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Análise dos Aspetos Metrológicos na Saúde em Portugal

No documento João Pedro Vasconcelos Pestana Leão (páginas 71-73)

A prestação de cuidados de saúde em Portugal caracteriza-se pela coexistência de um Serviço Nacional de Saúde (SNS) e de subsistemas públicos e privados.

O Sistema de Saúde Português incorpora simultaneamente financiamento público e privado, sendo maioritariamente financiado pela tributação aos trabalhadores e empregadores nos subsistemas públicos, enquanto no privado o financiamento substancia-se por co-pagamentos e pagamentos diretos do utente [81].

O aumento da longevidade da população, e a utilização crescente de medicamentos e tecnologia, têm determinado um acréscimo nas despesas com a saúde, traduzindo-se numa fração cada vez maior do Produto Interno Bruto (PIB) Português.

Em 2015 a despesa corrente com a saúde aumentou 2,0 %, em valor, face ao ano anterior, atingindo os 15.887,7 M€, enquanto o PIB avançou 3,4 %, traduzindo um peso da despesa corrente no PIB de 8,9 % e a uma despesa corrente per-capita de 1.533,85 € [82].

Os serviços de cuidados curativos e reabilitação, e os equipamentos médicos disponibilizados a doentes não internados, constituem as despesas mais representativas quer nos prestadores privados, quer nos públicos.

Em Portugal, os gastos em equipamentos médicos atingem os mil milhões de euros, dos quais 700 M€ ficam a cargo do Serviço Nacional de Saúde (SNS) [83].

Dada a atual conjuntura económica, os cortes orçamentais aplicados à área da saúde conduziram a mudanças significativas no funcionamento dos serviços, com o objetivo de racionalizar a utilização dos recursos materiais e humanos [84].

Atualmente os estabelecimentos de prestação de cuidados de saúde estão sob uma pressão crescente para identificarem formas de contenção de despesas operacionais e, simultaneamente, corresponderem às crescentes exigências de qualidade e segurança do seu serviço [84].

Na sua generalidade estes estabelecimentos consideram que os custos de manutenção dos equipamentos médicos são demasiado elevados, muito devido ao elevado número de equipamentos existentes mas, também, atendendo ao seu elevado grau de sofisticação.

Apesar da manutenção representar elevados custos financeiros para as instituições de saúde, constitui um indicador da qualidade dos equipamentos.

A manutenção é uma das áreas que mais depende dos conceitos de qualidade por forma a participar eficazmente no processo de melhoria contínua de qualquer instituição.

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Porém, atualmente, e considerando que todas as instituições de prestação de cuidados de saúde possuem os seus próprios departamentos de qualidade, a sua grande maioria não dispõe de uma gestão interna que se encarregue dos equipamentos médicos à luz das normas de qualidade.

Para a grande maioria destas instituições, a atual gestão hospitalar apenas trata dos equipamentos industriais presentes nas suas instalações, isto é, aqueles que são parte integrante do edifício, nomeadamente os sistemas AVAC, os AQS, entre outros, sendo que para os equipamentos médicos a sua gestão e manutenção é subcontratada a entidades externas (os próprios fabricantes dos equipamentos médicos, fornecedores, empresas do ramo), o que constitui uma despesa representativa.

Neste sentido, verifica-se cada vez mais a necessidade dos SIE gerirem a manutenção destes equipamentos médicos em parceria com os seus departamentos de qualidade, evoluindo-se assim no sentido da otimização de custos, sendo para tal necessário mudar a atual filosofia.

Para além de uma gestão pouco focada nos equipamentos médicos, constata-se que as manutenções realizadas a estes equipamentos são pouco adequadas.

Neste contexto, a grande maioria, senão mesmo todos os estabelecimentos de prestação de cuidados de saúde em Portugal, seguem exaustivamente as recomendações dos fabricantes dos equipamentos relativamente à manutenção preventiva, independentemente do estado em que este se encontra. Isto leva frequentemente a realização de manutenções desnecessárias, ou excessivas, já que o foco se encontra apenas na mitigação do risco operacional. Para além do desperdício de recursos, o tempo gasto a efetuar manutenção desnecessária faz com que os estabelecimentos incorram em despesas desnecessárias [85].

É certo que devido ao risco inerente ao ambiente hospitalar, pode ser difícil aceitar o desenvolvimento de políticas de manutenção que não aquelas que são recomendadas pelos fabricantes, porém, e tendo em conta o atual panorama económico, com uma crescente pressão no corte de despesas na saúde, não se deverá continuar a optar pelo caminho fácil, aplicando cegamente as recomendações dos fabricantes acerca dos intervalos de manutenção. Estes intervalos são desenvolvidos tendo em conta uma estratégia de mitigação do risco do ponto de vista legal e na eventualidade de ocorrência do pior cenário possível, levando muitas vezes à manutenção em excesso [86] [87].

Para além disto, constata-se que a legislação metrológica vigente em Portugal é insuficiente, sendo que na grande maioria dos estabelecimentos de prestação de cuidados de saúde é verificada a ausência, ou prática quase inexistente, de procedimentos rigorosos visando o controlo metrológico em equipamentos médicos com funções de medição, à exceção dos instrumentos de medição de radiações ionizantes e dos instrumentos de pesagem não automática.

Tais situações, põem em causa a veracidade dos resultados de medição obtidos por estes equipamentos cujo controlo metrológico é pouco ou nenhum, comprometendo o seu desempenho, a segurança de utentes e profissionais de saúde, o processo de diagnóstico e/ou o tratamento e consequentemente, agravando o orçamento destes estabelecimentos.

Tendo em consideração o panorama atual da saúde em Portugal, é evidenciada a falta de uma abordagem metrológica no controlo dos equipamentos, que resulta numa inadequabilidade destes instrumentos ao uso.

Verifica-se que, na sua generalidade, não é tida em conta a localização e o tipo de utilização dos equipamentos inseridos nos planos de manutenção preventiva, sendo aplicada a mesma metodologia a todos os equipamentos da mesma tipologia.

Assim sendo tornam-se evidentes prejuízos inerentes aos pacientes e estabelecimentos de prestação de serviços de saúde devido à duplicação de exames de diagnóstico, à aquisição desnecessária de novos equipamentos ou outro tipo de custos indiretos revertidos em desperdício [10].

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Por fim, para terminar esta análise acerca da situação atual da metrologia na saúde em Portugal, que teve o intuito de identificar algumas das vulnerabilidades responsáveis por influenciar negativamente o desempenho das atividades metrológicas hospitalares em Portugal, resta referir um último ponto critico acerca dessa realidade.

Em algumas situações existem dúvidas por parte dos profissionais de saúde sobre a utilização de determinado equipamento, o que origina em alguns casos o uso incorreto e o aumento da probabilidade de acidentes.

A par de alguma falta de formação para uma correta utilização dos equipamentos médicos, assiste-se igualmente a alguma falta de atitude proactiva em relação aos conhecimentos e procedimentos metrológicos. Isto traduz-se numa inerente falta de capacidade, ou dificuldade, em interpretar a validade dos resultados das medições efetuadas por esses equipamentos, o que conduz a diagnósticos erróneos, pedidos de reparação desnecessários e consequentemente, a custos acrescidos [88].

Apesar das últimas décadas terem sido favoráveis ao desenvolvimento do sector da saúde, este encontra-se ainda muito aquém da situação ideal quando comparado com outros sectores de atividade, e assim, neste contexto, o futuro torna inevitável a aplicação de abordagens metrológicas para o desenvolvimento deste sector.

No documento João Pedro Vasconcelos Pestana Leão (páginas 71-73)