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5. ANÁLISE DE CASOS CONCRETOS ENVOLVENDO IMPROBIDADE

5.2 ANÁLISE DE CASOS CONCRETOS PARA EDIÇÃO DE MEDIDAS

Outro caso envolvendo o pagamento de propina condicionada à aprovação de leis está em andamento na 10° Vara Federal do Distrito Federal, referente à edição de pelo menos três Medidas Provisórias convertidas em lei.215 Por se tratar de ação que tramita em segredo de justiça não foi possível ter acesso ao conteúdo do processo, mas apenas ao que foi seletivamente divulgado pela imprensa.

As MPs, regulamentadas no art. 62 da CF, são atos que, apesar de serem unipessoais e de competência do Presidente da República possuem força de lei e atuam no ordenamento como se lei fossem. A edição de Medidas Provisórias só deve ser utilizada nos casos em que

215 RICHTER, André. Operação Zelotes investiga suposta compra de medidas provisórias. Agência Brasil.

Disponível em: http://agenciabrasil.ebc.com.br/politica/noticia/2015-10/operacao-zelotes-investiga-suposta- compra-de-medidas-provisorias. Acesso em 04 fev 2017.

há relevância e urgência na sua edição, pois ela possui efeitos imediatos e a apreciação legislativa é postergada para momento posterior.

Antes da apreciação da MP pelo Poder Legislativo, elas podem permanecer em vigor por período de 60 dias, podendo ser prorrogado por igual período. Se ela não for aprovada no prazo de 45 dias, contados da sua publicação, a MP entrará em regime de urgência sobrestando as demais matérias em trâmite, seja na Câmara ou no Senado, até ela que seja votada, nos termos do art. 62 CF/88. Apenas algumas espécies de proposições podem ser votadas pela Câmara em sessão extraordinária.

A avaliação da relevância e urgência, no entendimento da jurisprudência216 do STF, cabe ao juízo discricionário do Presidente da República. Nem sempre estas condições são observadas pelo Poder Executivo antes de editar MPs, sendo elas por vezes utilizadas como uma forma de legislação prévia, dando tempo ao governo para obter os votos necessários para aprovação destas normas de seu interesse.

Ainda que as MPs não representem leis formais, elas criam e extinguem obrigações jurídicas. Algumas matérias como nacionalidade, cidadania, Direitos Políticos, Direito Penal, Direito Processual Penal e Civil, entre outras, não podem ser disciplinadas por essa via, como veda o art. 62, §1° CF/88.

Por sua vez, o Direito Tributário é disciplina frequentemente tratada por esta via, principalmente na majoração e/ou redução de alíquota de tributos de caráter extrafiscais, também chamados de reguladores de mercado, tais como: imposto de importação, imposto de exportação, imposto sobre produtos industrializados e o imposto sobre operações de créditos, câmbios e seguros, ou relativas a títulos e valores mobiliário.

No caso deste processo ainda em trâmite na Justiça Federal do Distrito Federal, ele se originou a partir de investigações da Polícia Federal em 2015 que deflagrou a Operação “Zelotes”, com intuito de apurar os crimes de advocacia administrativa fazendária, tráfico de influência, corrupção passiva, corrupção ativa, associação criminosa, organização criminosa e lavagem de dinheiro, cometidos no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF), com objetivo de reduzir ou anular multas aplicadas a empresas, além de haver também a

216 ADIn n. 162, rel. Min. Moreira Alves, j. 14-12-1989. ADIs: ADIMC n. 1.397-DF- Pleno, rel. Min. Carlos

suspeita de compra de Medidas Provisórias por empresas ligadas à indústria automobilística.217

Segundo as investigações, algumas empresas do ramo automobilístico formaram um grupo que por meio da atuação de lobistas e mediante o pagamento de propina conseguiram durante anos diversas Medidas Provisórias que os concedessem vantagens tributárias, como prorrogação de isenção do IPI. 218

Até o presente momento, 11 pessoas já foram condenadas em razão dos crimes cometidos para reduzir ou zerar as multas que haviam sido aplicadas pelo CARF. Dentre os condenados estão empresários do ramo automobilístico, lobistas e um servidor do Senado Federal.219 Apesar de alguns agentes políticos figurarem como investigados, ainda não houve nenhuma condenação por se tratar de processos diferentes originados de uma mesma investigação.

O fato de não termos acesso ao processo e contarmos apenas com matérias divulgadas pela impressa não nos permite uma análise mais aprofundada do caso. Apesar de as investigações apontarem que o desvio de dinheiro investigado pela Operação “Zelotes” é de pelo menos três vezes maior do que o desvio ocorrido na Petrobras e descoberto na Operação “Lava Jato”220, muito pouco está sendo publicado e divulgado pela grande mídia sobre essa operação e seus desdobramentos. Por isso, teceremos apenas algumas considerações hipotéticas a respeito da possível corrupção na aprovação das referidas MP.

De acordo com as investigações, três MP foram editadas mediante o pagamento de propina, sendo elas: MP 471/2009, convertida na Lei n° 12.218/10; MP 512/10, convertida na Lei n° 12.407/11; e MP 627/13, convertida na Lei n° 12.973/14. Todas concederam incentivos fiscais para a indústria automotiva. Até o presente momento, 9 pessoas já foram condenadas

217 RICHTER, André. Operação Zelotes investiga suposta compra de medidas provisórias. Agência Brasil.

Disponível em: http://agenciabrasil.ebc.com.br/politica/noticia/2015-10/operacao-zelotes-investiga-suposta- compra-de-medidas-provisorias. Acesso em 04 fev 2017.

218 LIMA, Sergio. Entenda a Operação Zelotes da Polícia Federal. Folha de São Paulo. Disponível em:

http://www1.folha.uol.com.br/mercado/2015/04/1611246-entenda-a-operacao-zelotes-da-policia-federal.shtml. Acesso em: 04 fev 2017.

219 VALENTE, Gabriela. MPF vai recorrer da condenação na Operação Zelotes. O Globo. Disponível em:

http://oglobo.globo.com/economia/mpf-vai-recorrer-da-condenacao-na-operacao-zelotes-19232843. Acesso em: 04 fev 2017.

220 PRAGMATISMO POLÍTICO. Zelotes: a operação que investiga esquema 3x maior que a Lava Jato.

Disponível em: http://www.pragmatismopolitico.com.br/2015/10/zelotes-a-operacao-que-investiga-esquema-3x- maior-que-a-lava-jato.html. Acesso em: 04 fev 2017.

pelo envolvimento na compra e venda das referidas MPs, mas nenhuma delas é agente político.221

Assumindo que o vício na edição destas MPs tenha se originado ainda no Poder Executivo, a comprovação de sua ocorrência, em tese, seria menos complexa por necessitar apenas da comprovação do envolvimento do chefe do Poder Executivo. Caso a edição das MPs tenha ocorrido de maneira isenta, com incidência de corrupção apenas no momento da conversão destas em leis, o critério para aferir o grau de mácula causado ao processo legislativo seria o mesmo apresentado em relação às EC n° 16 e n° 41: proporção entre quantidade de condenados e quórum obtido para aprovação.

Já os efeitos de uma declaração de inconstitucionalidade dessas MPs, poderiam ser minimizados com mais facilidade do que nos casos das EC trabalhadas no item anterior. Por se tratar de MPs, é da própria natureza dessa espécie normativa a possibilidade de sua rejeição pelo Congresso Nacional. Nesse sentido, o art. 62, § 3º, da CF/88 disciplina que, não havendo a conversão dessas em lei no prazo máximo de 120 dias, elas perderão sua eficácia desde a edição, cabendo ao Congresso Nacional disciplinar, por decreto legislativo, as relações jurídicas delas decorrentes.

Nos casos de vício por corrupção em leis fruto de conversão de MPs, a melhor solução para modular os efeitos de sua anulação seria dar a elas o tratamento já preceituado pela própria Constituição para os casos de rejeição. Cabendo, assim, ao Congresso Nacional regular as relações jurídicas criadas sob efeito destas.

No caso das três MPs objetos de investigação da Polícia Federal na Operação “Zelotes”, por todas se tratarem concessão de benefícios fiscais, as relações jurídicas decorrentes de sua edição se pautam em um aspecto eminentemente financeiro. Portanto, a sua declaração de inconstitucionalidade não impactaria diretamente em nenhum direito humano ou garantia fundamental, limitando-se à querela do aspecto monetário de restituição aos cofres públicos dos valores indevidamente não tributados.

221 RICHTER, André. Operação Zelotes investiga suposta compra de medidas provisórias. Agência Brasil.

Disponível em: http://agenciabrasil.ebc.com.br/politica/noticia/2015-10/operacao-zelotes-investiga-suposta- compra-de-medidas-provisorias. Acesso em 04 fev 2017.

5.3 ANÁLISE DE CASO CONCRETO PARA APROVAÇÃO DE LEI MUNICIPAL: