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Aliança rede Gife e redEAmérica

3 A REDE GIFE

3.2 Formas de atuação

3.2.1 Aliança rede Gife e redEAmérica

A redEAmérica é uma rede interamericana de fundações e ações empresariais na América Latina, liderada pelo setor empresarial, criada em 2002 com o objetivo de reunir empresas e organizações empresariais para promover ações visando redução da pobreza, inclusão social e fortalecimento da democracia nas Américas. É composta por 56 empresas e organizações distribuídas em 12 países da região, e contabiliza alianças internacionais com outras organizações como: Inter American Foundation (IAF); BID, Banco HSBC, México; Codespa, Espanha; Instituto Tecnológico de Monterrey, México; Usaid; Fundación Documenta, Espanha; Fundación DIS, Colômbia; Gife (REDEAMÉRICA, 2010).

A redEAmérica oferece aos associados ferramentas construídas para melhorar práticas e impacto de suas intervenções no desenvolvimento de base; formação para equipes dirigentes e técnicos; recursos para iniciativas em nível nacional e

hemisférico; acesso à base de contatos e vínculos com fundações e empresas que atuam de forma similar; estágios e intercâmbios entre membros da rede; seminários, fóruns e ciclos de formação; informação online e impresso. Tem como missão contribuir a la reducción de la pobreza y la inequidad en América Latina, articulando esfuerzos de fundaciones y organzaciones empresariales que promueven el desarrollo de base e mantém cinco linhas de ação: a) aprendizagem e geração de capacidades, b) alianças e trabalho em rede, c) recursos e oportunidades, d) incidência, e) comunicação, promoção e relações públicas (REDEAMÉRICA, 2010).

A aliança da redEAmérica com o Gife é uma iniciativa que se soma a outros seis programas mantidos pela primeira, a saber: construção de capacidades, programa de aprendizagem, programa Bid-redEAmérica, Fundo nacional colombiano, Fundo nacional argentino e formação virtual. O programa “construção de capacidades”, realizado entre 2003 e 2008, objetivou o desenvolvimento de conhecimentos e capacidades institucionais de seus membros para gestão do desenvolvimento de base, iniciativa que resultou em publicações disponíveis no website da rede: “Kit Construir Junto”, quatro cadernos e um guia de trabalho, com definições conceituais e orientações gerais para promoção do desenvolvimento de base; três guias de acompanhamento de organizações de base; e estudos sobre

organizações, redes intersetoriais e processos de desenvolvimento local (REDEAMÉRICA, 2010).

De acordo com Rodrigo Villar, consultor da redEAmérica Continental e da Fundación DIS, desenvolvimento de base é “o fortalecimento das capacidades de ação coletiva dos cidadãos excluídos e a criação de um ambiente institucional propício que facilite a participação das organizações de base na deliberação pública” (VILLAR, 2007, p. 9). Para o consultor, a estratégia no desenvolvimento de base seria dupla e complementar: de um lado exigiria “o fortalecimento da voz dos pobres” e de outro “a melhoria da capacidade de escuta do restante da sociedade e das instituições públicas” (VILLAR, 2007, p. 10). O conceito está relacionado à idéia de “sustentabilidade” e “autonomia” das “organizações de base” (ou organizações populares atuantes numa determinada localidade), e é encarado como uma possibilidade de:

[...] redución de la pobreza [que] puede ser impulsionada por organizaciones populares de base, redes sociales intersectoriales y programas de desarrollo local con capacidad de actuar, simultáneamente, como instancias que articulen la participación democrática y la mobilización de condiciones para la autosostenilidad e inclusión no marginal de los pobres en la economia (RIBAS; RIBAS JR., s/d, p. 11).

A estratégia do desenvolvimento de base de dar “voz aos pobres”, referida pelo consultor Rodrigo Villar, foi base para o

Relatório do Desenvolvimento Mundial 2000/20001 do Banco Mundial fundamentado em pesquisas realizadas em mais de 60 países (BANCO MUNDIAL, 2000). De acordo com comunicado à imprensa do Banco Mundial:

O relatório baseia-se no ponto-de-vista segundo o qual a pobreza não representa apenas baixa renda e baixo consumo, mas também a falta de educação, de nutrição e de saúde. Fundamentado no depoimento dos próprios pobres e em mudanças na maneira de se ver a pobreza, ele vai além da definição da pobreza para incluir também o sentimento de falta de poder, a incapacidade de se expressar, a vulnerabilidade e o medo (BANCO MUNDIAL, 2000, p. 2).

Vozes dos pobres, publicado em maio de 2000, foi título de um relatório nacional sobre a pobreza elaborado pela Fundação de Apoio ao Desenvolvimento da Universidade Federal de Pernambuco para o Poverty Reduction and Economic Management Network do Banco Mundial (BANCO MUNDIAL, 2000a). Os estudos que fundamentam esse relatório foram realizados em dez comunidades das cidades de Recife, Santo André e Itabuna; o relatório ressalta a necessidade da “politização” e “mobilização das comunidades” como estratégia para que suas reivindicações sejam atendidas (BANCO MUNDIAL, 2000a, p. 46-47). Outro elemento ressaltado foi a educação como fator necessário à redução da pobreza (BANCO MUNDIAL, 2000a, p. 85). De acordo com o documento,

[...] o governo é o maior responsável pela falta de oportunidades para que os indivíduos pobres melhorem de vida. Serviços públicos básicos tais como saneamento, educação, obras de infra- estrutura e serviços de saúde são considerados pré-condições importantes para a melhoria das condições de vida. Há uma percepção generalizada que a oferta adequada desses serviços permitiriam aos indivíduos sair da pobreza (BANCO MUNDIAL, 2000a, p. 86).

Nesse sentido, exercer controle sobre instituições estatais de “pior performance” foi a solução apresentada medida para “fortalecimento das instituições” e possibilidade de implementar mecanismos de responsabilização no nível local (BANCO MUNDIAL, 2000a, p. 90). As soluções apresentadas pelo Banco Mundial foram incorporadas pela redEAmérica e Gife e justificam programas/projetos implementados, fundamentados nos slogans da confiança, cooperação, ajuda mútua, mobilização, etc.

Podemos dizer que a união de rede Gife e redEAmérica evidencia dois movimentos simultâneos: o encontro de interesses da classe social dominante para a produção de pactos entre capitais, industrial e financeiro, que anuncia redução da pobreza e inclusão social como justificativas para promover tais alianças, mas que no entanto, sob a égide do neoliberalismo de Terceira Via, para recompor-se no poder como classe hegemônica, precisa respaldar-se em relações de confiança mútua e cooperação inter-

organizacional, viabilizadas quando organizadas em rede. O segundo movimento está intrinsecamente relacionado ao primeiro, e qualifica a rede como um espaço educativo para “uma nova cultura cívica, baseada em um associativismo colaboracionista” (NEVES, 2010, p. 36), dirigido por intelectuais, coletivos, “de tipo americano”.

A rede Gife, embora privilegie questões específicas em suas ações, atua como intelectual orgânico do capital, e reproduz, em nível local, os mesmos movimentos analisados até aqui, acrescido de um terceiro: a influência na produção e implementação de políticas públicas, tema do item que segue.