A ideia de espaços interactivos de comunicação síncrona não é nova. Salas de
Chat, MOO (Multi-user dungeon/domain Object Oriented), MUD (Multiple User
Dimension) e outras experiências online com multiutilizadores têm estado ligados à
educação há décadas (Bettencourt, 1997, Bracewell, et al., 1998, Day e Batson, 1995,
Dede, 1996, Lee, et al., 1999).
Ao longo dos últimos anos, foram mesmo diversas as tecnologias emergentes
desenhadas e adaptadas a ambientes de ensino a distância, entre as quais os
ambientes virtuais a três dimensões (3D), habitualmente também designados de
MUVE (Multi-User Virtual Environments).
Inspirados no conceito de “Metaverse”, concebido por Neal Stephenson(1993),
e descrito no seu livro “SnowCrash”, onde os utilizadores interagiam num mundo
virtual, por meio de avatares, ou seja, representações gráficas a 3 dimensões de si
mesmos, onde poderiam aprender, jogar, comprar, dançar, divertir-se, entre muitas
outras coisas, os MUVE caracterizam-se por três particularidades comuns: a ilusão do
espaço tridimensional e imersão nele mesmo, a representação dos utilizadores por
gráficos visuais – os avatares –, e meios de comunicação interactivos entre utilizadores
(maioritariamente através de chat).
No entanto, embora mantendo as mesmas características de outras tecnologias
mais antigas – comunicação baseada em texto e páginas Web –, estes ambientes
virtuais são espaços com imenso potencial educativo quer pelo seu dinamismo, quer
pela possibilidade de interacção e pelas oportunidades que abrem na sua exploração
(Dede, et al., 2004, Dieterle e Clarke, in press).
Investigadores como Dede (1996) defendem que os ambientes virtuais a 3
dimensões podem fornecer um suporte pedagógico ao desenvolvimento de ambientes
de aprendizagem construtivistas, principalmente para alunos que se encontram
geograficamente distantes.
A utilização deste tipo de ambientes na educação, segundo o mesmo autor,
abre a possibilidade de criação de contextos de aprendizagem ricos e envolventes,
possibilitando ainda meios de comunicação de suporte à interacção e colaboração
entre pares, assim como o acesso na Web a recursos “just-in-time” e ferramentas de
pesquisa de informação. Para além dos benefícios educativos, ao fornecer a
capacidade de resolução de problemas no seio da comunidade através da interacção
com os outros participantes, este tipo de ambientes tridimensionais favorece a cultura
de participação impulsionada pelas forças socioculturais a ele intrínsecas.
Enquadramento Teórico
Desta forma, os MUVE têm sido utilizados na educação com diversos fins, entre
os quais criar comunidades online para a formação inicial e contínua de professores,
envolver os alunos em actividades científicas, de forma a promover comportamentos
de responsabilidade social, ajudar os estudantes a perceber e experienciar a história
pela imersão num contexto histórico, promover o desenvolvimento social e moral
através do enriquecimento cultural, promover um ambiente de colaboração e
programação, explorar, de forma criativa, novos conceitos matemáticos (Dieterle e
Clarke, in press), e também promover a investigação cientifica (Clarke, et al., 2006).
São diversos os MUVE utilizados actualmente no contexto educativo. Como
exemplo podem-se citar o Second Life, Active Worlds – que no seu projecto Active
Worlds Education Universe (AWEDU) incluí cerca de oitenta mundos educativos –, e o
There que é também procurado por educadores em pesquisas individuais. Podem
ainda ser referenciados outros como o Central Grid, o Kaneva, o Furcadia, ou o Project
DarkStar.
De facto, a cada dia parecem surgir novas propostas neste ramo, instigadoras
de competências colaborativas, como por exemplo o projecto open source Croquete e
o Sun Technology’s Project Wonderland.
Recentemente, assistiu-se a um fenómeno de procura massificado pelo
ambiente virtual a 3 dimensões, o Second Life, havendo mesmo cerca de 200
universidades de todo o mundo com implantações institucionais neste ambiente e que
se dedicam à investigação neste campo de acção, confirmadas pelas estatísticas
apresentadas em 2007 por Pathfinder Linden (Kelton, 2007).
2.5.1. O Second Life
O Second Life é entendido como um MUVE, e foi criado pela empresa
LindenLab em 2003, começando a ter maior visibilidade mundial nos últimos dois anos,
contando já com cerca de 15 milhões
7de utilizadores registados. Tudo o que existe
neste ambiente virtual foi idealizado e construído pelos residentes que o habitam. A
própria representação gráfica, ou seja, o avatar do utilizador, pode ser inteiramente
personalizável pelo mesmo.
O utilizador acede ao Second Life online, após a instalação de um software
cliente, e através deste interage com diversos conteúdos e outros utilizadores. Dispõe,
para além de ferramentas de comunicação síncrona, baseadas em texto e voz, de
ferramentas de construção de objectos a três dimensões e programação, e acesso a
páginas Web externas e outros recursos da internet.
Para (Lester, 2006), aka Pathfinder Linden,
7
Construção de Comunidades Virtuais com o Second Life Um Estudo de Caso
32
“Virtual worlds like Second Life represent the future of human interaction in a globally networked world, and students who have grown up with the Internet naturally swim in these waters”.
(p. v)
O Second Life é encarado como um jogo por muitos utilizadores, mas no
entanto este não deve ser considerado como tal. Um jogo tem regras ou objectivos
bem definidos (NMC e ELI, 2007), o que não acontece neste ambiente virtual
tridimensional. Embora haja regras sociais “in-world”, relacionadas com o
comportamento de cada indivíduo, o Second Life é aquilo que cada utilizador entende.
Podem existir alguns jogos dentro do Second Life, mas o Second Life não é um jogo em
si mesmo (NMC e ELI, 2007).
De facto, este MUVE é muito para além de um jogo e as possibilidades que abre
na exploração educativa, formal ou informal, são várias. São diversos os educadores
que encontraram no Second Life um espaço conveniente para conduzir aulas formais
online, conferências, apresentações, ou encontros informais com os estudantes. Para
além disso, revelou-se também útil para os educadores enquanto um ambiente de
desenvolvimento de trabalhos em programação, na Interface de Programação de
Aplicativos, em Design, dentre outras actividades técnicas e criativas.
Uma característica única associada a todos os MUVE e, como tal, ao Second
Life, é a percepção de imersão num “mundo alternativo”. O SL permite aos seus
utilizadores interagir com um mundo simulado, como se estivessem lá, suspendendo a
sua atenção do verdadeiro mundo, transferindo-a para o mundo virtual.
Este sentido de imersão afecta o aluno e os utilizadores em geral, de forma
singular, permitindo-lhes o envolvimento com o conteúdo na primeira pessoa (Bricken,
1991).
Embora o ensino tradicional permita o envolvimento directo dos alunos em
algumas actividades, como actividades laboratoriais, jogos e visitas de estudo ou saídas
de campo, estas experiências são geralmente dispendiosas, impraticáveis, pouco
seguras, e limitadas a áreas restritas ou a um determinado grupo de alunos.
No Second Life o utilizador pode experimentar situações até então não
possíveis ou de difícil acesso. Por exemplo, em vez de estudar a célula vegetal através
de um livro de biologia, o aluno no Second Life pode entrar directamente dentro da
célula, examiná-la e até mesmo manipular os seus organelos.
Esta capacidade de possibilitar experiências educativas nos ambientes virtuais a
três dimensões, permite ao professor novas oportunidades de ensino/aprendizagem,
incluindo aquelas em que o estudante participa por si só, de forma autónoma.
Enquadramento Teórico
Embora se reconheça a responsabilidade individual na aprendizagem, o Second
Life, assim como outros ambientes virtuais enquadrados na mesma linha, através das
suas características interactivas, favorecem a socialização, a colaboração, o sentido de
presença e o desenvolvimento de comunidades e sentimentos de pertença, tal como é
mencionado no The Horizon Report 2007 (NMC e ELI, 2007, p. 6):
“Virtual worlds offer an opportunity for people to interact in a way that conveys a sense of presence lacking in other media. These spaces can be huge, in terms of the number of people that use them, and they are growing in popularity because they combine many of the elements that make Web 2.0 really exciting: social networking; the ability to share rich media seamlessly; the ability to connect with friends; a feeling of presence; and a connection to the community.”
Como refere (Rogers, 2000), é através do desenvolvimento das actividades de
participação e exploração colaborativa de ambientes autênticos que os processos de
aprendizagem da vida real emergem, ambientes esses por vezes difíceis de atingir em
contexto de sala de aula, mas possíveis num MUVE como o Second Life.
Este é pois caracterizado pelo sentido de partilha entre grupos e comunidades,
pela interoperabilidade, pela possibilidade de se implementarem situações de ensino
inviáveis na vida real, e pelo espírito de colaboração subjacente (Bransford e Gawel,
2006). E são estas mesmas especificidades que nos atraem à exploração deste
ambiente virtual, no contexto educativo.
Capítulo 3
Metodologia