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2 OCUPAÇÕES PRÉ-COLONIAIS E INDÍGENAS NO CENTRO-OESTE

3.7 ANÁLISE DE ASSENTAMENTOS

Eidt & Woods (1974) estabeleceram um novo método de análise de fosfato a partir dos desdobramentos de duas correntes intelectuais na Alemanha, e com isso um novo método de análise de fosfato e protocolos de coleta. O método é examinado com o estudo dos assentamentos humanos abandonados (EIDT & WOODS, 1974). O que os autores chamam de

spot-test16 é o método utilizado para a detecção do fosfato em campo apenas para leitura

preliminar; após, é recomendado que este seja feito em laboratório, com análise quantitativa, pois o valor observado em campo é relativo (para mais detalhes, ver Eidt & Woods, 1974, 1977, 1985; Amenomori, 1999). Nele, os autores ressaltam a importância da análise de fosfatos na identificação das ocupações humanas.

Os estudos de assentamentos abandonados através de métodos de fosfato aparecem pela primeira vez na Suécia, realizados pelo agrônomo Arrhenius, já mencionado, localizando sítios Vikings na década de 1930. Ele foi o primeiro a suspeitar da estreita correlação entre os assentamentos abandonados e a alteração nativa do fosfato do solo espalhar-se gradualmente por toda a Europa, tendo uma importância crescente após a Segunda Guerra Mundial (EIDT, 1977). O fósforo é especialmente apropriado para detectar solos afetados por assentamentos, devido à sua associação universal com atividades humanas.

A pesquisa nos Estados Unidos também foi afetada por este interesse, e começou nos anos 1950. O fósforo foi isolado pela primeira vez em 1669, pelo alquimista alemão Henning Brandt, ao evaporar grandes quantidades de urina humana. Só cem anos mais tarde o químico sueco Gahn descobre sua presença nos ossos, e dez anos depois, no mineral piromorfita (fosfato de chumbo). Foi somente em 1840 que o químico alemão Justus Von Liebig formulou a base científica de produção de ácido fosfórico. Em 1842, o fazendeiro inglês Bennet Lawes patenteou um processo de acidulação de nódulos fosfatados (coprólitos), e deu a este produto o

16 O método utiliza uma solução de extração de 35ml de ácido clorídrico 5N misturado com 5g de molibdato de

amónio dissolvido em 100ml de água fria. Prepara-se um reagente redutor dissolvendo 0,5g de ácido ascórbico em 100ml de água. Duas gotas do primeiro reagente são colocadas em 50ml; amostra de solo repousando sobre um papel de filtro pequeno, livre de fosfato, a fim de extrair o fosfato. Trinta segundos depois, duas gotas do segundo reagente são aplicadas. Um anel azul se forma quando o fosfato está presente; as características de cor e as proporções indicam diferentes quantidades de fosfato na amostra (EIDT, 1985).

nome de superfosfato, que se mantém até hoje (WAGGAMAN, 1969) (LOUREIRO et al., 2008:142).

A rápida difusão dessas investigações nos Estados Unidos e o desejo urgente de métodos mais eficientes de divulgação do passado aumentaram o apelo da análise química dos solos (Eidt, 1977).

Desta forma, a atividade de campo, combinada a um método de laboratório de investigação de assentamentos abandonados que foi desenvolvido na Universidade de Wisconsin Milwaukee por Eidt & Woods (1974), consiste em três partes: (1) análise química do fósforo do solo, uma das melhores características diagnósticas das atividades do homem na terra, segundo os autores; (2) microsseparação dos meios mecânicos; e (3) palinologia ou análise de pólen.

Segundo os autores, o método da análise de assentamentos abandonados pode chegar a evidências conclusivas sobre atividades humanas passadas, mas é preciso saber analisá-las. A abordagem teórica é que distribuições regionais de características do solo podem ser úteis para interpretar distribuições de: “The process of soil formation is influenced by environmental factors that often leave distinguishable traces in soils, and (2) human settlement patterns often are influenced by these same environmental factors” (WARREN et al., 1981:47). Woods (2002) menciona os numerosos procedimentos agronômicos, laboratoriais para a determinação de fosfato em assentamentos abandonados (ARRHENIUS, 1944; LUTZ, 1951; SOLECKI, 1951; DIETZ, 1956; EDDY & DREGNE, 1964). Segundo ele, estes resultados podem ser altamente errôneos, uma vez que o fosfato disponível constitui apenas uma pequena parte do fosfato inorgânico total, e pode variar significativamente em quantidade de estação para estação.

Para Woods (2002), o procedimento com uma extração ácida é mais confiável (BUEHRER, 1950; LORCH, 1954; CORNWALL, 1958). Embora adequadas para determinar as quantidades de fosfato de cálcio, as extrações ácidas não funcionam bem com o fosfato obstruído no óxido de ferro encontrado em alguns solos ácidos, sendo melhor apenas para determinar o fosfato não ocluído associado aos compostos de alumínio e ferro. As determinações totais de fosfato produzem um resultado inorgânico/orgânico combinado, mas ainda pouco contam sobre a natureza do fosfato, além de sua quantidade absoluta. Desta forma, para Woods (2002), o procedimento de fracionamento desenvolvido é o mais revelador.

A técnica de fracionamento baseia-se na solubilidade diferencial das principais formas de fosfato em várias soluções de extração (CHANG & JACKSON, 1957; SYERS et al., 1972). A quantidade total de fosfato inorgânico é relatada em partes por milhão de fósforo

elementar (ppm). Assim, através do método quantitativo de laboratório, com fracionamento sequencial, as deposições de fosfato humano podem ser distinguidas das naturais (WOODS, 2002).

Quando a maioria do fosfato é encontrada em apenas uma fração, isso revela uma falta de influência humana na distribuição. Por outro lado, numerosos testes em solos de condições tropicais mostraram que o fosfato associado a assentamentos humanos é encontrado distribuído em graus variados ao longo de todas as três frações (WOODS, 2002).

Com estes trabalhos, uma ampla variedade de métodos tem sido desenvolvida tanto na ciência do solo como na Arqueologia para extrair e medir o P do solo, resultando em uma enorme quantidade de dados e em uma ampla variedade de interpretações (HOLLIDAY, 2004; HOLLIDAY & GARTNER, 2007; WOODS, 2002; EIDT, 19771985).

Os estudos dedicados à construção de montes de materiais relacionados ao solo e concheiros de terra e conchas junto aos estudos na Amazônia identificaram relações entre os vestígios microscópicos e os teores de diferentes elementos medidos pelas análises geoquímicas

(ROOSEVELT, 1991; GASPAR, 1998; VILLAGRÁN et al., 2011; ROSTAIN, 2012).

Pesquisas na Amazônia são exemplos de solos antropogênicos desenvolvidos em

sítios arqueológicos abandonados, nos quais a forma das aldeias circulares centradas na praça cercadas por anéis de moradias foi identificada em formação de Terras pretas (HECKENBERGER, 2005). Nesse contexto, as evidências arqueológicas de modificações antropogênicas da paisagem, especialmente a formação de solos antropogênicos, têm se convertido numa das peças chave para as discussões sobre a origem do sedentarismo na Amazônia, sugerindo serem antigos aldeamentos indígenas.

Observações atuais, incluindo dados etnoarqueológicos, sugerem que casas, lixeiras e jardins seriam contextos ótimos para gerar os altos teores que são medidos nas análises geoquímicas, e documentam a formação de solos agrícolas a partir do manejo do lixo,

acumulação de adubos orgânicos, e queima de coivara (ZEIDLER, 1983; HECKENBERGER

et al., 1999; HECHT, 2003; SILVA & REBELLATO, 2004; HECKENBERGER, 2006;

ARROYO-KALIN, 2008; POSEY 1984; DENEVAN, 2004, SCHMIDT et al, 2009;

ERICKSON, 2003).

Outros exemplos se encontram em contextos históricos, como a Terra Urbana Europeia (MACPHAIL, 1983; CAMMAS, 2004) e depósitos antropogênicos em sítios da Idade do Bronze do Fondo Paviani (Verona, Itália), também utilizando análises pedoquímicas e micropedológicas (NICOSIA et al., 2011).

Alguns dos estudos geoarqueológicos mais sofisticados desses depósitos centram- se na determinação das propriedades, do modo de formação, da extensão espacial e da variabilidade dos solos antropogênicos, com especial ênfase na forma como os processos pedogenéticos foram afetados pela ação humana passada (SULLIVAN & KEALHOFER, 2004; CREMASCI & NICOSIA, 2010; NICOSIA et al., 2011).

Certamente, a geoquímica tem contribuído de forma notável para a análise de solos e sedimentos antrópicos e antropogênicos. Atualmente, estes dados, junto a documentos etnográficos, constituem uma ferramenta poderosa para inferir padrões no uso do espaço, especialmente quando as propriedades químicas são interpretadas com o auxílio de observações micromorfológicas (MILEK, 2012).

Neste contexto, em comparação com algumas pesquisas pioneiras das décadas de 1970 e 1980 (EIDT, 1985), a aplicação de observações micromorfológicas (COURTY et al., 1989) ampliou consideravelmente o escopo geral dessa pesquisa e ilustrou a notável heterogeneidade que caracteriza depósitos de ocupação como arquivos da atividade humana passada (BROCHIER, 2002; GOLDBERG & MACPHAIL, 2006).

Estudos micromorfológicos têm sido cruciais para verificar alguns desses processos, bem como a presença de fragmentos microscópicos de carvão, osso e cerâmica. Os métodos micromorfológicos do solo foram inicialmente implantados por cientistas do solo (Lima et al., 2002; Schaefer et al., 2004) para comparar as terras pretas e os latossolos vizinhos. Este estudo permitiu unir as inclusões antropogênicas mencionadas e aumentar as concentrações elementares.

Um estudo geoarqueológico com micromorfologia do solo (ARROYO-KALIN, 2008B; ARROYO-KALIN et al., 2009; ARROYO-KALIN, 2010; ARROYO-KALIN, 2012) expandiu esses resultados significativamente. Foram comparados sítios arqueológicos de terra preta contrastantes de textura arenosa, mostrando que altos níveis de aumento de nutrientes cobriam a presença de inclusões microscópicas (especialmente carvão e osso), destacando-se altas densidades de fragmentos de cerâmica microscópica e argila cozida refletidas em valores de susceptibilidade magnética elevada para estes sedimentos, junto a outras evidências empíricas para distinguir entre terras pretas e as terras-mulas periféricas (ARROYO-KALIN, 2014).

Desta forma, a micromorfologia é usada para resolver uma variedade de problemas arqueológicos, desde a identificação de constituintes específicos até a interpretação de estratigrafia aplicada à reconstrução de paleoambientes. Grosso modo, podemos distinguir os seguintes campos: (I) materiais arqueológicos (isto é, "artefatos" e "ecofatos"); (II) reconstrução

de tecnologia antiga; (III) reconstrução do contexto arqueológico, microestratigrafia, mudanças pós-deposição; (IV) impacto do homem no meio ambiente; (V) reconstrução do paleoambiente pelo estudo de sedimentos e solos (paleo) (NICOSIA & STOOPS, 2017). Assim, as investigações micromorfológicas também têm desempenhado um papel cada vez mais proeminente nas pesquisas geoarqueológicas, desde investigações da gênese do solo até o estabelecimento da natureza, origem e significância dos depósitos geogênicos e antrópicos e seus ambientes associados (COURTY et al., 1989; MACPHAIL E CRUISE, 2001). Técnicas micromorfológicas dirigidas à amostragem e análise do solo foram publicadas (por exemplo: Kubiena, 1938; Bullock & Murphy, 1983; Douglas, 1990 e Goldberg, 2003).

4 CARACTERIZAÇÃO FÍSICA E SÍNTESE DOS SÍTIOS ESTUDADOS