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3 A LOCALIZAÇÃO ESPACIAL E TEMPORAL: RORAIMA/ BOA VISTA

10.1 Análise dos Documentos Oficiais

A análise dos documentos oficiais foi o conhecimento preliminar, em que Bardin (2011) fundamenta a pré-análise como documentos que fundamentam indicadores para a interpretação final e pelo fato de comportar toda uma significação para subsidiar informações que contribuam na interpretação, buscando elemento simbólico para apoiar e inferir com os outros instrumentos coletados pelos participantes da pesquisa, como também são materiais que demonstram as várias maneiras de como funciona a organização e como as pessoas se comunicam.

O Referencial Curricular do Ensino Médio do Estado de Roraima, do ano de 2012, contém a sistematização da proposta curricular para todas as escolas do Ensino Médio de Roraima. Foi composto por professores da rede estadual, que atuam em

suas áreas de conhecimento, como também teve a contribuição de professores participantes, os quais atuam no Ensino Superior do Estado.

O referido referencial está dividido pelos componentes curriculares, os quais estão subdivididos em tópicos, que são: Concepção do Componente Curricular; Competência e Habilidades; Contextualização, Interdisciplinaridade e Conteúdo; e o Desafio de Avaliar. (RORAIMA, 2012).

No que se refere à Lei 10.639/03, que trata sobre o Ensino da História e Cultura Afrobrasileira e Africana, este ficou no tópico de Contextualização, Interdisciplinaridade e Conteúdo, que tem como finalidade organizar os conteúdos de cada disciplina do Ensino Médio no contexto atual mundial, nacional e regional, em que busca viabilizar a interdisciplinaridade.

Na disciplina de Geografia, o foco da pesquisa está concentrado no subtópico denominado Cultura, Diversidade e Ser Humano, no qual se conceitua a finalidade deste como:

O primeiro contexto nos convida a conhecer o homem e o espaço por ele habitado e muitas vezes transformado segundo suas necessidades ou interesses. Nesse contexto, a cultura produzida pelos seres humanos, representados por tradições e também inovações podem orientar o educando a valorizar o patrimônio sociocultural e respeitar a sociodiversidade, reconhecendo-os como direitos dos povos e indivíduos como elementos de fortalecimento da democracia. (RORAIMA, 2012, p. 195).

No bloco dos conteúdos, a temática está situada no 1º ano, no que se refere “[...] a situação dos negros e dos índios no Brasil” (RORAIMA, 2012, p. 198); no 3º ano, se refere à “África como centro das atenções do mundo – atualidades”. (RORAIMA, 2012, p.198).

Na disciplina de Geografia, a temática é salientada no início e no término do Ensino Médio, o que é muito importante, pois esses dois momentos, na história escolar do aluno, são marcantes. Igualmente, na escrita garante, no processo do ensino- aprendizagem, condições que quebrem os estereótipos, o combate ao racismo, além de educadores e educandos ampliarem e aprofundarem a discussão do direito humano.

Na disciplina de História, no que trata sobre o Ensino da História e Cultura Afrobrasileira e Africana, a temática está situada no tópico de Contextualização, Interdisciplinaridade e Conteúdo, mas de forma muito abrangente, ao especificar:

Com a dificuldade de colocar o índio para trabalhar nas lavouras e nas minas, os africanos foram introduzidos no território brasileiro na condição de escravos, como opção de mão de obra barata para os senhores colonizadores, o que gerou um forte comércio de tráfico de escravos, com lucros fáceis, vindos principalmente de Moçambique, Cabo Verde e outras regiões da costa africana, banhada pelo Oceano Atlântico (RORAIMA, 2012, p. 211).

Em nenhum momento essa disciplina faz referência a algum conteúdo ou temática específicos sobre a História e Cultura Afrobrasileira. Descreve um percurso histórico de forma simplista sobre a formação do povo brasileiro, colocando a condição do negro como escravo.

Com a obrigatoriedade do ensino da História e Cultura Afrobrasileira, a Lei 9.394, art. 26-A, caput e § 1º ressalta:

Art. 26-A. Nos estabelecimentos de ensino fundamental e de ensino médio, públicos e privados, torna-se obrigatório o estudo da história e cultura afro- brasileira e indígena.

§ 1º [...] o estudo da História da África e dos Africanos, a luta dos negros no Brasil, a cultura negra brasileira e o negro na formação da sociedade nacional, resgatando a contribuição do povo negro nas áreas social, econômica e política pertinentes à História do Brasil. (BRASIL, 1996).

Dessa forma, possibilita uma reinterpretação das questões raciais, mas não acontece no que se refere à escrita do referencial, na disciplina de história, pois o reforço do negro se dá na base colonialista, da exploração do trabalho e não ressalta o negro como sujeito social atuante na formação da sociedade nacional.

Na disciplina de Arte, a construção didático-pedagógica está na concepção do afrobrasileiro, que especifica: “A arte do afro-brasileiro e indígena” (RORAIMA, 2012, p. 279), em que descreve a recriação, a coreografia das lendas e parlendas numa perspectiva em que os alunos percebam as diversas realidades culturais e econômicas da miscigenação linguística causada pela migração e imigração.

O ensino de artes no estado de Roraima está de acordo com a Lei nº 10.639, de 9 de janeiro de 2003, ao descrever no:

Art. 26-A. Nos estabelecimentos de ensino fundamental e médio, oficiais e particulares, torna-se obrigatório o ensino sobre História e Cultura Afro-Brasileira. § 1o O conteúdo programático a que se refere o caput deste artigo incluirá o estudo da História da África e dos Africanos, a luta dos negros no Brasil, a cultura negra brasileira e o negro na formação da sociedade nacional, resgatando a contribuição do povo negro nas áreas social, econômica e política, pertinentes à História do Brasil.

§ 2o Os conteúdos referentes à História e Cultura Afro-Brasileira serão ministrados no âmbito de todo o currículo escolar, em especial nas áreas de

Educação Artística e de Literatura e História Brasileiras. (BRASIL, 2003b, grifo do autor).

Em atividade prática no ensino linguístico, citam-se, como exemplo, “adaptações da capoeira em Roraima”, sem especificar que adaptação é essa. Na forma descrita, deixa entender como se existisse um tipo de capoeira próprio de Roraima.

Outra questão importante é que a temática afrobrasileira está ligada ao indígena; o grande problema dos temas está interligado. É que a cultura indígena se sobrepõe na realidade de Boa Vista e sempre deixa a cultura negra em segundo plano.

Na disciplina de Língua Portuguesa, especifica exclusivamente as contribuições linguísticas indígenas e salienta também os dialetos e as línguas diferentes, como o espanhol e o inglês, pois Roraima, geograficamente, faz fronteira com a Venezuela e a Guiana Inglesa.

Na literatura, em nenhum momento descreve a situação didático-pedagógica que retome a temática afrobrasileira.

Então o ensino de Literatura, em nenhum momento desenvolve o tema, não estando de acordo com a Lei nº 10.639, de 9 de janeiro de 2003, ao descrever no Art. 26-A., § 2º: Os conteúdos referentes à História e Cultura Afro-Brasileira serão ministrados no âmbito de todo o currículo escolar, em especial nas áreas de Educação Artística e de Literatura e História Brasileiras”. (BRASIL, 2003b).

Promove-se, assim, uma ocultação da literatura afro, como se, no Brasil, ou mesmo em Roraima, não existisse ou não tivesse importância para desenvolver no processo de ensino-aprendizagem nas escolas do Ensino Médio de Roraima.

Nos Projetos Político-Pedagógicos (PPP) das escolas, no que se refere ao objeto da pesquisa, não citam a Lei 10.639/03 e o Parecer do CNE 01 e 03/2004, com relação à inclusão do tema da educação das relações raciais e do ensino de História e Cultura Afrobrasileira e Africana. No que se refere à missão, esta está de forma generalizada nas duas escolas, no respeito às diversidades, em que se promova o ensino-aprendizagem dialógico e se incuta no aluno atuação crítica e participativa.

A relação do Projeto Político-Pedagógico está relacionada intrinsicamente com o currículo desenvolvido na escola, mas o referido projeto, em que deveriam constar diretrizes para o trabalho pedagógico das culturas dos povos, não especifica como também é o documento pouco valorizado, pois ele deveria ser a base da atividade didático-pedagógico-administrativa da escola.

No que se refere às disciplinas nas duas escolas, as relações raciais estão configuradas no ensino de Artes, ao expor, nos PPP, a importância de analisar, refletir, respeitar e preservar as diversas manifestações de arte, as múltiplas linguagens que são utilizadas por diferentes grupos sociais e étnicos, interagindo com o patrimônio nacional e internacional, que se deve conhecer e compreender em sua dimensão sócio-histórica.

Também foi especificado na disciplina de Sociologia, ao se descrever que é necessário compreender e valorizar as diferentes manifestações culturais de etnias e segmentos sociais, agindo de modo a preservar o direito à diversidade, enquanto princípio estético, político e ético que supera conflitos e tensões do mundo atual.

A obrigatoriedade legal da inclusão da História e Cultura Afrobrasileira e Africana, que têm como finalidade o fortalecimento da consciência negra, tanto entre os negros e como em outras etnias, nos documentos educacionais acima apresentados, no que se refere ao currículo do estado de Roraima e nas repercussões pedagógicas, no Projeto Político Pedagógico das escolas na cidade de Boa Vista/RR, ainda não valorizam devidamente nem buscam reparar os danos que se repetem há séculos no que se refere ao povo afrobrasileiro.

Faz-se necessária uma política educacional que ressalte temas que focalizem a história e a cultura afrobrasileira e africana, pois esta temática diz respeito a todas as etnias, visto que se faz necessária uma formação numa perspectiva multicultural, para assim termos uma sociedade de respeito mútuo e de predominância democrática.