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Alfabetização dos adultos: recuperação do atraso econômico e desenvolvimento da cidadania

PROFISSIONAL E DE ELEVAÇÃO DA ESCOLARIDADE DOS JOVENS E ADULTOS

1.1 AS TAREFAS DA EDUCAÇÃO DE ADULTOS NO BRASIL: PROFISSIONALIZAÇÃO E PARTICIPAÇÃO CIDADÃ

1.1.2 Alfabetização dos adultos: recuperação do atraso econômico e desenvolvimento da cidadania

Paralelo às mudanças no sistema de formação profissional que se implantou no início dos anos 1940, dando ênfase aos cursos rápidos de Aprendizagem e aperfeiçoamento profissional nas escolas do SENAI, o poder público investia na educação elementar da população e, juntamente com a necessidade de preparação profissional da mão de obra, procurava-se a diminuição dos índices de analfabetismo, considerados, também, causa do atraso econômico brasileiro.

Um fato que evidencia a importância que assumia o domínio da leitura e da escrita na sociedade foi a introdução, na Lei que aprovou a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), do Artigo 417, que exigia “prova de saber ler, escrever e contar aos menores de 18 anos” que requeriam a carteira de trabalho. Di Rocco (1979) observa ser este um momento histórico em que melhorar as condições de trabalho tornava-se uma questão fundamental para a melhoria da produção e, para isso, à educação escolar, atribuía-se papel basilar. Assim, além da necessidade de preparar os jovens e os adultos para as atividades profissionais especializadas, reconhecia-se a importância da leitura e da escrita para a modernização do país e seu consequente desenvolvimento.

A respeito da educação geral dos adultos, é importante considerar as mudanças de ordem política e econômica do período da História do Brasil que vai de 1945 a 1963, uma vez que a educação escolar da maioria da população relacionava-se aos desdobramentos nestas áreas. Economicamente, este período tem como característica a aceleração e a diversificação do processo de substituição de importações e, na área da política, a consolidação do populismo41. A nova Constituição do país, pronta em 1946, tinha, marcadamente, uma característica liberal-democrática e reafirmava, em muitos pontos, a questão da democratização do ensino (RIBEIRO,

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Fausto (2009) explica como características do populismo latino-americano: a promoção no plano econômico de um capitalismo nacional, sustentado pela ação do Estado. No plano político, o populismo buscava reduzir as rivalidades entre as classes, chamando as massas populares e a burguesia nacional a uma colaboração promovida pelo Estado. Assim, explica, o Estado encarnaria as aspirações de todo o povo e não os interesses particulares desta ou daquela classe. Especificamente sobre o caso brasileiro, Fausto (2009, p. 388) aponta que os apelos simbólicos e as concessões econômicas às massas populares seriam a tônica do Getulismo e o favorecimento da burguesia industrial não importaria também em choque aberto com o setor dominante do campo.

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2003).

Nesse período de retomada do processo eleitoral no Brasil a questão da cidadania voltou como tema de discussões políticas e o papel da educação na ampliação do colégio eleitoral nos Estados passou a ser considerado. A preparação para a participação na vida cidadã passou a constituir-se em mais uma tarefa, ao lado da formação para a vida produtiva, a ser cumprida pela educação dos adultos.

A importância assumida pelo tema da educação dos adultos nesse contexto levou o governo federal à organização do Serviço de Educação de Adultos no âmbito do Ministério da Educação em 1947. Neste mesmo ano, foi elaborado o Plano Nacional de

Educação Supletiva para Adolescentes e Adultos Analfabetos, para o qual foram

destinados 25% dos recursos do Fundo Nacional do Ensino Primário42 e, lançada, sob a coordenação do Departamento Nacional de Educação, a Campanha de Educação de Adolescentes e Adultos (CEAA)43. Esta foi a primeira grande ação do governo da União para enfrentar o problema do analfabetismo no país que chegava a 56,17% da população com mais de 15 anos de idade (ROMANELLI, 2010, p. 78).

Paiva (2003) destaca que a criação da CEAA teve a influência da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO44). A posição da UNESCO sobre a educação dos adultos junto aos seus países-membros vem desde sua criação em 1945 e se intensificou a partir de 1948 quando foi aprovada a Declaração dos Direitos Humanos na III Sessão Ordinária da Assembleia Geral das Nações Unidas. Nesta Declaração, consta que “todo homem tem direito à instrução, tornando-a um direito de todos em qualquer idade” (Art. 26). Além da OIT, a UNESCO teve influência no processo de formulação de políticas públicas no campo da educação e formação profissional dos adultos num processo que se acentuaria nos anos seguintes. É importante observar que as duas agências ora destacadas, OIT e

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O Decreto Lei n. 4958 de 14 de novembro de 1942 instituiu o Fundo Nacional de Ensino Primário. Em 1945 foi regulamentado o auxílio federal do Ensino Primário sendo destinados 25% deste auxílio para a educação dos adolescentes e adultos.

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Paiva (2003, p. 206) fala da Campanha de Educação de Adolescentes e Adultos. Beisiegel (1974, p. 89) trata como Campanha de Educação de Adultos. Di Rocco (1979, p. 45), ao se referir à mesma campanha, denomina-a Campanha de Educação de Adultos e Adolescentes. Utilizaremos, aqui, a denominação conforme Paiva (2003). 44

Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO) foi criada em 16 de novembro de 1945 como Organismo Especializado da ONU, com a missão de modificar o homem e a política por meio da educação e da razão.

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UNESCO, representam em suas áreas de atuação as principais tarefas demandadas para a educação no Brasil: educação geral e formação profissional da classe trabalhadora. Considerando que, no caso dos adultos, a educação geral tem como principal ação a alfabetização.

O legado principal da CEAA45 foi a instalação de uma estrutura administrativa nos Estados, autorizada por meio da realização de convênios com a União para repasse de recursos que deveriam ser fiscalizados pelo Instituto Nacional de Estudos Pedagógicos46. A ideia de estender a escolaridade de nível primário a toda população apareceu no início da Campanha como seu maior objetivo. No entanto, para Beisiegel (1974, p. 96), esse era o meio pelo qual se poderia atingir seu verdadeiro fim: “[...] a recuperação de grandes massas da população que vivia praticamente à margem da vida nacional”. O motor dessa ideia era o nacionalismo, no qual se defendia a elevação cultural do povo para recuperar o atraso educacional que se exprimia nas altas taxas de analfabetismo no país. Outra ideia importante foi a de que a elevação cultural- educacional dos adultos se refletiria nas possibilidades de desenvolvimento educacional das crianças. Com base nesse entendimento, a educação dos adultos deixava de ser pensada como uma atividade isolada e tornava-se parte de um processo de elevação cultural da comunidade. Como as maiores taxas de analfabetismo concentravam-se no meio rural, foi nestas áreas que a CEAA foi iniciada e manteve-se por todo o período em que esteve vigente (PAIVA, 2003).

Romanelli (2010) explica que as ações do ensino supletivo com a CEAA, a partir de 1947, além de contribuir para a diminuição das taxas de analfabetismo entre a população com mais de 15 anos (de 56,17% em 1940 chegou a 39,35% em 1960), incentivou a matrícula em cursos profissionais e pré-profissionais de nível primário, evidenciando a estreita ligação entre educação geral e profissional, ainda que isso não tenha se manifestado em políticas públicas integradas nestas áreas.

Em termos práticos, a educação dos adultos, até o início dos anos 1960,

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A Campanha de Educação de Adolescentes eAdultos funcionou entre 1947 e 1963, quando foi oficialmente extinta já no governo João Goulart.

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O Inep foi criado, por lei, no dia 13 de janeiro de 1937, inicialmente era denominado Instituto Nacional de Pedagogia. Em 1938, por meio do Decreto-Lei nº 580, essa instituição teve sua estrutura regulamentada e passou a denominar-se Instituto Nacional de Estudos Pedagógicos.

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continuou sendo pautada pelas Campanhas de Alfabetização47 que vieram acompanhadas de ações que visavam tanto à profissionalização quanto às questões referentes à cidadania. Aqui, podemos afirmar que, apesar de a tarefa anterior dada à educação dos adultos, qual seja a ampliação da cidadania, não tenha sido resolvida, nova demanda se apresentava para essa área: a preparação de mão de obra para os processos produtivos que se modernizavam com o avanço do processo de industrialização do país.

Devemos destacar também, desse período, a sobreposição de atividades para a educação dos adultos, marca histórica desta área, que se mantém até hoje. Entendemos que isso acorre porque as demandas da população jovem e adulta vão sendo percebidas e atendidas de maneira separada e várias ações são empreendidas por diferentes Ministérios ou até mesmo dentro de um mesmo Ministério. Tais ações ocorrem de maneira desarticulada, embora com objetivos parecidos, respondendo a aspectos distintos de uma mesma problemática: educação e formação profissional da população jovem e adulta. Esse é o caso de Programas como o Proeja, Projovem, entre outros que serão tratados na seção seguinte deste trabalho.

No início do governo Jânio Quadros – 1961 –, foi aprovada a nossa primeira Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB 4.024) e, em cumprimento à nova Lei, foi elaborado o Plano Nacional de Educação. Em termos práticos para a educação de adultos, Quadros assinou um convênio entre o governo da União e a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), segundo o qual caberia ao Estado fornecer recursos financeiros para o desenvolvimento de um Movimento de Educação de Base (MEB), sob a responsabilidade da CNBB. Nesse convênio, o MEB desenvolveria trabalhos nas regiões subdesenvolvidas do Norte, Nordeste e Centro-Leste do país por

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Em 1951, a CEAA começou um trabalho voltado ao ensino profissionalizante, e, para isso, o Ministério da Educação e Saúde idealizou a Campanha Nacional de Educação Rural (CNER), que tinha como objetivo principal evitar o êxodo rural, por meio da melhoria nas condições de vida da população do campo. Em 1958, uma terceira campanha foi criada no Brasil, a Campanha Nacional de Erradicação do Analfabetismo (CNEA). Em agosto de 1961, poucos dias antes da renúncia de Jânio Quadros, foi instituída a Mobilização Nacional Contra o Analfabetismo (MNCA) que incorporava as campanhas anteriores ainda em vigência no país. João Goulart, ao assumir a Presidência da República, após a renúncia de Quadros, revogou os decretos assinados por seu antecessor e, por meio de outro decreto (Decreto n. 51.470/62), instituiu novamente a mesma campanha: a Mobilização Nacional Contra o Analfabetismo. Essa Mobilização passou a articular os seguintes movimentos: Campanha da Educação de Adultos Adolescentes, Campanha Nacional de Educação Rural, Construções de Prédios Escolares, Campanha de Erradicação do Analfabetismo e Campanha da Merenda Escolar (PAIVA, 2003).

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meio de sistemas radiofônicos. Neste ponto, podemos perceber a emergência da Igreja Católica como um novo protagonista na área das políticas e práticas de educação de adultos no Brasil, que ainda hoje exerce influência neste campo. Vale lembrar que o MEB mantém suas atividades em algumas regiões do país, ainda no século XXI, com trabalhos no campo da alfabetização de jovens e adultos, pautando suas ações na “luta pela conscientização e vida cidadã”48

(MEB, 2001) sendo essa a terceira grande tarefa

demandada à educação dos adultos a delinear-se a partir da década de 1960.

Quanto à nova LDB de 1961, é importante ressaltar a nova configuração trazida sobre o papel da União em relação à educação no país, no qual caberia ao Ministério da Educação decidir sobre a aplicação dos diversos fundos nacionais. De acordo com a nova Lei, ao governo federal, caberia o estabelecimento de metas a serem alcançadas em todo o país e a ação supletiva das deficiências regionais por meio de auxílio financeiro e assistência técnica. A execução dos serviços educacionais, desta forma, ficaria a cargo dos governos estaduais e municipais.

Ao iniciar o governo parlamentarista de João Goulart em 1961, foi apresentado o Programa de Governo no qual se ressaltava a preocupação em maximizar a rentabilidade dos investimentos educacionais, integrando a educação aos objetivos globais de desenvolvimento nacional. Defendia-se a educação como parte do esforço para o desenvolvimento econômico do país para o qual a educação dos adultos teria papel importante. Embora a relação entre educação e desenvolvimento já tenha se manifestado desde o início da década de 1940, foi na década de 1960 que esta ideia tornou-se mais consistente, abarcando a legislação educacional como um todo. O discurso era que o crescimento econômico da nação exigia pessoas capazes de se iniciar profissional e tecnicamente na sociedade moderna, ressaltando-se que a modernidade requeria dos trabalhadores a capacidade de ler e escrever, de compreender os valores morais, espirituais e políticos da cultura brasileira (PAIVA, 2003).

No início da década de 1960, mesmo com o esforço das campanhas de alfabetização de adultos existentes desde 1947, os índices de analfabetismo ainda

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eram muitos altos49, por isto, essa problemática continuava na pauta de discussão no governo. Em 1962, ante as preocupações quanto à educação dos adultos, o governo federal apresentou um Plano Nacional Contra o Analfabetismo. Neste Plano, as Campanhas já existentes continuavam autônomas e com objetivos específicos (DI ROCCO 1979). Em 1963, atendendo aos preceitos da Lei de Educação e alegando a sobreposição de atividades desenvolvidas pelas diversas campanhas existentes no Brasil, o Presidente João Goulart extinguiu todos os movimentos em prol da erradicação do analfabetismo em vigência no país50 e essa tarefa passou, definitivamente, para os entes federados. À União, caberia o desenvolvimento de atividades de cooperação financeira, assistência técnica, de pesquisa pedagógica e de convocação de congressos e seminários. Além disso, o governo federal seria o encarregado de estabelecer as metas a serem atingidas tanto quantitativa quanto qualitativamente, tal como preconizava a LDB de 1961. Paiva (2003) ressalta que, em decorrência da retirada do governo federal do campo de ações de alfabetização e a emergência dos movimentos sociais neste campo, os trabalhos que visavam à educação dos adultos por meio dos movimentos locais se ampliaram, multiplicando-se pelos estados brasileiros.

A extinção das Campanhas de Alfabetização de Adultos aconteceu em um período em que muitos setores da sociedade passaram a se interessar pelo problema do analfabetismo e começavam a ser organizados os movimentos de educação popular51 em várias regiões do país. Esses movimentos eram dirigidos para a promoção da cultura popular e para a formação da consciência política da população adulta.

A emergência da sociedade civil52 nas ações com o objetivo de promover a

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Analfabetismo na população de quinze anos e mais: 39,4% (XAVIER; RIBEIRO; NORONHA, 1994, p. 227). 50

Do Departamento Nacional de Educação, foram extintas as seguintes Campanhas: Campanha de Educação de Adultos e Adolescentes (CEAA); Campanha Nacional de Educação Rural (CNER); Campanha Nacional de Erradicação do Analfabetismo (CNEA) e a Mobilização Nacional contra o Analfabetismo (MNCA). Subordinadas ao Instituto Nacional de Estudos Pedagógicos, foram extintas: a Campanha de Construções e Equipamentos Escolares e a de Aperfeiçoamento do Magistério Primário e Normal (DI ROCCO, 1979, p. 63).

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Paiva (1986, p. 33), ao explicar a concepção de “educação popular”, relaciona-a com os movimentos educativos junto às camadas populares empreendidos por parte da igreja católica. Assim, coloca que o “[...] adjetivo popular deslocou-se do destinatário para o conteúdo político da educação, aparecendo como legitimamente digna de tal qualificativo apenas a educação produzida pelas classes populares ou para as classes populares em função de seus interesses de classe e, de preferência, realizada através de um processo informal inserido e confundido com a vida cotidiana das camadas populares”.

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Além dos trabalhos de Freire, outras iniciativas no campo da educação popular no Brasil foram desencadeadas nesse período, das quais destacamos os Centros Populares de Cultura, que floresceram em todo o país com o objetivo de promover a cultura da população que estava à margem da sociedade letrada. Tais movimentos

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educação popular e a alfabetização dos adultos aconteceu num contexto social marcado pelo avanço dos movimentos sociais e a emergência de novos atores no campo das lutas sociais no Brasil. Destes novos grupos, destacamos os setores do campo que, esquecidos durante os governos populistas, começaram a se mobilizar motivados pelas mudanças estruturais53 ocorridas no Brasil entre os anos 1950 e 1964; os estudantes, que, desde o governo João Goulart, mobilizaram-se levando à radicalização suas propostas de transformação social, passando a intervir diretamente no jogo político, e integrantes da Igreja Católica que, já na década de 1950, direcionaram sua atuação para as questões sociais e com uma preocupação maior com as camadas populares. Desses últimos, destacamos a Juventude Universitária Cristã (JUC), que teve uma participação importante na construção da ideia da educação popular no Brasil.

A partir desta nova forma de atuação tanto do Estado quanto da sociedade, novas exigências quanto aos programas de educação de adultos se faziam necessárias. Defendia-se uma educação que, além das técnicas de leitura e escrita, pudesse desenvolver o homem, a sua conscientização e a cultura. Neste sentido, Beisiegel (1974) explica que, por suas características, o método de alfabetização desenvolvido por Paulo Freire parecia responder às demandas educacionais tanto do governo quanto da sociedade. Por se tratar de um trabalho que partia da realidade social do alfabetizando, no qual a leitura e a escrita não tinham um caráter meramente instrumental, mas possuía, além deste, um conteúdo cultural, o método do Prof. Paulo Freire distinguia-se dos métodos tradicionais empregados na educação de adultos no Brasil. À medida que se analisa a conjuntura social brasileira, pode-se perceber que, desde as lideranças estudantis até o próprio governo da União, criaram-se as condições de trabalho para o desenvolvimento das ideias de Paulo Freire na área educacional. nasceram, no início dos anos 1960, devido a preocupações de intelectuais, políticos e estudantes quanto à participação política da população brasileira, que, nesse período, ainda possuía um grande número de analfabetos alijados do processo eleitoral. Quanto à posição da Igreja católica, vale ressaltar que aumentava o número de católicos preocupados com as questões sociais e políticas no país, sobretudo a partir do envolvimento da Juventude Universitária Cristã. (PAIVA, 2003).

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Tais mudanças são caracterizadas, sobretudo, pelo crescimento urbano e pelo processo de industrialização que ampliaram o mercado de produtos agrícolas, levando a uma mudança na forma de posse e uso da terra. Muitos posseiros foram expulsos e ou tiveram a suas condições de trabalho agravadas, o que levou ao descontentamento desses setores. (FAUSTO, 2009).

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Certamente, foram as mesmas implicações políticas desse método que levaram à sua disseminação em várias regiões do país e, ao mesmo tempo, a sua recusa após o golpe militar de 1964 pelo novo governo.

Paiva (2003, p. 258) nos lembra de que os grupos que se lançavam ao trabalho com a educação popular54, embora com métodos diferentes, tinham como objetivo comum a “[...] transformação das estruturas sociais, econômicas e políticas do país, sua recomposição fora dos supostos da ordem vigente; buscavam criar a oportunidade de construção de uma sociedade mais justa e mais humana”. Abriu-se, nesse período, uma nova etapa na educação dos adultos do país, com novos atores e nova demanda para a área a que nos referimos anteriormente: a formação da consciência política para mudança da estrutura da sociedade.

Enquanto se consolidava uma educação de adultos voltada para a alfabetização e a conscientização política, no campo da profissionalização dessa mesma população, até a década de 1960, fortalecia-se a estrutura criada na década de 1940. As escolas do Sistema S, especialmente o SENAI – construídas segundo a ótica e as necessidades dos empresários – foram ampliadas. Consolidou-se, desta forma, uma estrutura formada por escolas oficiais que materializaram um modelo de educação dualista no qual, de um lado, pautado em uma concepção acadêmica e generalista, os alunos tinham acesso aos conhecimentos cada vez mais amplos e, de outro, oferecia- se uma educação profissional na qual o aluno recebia um conjunto de informações importantes para o desenvolvimento de seu ofício sem a preocupação com questões teóricas (MANFREDI, 2002).

Depois do golpe militar de 1964, é possível perceber uma ênfase na educação e formação funcional nas ações oficiais para a educação dos adultos. Outra questão foi o esforço em sistematizar as funções atribuídas a essa modalidade da educação na legislação nacional que foi produzida no período. Tais funções – suplência, suprimento, qualificação e aperfeiçoamento, a serem discutidas no próximo item –, ao mesmo tempo, aproximavam, no âmbito do discurso, a educação dos adultos da formação

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Destes movimentos, pode-se citar como exemplo o Movimento de Cultura Popular (MCP) De Pé no Chão também

se Aprende a Ler, movimentos das prefeituras de Recife e Natal; o Centro Popular de Cultura da União Nacional dos

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profissional, na prática, reforçavam a institucionalização destes dois campos em sistemas escolares distintos para o atendimento da população jovem e adulta.

1.2 ENSINO SUPLETIVO E TREINAMENTO DOS TRABALHADORES:

ALFABETIZAÇÃO FUNCIONAL, SUPLÊNCIA, QUALIFICAÇÃO, APRENDIZAGEM E APERFEIÇOAMENTO

O período que antecedeu ao golpe militar de março de 1964 caracterizou-se pela efervescência dos movimentos de caráter popular no campo da educação e, na arena política, pela emergência de grupos e partidos de esquerda. Em meio às