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3. RESULTADOS DA PESQUISA

3.5. Os juízos de valor dos revisores do Jornal O Globo em relação às estratégias

3.5.2. Análise da autocrítica do Jornal O Globo

Após o debate conceitual apresentado na seção anterior, o presente estudo hipotetiza que as crenças e atitudes linguísticas tanto dos jornalistas como dos revisores afetam o comportamento dos dados verificado, quanto ao uso praticamente categórico da estratégia de relativização do tipo padrão, e são fundamentadas sobretudo nas orientações oferecidas pela norma padrão gramatical. Assim, a partir da norma gramatical fundamenta-se a construção da norma padrão culta escrita idealizada e compartilhada pelos escritores que trabalham na Editora do jornal e esta, por sua vez, orienta as crenças linguísticas dos escritores sobre os fenômenos da variedade brasileira. É a partir das crenças linguísticas de cada jornalista que as atitudes linguísticas vão ser refletidas nas escolhas das variantes utilizadas nos textos por ele produzidos,

gerando a norma culta em uso na escrita. Essa “regulação” das escolhas das variantes por parte do escritor faz com que um fenômeno que assuma um comportamento específico na modalidade oral em uma direção seja tratado como categórico na escrita jornalística em outra direção. Tais reflexões já vêm sendo apresentadas ao longo de todo capítulo 03, mas é nesta seção que se poderá observar com mais propriedade a atuação da “regulação das atitudes linguísticas” na escrita culta jornalística, ao serem analisadas as prescrições feitas pelos revisores do próprio jornal.

Como já descrito na seção 2.2.1.2, as colunas autocríticas publicadas pelo Jornal O Globo têm a finalidade de identificar e corrigir as “falhas de escrita” realizadas pelo próprio jornal em edição anterior, demonstrando, assim, o que considera “os usos corretos” da escrita do português brasileiro. Essas correções revelariam o conjunto de regras integrantes da norma padrão idealizada por esses profissionais, que, por sua vez, são frequentemente fundamentadas nas orientações da norma gramatical.

Ao observar quais seriam “as falhas de escrita do português” consideradas pelo revisor, foram encontrados os seguintes fenômenos, a seguir dispostos consoante o número de ocorrências verificado – Tabela 28.

Fenômeno Linguístico OCORRÊNCIAS

1º lugar - Ortografia 117 ocorrências 2º lugar – Regência verbo-nominal 105 ocorrências

3º lugar – concordância verbo-nominal 57 ocorrências (39 verbais e 28 nominais) 4º lugar - Erro de digitação 56 ocorrências

5º lugar – Colocação pronominal 26 ocorrências 6º lugar

Pontuação

Erro no emprego / emprego inadequado do pronome

Foram encontrados 18 ocorrências em cada fenômeno.

7º lugar

Coerência textual Erro na forma verbal

Foram encontrados 17 ocorrências em cada fenômeno.

8º lugar – Relativização não padrão 18 ocorrências 9º lugar – Coesão textual 04 ocorrências 10º lugar – Ordem dos constituintes 03 ocorrências 11º lugar – Mau estilo (eco, falta de elegância,

uso de modismo)

02 ocorrências 12º lugar

Emprego inadequado do vocábulo. Variação entre “Ter/Haver” (no sentido de existir).

Mistura de tratamento. Mau uso do particípio

Foi registrada 01 ocorrência de cada

Tabela 28. Fenômenos que revelariam “falhas na escrita jornalística” citados pela coluna Autocrítica, segundo a ordem de número de ocorrências.

A Tabela 28 demonstra, de imediato, o rigor avaliativo dos revisores na própria natureza dos temas citados, pois fenômenos como a variação entre os verbos “ter” e “haver” com sentido existencial – tão produtiva na fala do PB – são considerados “falha de português” pelo revisor do jornal. Em relação às estratégias de relativização, o revisor também considera as variantes não padrão inadequadas à escrita a ser praticada pelos jornalistas, tanto que o número de ocorrências das variantes é de 10 registros, o que posiciona o fenômeno em estudo na 8ª posição no ranking das “falhas de português” verificadas em edição anterior do jornal.

Excluindo “os erros de português” de natureza ortográfica (1º), de digitação (4º) e textual (6º e 7º) , o fenômeno em estudo – as estratégias de relativização – sobe quatro posições, alcançando o 4º lugar das “falhas de escrita” não toleradas pelo revisor do jornal. Essa constatação evidencia quanto este fenômeno é censurado pelo juízo de valor do revisor. Observando mais detalhadamente os resultados da coluna em análise, constatou-se, ainda, que os 18 registros relacionados ao tema foram identificados nas seções do Caderno Geral – 12 ocorrências –, no Caderno de Esportes – 05 ocorrências e no Segundo Caderno – 01 ocorrência. Em (86a – d), apresentam-se alguns exemplos retirados da Autocrítica que fazem menção a “falhas” retiradas do Caderno Geral.

(86) a) Na página 5 [Caderno Geral] de ontem: “Nova ossada é encontrada na região do Araguaia.” “A hipótese que se trabalha é que as ampolas estariam em poder...” Erro de regência no emprego do relativo. Certo: “A hipótese com que se trabalha é que as ampolas estariam em poder...” – seção autocrítica do jornal O Globo, data: 30/08/11.

b) Na página 2 de ontem [Caderno Geral]: “Panorama Político/190 milhões de vítimas.” “O descaso que as autoridades brasileiras e americanas trataram o assunto faz com que todos nós, brasileiros, sejamos prejudicados”, diz o enunciado.” Falta do “sic” ou erro de regência no emprego do relativo. Certo: “O descaso com que as autoridades brasileiras e americanas trataram o assunto faz que todos nós...”. – seção autocrítica do jornal O Globo, data: 09/10.

c) P. 15 [Caderno Geral]: “Regras de etiqueta na discussão ambiental”. “A limitação do tempo que cada pessoa poderá dispor para falar revela um certo autoritarismo.” Falta do “sic” ou erro de regência. Certo: “... de que cada pessoa...” – seção autocrítica do jornal O Globo, data: 27/08/11.

d) Na página 3 [Caderno Geral] de ontem: “Uma conta que não fecha”. “... para que o Congresso decida qual é o modelo de política que o país precisa, levando em conta a realidade...” Falta de “sic” ou erro de regência. Certo: “... qual é o modelo de política de que o país precisa...” – seção autocrítica do jornal O Globo, data: 14/02/12.

Esses exemplos (86a – d), que apresentam o pronome relativo “que”, recebem avaliação negativa do revisor devido à realização da variante não padrão cortadora. Segundo os comentários do revisor, trata-se de “Erros de regência no emprego do relativo” ou como “Falta do “sic” ou erro de regência”. Por essa razão as estruturas são imediatamente substituídas por suas respectivas variantes padrão, sendo reescritas pelo revisor. Essa substituição também ocorre em (87a – b), em que o pronome relativo exerce respectivamente a função sintática de complemento relativo.

(87) a) Na página 4 [Caderno Geral]: “Dilma deve definir sucessor de Negromonte ao voltar de Cuba.” “... um suposto dossiê com processos que familiares de Aguinaldo Ribeiro responderiam na Justiça.” Erro de regência. Certo: “... com processos a que familiares...” – seção autocrítica do jornal O Globo, data: 02/02/12

b) Na página 4 [Caderno Geral] de ontem: “A juventude rejeitada no mercado de trabalho.” “Nem sempre é o emprego que você gosta” Principalmente por ser fala, erro de regência no emprego do relativo. Certo: “Nem sempre é o emprego de que você gosta.” – seção autocrítica do jornal O Globo, data: 17/08/10

Em relação ao exemplo (87b), o revisor faz um comentário crítico sobre a construção sintática corrigida – “Principalmente por ser fala, erro de regência no emprego do relativo” – numa tentativa de reforçar a correção da estrutura sintática identificada como “falha de português”. Tal comentário, por não ser formado por uma explicação mais fundamentada em conhecimentos gramaticais, torna-se não substancial para justificar a correção e substituição da oração em análise. Na realidade, exatamente por se tratar de fala, a variante cortadora seria a opção preferencial, e não o contrário. Em (88a – c), são trazidas do Caderno de Esportes as ocorrências da variante não padrão cortadora sendo substituída pelo revisor pela variante padrão.

(88) a) Na página 1 do Caderno de Esportes: “Dever de casa feito.” “No dia que jogador de qualidade não puder jogar, eu paro.” Erro de regência. Certo: “No dia em que jogador de qualidade não puder jogar, eu paro.” – seção autocrítica do jornal O Globo, data: 08/03/12.

b) Na primeira página do caderno de Esporte: “Perto de mais uma decisão, lugar que o time do Vasco não pode sair...” Erro de regência no emprego do relativo. Certo: “Perto de mais uma decisão, lugar de que o time do Vasco não pode sair...” ou “Perto de mais uma decisão, lugar de onde o time do Vasco não pode sair...” – seção autocrítica do jornal O Globo, 14/05/11.

c) Na página 4 do Caderno Esportes de ontem: “Atuações/Flamengo/Bottinelli.” “... e complicou jogadas que poderia ser mais simples. Erro de concordância ou de regência. Certo: “... e complicou jogadas que poderiam ser mais simples.” Certo: ... e complicou jogadas em que poderia ser mais simples.” – seção autocrítica do jornal O Globo, data: 30/08/2011.

Em (88a), o pronome relativo está desempenhando função sintática de adjunto adverbial e, por articular uma oração relativa construída pela variante não padrão cortadora, é repetido em uma oração relativa formada pela variante padrão, para que haja a correção da falha de português.

Em (88b), o revisor propõe duas alternativas de correção da variante não padrão cortadora: a primeira é formada pela variante padrão encetada pelo pronome relativo “que” e a segunda é formada pela variante padrão encetada pelo advérbio relativo “onde”..

Em (88c), a oração relativa não padrão cortadora também possui duas alternativas de correção. Isto porque, além da possibilidade de substituir a variante não padrão pela variante padrão, há a possibilidade de substituir a concordância verbal do predicador da oração relativa não padrão. Colocando o predicador da relativa no plural, de acordo com a norma gramatical, a variante não padrão se tornaria uma variante padrão, visto que se admitira ser o pronome “que” o sujeito da oração.

Foram identificados 04 casos em que as orações relativas livres são substituídas pela variante padrão finita, uma vez que há a tentativa de recuperar a regência verbal dos predicadores das respectivas orações. Em (89a – d), respectivamente, os articuladores desempenham função sintática de complemento relativo (89a – b) e complemento nominal (89d):

(89) a) P. 7 [Caderno Geral] (...): Adiante: “A vida depois da escuridão”. “Elaine se sentiu traída por quem mais havia confiado.” Erro de regência. Certo: “... por aquele em quem mais havia confiado.” – seção autocrítica do jornal O Globo, data: 11/08/11.

b) Na página 4 de ontem [Caderno Geral]: “Educação, um direito até dentro do hospital.” “Além das luvas e do jaleco descartáveis, tudo o que ela precisa está dentro de uma cesta abarrotada de material escolar...” Erro de regência no emprego do relativo. Certo: “Além das luvas e do jaleco descartáveis, tudo o de que ela precisa está dentro de uma cesta abarrotada de material escolar...” Ou então: “Além das luvas e do jaleco descartáveis, tudo aquilo que ela precisa está dentro de uma cesta abarrotada de material escolar...” Ou melhor: “Além das luvas e do jaleco descartáveis, tudo o que ela precisa usar está dentro de uma cesta abarrotada de material escolar...” – seção autocrítica do jornal O Globo, data: 11/10/2011.

c) Na página 4 [Caderno Geral]: “Opinião/Grande irmão”. “Além de decidir o que a família assistirá na telinha, o poder público estará atento a tapinhas e beliscões pedagógicos de pais nos filhos.” Erro de regência. Certo: “Além de decidir aquilo a que a família...” – seção autocrítica do jornal O Globo, data: 17/12/11.

d) P. 2 [Caderno de Esportes]: “Na volta, churrasco...” “Família de Fabiana Murer diz que recepção à campeã mundial do salto com vara será com o que mais sente falta quando está...” Erro de regência no emprego do relativo. Certo: “Família de Fabiana Murer diz que recepção à campeã mundial do salto com vara será com aquilo de que mais sente falta quando está...” – seção autocrítica do jornal O Globo, data: 01/09/11.

Também foram considerados como falhas de Português 02 casos de estratégias de esquiva do uso do relativo “cujo” que estão no exemplo (90a – b). Em (90a), observa-se que o jornalista escreve, segundo os moldes propostos pela norma gramatical, de forma correta, já que a construção sintática “alguns até nem sabiam o nome” não apresenta qualquer suposto problema. Mas, ao ler o comentário crítico do revisor: “Erro na construção com o pronome relativo”, nota-se que a norma padrão que inspira este profissional cerceia a norma padrão que fundamenta a escrita do jornalista, uma vez que propõe a construção sintática que pode ser formada pelo relativo “cujo”.

(90) a) P.5 [Caderno de Esportes]: “Dilma promete ampliar o Bolsa Atleta.” “... fizeram questão de tirar fotos com os vencedores, alguns até nem sabiam o nome.” Erro na construção com o pronome relativo. Certo: “...fizeram questão de tirar fotos com os vencedores, até com alguns cujos nomes nem sabiam. – seção autocrítica do jornal O Globo, data: 11/11/11

b) Na página 3 do Segundo Caderno: “Humor maduro, mas sem perder a graça”. “Foi um filme que, quando li o roteiro, percebi uma ideia que nunca havia sido explorada e que era muito universal”. Erro de regência no emprego do relativo. Certo: “Foi um filme em que... – seção autocrítica do jornal O Globo, 29/06/11.

Em (90b), a estratégia de esquiva do jornalista foi realizada através do uso da variante não padrão cortadora e o revisor o corrige , apelando para o uso da preposição “em”, que parece ser cada vez mais a forma preferida para atribuir ao texto um aspecto de correto. É curioso observar, entretanto, que a correção do revisor não atende plenamente ao que costuma ser proposto pela própria norma gramatical, gerando o que poderia ser considerado por alguns outra “falha de português”. Como o termo

relativizado exerce a função sintática de adjunto adnominal, ele constitui o contexto próprio para ser articulado pelo pronome relativo “cujo”, a fim de formar uma variante padrão (como “foi um filme em cujo roteiro percebi ...”). Este exemplo evidencia claramente como as estruturas sintáticas são diretamente afetadas pelos juízos de valor dos falantes, no caso dos jornalistas e revisores.

Na realidade, tanto o jornalista, quanto o revisor têm como ponto de partida, em suas concepções de norma padrão, aquilo que consideram correto para ser escrito em um jornal de grande circulação. Para o primeiro profissional, o uso da variante não padrão já passa despercebido mesmo na escrita culta jornalística do PB; todavia, o segundo, em seu exercício consciente e ultramonitorado de revisão, cerceia o uso da variante não padrão, corrigindo com uma estrutura sintática que, de acordo com a norma padrão por ele idealizada, não condiz literalmente com que é prescrito pela norma gramatical.

Foram encontrados, ainda, 01 caso de ambiguidade sintática gerada pelo “mau uso do pronome relativo” (91a) e 01 caso de aparente erro de digitação, pelo acréscimo do acento grave, que gerou um problema sintático na construção da oração relativa (91b). Finalmente, foi encontrado 01 caso adicional em que o uso do pronome relativo foi criticado e corrigido pelo revisor (91c).

(91) a) Na página 7 [Caderno Geral] de ontem: “Ano novo, velhos hábitos”. “Registro, com pesar indivisível, a morte de Daniel Piza, que lia e admirava.” Mau uso do relativo/ambiguidade: quem lia e admirava? Eu ou o Daniel? Melhor: “Registro, com pesar indivisível, a morte de Daniel Piza, a quem lia e admirava.” – seção autocrítica do jornal O Globo, data: 05/01/12.

b) Na página 3 [Caderno Geral] de ontem: “Não há crise no Judiciário”. “E é o que, desde as origens, tem feito a magistratura como instituição, à qual foi a primeira a criar, há séculos, as corregedorias.” Mau uso do acento grave. Certo: “... a qual foi a primeira...” – seção autocrítica do jornal O Globo, data: 03/02/11

c) P. 16 [Caderno Geral]: “Opinião/Falta de respeito.” “O costume de empregar (...) é, no mínimo, desrespeito ao contribuinte, quem paga os impostos.” Erro no emprego do pronome. Certo: “O costume de empregar (...) é, no mínimo, desrespeito ao contribuinte, que paga os impostos.” – seção autocrítica do jornal O Globo, data: 09/06/11

É interessante frisar que as ocorrências passíveis de correção são da variante não padrão cortadora. Tal fato reafirma os dados percentuais expostos e analisados nas seções anteriores sobre a variante não padrão copiadora, que seria uma forma pouco produtiva e utilizada na fala em contextos linguísticos muito específicos (cf. MOLLICA, 1977; TARALLO, 1983; CORRÊA, 1998; ABREU, 2013; VALE, 2014), que ainda precisam ser bem mapeados pelas investigações linguísticas.

Outro fato interessante é o modo como o revisor se refere aos dados de variantes não padrão cortadoras, já que ele as interpreta como problema de regência e não como uma legítima alternativa de relativização do termo antecedente. Isto evidencia a influência da norma gramatical na norma padrão que norteia a escrita culta do Jornal O Globo, já que a Tradição Gramatical não reconhece as variantes não padrão copiadora e cortadora – assim como usualmente (exceção a Rocha Lima) não discute o comportamento das chamadas orações relativas livres – e, quando as identifica, imediatamente as rotula como desvio da língua – muitas vezes falada (como se os fenômenos variáveis na modalidade oral não exibissem sistematização linguística).

Focalizando essa discussão teórica para as estratégias de relativização, observa-se que os revisores (e talvez, observa-seguindo a mesma tendência, muitos jornalistas) possuem um juízo de valor depreciativo sobre a variante não padrão cortadora (e, por extensão, sobre a copiadora, avaliada usualmente como mais estigmatizada), uma vez que suas crenças sobre essa estrutura, respaldadas nas prescrições gramaticais, fazem com que assumam uma atitude de desvalorização, tratando-as como “erros de escrita” que devem ser corrigidos com a substituição pela variante padrão – legitimada pela gramática tradicional.

Apenas o discurso publicitário inserido no veículo jornalístico, nos dados analisados, não assumiria supostamente a mesma avaliação, visto que registra alguns dados da estratégia cortadora. Ao que parece, o publicitário admite que essa variante seja viável em contextos menos monitorados, como o do anúncio, e possivelmente o aproxime mais de seu público consumidor, que, como demonstram os estudos da fala brasileira, sobretudo os que se valem de dados contemporâneos, utiliza vastamente tal estratégia.

Com base nas reflexões propostas nesta seção, pode-se supor que, em se tratando da escrita culta brasileira, a variante padrão é altamente valorizada, configurando, para os revisores, mais do que um marcador, uma espécie de estereótipo com valoração

positiva. Faz-se uso consciente e monitorado dessa variante, como única opção viável para os gêneros efetivamente jornalísticos. Para os jornalistas em geral, a variante padrão é considerada do mesmo modo já descrito ou, no máximo, constitui um marcador, uma opção conscientemente eleita para contextos monitorados.

Quanto às variantes não padrão, ambas – cortadora e copiadora – são interpretadas como formas linguísticas marcadas pejorativamente que podem ser caracterizadas como estereótipos negativos, usos estigmatizados pela norma padrão para a escrita jornalística. Esta afirmativa pode ser feita, pois essas variantes – que não são frequentes ou nem se registram – e, quando aparecem, são interpretadas como “erro de português” e são substituídas pela variante padrão. Tal avaliação, entretanto, não impede que a variante não padrão cortadora apareça, embora seja corrigida, em alguns textos do Caderno Geral e dos Esportes, denunciando que, para alguns jornalistas, essa forma já soa natural ou escape mesmo na escrita. Ademais, essa forma aparece e fica registrada em determinados gêneros textuais como os anúncios publicitários que – apesar de ser um gênero textual jornalístico periférico (cf. BONINI, 2001, 2003) – compõe a estrutura textual do veículo. Nesse caso, a interpretação da variante é compatível com a de um marcador, variante a que se recorre em função do grau de monitoração estilística em questão.

CONCLUSÃO

Dentre os vários fenômenos que retratam o caráter heterogêneo que caracteriza as línguas do mundo, o presente estudo ocupou-se das estratégias de relativização. A fim de observar como o caráter variável da língua pode se manifestar nos usos da comunidade de fala, o trabalho desenvolveu os seguintes problemas acerca das estratégias de relativização:

1. Qual é o comportamento das estratégias de relativização na modalidade escrita culta da língua, em particular, na escrita jornalística do português brasileiro representada em exemplares do jornal carioca O Globo?

2. Quais são os fatores linguísticos e extralinguísticos que influenciam na variação do fenômeno na modalidade escrita?

3. Comparando-se os resultados obtidos para a escrita culta a dados da modalidade oral apresentados em outras pesquisas sobre as estratégias de relativização, o fenômeno apresenta o mesmo comportamento?

4. Os juízos de valor dos falantes acerca das estratégias de relativização – no caso dos revisores/jornalistas do jornal O Globo, expressos na coluna de revisão linguística das edições anteriores – interferem no comportamento linguístico quanto a esse fenômeno?

Partindo dos problemas lançados, desenvolveu-se a finalidade de observar o comportamento das estratégias de relativização na escrita culta jornalística brasileira. Além disso, observou-se o comportamento do fenômeno na fala culta através do cotejo de diversas pesquisas com os resultados obtidos no atual trabalho. Finalmente, foi averiguada a avaliação do revisor/jornalista acerca das estratégias de relativização.

Após a realização do estudo partindo dos problemas expostos, evidencia-se que, na escrita culta efetivamente jornalística, o comportamento das estratégias de relativização é categórico, segundo Labov (2003). A variante padrão foi a única