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AFINAL, PODEMOS FALAR EM TRABALHADORES DO TURISMO?

2 A MULTITERRITORIALIDADE E O FENÔMENO DO TURISMO

3 TURISMO E SEUS TRABALHADORES NA CONTEMPORANEIDADE

3.3 AFINAL, PODEMOS FALAR EM TRABALHADORES DO TURISMO?

Estamos convencidos que não cabe a nós afirmar de forma generalista que todos os trabalhadores vinculados à atividade turística devem ser rotulados como tal. Isto porque pode haver uma lacuna no entendimento sobre o que seria a atividade turística e o que está sendo exercido e vivenciado na prática de cada realidade. Percebemos que essa necessidade de definição está mais presente no âmbito da academia com a finalidade de pesquisar o fenômeno. Não que isso seja irrelevante, muito pelo contrário. O esforço feito aqui é no sentido de alinhar e organizar as ideias e pensamentos sobre a possibilidade da construção desse objeto de pesquisa, entendido como contemporâneo, recente e instigante.

E, por isso, defendemos que o desenvolvimento dessa discussão teórica sobre os trabalhadores seja feito em conjunto com a realidade e teorias escolhidas, e ao mesmo tempo, deve se retroalimentar de forma a manter o rigor científico. Perpassando também, por discussões epistemológicas (construção do objeto científico) e teóricas (formulação teórica do objeto e explicitação conceitual) (MOESCH, 2004).

É necessário levar em consideração os contextos, entendendo que o valor da variável não é função dela própria, mas do seu papel no interior de um sistema maior. Somente através do movimento do sistema, do todo, que podemos corretamente valorizar cada parte e analisá-la, para, em seguida, reconhecer concretamente esse todo. Portanto, para essa tarefa, supõe-se um esforço de classificação (SANTOS, 2008).

O fenômeno do turismo é multiescalar, multiterritorial, multidimensional, diversificado em sua atividade econômica, variável em segmentos de mercado, diverso sobre os setores das políticas públicas e seus agentes sociais podem mudar a partir de determinadas realidades observadas. Portanto, suas discussões não podem ser definidas exclusivamente em uma definição hermeticamente fechada, por possuir caráter multi/interdisciplinar, o que dificulta e, ao mesmo tempo, enriquece suas questões epistemológicas.

Nesse sentido, entendendo a lógica multiterritorial do turismo e a diversidade de seus estudos, propomos entender os trabalhadores do turismo como todos aqueles indivíduos que exercem determinadas funções relacionadas à atividade turística, direta ou indiretamente, dentre as mais diversas dimensões e abordagens “dos turismos”. Esta definição deve ser guiada e embasada pelo pesquisador e/ou pela linha de uma área de conhecimento, a partir de uma matriz teórico-filosófica, a fim de justificar e dar legitimidade a determinadas escolhas.

Mais especificamente sobre as diversas dimensões e abordagens dos turismos do contexto, que afirmamos anteriormente, ao olhar para o trabalhador, pensamos que esse grupo pode ser composto também por indivíduos que atuam em todas as áreas do fenômeno, e não somente na mais visível, a dimensão da prática, abordagem que tem como predominância a atividade econômica e o olhar pelo senso comum.

Se pensarmos o turismo apenas como atividade econômica englobaremos basicamente os trabalhadores de serviços turísticos. Se observarmos sob a ótica do fenômeno, a lente se expande a todas as possíveis partes envolvidas, indivíduos que trabalham com o turismo, mas não inseridos na atividade econômica em si. Poderíamos, por exemplo, pensar na dimensão pedagógica do turismo ao englobar os professores, tutores, coordenadores, pesquisadores, pós-graduandos e graduandos, alunos de iniciação científica (se pensarmos em bolsistas). Ou então, na dimensão do setor público, os funcionários do poder público, executivo e

legislativo envolvidos com o turismo, como as secretarias municipais e o próprio Ministério do Turismo.

Esse exercício de análise está baseado no que Santos (2008) recomenda sobre a descrição das funções dos elementos do espaço.

Se considerássemos a população como um todo, as firmas como um todo, a nossa analise não levaria em conta as múltiplas possibilidades de interação, ela seria unilateral. Ao contrário, quanto mais sistemática for a classificação, tanto mais claras aparecerão as relações sociais e, em conseqüência, as chamadas relações espaciais (SANTOS, 2008, p. 23).

Se olharmos os trabalhadores pelo território turístico composto pela superposição de territórios dos agentes sociais - poder público, mercado, trabalhadores, turistas e comunidade local, reconhecidos por Fratucci (2008) – podemos apontar algumas questões: Os donos de empreendimentos turísticos seriam trabalhadores? Quem são os agentes de mercado? Se estabelecêssemos o trabalhador do turismo como o assalariado, não excluiríamos os trabalhadores informais? E as pessoas que realizam atividades informais e, ao mesmo tempo, possuem um pequeno empreendimento? O pequeno empreendedor é caracterizado como agente de mercado? Poderíamos falar em trabalhador “contratado” e o trabalhador “empregador” (podendo ser visto como agente de mercado)?

Talvez, estejamos caminhando para definições muito cartesianas, porém elas podem nos ser úteis para fundamentações teóricas dos estudiosos do fenômeno e para entender com mais clareza as relações de trabalho inseridas a partir de lógicas de poder, veladas ou não. Dito isso, temos a consciência que não atingiremos o conhecimento da totalidade do turismo, assim como não alcançaremos a “verdade” sobre esse grupo de agentes sociais que chamamos de trabalhadores do turismo.

De toda forma, destacamos alguns pontos de análise sugeridos para entender melhor a dinâmica territorial dos trabalhadores do turismo (nosso foco de análise do objeto): a) mobilidade e territorialidade: tanto funcional quanto simbólica, inserindo também a transterritorialidade, a transição por distintos territórios, ao permitir que o trabalhador seja observado também em seus outros papéis no espaço. Incluem-se os movimentos pendulares, migratórios sazonais ou permanentes, perpassando pelas discussões sobre imobilidades, mobilidade restrita/reduzida e também pelos territórios reticulares e zonais (território-rede e território-zona). Não se esquecendo

também, de observar as infraestruturas que possibilitam seus fluxos nas e pelas redes; b) tempo de lazer e de trabalho: tendo em vista sua apropriação territorial em um espaço que é predominantemente marcado pelo turismo, ou pelo menos no espaço de trabalho, mas tendo como premissa o espaço turístico. As discussões de tempo de não trabalho e lazer para o turista e o tempo de trabalho para o trabalhador do turismo precisam estar juntas no sentido de entender essas duas situações e relações que o trabalho e o turismo interferem e são interferidos nas estruturas de poder nesta sociedade “pós moderna”, c) a prática de suas funções e atividades, destacando os cargos, horas trabalhadas, remuneração, formação profissional, condições de trabalho, qualificação e mercado de trabalho.

Nesse sentido, ao estudarmos sobre os trabalhadores do turismo precisamos estar atentos acerca de algumas características e peculiaridades que esse agente social pode apresentar, para então alinhar as pesquisas e análises sobre o tema. O trabalhador do turismo pode sofrer com efeito da sazonalidade, informalidade, terceirização (traço muito comum nos serviços em geral), precarização e heterogeneidade como coletivo, tanto em suas funções quanto sobre os setores dentro da atividade turística. Pode possuir flexibilidade e mobilidade em suas atividades como consequência das características anteriores e devemos também observar o nível e diversidade de qualificação e remuneração do profissional.