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Alquimia dos Elementos, Matizes, Totem Animal, Roda de Objetos e Objeto

3.2 THÉRÈSE IN PROCESS: PROCEDIMENTOS MITODOLÓGICOS DE

3.2.1 RITOS DE PARTIDA

3.2.1.3.4 Alquimia dos Elementos, Matizes, Totem Animal, Roda de Objetos e Objeto

Recife, 20 de outubro de 2016.

Querida Teresa,

retomamos o trabalho com os quatro elementos. Do primeiro

contato, o Prof. Robson trouxe a poética dos elementos e lá

experienciamos, em especial, a relação com a água e o fogo.

Posteriormente, adensamos essa relação via os procedimentos

mitodológicos pela Alquimia dos elementos, sob a orientação

de Lyra. Penso que essa proposição de ativação do

imaginário do atuante via a relação com os elementos é um

dos pontos de contato entre ambas proposições de trabalho.

Os caminhos apontados na condução do processo são

diferentes, mas com alguns pontos de contato e fins

semelhantes.

Segundo Lyra (2015):

Entendendo que o corpo humano é uma síntese do cosmos, uma espécie de microcosmos e que o cosmos é formado por quatro elementos que se combinam, todos esses mesmos elementos estão no corpo. Sendo assim, água, terra, fogo e ar, atuam como hormônios para imaginação, como no dizer bachelardiano (2006), ampliando, potencializando as imagens e as preenchendo de gradações e sentidos (p. 51).

Na prática cênica que partilhei com a banca na qualificação, em Campinas (SP), a cena trazia a configuração arena com referência a cada um dos elementos na sequência da performance. Guardei comigo as anotações do que intitulei de trajetória dos quatro elementos na criação de Thérèse, e identifiquei um caminho de retroalimentação, à medida que vou até o elemento, ele também vem a mim: nos transformamos, encaixamos e complementamos.

Neste percurso / processo, elenquei o entrecruzamento dos elementos por meio de algumas imagens em Thérèse:

IMAGEM 20: Prática cênica na qualificação de Mestrado, em Campinas, 2016.

Fonte: Camila Duarte. Edição: Karla Martins

Querida Teresa, trabalhar com o elemento terra foi um

processo de muitas descobertas, entendo como uma transição

entre o que até então havíamos desvelando no caminho desta

criação. Neste fluxo, recordo que enveredamos por outras

quatro experiências mitodramáticas as Matizes, o Totem

Animal, o Objeto Sagrado e a Roda de Objetos.

O rito pessoal das Matizes vai estimular o trabalho dos atuantes com as cores. Sobre esse procedimento, Lyra vai nos falar que:

[...] dá-se por meio da ação psicofísica dos atuantes. Após os ritos preparatórios, os atuantes do processo são estimulados à visualização das cores por meio das imagens, deixando que essas matizes promovam o fluxo de movimentos corporais. Muitas vezes, são utilizados pigmentos e tintas para fomentar com maior intensidade a relação com as matizes e os movimentos delas decorrentes, além de que o trabalho com as cores intensifica a alquimia dos elementos (LYRA, 2015, p. 55).

Em Thérèse, desde o princípio da jornada, apontava-se o caminho para a cor marrom em várias nuances. Era a cor que estava na madeira e no couro dos objetos que trazia da mística. O marrom escuro e o claro sempre compuseram os hábitos das freirinhas do meu convívio. O marrom é a cor das vestes – o hábito – das irmãs carmelitas da santa Teresinha e toda a sua congregação. Camadas e camadas sobre os corpos das freirinhas. Um hábito composto por finas camadas de tecidos diversos.

IMAGEM 21: Cena da profissão dos votos carmelitas no filme Teresa de Lisieux.

Fonte: Pièce de théâtre "Histoire d'une âme" interprétée par Eva Hernandez.

O marrom é uma cor que, geralmente, está associada à terra e à estabilidade, além de trazer em si aspectos da

[...] maturidade, consciência e responsabilidade. Está ainda associada ao conforto (o bege pode ser considerado como um castanho claro), à estabilidade, à resistência e simplicidade. O marrom representa a constância, a disciplina, a uniformidade e a observação das regras. Conecta a pessoa à natureza e à terra. Usado em excesso traz autocrítica exagerada, dependência afetiva e isolamento. [...] emana a impressão de algo maciço, denso, compacto. Sugere segurança e solidez. É a cor do

outono, do recolhimento [...]. (Disponível em:

<www.significadodascores.com.br>. Acesso em 20 de janeiro de 2017).

Esse marrom escuro da terra me levou ao quintal de minha infância, onde cavei, cavei, cavei... Era também a cor do pelo do meu cachorro Puppy. E foi ali que eu aterrei. Da menina ao bicho solto no quintal. Fui cachorro, fui cavalo...

A investigação dessa terra teve como ponto de partida os pés. Com eles, investiguei os espaços, possibilidades de deslocamento sobre esta terra. Cavei com os pés. Mãos e pés a avançar sobre o quintal. A energia se concentrava na base, ao passo que as imagens eclodiam e reverberavam no corpo. Havia um bicho dentro de mim pronto para correr solto. Era a mulher que carrego cheia de gritos silenciados? Era Thérèse pedindo para falar? Era o grito vindo do claustro que carrego?

A experiência com o Totem Animal despertou luzes sobre um eu-selvagem. “Aprendendo sobre os aspectos animais de nossa própria natureza, podemos nos conectar com padrões instintivos que guiam o comportamento dos animais e que estão presentes nos seres humanos, como uma fonte inesgotável de sabedoria” (LYRA, 2015, p. 57). Eu e Teresa, bichos soltos no quintal!

IMAGEM 22: Transposição da experiência mitodramática “Totem animal” para desenho. Criações: à esquerda, Luciana Lyra e à direita Karla Martins, respectivamente. Recife, 2016. Fonte: acervo da artista-pesquisadora

De acordo com Lyra,

No processo mitodológico, o animal de poder surge muitas vezes como guia do atuante na relação com o portal, mas reaparece quando são solicitados no rito pessoal específico do Totem Animal. Este rito geralmente potencializa as camadas mais instintivas da persona, a máscara ritual, que começam por eclodir em ritos pessoais anteriores (LYRA, 2015, p. 58).

Querida Teresa, eu queria ser Puppy! Eu queria ser

Bob, o cachorro da lá do convento. Bob era um cachorro

feliz e se alimentava bem demais. Corria solto pelo quintal do

convento. Os bichos ficam no quintal guardados... Velados...

Sem eles perdemos a nossa forma. As irmãs guardavam o

bicho lá no quintal. Para além dos hábitos, dos véus... As

paredes do convento guardam uma natureza selvagem!

IMAGEM 23: A Roda de Objetos ao final do processo de criação Thérèse, realizada em Recife, 2017. Fonte: acervo da artista-pesquisadora.

E foi cavando neste quintal que encontrei o meu objeto sagrado (LYRA, 2015). Ou seria melhor dizê-lo no plural? Muito embora os elementos dispostos na roda de objetos (LYRA, 2015) não tenham chegado ali de forma aleatória, com as experiências em laboratório permanecem somente os que se instalam neste campo do sagrado.

De acordo com Lyra, os objetos distribuídos na roda de objetos:

[...] passam a constituir chaves para o desenrolar do rito pessoal desse eu ritual e se constituir como extensão física do atuante, propondo-lhe novas brincadeiras e adensando os movimentos já descobertos com os ritos pessoais anteriores. Desta maneira, o objeto não tem uma função utilitária, nem mesmo abstrata, mas deve estar aberto à exploração, servindo-lhe como um disparador para eclosão de novas imagens em movimento por parte do atuante (LYRA, 2015, p. 55).

E acrescenta:

Na Mitodologia em Arte a roda aparece como lócus de brincadeira, o útero do jogo. É no interior da roda onde são experimentados os perigos das experiências mitodramáticas e mitocênicas. A roda é formada justamente pelos Objetos sagrados e Vestes Rituais, que tomam as vezes de brinquedos a serem explorados pelos atuantes do processo (LYRA, 2015, p. 61).

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