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3. REVISÃO BIBLIOGRÁFICA

3.3. Agentes para estruturação

Estudos em tecnologia de organogéis demonstraram que a dispersão direta de um único estruturante na fase lipídica líquida é capaz de formar géis com características desejadas de plasticidade para aplicação em produtos alimentícios; contudo, com menor estabilidade durante estocagem por longos períodos. Alternativa para esta abordagem consiste na estruturação por interação sinérgica em sistemas mistos, ou seja, com mais de um tipo de estruturante. Sendo assim, a formação de “sistemas híbridos”, no qual se incorpora uma pequena concentração de partículas cristalinas, pode proporcionar bases com a rigidez e funcionalidade desejada para aplicação em alimentos (Patel e Dewettinck, 2015).

3.3.1. Cera de candelilla

Cera é um termo comumente utilizado como referência para a mistura de compostos não polares de cadeia longa, incluindo neste grupo os hidrocarbonetos, ésteres de cera, ésteres de esterol, cetonas, aldeídos, álcoois graxos e esteróis. São naturalmente encontradas na superfície de plantas, tendo por função protegê-las da perda de água e ataque de insetos (Rocha et al., 2013).

A cera de candelilla (CC) é derivada das folhas de um pequeno arbusto da família Euphorbiaceae, sendo este nativo do norte do México e sudoeste dos Estados Unidos. A CC é um aditivo alimentar reconhecidamente seguro e aprovado para utilização em alimentos, segundo regulamentação da FDA. É comumente utilizada na indústria de alimentos como agente de revestimento e aglutinante em gomas de mascar. Também é utilizada na indústria cosmética na produção de lip balms e loções corporais, e na indústria de tintas para a fabricação de vernizes (Toro-Vazquez et al., 2007).

Um dos principais componentes desta cera é o hentriacontano (78,9%), um hidrocarboneto que apresenta característica de auto-associação com solventes orgânicos e óleos vegetais. A partir desta associação é observada a formação de estruturas microcristalinas do tipo microplaquetas, sendo que estas estruturas primárias vão dar origem à rede tridimensional característica de organogéis formados por hidrocarbonetos. Como a CC é composta principalmente por tais compostos, esta pode ser amplamente utilizada para a estruturação de organogéis à base de óleos vegetais, sendo estes de grande interesse para a aplicação em produtos alimentícios (Marangoni e Garti, 2011; Toro-Vazquez et al., 2007).

3.3.2. Monoacilgliceróis

Monoacilgliceróis (MAG) são surfactantes não iônicos, sintetizados quimicamente por três principais métodos: catálise enzimática por lipases, hidrólise ou glicerólise de triacilgliceróis, e esterificação ou transesterificação de glicerol com ésteres de ácidos graxos (Freitas et al., 2008).

São classificados como GRAS (Generally Recognized as Safe) pela FDA, sendo utilizados pelas indústrias farmacêutica, alimentícia e cosmética, uma vez que não apresentam efeitos colaterais quando ingeridos ou aplicados sobre a pele. Especificamente na indústria alimentícia, MAGs são comumente utilizados como emulsificantes em uma ampla gama de produtos como margarinas, produtos de confeitaria, molhos, derivados do leite, entre outros (Freitas et al., 2008).

O uso do MAG como agente estruturante tem ganhado interesse significativo nos últimos tempos, uma vez que corresponde a um típico exemplo de estruturante comestível à base de pontes de hidrogênio, e estão entre os raros sistemas capazes de se auto associarem tanto em meio aquoso como em meio orgânico (Lupi et al., 2016; Sintang et al., 2017).

Em soluções aquosas de monoacilgliceróis observa-se a formação de diferentes mesofases cristal-líquidas após o resfriamento, onde os materiais apresentam simultaneamente propriedades físicas características de líquidos e sólidos. Enquanto que em sistemas ternários MAG/água/óleo, o comportamento estruturante é regido pela presença da água, devido à afinidade do MAG com a mesma (Lupi et al., 2016).

Quando o MAG é adicionado em óleo vegetal, o aquecimento dessa mistura em temperatura acima do ponto de fusão do MAG (superior a 70ºC), seguido pelo resfriamento do sistema, leva à auto-organização das moléculas de MAG em uma fase lamelar inversa, que posteriormente dá origem à rede tridimensional característica deste estruturante (Valoppi et al., 2017).

Desta forma, dentro de um sistema hidrofóbico, a região hidrofílica do MAG (glicerol) orienta-se para o meio da bicamada, adotando uma conformação fechada (fase lamelar inversa), sendo esta responsável pelo processo de gelificação do óleo e pelas propriedades elásticas aos organogéis à base de MAG. Além disso, por esta configuração ser estabilizada por pontes de hidrogênio entre os grupos hidroxila (-OH) primários e secundários do MAG, esta conformação promove a cristalização das caudas alifáticas (ácidos graxos) do MAG proporcionando a formação de polimorfos mais estáveis (sub-α para fase β). Contudo, a transição polimórfica de cristais α para β, e posteriormente a aglomeração dos cristais β, em função do tempo, resultam em modificação significativa da rede cristalina, com consequências negativas para as propriedades térmicas, físicas e capacidade de aprisionamento do óleo líquido na estrutura dos organogéis estruturados por MAG (Lopez-Martinez et al., 2015). Sendo assim, a utilização do MAG em conjunto com outros tipos de estruturantes pode resultar na formação de redes de maior estabilidade, obtendo-se as características desejáveis para organogéis.

3.3.3. Hardfat de óleo de soja

Os denominados hardfats consistem em produtos da hidrogenação catalítica total de óleos ou gorduras, caracterizando materiais homogêneos, compostos por triacilgliceróis trissaturados de alto ponto de fusão. São considerados produtos de baixo de custo de produção e aplicação. Podem ser utilizados para melhorar características funcionais e tecnológicas de sistemas lipídicos, atuando como moduladores do processo de cristalização, devido à sua capacidade de induzir

a formação de hábitos polimórficos específicos (Oliveira et al., 2015a; Ribeiro et al., 2013a).

Quando sistemas lipídicos fundidos contendo hardfats são resfriados, estes por apresentarem ponto de fusão elevado (por volta de 70 a 75°C), iniciam o processo de cristalização anteriormente aos demais componentes do sistema. Desta forma, tais compostos agem como indutores da cristalização, acelerando a formação de núcleos estáveis de cristais, o que consequentemente resultará na formação de uma rede cristalina mais ordenada e coesa (Ribeiro et al., 2013a).

Os hardfats apresentam características distintas de cristalização, sobretudo em relação ao hábito polimórfico preferencial, sendo este fator crucial para a indicação de aplicação em diferentes produtos lipídicos. O hardfat de óleo de soja é composto predominantemente por ácido esteárico (88%) e apresenta hábito polimórfico do tipo β (Oliveira et al., 2015c).

Em organogéis geralmente utiliza-se hardfats em concentrações abaixo de 5%, sendo que nestas concentrações já é possível obter mudanças positivas em relação ao perfil de sólidos, ponto de fusão e consistência dos sistemas lipídicos (Ribeiro et al., 2013b). Contudo, se utilizados em concentrações superiores a este limite, podem resultar na formação de cristais grandes, e consequentemente em textura granular e arenosa, características indesejáveis quando objetiva-se a aplicação em produtos alimentícios (Dassanayke et al., 2011).

Quando utilizados em baixas concentrações, os hardfats, em conjunto com estruturantes do tipo auto-associação, como por exemplo, o monoestearato de sorbitana ou fitoesteróis, apresentaram bom sinergismo com os mesmos, contribuindo para o aumento da resistência térmica do sistema e formação de uma rede cristalina rígida e coesa (Oliveira et al., 2015b).

3.4. Base lipídica 3.4.1. Óleo de soja

A soja é a cultura agrícola produzida no Brasil com maior crescimento nos últimos anos, correspondendo a 49% da área plantada em grãos no país. Este grão é cultivado principalmente nas regiões Centro Oeste e Sul do país, representando um dos produtos de maior destaque na agricultura nacional e balança comercial. As principais formas de comercialização desta oleaginosa é na forma de grão, farelo proteico e o óleo refinado (MAPA, 2015).

O crescimento nos setores envolvidos com a soja, por meio de maiores investimentos em tecnologia, novas áreas agrícolas e industriais para o processamento dos grãos e refino de óleo tem produzido resultados positivos nos volumes operados por ano. Segundo dados da Associação Brasileira das Indústrias de Óleos Vegetais (ABIOVE), no ano de 2014 a produção do óleo de soja foi de 7443 toneladas. Boa parte desta produção é destinada ao consumo interno, tornando o país autossuficiente na produção do óleo de soja, e a parcela excedente destina-se à exportação (ABIOVE, 2015).

O óleo de soja caracteriza-se pela sua composição química de grande interesse nutricional, uma vez que apresenta predomínio de ácidos graxos insaturados, que correspondem a cerca de 85% do total, sendo os principais ácidos graxos o ácido oleico (17 - 30%), linoleico (48 - 59%) e linolênico (4,5 - 11%), com destaque para os dois últimos, que são ácidos graxos das famílias ɷ-6 e ɷ-3, respectivamente, sendo estes comprovadamente essenciais ao organismo. Em relação ao teor de ácidos graxos saturados, estes correspondem a cerca de 15% da composição total, e os principais são o ácido palmítico (8 – 13,5%) e esteárico (2 – 5,4%) (Gunstone, 2002).

Com relação às propriedades físicas apresentadas pelo óleo de soja, este manifesta tendência a formar cristais do tipo β, polimorfo de maior estabilidade em óleos e gorduras. Além disso, possui baixo ponto de fusão (-20°C), devido, sobretudo à sua composição em ácidos graxos, predominantemente insaturada (Gunstone, 2002).

Como considerações finais, o óleo de soja é de grande interesse industrial, uma vez que representa um produto de baixo custo, grande disponibilidade e composição lipídica diferenciada para aplicação em que se almeja a redução no conteúdo de ácidos graxos saturados.

4. MATERIAIS E MÉTODOS 4.1. Materiais

4.1.1. Base lipídica

4.1.2. Agentes Estruturantes

 Óleo de soja totalmente hidrogenado (HS), fornecido pela empresa SGS Agricultura e Indústria Ltda (Brasil);

 Emulsificante monoglicerídeo de ácido graxo (MAG) – Grindsted Crystallyzer 100, fornecido pela empresa Dupont (Brasil);

 Cera de Candelilla (CC), fornecida pela empresa Koster Keunen (EUA).