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CAPÍTULO 4: ANÁLISE DOS DADOS

4.2 Análise das observações e notas de campo

Nesta seção, desenvolveu-se a análise das observações e notas de campo registradas nas aulas de português como segunda língua. Foram observadas 07 (sete) aulas de duração de uma hora e meia, totalizando 11h (onze) horas observadas. Portanto, foi feita uma análise descritiva acerca das ações da professora que possibilitem a manifestação do cultural no momento da aula. Por se tratar de uma pesquisa de cunho etnográfico, esta foi apresentada em forma de exposição de fragmentos das aulas observadas e análise destes. As transcrições das observações e as notas de campo se encontram no anexo, no final deste trabalho, em ordem de número de aula observada e data. As notas de campo são anotações feitas no decorrer de cada aula e indagações feitas antes, durante ou após a aula observada.

Para contextualizar, a turma observada foi constituída por sete alunos e a maioria sendo estrangeira ou morou no exterior durante muito tempo.

No decorrer das observações das aulas de português para estrangeiros – denominado “português internacional” – na instituição de educação bilíngüe, a qual engloba alunos de várias nacionalidades, percebeu-se que havia alunos brasileiros tendo aulas de português como segunda língua. Havia dois alunos, irmãos, filhos de um diplomata brasileiro e de uma estrangeira, nascidos no Brasil, mas que viveram a maior parte de suas vidas no exterior, devido à diplomacia. Eles falam inglês em casa, entre si e com os pais. Utilizam a língua portuguesa para interagir com os colegas que o falam e na vida no Brasil. Embora sejam brasileiros, parecem ter aprendido a língua em ambiente formal – na escola, não no familiar. Segundo Kramsch (1998), o falante nativo é geralmente estereotipado por pertencer a uma determinada língua e ser falante da língua desta cultura. No entanto, como o exemplo mostra, alguns alunos, filhos de estrangeiros ou não, ou nasceram no Brasil, não necessariamente se sentem falantes nativos da língua portuguesa do Brasil, como há outro caso peculiar: a presença de um aluno brasileiro, filho de brasileiros, residente no Brasil, nunca viveu fora do país, fala português em casa, etc., e estuda língua portuguesa para estrangeiros. Admite sentir dificuldade com a língua, já que estudou a sua vida inteira em uma escola americana em Brasília.

Com base nas teorias de abordagens de ensinar uma segunda língua, mais especificamente, no âmbito do ensino e aprendizagem de uma segunda língua por meio da Abordagem Comunicativa Intercultural (ACIN) e nas concepções complexas, por vezes, míope, de cultura, buscou-se analisar as seguintes características da Abordagem Comunicativa

Intercultural: 1 – língua como cultura; 2 – o foco do ensino no sentido; e 3 – o diálogo de culturas.

Nas aulas, foi utilizado um material produzido pela professora. Tal trata-se de uma ficha com informações retiradas de livros didáticos, revistas, jornais e gramáticas. Grande parte deste material contém uma ficha gramatical, com estruturas de cunho estrutural.

Portanto, iniciou-se a análise por meio do lugar da cultura, do aspecto cultural, ou da concepção língua-cultura no processo e como filtro para análise, apresentam-se as principais características da Abordagem Intercultural (ACIN), e categorias de análise em questão, propostas por Oliveira Santos (2004) abaixo:

1 – A língua como cultura. A visão de língua, ou linguagem, como instrumento social de comunicação, o qual inclui uma rede complexa de fatores lingüísticos e extralingüísticos. Língua que mais do que parte da dimensão cultural, ela é a própria cultura, se confunde com ela. A essa língua que não é uma abstração teórica e que não possui existência fora do contexto social de uso pelos seus falantes, denominaremos de língua-

cultura..

2 – O foco no sentido. A organização das experiências de ensinar e aprender com

foco no sentido, no uso comunicativo da língua, em detrimento da prática excessiva e descontextualizada de estruturas formais. Quaisquer que sejam os conteúdos tomados como ambientes para o desenvolvimento da aprendizagem, o importante é o modo como esses conteúdos, sejam relativos a informações culturais ou não, funcionam como pontes e passaportes de acesso a novas experiências e significados construídos em conjunto.

3 – O diálogo de culturas. Ensinar e aprender uma língua-cultura como processos que englobam, além dos aspectos lingüísticos propriamente ditos, toda a rede de aspectos socioculturais, cognitivos, afetivos e psicológicos que caracterizam o uso da linguagem; processos que visam ao engrandecimento do indivíduo como sujeito histórico, cultural e como cidadão, e ao uso comum da nova língua-cultura como passaporte para a inserção pacífica e dialógica do sujeito no mundo à sua volta. Pressupõem também o desenvolvimento da intersubjetividade, pela construção conjunta de conhecimentos, através da partilha de experiências, antigas e novas, de pessoas que se reconhecem como pertencentes ao mesmo mundo, ao mesmo processo de construir as suas vidas ao vivê-las.

Edleise Mendes Oliveira Santos (2004, p.157-158)

Na ACIN, outros aspectos, não expostos nesta pesquisa, fazem parte, tais como: a integração de competências, materiais como fonte, agência humana e avaliação. Para se analisar a questão cultural no momento da aula, buscou-se fundamentar nos aspectos, ou até princípios, acima propostos.

A ACIN é a fundamentação teórica deste trabalho. Por ser uma abordagem moderna e que engloba, de certa forma, as questões, após várias discussões, essenciais do processo de

ensino e aprendizagem de línguas, foi tomada como olhar para a questão cultural a partir das ações da professora no momento da aula de português como segunda língua. Como escopo do trabalho, esta abordagem é uma ferramenta que possibilita auxiliar o olhar para esta questão, como investigação, a partir do olhar do observador-pesquisador e não, necessariamente, se espera que o professor observado apresente esta concepção para o processo.

O primeiro aspecto examinado é a concepção língua-cultura. Como bem afirmado por Oliveira Santos (2004), a visão de língua abrange mais do que sua forma. Trata-se de uma prática social, um instrumento social de comunicação.

4.2.1 A língua como cultura

Esta característica da abordagem comunicativa culturalmente sensível e, neste caso, um critério de análise, considera a língua ou o uso desta como cultura. É impossível dissociar a língua da cultura. Entretanto, a partir deste critério, analisou-se o momento cultural por meio da exposição de aspectos culturais e da língua-cultura.

Em uma de suas aulas, a professora descreve a origem da língua portuguesa mostrando informações sobre a Península do Lácio e que um povo dominado absorve a cultura, como segue o fragmento: