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Alguns aspectos das teorias da Comunicação

CAPÍTULO 01 MÍDIA-EDUCAÇÃO E POLÍTICAS DE INSERÇÃO DE TECNOLOGIAS DA

1. Mídia, Educação e Comunicação

1.3 Alguns aspectos das teorias da Comunicação

época (1995, p. 12). Supomos que Freinet, na atualidade, estaria de acordo com a inclusão das tecnologias e meios digitais não só na escola, na perspectiva de oficinas, mas no interior de todas as salas de aula, durante todo o processo de ensino e aprendizagem. Por isso, ele é um autor que nos ajuda a atualizar suas concepções de imprensa e correspondência escolar para os meios atuais, e refletir sobre o modelo atual centralizador das salas informatizadas, das escolas brasileiras, a fim de ampliar as possibilidades de educação e comunicação.

1.3 Alguns aspectos das teorias da comunicação

No campo da Comunicação, várias teorias foram sendo engendradas no decorrer de momentos históricos. De acordo com Mattelart, a noção de comunicação envolve vários sentidos, e seus processos suscitaram o interesse de várias ciências, situados como objetos de fronteira numa “encruzilhada de várias disciplinas” (2006, p. 09). O autor procura dar conta da pluralidade e da dispersão desse campo, afirmando que a história das teorias da comunicação é a história das separações. Para Mattelart “em contextos históricos diversos, sob formulações variadas, essas tensões e antagonismos, fontes de exclusão, não deixaram de se manifestar, dividindo escolas, correntes e tendências” (p. 10).

Considerando a pluralidade e a dispersão do campo, indicados por Mattelart, abordamos aspectos de algumas teorias da Comunicação, pois nos dão suporte para pensar fragmentos da complexidade das relações comunicacionais na escola. Chamam atenção, entre estas teorias, duas em especial, a primeira é a Teoria Crítica, originária na Europa, no século passado, e a segunda são os Estudos Culturais, também originários na Europa, e seus desdobramentos latino-americanos com a ênfase na Teoria das Mediações.

Abordamos estas duas teorias da comunicação neste trabalho pois a Teoria Crítica é uma escola de pensamento que critica a instrumentalização das coisas e dos sujeitos, e atribui a mídia uma ideologia dominante que é preciso ter consciência para combatê-la. Contudo, ela limita o papel dos espectadores a uma relação passiva, uma massa inerte, justamente o contrário do que os teóricos dos Estudos Culturais (especialmente os latino- americanos) defendem, mostrando uma dimensão ativa da recepção, em que os espectadores não absorvem os conteúdos e as mensagens de forma tão passiva. De um lado, não podemos nos esquecer da dimensão ideológica, por vezes alienante e reprodutiva dos meios de comunicação de massa, sendo necessária mesmo uma postura reflexiva e crítica. De outro lado, com uma recepção ativa podemos observar que os espectadores e usuários podem resignificar o sentido dos conteúdos e mensagens dos meios, e através da mediação educativa, esse processo pode ser crítico e participativo também.

1.3.1 A Teoria Crítica

A Teoria Crítica foi concebida por filósofos e sociólogos que compunham a chamada Escola de Frankfurt, na Alemanha, no final dos anos 20. Este grupo tinha um posicionamento crítico diante da sociedade capitalista da época, e tinha como foco a indústria cultural e a cultura de massa, numa época em que o cinema, o rádio, e as publicações impressas passavam a acelerar seu processo de popularização, atingindo várias camadas da sociedade, especialmente as 'massas' de trabalhadores.

Theodor W. Adorno e Max Horkheimer foram críticos bastante enfáticos, até radicais, da indústria cultural e da cultura de massas, e diante do momento histórico que viviam, é compreensível que precisassem demarcar as diferenças. O texto “A Indústria Cultural”, escrito por volta de 1948 (logo após a Segunda Guerra), é praticamente um manifesto político contra a reprodução mecânica da indústria cultural, e contra a “atrofia da imaginação” e alienação produzidas por ela nos sujeitos. No texto, Adorno e Horkheimer comparam filmes e rádio à automóveis e bombas, todos produtos da indústria. Para eles, cinema e rádio são “barbáries estilizadas”, e não poderiam ser considerados como arte, pois sendo construções da indústria cultural “servem para classificar e organizar os consumidores a fim de padronizá-los” (1982, p. 177).

Para os autores, a indústria cultural faz com que os espectadores não pensem por si, pois a atividade intelectual é evitada com a ausência de significados. Para eles, cada vez mais a indústria procura fazer a fusão entre cultura e diversão, e ressaltam que “quanto mais sólidas se tornam as posições da indústria cultural, tanto mais brutalmente esta pode agir sobre as necessidades dos consumidores, produzi-las, guiá-las e discipliná-las, retirar-lhes até o divertimento”. (1982, p. 192)

Outro teórico importante desta teoria crítica foi Walter Benjamin, que apesar de ser identificado com seus pressupostos, para alguns autores ele acrescentou um novo olhar para esta teoria. No texto “A Obra de Arte na era da sua reprodutibilidade técnica”, escrito em 1936, Benjamin faz referência à fotografia, criticando a reprodutibilidade mecânica da arte, que se iniciava intensamente com a indústria cultural da época, e fazia com que a reprodução da fotografia perdesse a sua “aura”, que seria o “aqui e agora” da obra de arte, bem como seu caráter único, sua singularidade e a sua durabilidade. Conforme Silverstone (2002, p. 51), Benjamim reconheceu momentos decisivos na história da cultura ocidental, pois a reprodução mecânica “é o traço definidor da tecnologia midiática”.

Benjamin admite que as mudanças daquele momento histórico enriqueceram o horizonte da percepção humana. Ao historicizar a percepção e admitir que ela se modifica ao longo do tempo, o autor enfatiza a mudança na forma como as pessoas passaram a perceber a arte por causa do cinema e da fotografia, e demonstra uma preocupação com a

recepção estética das obras. Esta parece ser uma grande contribuição para os estudos de recepção, pois ao invés de focar apenas na produção e na emissão, como os demais teóricos da Escola de Frankfurt, Benjamin aponta para a importância de se voltar para o processo de recepção dos espectadores.

Além disso, Benjamin também apresenta uma visão mais positiva da “cultura das massas”, como matriz de novas atitudes, diferenciando-se dos outros pensadores da Teoria Crítica. Ele denuncia e presta atenção ao que se perde, mas também está atento às coisas novas, o que nos auxilia a pensar as mudanças vividas atualmente e suas consequências para a educação.

1.3.2 Os Estudos Culturais e os Estudos de Recepção

Os Estudos Culturais (Cultural Studies) é uma corrente de investigação que teve sua origem na Inglaterra, na Universidade de Birmingham, por volta de 1960, a partir da implementação do Centre of Contemporary Cultural Studies (CCCS). Os três primeiros fundadores foram Richard Hoggart, Raymond Williams e Edward P. Thompson (Mattelart e Neveu, 2006, p. 23), e alguns anos depois, esse grupo foi completado com Stuart Hall. Os Estudos Culturais se ocupam em trabalhar com a cultura contemporânea, abrangendo várias ciências. Sobretudo para compreender a dimensão da recepção de programas televisivos, para entender como o meio social, o gênero ou a etnia interfere nas relações das pessoas com a cultura. Conforme Mattelart e Neveu (2006, p.8):

O objetivo é encarar a cultura num sentido lato, antropológico, alternar entre uma reflexão focalizada na ligação cultura-nação e uma abordagem da cultura dos grupos sociais. Se se mantiver ligada a uma dimensão política, a principal questão consistirá, pois, em compreender de que forma a cultura de um grupo, e, principalmente, a das classes populares, funciona como contestação da ordem social, ou, inversamente, como modo de adesão às relações de poder.

Associado a uma evolução dos Estudos Culturais, ocorre uma “virada etnográfica” que designou uma migração dos Estudos Culturais para os estudos de diferentes modalidades de recepção das mídias a partir de diferentes públicos, esclarece Mattelart e Neveu (2006, p. 53). E isso tem contribuído para dar visibilidade à questão da recepção, pois para o autor, os Estudos de Recepção seria um campo que ultrapassa os Estudos Culturais. “Objetivos, pressupostos epistemológicos e estratégias de investigação muito diversos tocam-se, casam-se, remetem um para o outro ou entrelaçam-se” (p. 55).

E seguindo a ideia de migração, podemos situar a abordagem latino-americana dos Estudos Culturais. Neste enfoque mais amplo, pesquisas latino-americanas sobre as

culturas populares contemporâneas tiveram origem na década de 80, com trabalhos como os de Jesús Martin-Barbero, Nestor Canclini, Renato Ortiz, Guilhermo Orozco, e outros.

Alguns autores situam o que seria uma possível vertente dos Estudos Culturais latino- americanos, os Estudos de Recepção, que pode ser entendido como especificidade de um desdobramento da corrente inglesa, “de teoria latino-americana das mediações ou também o enfoque integral das audiências” (OROFINO, 2005, P.32). Se há ou não especificidades entre as abordagens inglesa e latino-americana não iremos aqui aprofundar. O que interessa neste momento é situar a ênfase que os Estudos Culturais, os Estudos de Recepção e a “teoria das mediações” trazem para pensar a mediação escolar.

A ênfase dos estudos de recepção inverte a lógica que até então se usava para pensar a realidade comunicacional, em que os espectadores eram vistos como receptores passivos e sujeitos à ideologia dominante e à alienação imposta pelos meios de comunicação. Os estudos de recepção, ao contrário, “têm como preocupação fundamental compreender como se estabelecem processos de atividade por parte dos receptores a partir de mecanismos de seleção, apropriação ou recusa” (OROFINO, 2005, p. 54).

O pesquisador Jesús Martín-Barbero é considerado um dos representantes da corrente teórico-metodológica dos “Estudos Culturais latino-americanos”, e no livro Dos Meios às Mediações, Barbero destaca as potencialidades das mediações, enfatizando a recepção.

Assim a comunicação se tornou para nós questão de mediações mais do que de meios, questão de cultura e, portanto, não só de conhecimentos mas de re-conhecimento. Um reconhecimento que foi, de início, operação de deslocamento metodológico para re-ver o processo inteiro da comunicação a partir de seu outro lado, o da recepção, o das resistências que aí têm seu lugar, o da apropriação a partir de seus usos. (2003, p. 28)

Ao invés de pensar do lado de quem produz as mensagens, dos meios de comunicação, Barbero pensa do lado de quem as recebe, e verifica as mediações da cultura que acontecem a partir das mídias. Sua abordagem faz um deslocamento do lugar das perguntas e busca superar a compreensão do emissor como dominador e dos receptores como dominados (Orofino, 2005, p. 61).

Para Barbero, o popular, o erudito e o massivo não podem ser vistos separadamente, por isso questiona, na esteira dos Estudos Culturais britânicos, o conceito de alta e baixa cultura, concebendo cultura como produção, ação e reprodução, e não só como um acervo. Assim, para o autor, a apropriação cultural também é criação, autoria e espaço de mediação.