pode tacitamente rejeitar morenas e ruivas.

Até a preferência sexual pode mudar de vez em quando. 1 Embora alguns cientistas destaquem cada vez mais a base inata de nossas preferências sexuais, também é verdade que algumas pessoas têm atração heterossexual durante parte de sua vida — sem histórico de bissexualidade — e depois “acrescentam” uma atração homossexual e vice-versa.

Pode parecer que a plasticidade sexual chegou ao seu auge naqueles que têm muitos parceiros diferentes, aprendendo a se adaptar a cada novo amante; mas pense na plasticidade necessária para um casal que envelhece junto, com uma boa vida sexual. Eles pareciam muito diferentes aos 20

anos, quando se conheceram, do que aos 60; entretanto, sua libido se adaptou, então eles ainda se sentem atraídos.

Mas a plasticidade sexual vai ainda mais além. Os fetichistas desejam objetos inanimados. Um fetichista pode ficar mais excitado com um salto alto com um forro de peles, ou com uma lingerie do que com uma mulher de verdade. Desde os tempos antigos, alguns homens das áreas rurais tinham relações sexuais com animais. Algumas pessoas parecem se sentir atraídas não tanto por pessoas, mas por roteiros sexuais complexos, nos quais os parceiros interpretam papéis, envolvendo várias perversões, combinando sadismo, masoquismo, voyeurismo e exibicionismo. Quando colocam uma nota na seção de anúncios pessoais do jornal, a descrição do que procuram em um amante mais parece a descrição de um cargo do que de uma pessoa que eles gostariam de conhecer. Dado que a sexualidade é um instinto, e que o instinto é tradicionalmente definido como um comportamento hereditário exclusivo de uma espécie, variando pouco de um membro para outro, a variedade de nossas preferências sexuais é curiosa. Os instintos normalmente resistem a mudanças e, acredita-se, têm um propósito claro, irredutível e fisicamente estruturado, como a sobrevivência. Mas o “instinto” sexual humano parece ter se libertado de seu propósito essencial, a reprodução, e varia numa proporção desconcertante, como não acontece em outros animais, para os quais o impulso sexual parece se comportar e agir como um instinto. 2

Nenhum outro instinto pode ser tão satisfeito sem a realização de seu propósito biológico e nenhum outro instinto é tão desligado de seu propósito. Os antropólogos mostraram que, por um longo tempo, a humanidade não sabia que o sexo era necessário para a reprodução. Esse “fato da vida” teve de ser aprendido por nossos ancestrais, assim como as crianças devem aprendê-lo hoje. Esse desligamento de seu propósito principal talvez seja o sinal definitivo da plasticidade sexual.

O amor também é extraordinariamente flexível, e sua expressão mudou ao longo da história. Embora falemos de amor romântico como o mais natural dos sentimentos, na realidade a concentração de nossas esperanças adultas de intimidade, ternura e desejo sexual em uma só pessoa “até que a morte nos separe” não é comum a todas as sociedades e só recentemente se tornou disseminada na nossa. Durante milênios, a maioria dos casamentos era arranjada pelos pais por motivos práticos. Certamente há histórias inesquecíveis de amor romântico ligadas ao casamento na Bíblia, como no Cântico dos Cânticos, e ligadas ao desastre na poesia medieval dos trovadores e, mais tarde, em Shakespeare. Mas o amor romântico começou a ter aprovação social na aristocracia e nas cortes da Europa no século XII — originalmente entre um homem solteiro e uma mulher casada, adúltero ou não consumado, geralmente terminando mal. Só com a divulgação dos ideais democráticos do individualismo foi que se firmou — e aos poucos começou a parecer

completamente natural e inalienável — a ideia de que os amantes deviam poder escolher seus próprios cônjuges.

É razoável indagar se nossa plasticidade sexual está relacionada com a neuroplasticidade. A pesquisa mostrou que a neuroplasticidade não é compartimentalizada em departamentos cerebrais nem confinada às áreas de processamento sensorial, motor e cognitivo que já exploramos. A estrutura do cérebro que regula os comportamentos instintivos, inclusive o sexo, chamada hipotálamo, é plástica, como é a amídala, a estrutura que processa a emoção e a ansiedade. 3 Embora algumas partes do cérebro, como o córtex, possam ter mais potencial plástico porque há mais neurônios e conexões a serem alterados, até as áreas não corticais exibem plasticidade. É uma propriedade de todo o tecido cerebral. A plasticidade existe no hipocampo (a área que transforma nossas lembranças de curto prazo em recordações de longo prazo), 4 bem como em áreas que controlam nossa respiração, 5 processam as sensações primitivas 6 ou a dor. 7 Ela existe na medula espinhal 8 — como os cientistas mostraram; o ator Christopher Reeve, que sofreu uma lesão espinhal grave, demonstrou esta plasticidade quando conseguiu, por meio de incansáveis exercícios, recuperar parte da sensação e da mobilidade sete anos depois do acidente.

Merzenich coloca esse fato desta maneira: “Não é possível isolar a plasticidade (...) é absolutamente impossível.” Seus experimentos mostraram que se um sistema cerebral muda, aqueles sistemas conectados com ele também se alteram. 9 As mesmas “regras plásticas” — use ou perca, ou neurônios que disparam simultaneamente se ligam entre si — são válidas em todo o cérebro. Se não fosse assim, as diferentes áreas cerebrais não poderiam funcionar juntas.

Será que as mesmas regras plásticas para os mapas cerebrais nos córtices sensorial motor e da linguagem são válidas para mapas mais complexos, como os que representam nossos relacionamentos, sexuais ou outros? Merzenich também mostrou que os mapas cerebrais complexos são regidos pelos mesmos princípios plásticos dos mapas mais simples. Os animais expostos a um único som desenvolverão um único mapa cerebral para processá-lo. Animais expostos a um padrão complexo, como uma melodia de seis sons, não só unem seis mapas diferentes, mas desenvolvem uma região que decodifica toda a melodia. Esses mapas “melódicos” mais complexos obedecem aos mesmos princípios plásticos dos mapas para um único som. 10

“Os instintos sexuais”, escreveu Freud, “nos são perceptíveis por sua plasticidade, sua capacidade de alterar seus alvos.” 11 Freud não foi o primeiro a argumentar que a sexualidade era plástica — Platão, em seu diálogo sobre o amor, afirma que o Eros humano assume muitas formas 12 —, mas Freud deitou as fundações para a compreensão neurocientífica da plasticidade sexual e romântica.

Uma das contribuições mais importantes foi sua descoberta de períodos críticos da plasticidade sexual. Freud sustentou que a capacidade de um adulto de amar íntima e sexualmente se desenrola em fases, começando com as primeiras ligações apaixonadas do bebê com os pais. Ele aprendeu com os pacientes, e observando crianças, que a primeira infância, e não a puberdade, era o primeiro período crítico para a sexualidade e a intimidade, e que as crianças são capazes de sentimentos apaixonados e protossexuais — paixões, sentimentos amorosos e em alguns casos até excitação sexual, como no caso do paciente A. Freud descobriu que o abuso sexual de crianças é prejudicial porque influencia o período crítico da sexualidade na infância, moldando nossas ideias e tendências sexuais futuras. As crianças são carentes e em geral desenvolvem ligações passionais com os pais. Se o genitor é caloroso, gentil, confiável, a criança desenvolverá uma preferência por esse tipo de relacionamento na vida; se o genitor é desligado, frio, distante, voltado para si mesmo, colérico, ambivalente ou errático, a criança pode procurar um parceiro adulto que tenha tendências semelhantes. Existem exceções, mas um sólido conjunto de pesquisas confirma agora o insight básico de Freud, de que os primeiros padrões de relação e ligação com os outros, se problemáticos, podem ficar “fisicamente embutidos” em nosso cérebro na infância e se repetir na idade adulta. 13 Muitos aspectos do roteiro sexual que A. representava quando começou a se tratar comigo eram repetições de sua situação traumática na infância, levemente disfarçados — como sua atração por mulheres instáveis que atravessavam as fronteiras sexuais normais em relações furtivas, nas quais a hostilidade e a excitação sexual se fundiam, enquanto o parceiro oficial da mulher era traído e ameaçava reentrar em cena.

A ideia do período crítico foi formulada mais ou menos na época em que Freud começou a escrever sobre o sexo e o amor, por embriologistas que observaram que o sistema nervoso do embrião se desenvolve em fases e que, se essas fases são perturbadas, o animal ou a pessoa será prejudicado, muitas vezes de forma dramática, pela vida toda. 14 Embora Freud não usasse a expressão, o que ele disse sobre as primeiras fases do desenvolvimento sexual se coaduna com o que sabemos sobre os períodos críticos. São breves janelas de tempo em que os novos sistemas e mapas cerebrais se desenvolvem com a ajuda de estímulos provenientes de pessoas no próprio ambiente. 15 Os resquícios de sentimentos infantis no amor e na sexualidade adultos podem ser detectados em comportamentos cotidianos. Na nossa cultura, durante as preliminares amorosas, ou quando expressam seu afeto mais profundo, os adultos frequentemente se tratam por “neném”. Usam termos carinhosos que suas mães usavam com eles quando crianças, como “lindinho” e “amorzinho”, termos que evocam os primeiros meses de vida, quando a mãe expressava seu amor alimentando, acariciando e falando docemente com o bebê — o que Freud chamou de fase oral, o

primeiro período crítico da sexualidade, cuja essência é resumida nas palavras “nutrição” e “nutrir” — cuidando ternamente dele, amando e alimentando. O bebê se sente mesclado com a mãe, e sua confiança nos outros se desenvolve à medida que é sustentado e nutrido com um alimento adocicado, o leite. Ser amado, cuidado e alimentado são associados mentalmente e conectados no cérebro em nossa primeira experiência formadora desde o parto.

Quando falam como bebês, usando palavras como “docinho” e “neném” ao se dirigirem ao outro, e dão à conversa um sabor oral, os adultos estão, segundo Freud, “regredindo”, passando de estados mentais maduros a outros relacionados com as primeiras fases da vida. Em termos de plasticidade, esta regressão, acredito, envolve o desmascaramento de antigas vias neuronais que depois disparam todas as associações da fase primeva. A regressão pode ser agradável e inócua, 16 como nas preliminares adultas, ou pode ser problemática, quando vias infantis agressivas são desmascaradas e um adulto tem ataques de raiva.

Mesmo a “conversa suja” mostra vestígios de estágios sexuais infantis. Afinal, por que o sexo deveria ser considerado “sujo”? Esta atitude reflete uma visão infantil do sexo, de uma fase em que a criança toma consciência da higiene pessoal, da micção e da defecação e fica surpresa ao saber que os genitais, que estão envolvidos na micção e ficam tão perto do ânus, também são envolvidos no sexo, e que a mamãe deixa que o papai insira seu órgão “sujo” num buraco que fica muito perto de suas nádegas. Os adultos em geral não se incomodam com isso, porque na adolescência passaram por outro período crítico de plasticidade sexual, em que o cérebro se reorganizou novamente, de modo que o prazer do sexo se torna intenso o bastante para superar qualquer repulsa.

Freud mostrou que muitos mistérios sexuais podem ser compreendidos como fixações do período crítico. Depois de Freud, não ficamos mais surpresos quando uma menina abandonada pelo pai procura, quando adulta, homens indisponíveis e velhos o bastante para serem seu pai, ou quando pessoas criadas por mães gélidas e autoritárias frequentemente procurem pessoas assim como parceiras, às vezes tornando-se elas mesmas “frias”, porque, sem jamais terem vivido a empatia no período crítico, toda uma parte de seu cérebro deixou de se desenvolver. E muitas perversões podem ser explicadas em termos de plasticidade e de conflitos infantis que persistem. Mas a principal questão é que em nossos períodos críticos podemos adquirir gostos e inclinações sexuais e românticas que são embutidas estruturalmente em nosso cérebro e podem ter um forte impacto pelo resto de nossa vida. E o fato de que podemos adquirir diferentes gostos sexuais contribui para a imensa variabilidade sexual entre nós.

A concepção de que um período crítico ajuda a formar o desejo sexual em adultos contradiz o argumento hoje popular de que o que nos atrai é menos o produto de nossa história pessoal do que

de nossa biologia comum. Algumas pessoas — modelos e estrelas de cinema, por exemplo — são amplamente consideradas bonitas ou sexies. Uma certa corrente da biologia nos ensina que essas pessoas são atraentes porque exibem sinais biológicos de resistência, que prometem fertilidade e força: uma aparência limpa e traços simétricos indicam que um potencial parceiro não tem doenças; um corpo de ampulheta é sinal de uma mulher fértil; os músculos de um homem predizem que ele será capaz de proteger uma mulher e sua prole.

Mas isso simplifica o que a biologia realmente ensina. Nem todos se apaixonam pelo corpo, como acontece quando uma mulher diz, “Eu sabia, quando ouvi aquela voz pela primeira vez, que ele foi feito para mim”, pois a musicalidade da voz talvez seja uma melhor indicação da alma de um homem do que a superfície de seu corpo. E a preferência sexual mudou com o passar dos séculos. As beldades de Rubens eram gordas pelos padrões atuais, e com o correr das décadas as estatísticas demográficas das páginas centrais da Playboy e das modelos da moda passaram do tipo voluptuoso ao andrógino. A preferência sexual evidentemente é influenciada pela cultura e pela experiência e é frequentemente adquirida e depois embutida estruturalmente no cérebro.

“Gostos adquiridos” são por definição aprendidos, ao contrário dos “gostos”, que são inatos. Um bebê não precisa adquirir gosto por leite, água ou doces. Estes são percebidos de imediato como agradáveis. Os gostos adquiridos são inicialmente experimentados com indiferença ou desprazer, mas posteriormente tornam-se agradáveis — os odores de queijos, de vinhos italianos, amargos e secos, cafés, patês, a sugestão de urina num rim frito. Muitas iguarias pelas quais as pessoas pagam caro, e pelas quais precisam “desenvolver um gosto”, são os mesmos alimentos que nos enojavam quando crianças.

Na época elisabetana, os amantes eram tão apaixonados pelos respectivos odores corporais que era comum uma mulher manter uma maçã descascada em sua axila até que tivesse absorvido todo o suor e o cheiro. Ela daria essa “maçã do amor” para que o amante a cheirasse em sua ausência. Nós, por outro lado, usamos aromas sintéticos de frutas e flores para mascarar nosso odor corporal para nossos amantes. Não é fácil determinar qual dessas duas abordagens é adquirida e qual é natural. Uma substância que nos é tão “naturalmente” repugnante como a urina de vaca é usada pela tribo masai da África Oriental como loção para o cabelo — uma consequência direta da importância da vaca em sua cultura. Muitos gostos que consideramos “naturais” são adquiridos por aprendizado e se tornam uma “segunda natureza”. Somos incapazes de distinguir nossa “segunda natureza” de nossa “natureza original” porque nosso cérebro neuroplástico, depois de reestruturado, desenvolve uma nova natureza tão biológica quanto a original.

A atual epidemia de pornografia demonstra claramente que os gostos sexuais podem ser adquiridos. A pornografia, fornecida por conexões de internet de alta velocidade, satisfaz cada um dos requisitos para a mudança neuroplástica. 17

À primeira vista, a pornografia parece ser uma questão puramente instintiva: imagens sexualmente explícitas incitam reações instintivas, que são o fruto de milhões de anos de evolução. Mas se isso fosse verdade, a pornografia não teria se alterado. Ficaríamos excitados com os mesmos estímulos, as mesmas partes do corpo e suas proporções que excitavam nossos ancestrais. Isso é o que os produtores de material pornográfico querem nos fazer acreditar, pois alegam que estão combatendo a repressão sexual, o tabu e o medo e que seu objetivo é liberar os instintos sexuais naturais e reprimidos.

Mas, na realidade, o conteúdo da pornografia é um fenômeno dinâmico que ilustra perfeitamente o progresso de um gosto adquirido. Trinta anos atrás, pornografia “hardcore” em geral significava a representação explícita de atos sexuais entre dois parceiros excitados, exibindo seus genitais. A “softcore” significava imagens principalmente de mulheres numa cama, no banheiro