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2. EXIBIR, DEBATER E ENSINAR: AS PROMOÇÕES DO CCUC DURANTE OS

2.10. ALGUMAS CONSIDERAÇÕES

Diante da realidade do circuito exibidor comercial de Campinas na segunda metade dos anos 1960 e início dos anos 1970, preocupado quase que exclusivamente com obras hollywoodianas, é possível dizer que o Cineclube Universitário desempenhou um papel decisivo no que diz respeito a trazer à vida cultural da cidade uma nova opção. No período de sua existência, o CCUC proporcionou ao público campineiro a possibilidade de ver e discutir filmes até então somente exibidos na capital do Estado.

Além disso, com a promoção de festivais como as Semanas do Cinema Francês e a Semana Internacional do Filme Moderno, o espectador de Campinas pôde colocar-se em contato com obras contemporâneas de grandes diretores de diferentes locais do mundo, como Jean-Luc Godard, bastante querido pelo grupo do cineclube, Michelangelo Antonioni ou Ingmar Bergman. A agitação cultural dos anos 1960 e 1970, as novas propostas cinematográficas e os jovens diretores puderam, então, ser colocados em debate em diferentes salas de cinema campineiras, alugadas pela equipe do CCUC.

Ao todo foram exibidos mais de uma centena de filmes114, em vários locais, como o Cine Brasília, o Cine Alvorada, o auditório da UCC, o Centro de Ciências, Letras e Artes, o

61 Cine Regente, entre outros. O contato inicial para requisitar películas, muitas vezes, era feito com os consulados dos diferentes países e, em seguida, diretamente com as distribuidoras, como Paris Filmes, Áurea Filmes, Mundial Filmes, Cia. Cinematográfica Franco-Brasileira etc. Os nomes das distribuidoras com que negociavam aparecem pouco nos documentos do cineclube, por isso não é possível precisar todas as empresas com que tiveram contato. Com relação ao cinema nacional, destaca-se a Difilm, que distribuía filmes do Cinema Novo e de Roberto Farias.

De qualquer forma, os tipos, gêneros e nacionalidades dos filmes exibidos durante a existência do CCUC foram variados. É possível notar, no entanto, uma maior ocorrência de festivais de películas francesas, talvez por conta da maior facilidade de obtenção das fitas, que ocorria, em certas ocasiões, como o Ciclo de Filmes Clássicos Franceses, com o apoio da Aliança Francesa e da Cinemateca da Embaixada da França. A preocupação em trazer ao público campineiro obras europeias pode ter imperado nas sessões promovidas pelo cineclube, porém não podemos esquecer que também foram realizados festivais de cinema brasileiro e americano, e algumas exibições de filmes japoneses e canadenses.

Importante se faz lembrar que, apesar de seus esforços para levar fitas filiadas ao cinema de arte a seus sócios e demais interessados, o CCUC não cumpria uma periodicidade rígida em suas promoções. A disponibilidade das salas onde seriam exibidos os filmes era determinante para a escolha de datas, o que, aliado às dificuldades em conseguir as cópias, contribuiu para a falta de periodicidade da programação. Além disso, as atividades de redação do jornal Cine Clube e de realização de curtas-metragens não permitiam que as exibições fossem realizadas em intervalos regulares de tempo. Em 1972, por exemplo, durante o segundo semestre, nenhuma sessão foi promovida, por estarem os membros do Cineclube Universitário envolvidos com o processo de finalização de seu terceiro filme, Dez jingles para Oswald de Andrade.

Essa realidade também nos leva a refletir sobre a quantidade de atividades desenvolvidas nos diferentes anos em que o cineclube existiu. Entre festivais, ciclos e semanas foram promovidos ou apoiados catorze eventos, dos quais seis foram exclusivamente dedicados ao cinema francês, ou seja, quase a metade das promoções. Dos demais festivais, três foram de cinema brasileiro, um de cinema polonês, um de cinema norte-americano, um de cinema italiano e dois abrangendo variadas nacionalidades, novamente com predominância de filmes franceses e, em menor quantidade, filmes italianos e brasileiros.

62 Quando falamos em filmes brasileiros, é possível notar que sua grande maioria era de obras ligadas ao movimento do Cinema Novo. A ideia de um cinema de autor feito no Brasil muito animava os integrantes do CCUC, que, através da promoção de exibições desses filmes, da elaboração de críticas sobre eles e da realização de seus próprios filmes, foram capazes de divulgar as propostas que regiam esse movimento. A partir da relação com a Difilm, a distribuidora ligada ao Cinema Novo, foi possível promover sessões de filmes como Deus e o diabo na terra do sol e A hora e a vez de Augusto Matraga.

Não se pode esquecer, no entanto, das limitações impostas pelas distribuidoras às exibições promovidas pelo cineclube. A quantidade de títulos era limitada e, muitas vezes, os filmes a serem exibidos eram escolhidos pela própria distribuidora, como foi o caso da II Semana do Cinema Francês.

Considerando tais dificuldades, é possível afirmar que o ano de 1969 foi o de maior movimentação no cineclube. A mudança na diretoria, com a eleição de Dayz Peixoto Fonseca para a presidência, deu um novo fôlego ao CCUC, que vinha de uma grande queda no número de atividades desenvolvidas no ano anterior. Uma explicação para a diminuição acentuada das ações do cineclube em 1968 poderia ser o fato de existir um acúmulo de incumbências dos membros da diretoria, que sequer conseguiam organizar o quadro de sócios, para a concretização de novas eleições.

Nos três primeiros anos de existência do Cineclube Universitário, assim como no ano de 1970, foi mantida uma média de exibições, algo que não se repetiu nos anos seguintes. A partir de 1971 e até 1973, o cineclube exibiu somente oito filmes e realizou Dez jingles para Oswald de Andrade. Já em 1972, os sinais de declínio se tornaram mais evidentes, com a promoção de poucas sessões, por conta do impedimento, cada vez maior, de que o cineclube tivesse o poder de escolha de títulos para serem exibidos em salas de cinema, e também pelo fato de a Prefeitura de Campinas haver passado a negar ao CCUC o valor correspondente ao imposto sobre diversões públicas. Assim, é possível notar a diminuição nas atividades, que culminaria na extinção do Cineclube Universitário, em 1973.

Mesmo em processo de decadência, em 1972, o CCUC recebeu os integrantes do Cine Universitario del Uruguay, o que demonstra seu relacionamento com outros cineclubes não só brasileiros, mas também sul-americanos, assim como fazia o Clube de Cinema de Porto Alegre. Ademais, o Cineclube Universitário de Campinas, como pudemos notar ao longo desse capítulo, mantinha contato próximo com o Centro de Cineclubes de São Paulo,

63 acompanhando assembleias e encontros, e comparecendo às Jornadas Brasileiras de Cineclubes, que ocorriam em diversos locais do território brasileiro.

Os cursos oferecidos pelo CCUC foram três, dois em 1967 e um em 1970. Os debates são mais difíceis de numerar, porém ocorreram diversas vezes, incitados por sessões promovidas pelo Cineclube Universitário ou por filmes em cartaz em algum dos cinemas da cidade. Por conta da falta de uma sede apropriada, os debates aconteciam na UCC ou no CCLA.

A questão da sede também é algo interessante de ser relembrado. Inicialmente, foi concedida pela Universidade Católica uma sala próxima ao Pátio dos Leões, que, em seguida, foi tomada de volta, assim como as salas utilizadas pelos centros acadêmicos. Posteriormente, a sede do cineclube foi transferida para o casarão do chamado “Centrão”, no centro da cidade, onde também funcionavam os centros acadêmicos. Após, em 1969, com a presidência de Dayz Peixoto Fonseca, foi oferecida, pelo reitor da UCC, uma nova sala, que também era ocupada pelo DCE. Depois disso, próximo ao ano de 1971, o cineclube deixou de possuir sede ou endereço oficial. Os documentos referentes ao CCUC eram guardados na casa da então presidente, onde também ocorreram várias reuniões.

Quanto à Universidade Católica de Campinas, sua proximidade com o cineclube se esvaiu ao longo do tempo. Apesar de haver sido o berço do CCUC, a maior contribuição da UCC, além do estímulo inicial, foi haver fornecido uma sede ao cineclube durante seus primeiros anos, em uma sala própria, além de auxílio financeiro para a publicação do primeiro número do jornal Cine Clube. Depois, com o episódio envolvendo o Cineclube Universitário e o então Cônego Amaury Castanho, houve um distanciamento por parte da universidade. O contato foi retomado em maior intensidade quando, na gestão de Dayz Fonseca, teve início o trabalho de exibição de filmes junto aos cursos e a retomada de uma sede na Universidade. Atualmente, constatamos que a PUC-Campinas pouco divulga sua relação com o CCUC, tampouco possui em sua biblioteca um arquivo destinado a informações sobre o cineclube.

Uma das maneiras mais interessantes de aproximação entre o público e o CCUC, além das sessões, debates e cursos, era o jornal Cine Clube. A partir dele foi possível iniciar o mapeamento das exibições realizadas pelo cineclube campineiro, durante os anos de sua publicação. Em suas páginas, as críticas, escritas pelos membros do CCUC e colaboradores, sendo várias sobre filmes apresentados em sua programação, foram capazes de enunciar o pensamento cinematográfico de um grupo de jovens universitários de classe média que seria responsável pela realização de curtas-metragens na cidade, utilizando-se das influências das

64 obras assistidas. É sobre o jornal Cine Clube que se deterá o próximo capítulo dessa dissertação.

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