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3. AS INOVAÇÕES REALIZADAS PELAS LEIS 11.705/2008 E 12.760/2012

3.1.1 Alterações da Lei 11.705/2008

A única alteração relevante que a Lei 11.705/2008 trouxe para o Art. 165 do CTB encontra-se em seu caput, onde houve a mudança de “substância entorpecen- te” para “substância psicoativa”.

Segundo a OMS, as substâncias psicoativas podem ser definidas como subs- tâncias que, ao entrarem em contato com o organismo, sob diversas vias de admi- nistração, atuam no sistema nervoso central produzindo alterações de comporta- mento, humor e cognição, possuindo grande propriedade reforçadora sendo, portan- to, passíveis de auto-administração. Ainda segundo essa mesma agência, as psi- coativas são utilizadas na busca de alívio de tensões internas, como angústia ou tristeza34.

Analisando o texto legal, em conjunto com o Art. 276, não houve dúvida, por- tanto, que qualquer concentração de álcool por litro de sangue sujeitaria o condutor às penas do Art. 165 do CTB. Essa premissa veio expressa na Lei e não admitiu

33 MOREIRA, Fernando. A Mudança Cultural que Salva vidas. Rio de Janeiro: Arquimedes Edições, 2007. p.

20.

34 UNICAMP. Programa de prevenção ao uso de substâncias psicoativas lícitas e ilícitas. Disponível em http://www.prdu.unicamp.br/vivamais/Substancias_Psicoativas.pdf acesso em 05 abr 2013.

discussão. Decorreu daí o apelido de “Lei Seca”. A tolerância do nível máximo de álcool por litro de sangue foi igualada a zero. Na verdade, o efeito catastrófico do álcool fez com que as autoridades no Brasil passassem a reduzir continuamente os limites de alcoolemia, até chegar ao patamar mínimo, a exemplo de vários outros países do mundo. Não se admitia, desde então, mais que alguém ingerisse qualquer quantidade de álcool e viesse a dirigir veículo automotor35.

A infração administrativa continuou sendo classificada como gravíssima, com o valor da multa multiplicado por cinco vezes. Ademais, a sanção pecuniária persis- tiu acompanhada da penalidade administrativa de suspensão do direito de dirigir somada com a medida de retenção do veículo e recolhimento do documento de ha- bilitação.

Ocorreu, porém, uma alteração na penalidade de suspensão do direito de di- rigir. A essa penalidade foi atribuído um prazo máximo de 12 meses, isso em razão do princípio constitucional da temporalidade, que também se aplica às sanções de natureza administrativas.

O Art. 276 do CTB foi severamente modificado com o advento da Lei nº 11.705/2008. Enquanto sua redação original prescrevia que se submetia às penali- dades do art. 165 o condutor que se encontrasse com 6 dg/l de álcool no sangue, a sua nova redação estabeleceu a chamada “tolerância zero”, pois definiu que qual- quer concentração enquadra o motorista nas sanções resultantes da infração admi- nistrativa.

Lembre-se que o Art. 276, interpretado conjuntamente com o Art. 165, ainda remetia à possibilidade de interpretação segundo o pensamento de que a infração somente estararia configurada quando o motorista apresentasse uma concentração de álcool no sangue com o potencial de exercer certa influência na sua capacidade normal de conduzir veículo automotor, ou seja, dirigindo “sob influência de álcool”.

No parágrafo único do dispositivo em estudo vê-se que o legislador previu a possibilidade de estabelecimento excepcional de margens de tolerância de concen- tração de álcool no sangue, como prescrevia o texto legal:

35 MP-SC. Centro de Apoio Operacional Criminal (CCR), Parecer n. 005/2008/CCR, p.5. Disponível em www.cetran.sc.gov.br/atas/2008/ordi035.doc Acesso em 07 abr 2013.

“PARÁGRAFO ÚNICO. Órgão do Poder Executivo federal disciplinará as margens de tolerância para casos específicos”.

Com o intuito de complementar os dispositivos referentes à infração adminis- trativa de trânsito, o art.1º do Decreto nº 6488/2008 expôs mais uma vez a política de "tolerância zero" já estabelecida, assim como tomou outras providências, relativas às margens de tolerância excepcionalmente aceitas para casos específicos:

Art. 1º Qualquer concentração de álcool por litro de sangue sujeita o condu- tor às penalidades administrativas do art. 165 da Lei nº 9.503, de 23 de se- tembro de 1997 - Código de Trânsito Brasileiro, por dirigir sob a influência de álcool.

§ 1º As margens de tolerância de álcool no sangue para casos específicos serão definidas em resolução do Conselho Nacional de Trânsito - CON- TRAN, nos termos de proposta formulada pelo Ministro de Estado da Saúde. § 2º Enquanto não editado o ato de que trata o § 1º, a margem de tolerância será de duas decigramas por litro de sangue para todos os casos.

§ 3º Na hipótese do § 2º, caso a aferição da quantidade de álcool no sangue seja feito por meio de teste em aparelho de ar alveolar pulmonar (etilôme- tro), a margem de tolerância será de um décimo de miligrama por litro de ar expelido dos pulmões.

Ocorre que, enquanto não foram expedidos tais regulamentos, não poderia fi- car em suspenso a definição das margens de tolerância, de forma que o Art. 1º, § 2º, do Decreto sob comento, estabeleceu, provisoriamente, até a edição das ditas nor- mas, que a margem de tolerância seria de “duas decigramas por litro de sangue para todos os casos” ou de “um décimo de miligrama por litro de ar expelido dos pulmões”, em caso de aferição por “etilômetro” (Art. 1º, § 3º, do Decreto nº 6.488/2008)36.

Agiu bem o Poder Público nessa regulamentação, pois que se deixassem as margens de tolerância em aberto, causaria uma situação de dúvida e insegurança jurídica, que fatalmente beneficiaria o infrator (princípio do “favor rei”), tornando tem- porariamente inaplicáveis os Arts. 165 e 276 do CTB.

Em relação à redação do Art. 277 dada pela vigência da Lei nº 11.275/2006, a Lei nº 11.705/2008 trouxe poucas, mas, significativas alterações no referido disposi-

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CABETTE, Eduardo Luiz Santos. Primeiras impressões sobre as inovações do Código de Trânsito Brasi-

leiro. Informação disponível em http://www.ambitojuridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_ leitura &artigo _id=2815 acesso em 08 abr 2013.

tivo, localizadas principalmente na inovação de seu § 3º, inalterado pela Lei nº 12.760/2012, que prescreve: “Serão aplicadas as penalidades e medidas administra- tivas estabelecidas no Art. 165 deste Código ao condutor que se recusar a se sub- meter a qualquer dos procedimentos previstos no caput deste artigo”.

Estabeleceu-se, portanto, uma sanção ao condutor que independe de qualquer medição de sua taxa de alcoolemia no sangue: basta que o mesmo se recuse a sub- meter-se à qualquer procedimento relativo à testes de alcoolemia, exames clínicos, perícia ou outros, conforme o texto legal. Tal inteligência por parte do legislador permi- te o mínimo respeito por parte dos condutores em relação às blitzen, pois, por mais que não permitam que seja realizado o “teste do bafômetro”, sua negativa irá ter como consequência uma pesada multa e a suspensão do direito de dirigir por doze meses.