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Os ambientes virtuais: desafios postos para a aprendizagem na educação online

Atualmente, muito tem se falado em Ambientes Virtuais de Aprendizagem (AVA) como espaço propício para a promoção da Educação online, apesar de que este não se restringe a essa modalidade de educação, pois na prática tem sido usado intensamente como suporte na aprendizagem presencial. Contudo, vale situar que o advento dos AVA se deu a partir da emergência do ciberespaço, o que, para Lévy (1999), designa não tanto os novos suportes da informação, mas sim as formas originais de criação, da navegação do conhecimento e da relação social que esse espaço permite. Ainda para o referido autor, podemos perceber o ciberespaço como um campo aberto à intercomunicação e ao estabelecimento de interfaces com todos os dispositivos de criação, de registro, de comunicação e simulação representados por interfaces dispostas nesse espaço virtual.

A princípio, precisamos entender o que quer dizer Ambiente Virtual de Aprendizagem. Ambiente, seria aquilo que cerca ou envolve pessoas e/ou coisas. Quanto ao Virtual, no sentido filosófico, é uma dimensão da realidade (LÉVY, 1999, p.47), embora em seu uso corrente a palavra seja empregada para significar a irrealidade, sendo que a realidade pressupõe uma efetivação material, uma presença tangível. O citado autor argumenta que nesse sentido,

A expressão “realidade virtual” soa então como oxímoro, um passe de mágica misterioso. Em geral acredita-se que uma coisa deva ser ou real ou virtual, que ela não pode, portanto, possuir as duas qualidades ao mesmo tempo. Contudo, a rigor, em filosofia o virtual não se opõe ao real, mas sim ao atual: virtualidade e atualidade são apenas dois modos diferentes da realidade. (LÉVY, 1999, p. 47).

Nessa direção, Lévy entende que o virtual existe em potência e não em ato, o campo de forças e de problemas que tende a resolver em uma atualização. Para esclarecer o assunto, o autor nos mostra o exemplo da árvore e da semente, e diz que a produção da árvore está na essência de toda semente, de todo grão, portanto, a virtualidade da árvore é bastante real (sem que seja ainda atual). Existe em potência, pois não temos a certeza que essa semente ou esse grão irão germinar, irão se atualizar.

Lemos e outros autores, tomando o exposto por Lévy, sinalizam que as experiências educativas são, por definição, compostas por infinitas combinações de processos

de virtualização e atualizações. O real é um conjunto de processo de virtualização e atualização sucessivos, sendo os primeiros dispositivos de questionamento de um determinado estado de coisas, e os segundos formas de resoluções desses problemas.

O processo educativo, independente de novas ou velhas tecnologias, é virtualizante por natureza, visto que o normal é que em qualquer situação educacional a virtualização dos assuntos de uma determinada matéria é constante. A educação é (deveria ser) virtualizante por essência. Educar significa problematizar, propor questões e resolvê-las, mesmo que temporariamente, pois essas mesmas questões podem gerar outras novas, portanto um eterno virtualizar, constante processo de criação. Nesse sentido, corroboramos com Santos (2003, p. 223) quando refere que o Ambiente Virtual de Aprendizagem é um espaço fecundo de significação, onde seres humanos e objetos técnicos interagem, em permanente estado de virtualização, potencializam a construção de conhecimentos, logo a aprendizagem.

Qualquer espaço no ciberespaço pode ser um AVA, a depender da proposta pedagógica de utilização do mesmo. No Yahoogrupos, por exemplo, podemos mediar a aprendizagem a partir da criação de listas de discussão, da criação de portfólios, da postagem de conteúdos, entre outras possibilidades. O blog coletivo também pode ser considerado um AVA. Apesar do reconhecimento desses outros espaços no ciberespaço propiciar a aprendizagem em/na rede, o que estamos enfatizando nesse trabalho é o Learning Management System (LMS)18, aquele que vem sendo pensado para ser utilizado nas

atividades educacionais.

Pesquisadores têm discutido sobre as possibilidades dos diversos Ambientes Virtuais de Aprendizagem e apontam que a sua escolha depende das demandas e características do curso online. No site da Rede Escolar Livre19 há um quadro comparativo que apresenta alguns dos ambientes que estão sendo usados com mais intensidade nos cursos de EAD, informando as ferramentas de comunicação e de produção contidas em cada um deles. No decorrer desse trabalho, focamos nossa discussão no Ambiente Virtual Moodle, por ser este o utilizado no curso analisado e atualmente um dos preferidos nas diversas instituições de ensino, visto que, além de ser um software livre, se diferencia dos demais por

18 A Learning Management System (ou LMS), é um termo usado para descrever o software que foi projetado para gerenciar usuários na aprendizagem de intervenções. Learning Management Systems (LMS) é o Sistema de Gerenciamento de Cursos (SGC). São aplicações internet/intranet que rodam em um servidor e são acessadas por um navegador web. O servidor está, normalmente, localizado e um departamento ou centro de processamento de uma Universidade, mas pode estar localizado em qualquer lugar do mundo. O professor e os alunos podem acessar o sistema de qualquer lugar desde que haja um computador, conexão com a internet e um navegador web.

possibilitar que os próprios educadores personalizem seus espaços, de acordo as suas necessidades, sem depender de um especialista na área de programação.

De acordo com Cunha Filho e outros (2000, p. 57) os ambientes virtuais de estudo, os websites pedagógicos, são reconhecíveis por três características tecnológicas e duas características sociocognitivas. No que diz respeito às primeiras constam: comunicação multidirecional efetiva (situação em que todos podem falar com todos de forma autônoma e com níveis de censura e etiqueta previamente acordados no grupo); registro (gravação) de conteúdos produzidos pelo grupo; acesso aberto no tempo e no espaço (permitindo a todos o gerenciamento de ritmo de aprendizagem e local de conexão). Já no âmbito das sociocognitivas estão: sociabilidade (capacidade de gerar e/ou manter laços entre os indivíduos participantes de determinados grupos numa rede aberta, não limitada aos membros de determinados ambientes formais); inteligência coletiva (interesse do grupo e capacidade tecnológica para construir e compartilhar um saber comum).

No entanto, apesar de nos ambientes conterem interfaces que potencializam a comunicação bidirecional, democratização, desterritorialização de textos, flexibilidade, plasticidade e permanente metamorfose, na sua maioria, ainda prevalecem uma estrutura hierárquica, fundamentada no modelo instrucionista. A depender da proposta pedagógica, nem todos têm a possibilidade de se expressar livremente. Outro ponto crítico é que não podemos considerar um AVA na sua totalidade como uma rede aberta, pois só quem tem acesso a certos ambientes são os sujeitos neles cadastrados, como no caso do Curso Mídias Digitais e Educação20.

O grupo Lavia21, a partir da voz de diferentes pesquisadores, construiu uma concepção de AVA que vai além da idéia de um conjunto de páginas educacionais na web, ou sites com diferentes ferramentas de interação e de imersão (simulação). Para eles,

[...] um AVA é um espaço social, constituindo-se de interações cognitivo- sociais sobre ou em torno de um objeto de conhecimento: um lugar na web, “cenários onde as pessoas interagem”, mediadas pela linguagem hipermídia, cujos fluxos de comunicação entre os interagentes são possibilitadas pelas

20 Por esse motivo (falta de acesso dos não-cadastrados), disponibilizamos em anexo a Dissertação em um CD com as telas do Curso para possíveis consultas dos leitores.

21O Lavia - Laboratório de Ambientes Virtuais de Aprendizagem (www.ucs.br/lavia) – é um grupo interdisciplinar de pesquisa da Universidade de Caxias do Sul que tem como propósito desenvolver um trabalho interativo e cooperativo, implementando, desenvolvendo e avaliando formas alternativas para a criação de AVAa, analisando de forma compartilhada as possibilidades reais e os limites no uso de alternativas tecnológicas, examinando estratégias educacionais e avaliando o processo de aprendizagem em decorrência das interações nesses ambientes.

interface gráfica. O fundamental não é a interface em si mesma, mas o que os interagentes fazem com essa interface. Nesse sentido, o plano pedagógico que sustenta a configuração do ambiente é fundamental para que esse ambiente possa ser um espaço onde os interagentes se construam como elementos ativos, co-autores do processo de aprendizagem. (VALENTINI e SOARES, 2005, p. 19)

O que há de mais específico nos AVA é o conjunto de atividades, estratégias e intervenções que levam os interagentes a construir e a se transformarem juntos. Mas, os interagentes não estão restritos ao uso/consumo das informações do ambiente ou da web,eles podem tornar-se produtores de informação e conhecimento. Além de textos e páginas da web; outros produtos (programas de computador, objetos gráficos e até o próprio AVA) podem ser construídos coletivamente. Assim, uma atividade de aprendizagem em AVA refere-se a algo mais para além de um conjunto de tarefas a serem cumpridas: refere-se a atividades que vão emergindo a partir do processo de aprender. Para os autores citados, a expressão Ambiente Virtual de Aprendizagem está relacionada ao desenvolvimento de condições, estratégias e intervenções de aprendizagem num espaço virtual na web, organizado de tal forma que propicie a construção de conceitos, por meio da interação entre alunos, professores e objeto do conhecimento.

Dessa forma, precisamos nos colocar numa condição de alerta para o sentido individualista do conceito de ambiente, para o qual pode se criar uma imagem da pessoa isolada no ambiente, uma vez que existe a tendência a se atribuir aos demais participantes o papel de objetos a serem manipulados ou utilizados da mesma forma que os outros recursos disponíveis (imagens, textos, áudios, vídeos, os chamados objetos de aprendizagem). Este aspecto afasta-se da idéia de que a aprendizagem é construída nas interações, nas participações, nos diálogos, nas trocas de experiências, de sentidos e significados, de cooperação e colaboração entre os sujeitos, ou seja, de que ela é um processo social.

Um dos aspectos mais relevantes da utilização das comunidades no contexto educacional surge através do desenvolvimento dos novos ambientes de educação. Para Dias (2001, p. 27), estes ambientes de grande potencial, ao nível da interação e da comunicação, permitiram a formação das comunidades virtuais de aprendizagem que se encontram em um determinado espaço para as suas atividades na Web, através das tecnologias hipermídia e dos processos de comunicação em rede, a partir de uma abordagem educacional orientada para o aluno na construção das aprendizagens.

padrões clássicos de interação e relacionamentos humanos, possibilitando novas construções sociais. Nesses espaços, alunos e professores trabalham em parceria na construção de projetos e atividades, trocando suporte de aprendizagem entre si e com o ambiente. Rheingold (1996, p. 20), um dos autores pioneiros a utilizar o termo "comunidade virtual" para os grupos humanos que travavam e mantinham relações sociais no ciberespaço, ele mesmo um formaddor de espaços vituais, Rheingold afirma que "a comunidade virtual é um elemento do ciberespaço, mas é existente apenas enquanto as pessoas realizarem trocas e estabelecerem laços sociais" e define:

As comunidades virtuais são agregados sociais que surgem da Rede [Internet], quando uma quantidade suficiente de gente leva adiante essas discussões públicas durante um tempo suficiente, com suficientes sentimento humanos, para formar redes de relações pessoais no espaço cibernético [ciberespaço]. (Idem)22

De acordo a Palloff e Pratt (2002, p. 39), há uma diferença entre uma comunidade de aprendizagem online e uma comunidade online, como uma lista de discussão ou um grupo de discussão em que as pessoas se encontram para compartilhar um interesse mútuo. O envolvimento com a aprendizagem colaborativa e prática reflexiva implícita na aprendizagem transformadora é o que diferencia a comunidade de aprendizagem online e sugere algumas características que a define: interação ativa que envolve tanto o conteúdo do curso quanto a comunicação pessoal; aprendizagem colaborativa evidenciada pelos comentários dirigidos primeiramente de um aluno a outro e não do aluno ao professor; significados construídos socialmente evidenciados pela concordância ou questionamento, com a intenção de se chegar a um acordo; compartilhamento de recursos entre alunos; expressões de apoio e estímulo trocadas entre alunos, tanto quanto a vontade de avaliar criticamente o trabalho dos outros.

Assim, “percebe-se que a formação de uma comunidade de aprendizagem compreende a criação de uma cultura de participação coletiva nas interações que suportam as atividades de aprendizagem de seus membros” (DIAS, 2001, p. 27). Portanto, a comunidade de aprendizagem constitui-se como um sistema colaborativo e distribuído, que se forma na interação e que se efetua na comunicação, orientada pela conquista de objetivos

22 "Las comunidades virtuales son agregados sociales que surgem de la Red cuando una cantidad suficiente de gente lleva a cabo estas discusiones públicas durante un tiempo suficiente, com suficientes sentimentos humanos como para formar redes de relaciones personales en el espacio cibernético. O mesmo autor

disponibiliza download de seu livro online The Virtual Comunity pelo site

compartilhados entre os membros.

Por outro lado, cabe aqui refletir sobre as comunidades de aprendizagem que se formam no espaço virtual, a partir do conceito de organismo vivo, que se auto-organiza via relações sociotécnicas estabelecidas pelos sujeitos no processo de aprendizagem – professores, estudantes, técnicos, mais comunidade externa – com os artefatos materiais e informacionais. Assim como Santos (2005), Maturana e Varela (2001) o reconhecemos como um espaço vivo e mutante que se auto-organiza pela complexidade dos processos instituídos e instituintes. Espaço onde seres humanos e objetos técnicos se implicam, se transformam e se afetam, produzindo assim modos de ser, de pensar e de viver que vêm desafiando os processos de ensino e de aprendizagem legitimados pela lógica cartesiana e racionalista de conhecer.